segunda-feira, 8 de abril de 2013

Patriotadas - Mary Zaidan (Blog do Noblat)

Enviado por Mary Zaidan - 07.04.2013 |
Blog do Noblat, 16h26m

Política

Patriotadas, por Mary Zaidan

O governo norte-coreano informou sexta-feira que não poderá garantir a segurança de representações diplomáticas instaladas na capital Pyongyang. De pronto, o Brasil decidiu não fechar a embaixada que nem aberta deveria ter sido.
Pelo menos é o que se depreende da fala do ministro das Relações Exteriores Antônio Patriota ao tentar explicar a importância da presença brasileira em terras que sequer registram brasileiros residentes, e que, por ano, têm troca comercial irrisória, de pouco mais de R$ 370 milhões. Sem rir, disse que com a embaixada o Brasil passou a ter informações “de primeira mão”, deixando de depender da “imprensa ocidentalizada”.
Pelo jeito Patriota crê que a mídia não controlada do Ocidente é menos confiável do que as informações da ditadura de Kim Jong-un, que agora brinca de ameaçar o mundo com uma guerrinha nuclear. Deve achar normal também o Brasil ter instalado nos últimos 10 anos nada menos do que 62 embaixadas, boa parte em lugares exóticos como Tuvalu, com menos de 13 mil habitantes, Burkina, Butão, Samoa, Palau, Ilhas Fiji, Nauru e Névis.
Desde que Celso Amorim instituiu no Itamaraty a supremacia partidária acima das questões de Estado, a diplomacia brasileira caminha trôpega. Isso, quando caminha.
Laços fraternos com presidentes do Irã Mahmoud Ahmadinejad e da Síria Bashar al-Assad, erros crassos em Honduras, emissão farta de passaportes diplomáticos para amigos e familiares do ex-presidente Lula são algumas marcas de que Amorim deveria se envergonhar.
Com Dilma já eleita, enquanto 80 nações condenavam a lapidação, tendo como símbolo a iraniana Sakineh Mohammadi Ashtiani, o Brasil postou-se junto aos progressistas Angola, Benin, Butão, Guatemala, Marrocos, Nigéria e Zâmbia, omitindo-se.
Patriota começou valente. Por um momento, até pareceu que corrigiria rumos. Mas qual o quê.


Na América do Sul, ficou de cócoras frente aos desmandos da argentina Cristina Kirchner, que continua a sobretaxar e a dificultar a entrada de produtos brasileiros em seu País. Faz vista grossa à falsa democracia venezuelana. E é incapaz de agir em defesa dos cidadãos brasileiros no exterior. Que o digam os 12 presos em regime fechado, há quase dois meses, acusados de forma genérica da morte de um jovem durante o jogo San José x Corintians, em Oruro, interior do País do amigo do peito Evo Morales, para quem Lula fez campanha.
Uma década de diplomacia esquizofrênica, expansionista, caríssima e nada eficaz. Que cada dia está mais distante dos fóruns que importam no mundo; que preferiu ser parceira do atraso. Mas isso é pura intriga da “imprensa ocidentalizada”.

Mary Zaidan é jornalista. Trabalhou nos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo, em Brasília. Foi assessora de imprensa do governador Mario Covas em duas campanhas e ao longo de todo o seu período no Palácio dos Bandeirantes. Há cinco anos coordena o atendimento da área pública da agência 'Lu Fernandes Comunicação e Imprensa'. Escreve aqui aos domingos. @maryzaidan
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IstoÉ, 06/04/2013 | 19:04
O patriotismo torto de Patriota
Atuação burocrática e deslizes diplomáticos desgastam o chanceler Antonio Patriota, que recebe ultimato de Dilma
Claudio Dantas Sequeira

PUNHOS FRÁGEIS
De Dilma para o ministro Antonio Patriota:
“Ou demonstra liderança ou deixa o cargo”
A diplomacia é a expressão internacional dos interesses de uma nação. É feita de gestos discretos sim, mas também de ações contundentes. Desde que assumiu o comando do Itamaraty há mais de dois anos, o chanceler Antonio Patriota aferrou-se à primeira parte da sentença. Mantém uma postura discreta, burocrática, uma espécie de timidez funcional. Não bastasse isso, acumulou deslizes diplomáticos e, em consequência, perdeu espaço na Esplanada. Irritada com os erros e especialmente com a falta de iniciativa do subordinado, a presidenta Dilma Rousseff tem evitado recebê-lo e já mandou o recado: ou Patriota demonstra a liderança que seu cargo exige ou aposenta seus punhos de renda. A última vez que o ministro pisou no gabinete de Dilma foi em 22 de janeiro, quase três meses atrás. “Ele tremia durante a audiência”, relata um assessor. O medo só acentuou o desgaste que começou há quase um ano.

O primeiro vacilo de Patriota, segundo assessores palacianos, foi na visita da presidenta aos Estados Unidos em março do ano passado. O encontro quase protocolar, sem honras de chefe de Estado, decepcionou Dilma, que havia recebido o colega americano Barack Obama em Brasília, com toda pompa, um ano antes. Esperava-se, aliás, que as relações bilaterais com os EUA avançassem significativamente na gestão de Patriota, considerando que o diplomata conhece a fundo a cultura e a política daquele país. Foi embaixador em Washington e casou-se com uma diplomata americana, Tania Cooper, funcionária da ONU e filha de Charles Cooper, afamado ex-oficial de contra-inteligência do Exército americano. O que se viu, porém, foi o efeito inverso. As relações diplomáticas esfriaram e as exportações recuaram, apesar de os EUA terem mantido o Brasil no sistema geral de preferências.

Outro flagrante tropeço da gestão de Patriota foi a demora em agir para tentar evitar o processo de impeachment do presidente paraguaio Fernando Lugo. Apesar dos alertas da embaixada sobre a deterioração da governabilidade do bispo, o chanceler brasileiro só reagiu quando a destituição de Lugo era um fato consumado. Dilma foi pega de surpresa e restou ao governo brasileiro retirar seu embaixador de Assunção, em protesto ao que chamou de “golpe parlamentar” que levou Federico Franco ao poder.

A mais recente trapalhada da diplomacia brasileira, e que irritou profundamente Dilma, deu-se na terça-feira 26, em março. Graças a uma mediação malfeita por Patriota, a presidenta passou pelo constrangimento de tomar um chá de cadeira de mais de uma hora do presidente da África do Sul, Jacob Zuma. Motivo: o sul-africano conversou mais tempo do que o previsto com o presidente da Rússia, Vladimir Putin. Contrariada com a desorganização, Dilma voltou ao hotel onde havia se hospedado para participar da 5ª cúpula de chefes de Estado dos Brics, grupo das mais importantes economias emergentes, que o Brasil integra com Rússia, Índia, China e África do Sul. A chateação fez com que ela desistisse de participar de todo o jantar de gala.
Assédio diplomático
Em nenhuma carreira pública o corporativismo é tão forte como na diplomacia. Uma tradição que serve ao sigilo decorrente de uma atividade sensível, mas que acaba justificando atos pouco transparentes e abusos funcionais. Quando era cônsul-geral em Toronto, em 2007, Américo Fontenelle foi investigado após denúncias de comportamento “agressivo, discriminatório e humilhante”. O caso foi mantido em segredo e ninguém foi punido. Agora, Fontenelle volta a ser alvo de denúncias de excessos. Oito funcionários do Consulado-Geral do Brasil em Sydney, na Austrália, apresentaram um abaixo-assinado pedindo a abertura de processo disciplinar contra o embaixador e o conselheiro-adjunto Cesar de Paula Cidade, acusados de assédio moral e sexual, homofobia, discriminação e abuso de poder. O caso está sendo investigado pela Comissão de Ética, que deve apresentar um parecer até o final do mês.
Vem ganhando contornos dramáticos também a situação dos 12 torcedores do Corinthians presos em Oruro, na Bolívia. Acusados pela morte de um jovem torcedor boliviano, os brasileiros são submetidos a humilhações e torturas. A embaixada em La Paz trabalha intensamente para conseguir a libertação do grupo, mas carece de apoio político de Brasília. ISTOÉ denunciou os maus-tratos e até a cobrança de propina a autoridades diplomáticas. Na quinta-feira 4, Patriota foi ouvido em audiência pública na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado. Pressionado, deu declarações genéricas e disse ter “esperanças” de que o caso se resolva em breve. Para o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), que preside a Comissão, Patriota precisa de “um banho de povo”. “A coisa já ganhou forma de crise diplomática”, alerta.

No Palácio do Planalto e em embaixadas consultadas por ISTOÉ, a impressão de autoridades e diplomatas é de que falta um norte político para o Itamaraty. Foram relegadas as iniciativas de integração regional e desapareceu da pauta a briga por um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Essas duas diretrizes alimentaram por anos as ações do Itamaraty, justificando a abertura de novas embaixadas. A esperança é que a candidatura de Roberto Azevedo à direção-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC) possa cumprir parte desse papel, ainda que pontualmente. A eleição é em maio.
Foto: Adriano Machado
SUA OPINIÃO
COMENTÁRIOS
(12)
J.Lima
EM 07/04/2013 19:56:45
E as irregularidades envolvendo o Consulado Brasileiro em Miami, quando "explodirá" na mídia brasileira?
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Roberto
EM 07/04/2013 17:57:38
Alem de ser patrulhado pelo partido é desprovido de liderança e carisma.
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MariaAparecida
EM 07/04/2013 03:30:52
Isto é deveria fazer uma matéria sobre os abusos dos Embaixadores em todas as embaixadas no mundo. E como sugestão para a Presidenta, leve o fantástico embaixador no Reino Unido para substituir o Patriota, pois esse já virou um Semi Deus.
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leila
EM 07/04/2013 02:54:25
presidente Dilma, Leve por favor toda essa curriola do Patriota como esse embaixador Paulo soares de Jakarta. Imagine a senhora o que passamos nos brasileiros relis mortais se a Presidente passou por situacoes tao delicadas como as aqui narradas
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Paulo
EM 07/04/2013 02:21:58
Levem de volta o embaixador Fontenelle , pelo amor de Deus. Esse tipo de gente deve ser secretario do Patriota em Brasília.
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domingo, 7 de abril de 2013

Mais uma crise: a do corporativismo ordinario (Itamaraty)

Corporativismo faz Patriota enviar nova missão a Sydney
FSP, domingo, 07 / abril / 2013 | Caderno - Política

Insatisfeito com a sindicância instaurada para apurar denúncias de assédio moral contra o cônsul-geral brasileiro na cidade australiana, ministro cria comissão

Insatisfeito com a condução na apuração das denúncias de assédio moral contra Américo Dyott Fontenelle, cônsul-geral do Brasil na cidade australiana de Sydney, chefiada por Roberto Abdalla, embaixador do Brasil no Kuwait, o ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, resolveu agir. Ordenou, na última quarta-feira, que uma nova missão, composta por um conselheiro, um oficial de chancelaria e um assistente de chancelaria, fosse ao Consulado do Brasil em Sydney para a realização de novas investigações.

O conselheiro Adriano Silva Pucci chefiará as novas diligências. Será auxiliado pela oficial de Chancelaria Thálita Billerbeck e o assistente Guilherme Santana. Os funcionários serão ouvidos nos dias 15 e 16 deste mês. A determinação do ministro é para que todos os servidores estejam presentes nestas datas no local de trabalho.

O Ministério das Relações Exteriores (MRE) já encaminhou ao consulado comunicado reservado, ao qual o Correio teve acesso. Na prática, é um recado direto do ministro contra o corporativismo dos primeiros relatórios de Abdalla. Nos corredores do consulado do Brasil em Sydney, Abdalla é chamado de “embaixador abafa”.

Patriota esperava ser questionado a respeito do assunto pelos senadores, quarta-feira, durante audiência na Comissão de Relações Exteriores do Senado. No entanto, o assunto não foi abordado.

Diante do corporativismo com que as investigações eram conduzidas, resolveu reformular a Comissão de Ética do Itaramaty. Inicialmente, era composta apenas por diplomatas. Na reformulação da equipe, um assistente de chancelaria será designado membro da comissão e um oficial de chancelaria, secretário executivo. O colegiado presta informações das investigações que conduz à Presidência da República.

Humilhações
Em duas denúncias encaminhadas ao Ministério das Relações Exteriores, o cônsul Américo Dyott Fontenelle é acusado de intimidar, humilhar e agredir subordinados verbalmente. O “caso Fontenelle” foi o estopim para o primeiro protesto contra assédio moral do Itamaraty, em fevereiro, e ajudou a tornar públicas denúncias informais de assédio moral, vindas de diferentes embaixadas do Brasil no exterior, que nunca haviam extrapolado os muros da instituição.

Antes de chegar a Sydney, o cônsul Américo Fontenelle já havia sido investigado por assédio moral em 2007, mas a sindicância foi arquivada pela “extrema dificuldade de se obterem provas materiais”, apesar dos “elementos testemunhais relevantes”.

No pedido de abertura de investigação disciplinar, é relatado que “a prática reiterada dos múltiplos tipos de assédio” provocaram pedidos de demissão de oito contratados locais e a “remoção prematura” de seis funcionários do quadro permanente nos últimos dois anos.

Abdalla comunicou ao Correio que não poderia falar porque a investigação estava em curso. Fontenelle afirmou, por e-mail, que também não poderia se pronunciar. Relatou apenas que era inocente.

A proxima crise economica: Egito (Editorial do Le Monde)

L'Egypte au bord du drame économique
LE MONDE, 05.04.2013
Éditorial du "Monde"

L'Egypte va-t-elle à la faillite ? Le plus grand pays arabe est-il proche de l'effondrement économique et financier ?

Ajournée de mois en mois, une négociation importante avec le Fonds monétaire international (FMI) a repris cette semaine au Caire. Mais, au bord du Nil, l'humeur est pessimiste.
Il y a le front politique d'abord. Venu du parti des Frères musulmans – islamistes –, le président Mohamed Morsi, s'il n'a cessé d'étendre le champ de ses prérogatives, a aussi multiplié maladresses et atteintes aux libertés politiques. A la tête de l'Etat depuis le 30 juin 2012, l'ingénieur Morsi n'a jamais trouvé un style de gouvernement susceptible de rassurer et ramener la confiance dans le pays.

Tantôt il hésite, revenant sur des mesures annoncées à la hâte ; tantôt il procède avec brutalité. Méfiant à l'adresse de toutes les autres formations politiques, il a donné le sentiment de privilégier sa mouvance sur l'ouverture. Ce raïs a déçu : on l'attendait grand seigneur, le voilà redevenu militant.

Tout aussi grave, il confirme ce qu'on disait des Frères musulmans avant leur arrivée au pouvoir par les urnes : ils n'ont pas le moindre programme économique et social.

Or le pays va très mal. Sur fond de turbulences politiques aussi déstabilisantes qu'un vent de sable, le front économique est inquiétant. Tous les indicateurs sont au rouge. Le tourisme et les investissements directs étrangers sont en chute libre. Le diesel manque, entraînant coupures de courant et chômage technique en ville comme à la campagne.

Les finances publiques se dégradent. Les réserves de devises ont chuté en deux ans, passant de 36 à 13 milliards de dollars. Cela représenterait trois mois d'importation de blé et de carburant : comment fera-t-on cet été, sachant que l'Egypte est le premier importateur de blé au monde ? La livre égyptienne est en baisse, et les produits alimentaires en hausse.

Derrière ces chiffres et le tableau macro-économique qu'ils dessinent, se cache une impitoyable réalité : la pauvreté endémique que connaît le pays, la vie de misère imposée depuis trop longtemps à des dizaines de millions d'Egyptiens.

L'aide du FMI est urgente.
Depuis près de deux ans, Le Caire négocie un prêt de 4,8 milliards de dollars. Il serait susceptible de rassurer les investisseurs étrangers et de débloquer toute une série d'aides : celles de l'Union européenne, de la Banque mondiale et de la Banque africaine de développement.

La négociation achoppe sur les conditions mises à l'octroi du prêt. Le FMI demande une baisse des subventions de l'Etat sur un certain nombre de produits de base et une hausse des impôts.

M. Morsi a peur des réactions de la rue face à une nouvelle hausse du prix des denrées de première nécessité. Il manque d'assise et de légitimité politiques pour "vendre" aux Egyptiens des mesures difficiles.

Le FMI déplore le peu de compétences techniques de l'équipe du président Morsi. Et son absence d'imagination aussi. Car on devrait bien trouver un moyen d'attaquer le mal : comment transformer le système de subventions actuel – gouffre financier notoirement inefficace – en un mécanisme de protection plus ciblé qui aide les pauvres à sortir de leur condition. Mais les Frères musulmans – c'est leur échec – n'en ont pas la moindre idée.

O declinio da violencia no mundo - Steven Pinker (OESP)

Talvez menos na Venezuela e no próprio Brasil, mas ela virá em seu tempo.
PRA

Uma chance para a paz em meio ao caos
Antonio Gonçalves Filho
O Estado de S.Paulo, 06 de abril de 2013

Considerado uma das 100 pessoas mais influentes do mundo pela 'Time', o cientista Steven Pinker defende, em 'Os Anjos Bons da Nossa Natureza', que a violência está em declínio na sociedade
Pinker: As formas radicais do Islã estão interferindo na implementação dos direitos humanos

A simples ideia de que houve um declínio de violência no mundo parece um tanto excêntrica quando o que se vê é o crescimento da intolerância. Seja a guerra atômica com a qual o ditador da Coreia do Norte ameaça o resto do planeta ou a volta de bélicos discursos nacionalistas, a humanidade parece ter mais motivos para se preocupar com a violência do que celebrar uma vitória contra ela. No entanto, o cientista cognitivo canadense Steven Pinker, 55 anos, diz que é preciso, de fato, comemorar esse declínio, baseado em seu extenso estudo sobre a queda global da violência, Os Anjos Bons da Nossa Natureza, lançado esta semana pela Companhia das Letras.

Definido pelo inglês Ian McEwan, o autor de Desejo e Reparação, como "um desses cientistas extraordinários que sabem atrair a atenção dos leigos", Pinker foi considerado pela revista Time uma das 100 pessoas mais influentes do mundo. Não sem razão. Seus livros, sempre volumosos, com mais de 500 páginas - entre os quais se destacam Como a Mente Funciona e Do Que É Feito o Pensamento -, entraram invariavelmente nas listas de best-sellers, fazendo de Pinker um cientista tão popular como Carl Sagan ou Oliver Sacks. Em entrevista, por e-mail, ao Sabático, o professor da Universidade Harvard reafirma sua crença numa nova paz mundial, embora admita que não saiba - ninguém sabe - o que vai acontecer num futuro próximo. A despeito disso, ele prevê que a chance de um grave episódio de violência irromper na próxima década (um conflito com mais de 1 milhão de mortes) é de 9,7%.

Inspirado em Kant, que argumentava, em defesa das democracias, que elas não tendem a lutar umas contra as outras, Pinker define essa forma de governo como a ideal para evitar guerras, "pois os comandantes dos países democratas sempre pensarão duas vezes antes de gastar seu próprio dinheiro e sangue numa aventura tola no estrangeiro". Ainda que se possa evocar nomes como Nixon e Bush, é certo que os EUA tomaram outro rumo depois de Obama, o que justifica o otimismo de Pinker.

Embora ateu, Pinker usa anjos no título de seu livro argumentando que, para explicar o declínio da violência, é preciso entender os demônios que nos conduzem a atos sádicos e irracionais, conclamando a intercessão da parte boa de nossos cérebros para os conter. Ideologias, lembra Pinker, são outros mecanismos que nos incitam à violência. Elas, invariavelmente, perseguem uma utopia e tornam as pessoas obsessivas, levando-as a demonizar os opositores e eliminar os obstáculos à frente, sejam eles a classe dominante, os infiéis ou etnias que incomodam.

Um estudo publicado por duas cientistas sociais, Erica Chenoweth e Maria J. Stephan, Why Civil Resistance Works (Por que a Resistência Civil Funciona, 2008), lido por Pinker, certamente teve um peso significativo na elaboração de seu 13.º livro, pois Os Anjos Bons da Nossa Natureza defende tese semelhante: a de que as campanhas de não violência têm obtido melhores resultados que as campanhas políticas bélicas, pois as primeiras tendem a ganhar legitimidade com maior rapidez (especialmente na era da internet). As duas pesquisadoras estudaram dados históricos entre 1900 e 2006 para chegar a essa conclusão. Pinker usa igualmente dezenas de gráficos e estatísticas para provar que a taxa de sucesso de movimentos pacifistas é bem maior que a dos bélicos (75% ante 25%). Pode-se ou não dar razão ao cientista, mas é impossível ignorar esses dados.

Pinker não afirma, é claro, que a violência foi extinta do planeta. Diz, isto sim, que a evolução do comércio, da educação em massa e o respeito às leis fizeram do século 20 um tempo menos violento que a Idade Média, em que direitos individuais eram ignorados e reinava a linguagem do terror, usada pelo fundamentalismo religioso. Ele sabe que a violência talvez jamais seja erradicada, mas é preciso dar uma chance à paz, como pregou John Lennon.

Seu livro mostra uma correlação entre religião e violência, assim como entre a ideologia marxista e o crescimento da opressão no mundo. O senhor diria que a democracia é o único sistema político capaz de garantir a paz mundial?

Não é o único, mas certamente há uma correlação entre democracia e paz. Democracias quase nunca lutam umas contras as outras e parecem menos propensas a lutar fora de suas fronteiras (Pinker diz que o governo democrático "é concebido para resolver conflitos entre os cidadãos pelos ditames consensuais da lei", o que significa que as democracias "devem externar essa ética quando lidam com outros Estados"). Contudo, sob certas circunstâncias, países não democráticos podem igualmente recuar diante da guerra. Desde que a China se tornou capitalista, mas não democrática, ela não participou de nenhuma guerra. É um recorde melhor que o dos EUA.

O mundo já sofreu ameaças de aniquilamento no passado, considerando que enfrentamos o fantasma de uma guerra nuclear mais de uma vez. Ele não desapareceu, pois ainda estamos submetidos à loucura de ditadores como o da Coreia do Norte. O senhor considera possível um diálogo com gente como ele?

A Coreia do Norte parece um exemplo único no mundo em sua insularidade e irracionalidade. Não tenho a menor ideia de como começar esse diálogo com os coreanos do Norte. Provavelmente, a melhor escolha é esperar que a China faça isso (Pinker lembra, no livro, que há dez anos o mundo sabia que a Coreia do Norte iria adquirir capacidade nuclear, partilhando-a com terroristas, e iniciaria uma ofensiva contra a Coreia do Sul, mas observa que, apesar disso, o fim da década chegou e nada aconteceu).

Seu livro mostra um declínio da violência através dos tempos, mas como podemos estar certos disso quando o mundo ainda assiste à violência praticada pelo Estado, como a pena de morte, mesmo em países democráticos e desenvolvidos como os EUA, e testemunha o tráfico de pessoas, a crise econômica que leva ao conflito entre classes e a má-educação, que promove o irracionalismo?

A pergunta, eu diria, está fundamentada num erro matemático. Um declínio na violência significa que a taxa de violência numa época mais recente é apenas mais baixa que em tempos passados. Não significa que a taxa de violência mais recente seja zero.

A tecnologia tornou mais comum a existência solitária e, como consequência, trouxe uma espécie de alienação que pode se transformar em ódio contra o semelhante, o que se vê com certa frequência no bullying praticado via computador. Há, de fato, um risco real de que tecnologias com alto poder destrutivo venham a diminuir as chances de uma paz duradoura. O senhor recomendaria a imposição de limites para a tecnologia?

Não vejo como a tecnologia possa facilitar o bullying. Há 20 anos um molestador podia espancar e insultar uma criança. Agora, se está usando o computador, ele pode apenas insultar. Como é que piorou? Acho que restringir a tecnologia armamentista, como a nuclear, é lícito. Porém, é ilógico falar em estabelecer um limite para a tecnologia. Que vantagem poderia advir de uma restrição aos avanços da tecnologia médica? Ou da tecnologia de computadores? Ou da energia solar? Como poderia essa evolução ameaçar a paz?

No capítulo dedicado aos direitos humanos, o senhor menciona o caso do matemático Alan Turing, criador do moderno computador, vítima do Estado tanto como Oscar Wilde, ambos por serem gays. Muitos países, especificamente do mundo islâmico, ainda conservam leis rígidas contra a homossexualidade e os direitos da mulher. É lícito esperar que esses países venham a respeitar os direitos humanos quando seus cidadãos são submetidos a formas radicais de crença religiosa?

Certamente, as formas radicais do Islã estão interferindo na implementação dos direitos humanos nos países de maioria muçulmana. É impossível dizer quando o progresso vai chegar às nações islâmicas, mas não considero irrealista imaginar que haverá melhorias nas próximas três décadas, graças à globalização e à mídia eletrônica. Os países islâmicos foram os últimos a abolir a escravidão - a Arábia Saudita e o Iêmen em 1962, a Mauritânia em 1980 -, mas resistiram quanto puderam à ideia. A Primavera Árabe trouxe as primeiras democracias ao mundo árabe. As pesquisas de opinião revelam uma enorme demanda pelos direitos das mulheres, mesmo nos mais repressivos países islâmicos. Duvido que eles consigam continuar vivendo na Idade Média para sempre.

No capítulo final o senhor diz que o declínio da violência pode ser o acontecimento mais importante e menos apreciado na história humana e assume que o livro está conectado com seu lado mais otimista. O senhor definiria esse estado mental como resultado de uma mudança mística no mundo, que ainda não fomos capazes de perceber? Um cientista como o senhor não deveria ser cético?

Nas páginas finais do livro explico que o declínio da violência não é produto de nenhuma dialética mística ou de qualquer movimento utópico. É simplesmente o resultado de pessoas tentando melhorar como seres pertencentes a uma coletividade. Violência, de modo geral, é uma atividade inútil - o mal causado às vítimas recai fatalmente sobre o agressor. Quando agressores e vítimas trocam de lugar, todos se beneficiam a longo prazo, se a violência for contida. Gradualmente baixamos essas taxas de violência pelas mesmas razões pelas quais baixamos as taxas de fome e doenças. Usamos nossa experiência para tornar nossas vidas mais agradáveis e produtivas. Não há nada de místico nisso.

OS ANJOS BONS DA NOSSA NATUREZA - POR QUE A VIOLÊNCIA DIMINUIU
Autor: Steven Pinker
Tradução: Bernardo Joffily e Laura Teixeira Motta
Editora: Companhia das Letras (1.048 págs., R$ 74,50)

Trechos - Sobre Tortura
"A tortura na Idade Média não era escondida, negada ou mencionada com eufemismos. Não era apenas uma tática com a qual regimes brutais intimidavam seus inimigos políticos ou regimes moderados extraíam informações de suspeitos de terrorismo. Não irrompia em uma multidão furiosa insuflada de ódio contra um inimigo desumanizado. (...) A tortura integrava a tessitura da vida pública."

Uso de armas nucleares
"Zero é o número que se aplica a uma espantosa coleção de categorias de guerra durante os dois terços de século decorridos desde o fim da guerra mais letal de todos os tempos. (...) Zero é o número de vezes em que armas nucleares foram usadas em conflitos. Cinco grandes potências as possuem, e todas elas guerrearam. No entanto, nenhum dispositivo nuclear foi disparado em um acesso de cólera."

Uma reflexão final
"Sei que por trás dos gráficos há um jovem que sente uma punhalada de dor e assiste à vida que se esvai dele, sabendo que foi despojado de décadas de existência. Há uma mulher que soube que seu marido, seu pai e seus irmãos jazem mortos em uma vala, e que ela dentro em pouco ‘cairá nas mãos de quente e forçada violação’. (...) Com todas as tribulações (...), o declínio da violência é um resultado que podemos saborear."

Chega de historia operaria: agora vamos cuidar dos capitalistas ( NYT)

In History Departments, it's up with capitalism
Jennifer Schuessler
The New York Times, April 6th, 2013

A specter is haunting university history departments: the specter of capitalism.

After decades of “history from below,” focusing on women, minorities and other marginalized people seizing their destiny, a new generation of scholars is increasingly turning to what, strangely, risked becoming the most marginalized group of all: the bosses, bankers and brokers who run the economy.

Even before the financial crisis, courses in “the history of capitalism” — as the new discipline bills itself — began proliferating on campuses, along with dissertations on once deeply unsexy topics like insurance, banking and regulation. The events of 2008 and their long aftermath have given urgency to the scholarly realization that it really is the economy, stupid.

The financial meltdown also created a serious market opportunity. Columbia University Press recently introduced a new “Studies in the History of U.S. Capitalism” book series (“This is not your father’s business history,” the proposal promised), and other top university presses have been snapping up dissertations on 19th-century insurance and early-20th-century stock speculation, with trade publishers and op-ed editors following close behind.

The dominant question in American politics today, scholars say, is the relationship between democracy and the capitalist economy. “And to understand capitalism,” said Jonathan Levy, an assistant professor of history at Princeton University and the author of “Freaks of Fortune: The Emerging World of Capitalism and Risk in America,” “you’ve got to understand capitalists.”

That doesn’t mean just looking in the executive suite and ledger books, scholars are quick to emphasize. The new work marries hardheaded economic analysis with the insights of social and cultural history, integrating the bosses’-eye view with that of the office drones — and consumers — who power the system.

“I like to call it ‘history from below, all the way to the top,’ ” said Louis Hyman, an assistant professor of labor relations, law and history at Cornell and the author of “Debtor Nation: The History of America in Red Ink.”

The new history of capitalism is less a movement than what proponents call a “cohort”: a loosely linked group of scholars who came of age after the end of the cold war cleared some ideological ground, inspired by work that came before but unbeholden to the questions — like, why didn’t socialism take root in America? — that animated previous generations of labor historians.

Instead of searching for working-class radicalism, they looked at office clerks and entrepreneurs.

“Earlier, a lot of these topics would’ve been greeted with a yawn,” said Stephen Mihm, an associate professor of history at the University of Georgia and the author of “A Nation of Counterfeiters: Capitalists, Con Men and the Making of the United States.” “But then the crisis hit, and people started asking, ‘Oh my God, what has Wall Street been doing for the last 100 years?’ ”

In 1996, when the Harvard historian Sven Beckert proposed an undergraduate seminar called the History of American Capitalism — the first of its kind, he believes — colleagues were skeptical. “They thought no one would be interested,” he said.

But the seminar drew nearly 100 applicants for 15 spots and grew into one of the biggest lecture courses at Harvard, which in 2008 created a full-fledged Program on the Study of U.S. Capitalism. That initiative led to similar ones on other campuses, as courses and programs at Princeton, Brown, Georgia, the New School, the University of Wisconsin and elsewhere also began drawing crowds — sometimes with the help of canny brand management.

After Seth Rockman, an associate professor of history at Brown, changed the name of his course from Capitalism, Slavery and the Economy of Early America to simply Capitalism, students concentrating in economics and international relations started showing up alongside the student labor activists and development studies people.

“It’s become a space where you can bring together segments of the university that are not always in conversation,” Dr. Rockman said. (Next fall the course will become Brown’s introductory American history survey.)

While most scholars in the field reject the purely oppositional stance of earlier Marxist history, they also take a distinctly critical view of neoclassical economics, with its tidy mathematical models and crisp axioms about rational actors.

Markets and financial institutions “were created by people making particular choices at particular historical moments,” said Julia Ott, an assistant professor in the history of capitalism at the New School (the first person, several scholars said, to be hired under such a title).

To dramatize that point, Dr. Ott has students in her course Whose Street? Wall Street! dress up in 19th-century costume and re-enact a primal scene in financial history: the early days of the Chicago Board of Trade.

Some of her colleagues take a similarly playful approach. To promote a two-week history of capitalism “boot camp” to be inaugurated this summer at Cornell, Dr. Hyman (a former consultant at McKinsey & Company) designed “history of capitalism” T-shirts.

The camp, he explained, is aimed at getting relatively innumerate historians up to speed on the kinds of financial data and documents found in business archives. Understanding capitalism, Dr. Hyman said, requires “both Foucault and regressions.”

It also, scholars insist, requires keeping race and gender in the picture.

As examples, they point to books like Nathan Connolly’s “World More Concrete: Real Estate and the Remaking of Jim Crow South Florida,” coming next year, and Bethany Moreton’s “To Serve God and Wal-Mart: The Making of Christian Free Enterprise” (Harvard, 2009), winner of multiple prizes, which examines the role of evangelical Christian values in mobilizing the company’s largely female work force.

The history of capitalism has also benefited from a surge of new, economically minded scholarship on slavery, with scholars increasingly arguing that Northern factories and Southern plantations were not opposing economic systems, as the old narrative has it, but deeply entwined.

And that entwining, some argue, involved people far beyond the plantations and factories themselves, thanks to financial shenanigans that resonate in our own time.

In a paper called “Toxic Debt, Liar Loans and Securitized Human Beings: The Panic of 1837 and the Fate of Slavery,” Edward Baptist, a historian at Cornell, looked at the way small investors across America and Europe snapped up exotic financial instruments based on slave holdings, much as people over the past decade went wild for mortgage-backed securities and collateralized debt obligations — with a similarly disastrous outcome.

Other scholars track companies and commodities across national borders. Dr. Beckert’s “Empire of Cotton,” to be published by Alfred A. Knopf, traces the rise of global capitalism over the past 350 years through one crop. Nan Enstad’s book in progress, “The Jim Crow Cigarette: Following Tobacco Road From North Carolina to China and Back,” examines how Southern tobacco workers, and Southern racial ideology, helped build the Chinese cigarette industry in the early 20th century.

Whether scrutiny of the history of capitalism represents a genuine paradigm shift or a case of scholarly tulip mania, one thing is clear.

“The worse things are for the economy,” Dr. Beckert said wryly, “the better they are for the discipline.”

A historia do capitalismo americano, em Harvard

Teaching the History of Capitalism
Harvard.edu

The history of capitalism first appeared as a framework for teaching. Much of the field’s strength and vitality thus far has been drawn from the enthusiastic reception it received from undergraduate and graduate students. The demand for courses that use historical methods to engage issues of political economy in innovative ways has often been overwhelming. Lectures, seminars, and tutorials on the topic are currently offered at a wide range of schools, including Harvard, Columbia, Princeton, Brown, the University of Chicago, the New School for Social Research, the University of Georgia, the University of Florida, and Vanderbilt. Indeed, the success of the history of capitalism as a field will be determined in classrooms and lecture halls, not merely in the archives and on the pages of scholarly journals. As students on campuses around the world increasingly interrogate the foundations of the current economic system, our success will depend on what we can offer to complement, enhance, and challenge the ways students think about the world around them.

In November 2011, the conference on Teaching the History of Capitalism gathered a small group of scholars in the field at Harvard University to reflect on their own teaching, learn from the wisdom and experience of our colleagues, and develop a clearer sense of the field’s pedagogical aims. The conversation focused on how the history of capitalism might enhance college curriculums. Several scholars who could not attend in person also sent their syllabi and suggestions.

Download and read the full report here.
Sample Syllabi in the History of Capitalism
Sean Adams, Florida University: History of American Capitalism
Sven Beckert, Harvard: History of American Capitalism
Sven Beckert and Christine Desan, Harvard: The Political Economy of Modern Capitalism
Elizabeth Blackmar, Columbia: The Rise of American Capitalism
Joanna Cohen, Queen Mary University of London: Creation of American Capitalism
Alison Frank, Harvard: Commodities in International History
Tami J. Friedman, Brock University: Wealth, Work and Power in the United States
Peter Knight, University of Manchester: Corporate Fictions
Jonathan Levy, Princeton: The History of American Capitalism
'' '' The American Corporation

Stephen Mihm, University of Georgia: The History of Money in America
Julia Ott, The New School: Wall Street in Crisis: A Geneology
'' '' Consumer Culture in American History

Seth Rockman, Brown: Capitalism, 1500-Present
Elizabeth Tandy Shermer, Claremont McKenna College: American Capitalism and Society: From Railroads to Starbucks
Benjamin Waterhouse, University of North Carolina: The History of American Business
'' '' University of North Carolina: Graduate Readings Seminar in American Economic History and the History of Capitalism

David Zimmerman, English, University of Wisconsin: American Capitalism and Its Discontents (Additional Literature)
This is an ongoing project; if you have taught a course dealing with the history of capitalism and are willing to share it, please send us your syllabus .

Attachment:
Teaching the History of Capitalism 2011.pdf

sábado, 6 de abril de 2013

"Hoje tem marmelada? Tem, sim senhor!" - Circo Brasil esquenta o espetaculo do crescimento (do deficit)...

‘Circo Brasil’
Rolf Kuntz
O Estado de S.Paulo, 6/04/2013

Se o céu ajudar, os ventos forem favoráveis e os fatos confirmarem a projeção mais otimista em circulação na praça, a economia brasileira crescerá 3,2% em 2013 e 6,94% nos três primeiros anos da presidente Dilma Rousseff. Isso equivalerá a uma média anual composta de 2,26%. Talvez ainda se possa falar de espetáculo do crescimento. Circos mambembes também anunciam espetáculos. Mas cobram pouco pelo ingresso e seus dirigentes evitam equiparar-se aos melhores do ramo.

Menos modesto e muito menos realista, o governo brasileiro insiste, no entanto, em se alinhar a emergentes muito mais dinâmicos, como se o uso de um crachá dos Brics fosse um atestado de competência e dinamismo. A presidente Dilma Rousseff esbraveja quando se cobra uma política mais eficaz contra a inflação, sem gastar um minuto para olhar outros latino-americanos, como Colômbia, Chile, Peru e México. Todos esses países têm crescido mais que o Brasil, nos últimos anos, com preços muito menos instáveis.

Este é outro detalhe do show mambembe: a inflação prevista para o ano está na vizinhança de 5,7% e mesmo essa projeção pode ser furada se as contas públicas forem administradas como até agora. Mais de uma vez, desde o fim do ano passado, o Banco Central chamou a atenção para a tendência expansionista das finanças federais. Esses componentes bastariam para fazer da exibição do Circo Brasil uma das mais constrangedoras, mas o programa oferecido ao distinto público é bem mais rico.

Outra grande atração do programa é a depredação das contas externas. O desastre poderá demorar um pouco, mas será inevitável se as tendências dos últimos seis ou sete anos forem mantidas. A partir de 2007 as importações têm sido mais dinâmicas que as exportações. Entre 2007 e 2012 o valor exportado aumentou 51%, de US$ 160,65 bilhões para US$ 242,58 bilhões, enquanto o custo dos bens importados cresceu 85%, de US$ 120,62 bilhões para US$ 223,15 bilhões. Esse poderia ser o efeito normal de uma estratégia de abertura econômica, mas a história é outra. Durante esse período o governo elevou as barreiras comerciais e o país se tornou muito mais protecionista. Esse protecionismo é parte da impropriamente chamada política industrial, mas os resultados têm sido abaixo de pífios. Com essa orientação o governo conseguiu, entre outros efeitos discutíveis, inflar os custos da Petrobrás, dificultar as compras de equipamentos para petróleo e favorecer a acomodação de alguns setores beneficiados.

Com ou sem barreiras de proteção, a indústria brasileira continua sujeita à concorrência de fabricantes mais competitivos e a erosão do saldo comercial amplia o déficit em conta corrente. Durante algum tempo o problema foi atribuído ao real valorizado. A valorização cambial atrapalhou, de fato, mas as demais desvantagens comparativas são muito mais importantes, a começar pela tributação incompatível com uma economia ligada, mesmo com limitações, ao mercado internacional. É até grotesco insistir na história do câmbio quando os caminhões se enfileiram nas estradas e o agronegócio brasileiro, um dos mais eficientes do mundo, mal consegue enviar seus produtos aos portos.

A deterioração das contas externas continua. De janeiro a março o país acumulou um déficit comercial de US$ 5,15 bilhões. Para tapar esse buraco e alcançar o superávit de US$ 15 bilhões ainda estimado pelo BC, o Brasil terá de conseguir nos nove meses restantes um saldo positivo de US$ 20,15 bilhões, maior que o de todo o ano passado, US$ 19,43 bilhões. A mediana das previsões do mercado financeiro estava em US$ 12,4 bilhões na semana passada. Em seu último informe conjuntural a Confederação Nacional da Indústria (CNI) reduziu para US$ 11,3 bilhões o saldo estimado para o ano. Em dezembro a projeção ainda era de US$ 18,1 bilhões.

O quadro fica mais feio quando se olham os detalhes: a exportação prevista é de US$ 253,4 bilhões, mais uma vez inferior à de 2011 (US$ 256 bilhões). No ano passado o valor ficou em 242,6 bilhões. A importação, US$ 242,1 bilhões, continuará em alta e será 7,03% maior que a de dois anos antes. Mesmo com o cenário internacional adverso, as vendas do agronegócio continuarão sustentando o resultado comercial. O PIB industrial, mesmo com crescimento previsto de 2,6%, continuará muito fraco, por causa das limitações estruturais. Os incentivos adotados pelo governo continuam favorecendo mais o consumo do que o investimento e a produção, mas o governo ─ por falha de percepção, por interesse eleitoral ou por uma combinação dos dois fatores ─ insiste nas medidas de curtíssimo alcance já experimentadas nos últimos dois anos.

O investimento deve aumentar 4% neste ano e puxar a expansão econômica de 3,2%, segundo a CNI. A projeção é bem menor que a divulgada em dezembro (7%), mas pelo menos indica uma composição mais saudável que a do ano passado. Se a previsão estiver correta, o valor investido mal compensará a redução de 4% registrada em 2012. Além disso, o país continuará aplicando muito menos que o necessário para sustentar durante alguns anos um crescimento econômico igual ou pouco superior a 4%. Se o Brasil investir 4% mais que em 2012 e a economia avançar os 3,2% estimados, a relação entre o investimento e o produto interno bruto (PIB) passará de 18,14% para 18,28%. Será uma variação irrisória. Além disso, o valor investido continuará muito longe dos 24% ou 25% apontados por muitos economistas como indispensáveis a um dinamismo mais parecido com o de outros emergentes.

O espetáculo mambembe do crescimento ainda se completa com cenas grotescas de avacalhação da máquina governamental. O número de ministérios aumenta, mais uma vez, para a acomodação de aliados, e mais estatais de valor muito duvidoso são criadas. O loteamento continua, com a participação de siglas e de líderes partidários afastados na faxina encenada em 2011. Mas uma boa parte do distinto público aplaude como se assistisse a um espetáculo de classe mundial.

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Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...