domingo, 13 de outubro de 2013

Brasil velho, Brasil "novo" (!!), tudo misturado, como sempre acontece...

O ASSUNTO É ELEIÇÃO DE 2014
Uma alternativa para o Brasil
EDUARDO CAMPOS
Folha de S.Paulo, 13/10/2013

Dois movimentos políticos que agiam na defensiva notaram que sua aliança transformaria a estratégia em possibilidade de ofensiva

O olhar atento à história recente do Brasil leva à conclusão de que os ciclos políticos coincidem com a ascensão, envelhecimento e substituição dos partidos no poder. A ausência de renovação impõe uma dinâmica de obsolescência das legendas.
Nos anos 1980, o MDB/PMDB foi vetor principal da redemocratização. Uma década depois, o PSDB cumpriu a tarefa de matar a hiperinflação e construir os alicerces da estabilidade econômica. No período seguinte, o PT, apoiado nos pilares da democracia e da estabilidade, pôde comandar um ciclo de inclusão.
Todas essas forças operaram apoiadas nas conquistas das etapas que as precederam, ainda que muitas vezes as tentações da política peçam a negação retórica do passado. Mas essa negação não resiste à análise. Sem 1985 não haveria 1994, e sem 1994 não haveria 2002.
Sem democracia, não haveria como o país superar um impeachment; sem estabilidade, não seria possível distribuir renda.
Toda força política momentaneamente hegemônica sofre a tentação de enxergar-se como o ponto final do bonde da história. Mas é ilusão. Hoje, por exemplo, assistimos ao enorme desejo de que se abra um novo ciclo na política brasileira.
É disso que tratarão as eleições do próximo ano. Como superar a velha política para que o poder possa ser mobilizado na construção do novo, na pavimentação dos caminhos necessários e possíveis para alcançar outro patamar --eis a questão.
Precisamos remover o velho arranjo político, ou nenhuma agenda inovadora será viável.
Cada um por sua própria estrada, o Partido Socialista Brasileiro e a Rede Sustentabilidade vinham tateando em busca do novo.
O PSB, que governa seis Estados e mais de 400 cidades, estava empenhado em construir gestões democráticas, inovadoras e sérias, lutando para valorizar a função primeira do Estado: servir à sociedade. A Rede, procurando compreender e reunir a imensa energia represada nas aspirações dos jovens, nas preocupações com o bem-estar das gerações futuras, na busca obsessiva por uma economia renovada e mais democrática.
Certamente teriam convergido num eventual segundo turno, se as circunstâncias perversas da política brasileira não tivessem antecipado esse desfecho. Quando alguns imaginaram que poderiam represar completamente o rio da história, foram surpreendidos pela água que jorrou das frestas do dique, até derrubá-lo.
Eis por que a convergência entre o PSB e a Rede Sustentabilidade aconteceu com tamanha e surpreendente naturalidade. Porque já eram dois vetores de uma única inquietação: romper com estruturas fossilizadas para abrir caminho ao futuro.
O desenvolvimento sustentável é a releitura contemporânea mais próxima do socialismo democrático.
Dois movimentos políticos que agiam taticamente na defensiva, lutando para sobreviver em terreno desfavorável, notaram que sua aliança transformaria a estratégia em possibilidade de ofensiva.
O Brasil, infelizmente, acostumou-se a debater eleições como se se resumissem a pesquisas, tempo de rádio e TV e palanques estaduais. Mas a política é muito mais do que isso. Sua beleza está em trazer para si o debate programático do futuro, sobre como romper as amarras da inércia, e avançar.
Pretendemos contribuir para que o processo eleitoral supere a tentação da mediocridade, para que os eleitores sejam contemplados com uma opção consistente, transparente e sincera, que lance luz sobre deficiências e aponte caminhos para atender as exigências da sociedade.
Como dissemos ao selar nossa aliança, a luta da sociedade brasileira tem alcançado importantes conquistas: a redemocratização, a estabilidade econômica, a redução das desigualdades sociais. A única forma de aprofundá-las é avançar. Por isso, unimos forças para apresentar ao Brasil uma alternativa.

EDUARDO HENRIQUE ACCIOLY CAMPOS, 48, economista, é governador de Pernambuco desde 2007 e presidente nacional do PSB desde 2006
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br

Campos prega ‘nova política’ e pratica a velha
Josias de Souza
Folha de S.Paulo, 13/10/2013

A chegada de Marina Silva ao PSB fez de Eduardo Campos um personagem paradoxal. Na corrida presidencial, ele passou a enfatizar a tese segundo a qual é preciso combater o status quo, adotando novas práticas políticas. No governo de Pernambuco, administra o status sem mexer no quo.
A caminho do término do seu segundo mandato, Eduardo Campos nunca se deu ao luxo de moralismos e ideologias na composição do seu secretariado. Conforme relatao repórter Jamildo Melo, a gestão dele é apoiada por um condomínio partidário de 14 siglas. Desse emaranhado não sai coelho. Sai jacaré, Inocêncio Oliveira (PR), cobra, Severino Cavalcanti (PP)…
Inocêncio Oliveira, um ex-pefelê que se alojou no PR do mensaleiro Valdemar Costa Neto, é um político de muitas façanhas. A mais memorável foi ter recorrido ao Departamento Nacional de Obras contra a Seca, o Dnocs, para cavar poços em dois empreendimentos de sua propriedade – uma clínica médica e uma revendedora  de motocicletas. Fez isso numa época em que presidia a Câmara.
Aliado de Eduardo Campos desde a campanha de 2006, Inocêncio foi premiado no primeiro mandato com duas vistosas secretarias: Agricultura e Transportes. Nesta última, acomodou um primo: Sebastião Oliveira. No mandato atual, Inocêncio indicou apaniguados para a Secretaria de Turismo e para o Porto de Recife.
Severino Cavalcanti, outro ex-pefelê, esse alojado no PP de Paulo Maluf, também é personagem de façanhas múltiplas. Eleito presidente da Câmara numa sublevação do baixo clero parlamentar, pediu a Lula “aquela diretoria da Petrobras que fura poço.”
Antes de ser posto a nocaute por um concessionário de restaurante de quem cobrava um mensalinho, levou uma descompostura de Fernando Gabeira, então deputado do PV, por defender numa entrevista que a turma do mensalão recebesse da Câmara apenas “censuras”, não a cassação dos mandatos.
Gabeira foi ao microfone de apartes do plenário numa hora em que Severino presidia a sessão. Dedo e língua em riste, disparou: “Vossa Excelência está se comportando de maneira indigna.” Recordou que Severino já havia defendido até uma destilaria pernambucana que explorava trabalho escravo.
“Vossa Excelência está em contradição com o Brasil. A sua presença na presidência da Câmara é um desastre para o Brasil e para a imagem do país”, esculachou Gabeira, amigo de Marina Silva (assista abaixo).
De fato, o Brasil revelou-se grande demais para Severino. Ele desceu do comando da Câmara para a prefeitura de João Alfredo, sua cidade. Mas encontrou espaço na megacoligação de Eduardo Campos, que nomeou sua filha, Ana Cavalcanti, para o comando da Secretaria de Esportes.
O arcaísmo político de Eduardo Campos materializou-se também numa cruzada que empreendeu há dois anos. Com 222 votos, a então deputada Ana Arraes (PSB-PE) venceu a disputa por uma poltrona no TCU. Seu principal rival, Aldo Rebelo (PCdoB-SP) só obteve 149 votos.
Advogada e servidora licenciada do Tribunal de Contas de Pernambuco, Ana prevaleceu graças a outra credencial: sua condição de mãe, uma carreira que dispensa exames psicotécnicos, cursos universitários e antecedentes funcionais. Virou ministra do TCU graças ao esforço do filho Eduardo.
Nepotismo?, indagaram os repórteres à mãe do governador. E ela: “Se o nepotismo é feito pelo povo, então é o voto do povo. [...] É uma honra criar um filho como Eduardo. […] Pergunte ao povo de Pernambuco como ele está satisfeito. Ele [Eduardo] tem 92,5% de satisfação da população.”
A chegada de Ana ao TCU fez aniversário de dois anos no mês passado. O salário é bom: R$ 25 mil mensais. As férias, generosas: dois meses por ano. Os benefícios assemelham-se aos que ela tinha quando era deputada: gabinete bem estruturado, carro oficial e cota de passagens. A diferença é que o posto é vitalício.
Ao tomar posse, assistida pelo filho e por Dilma Rousseff, a mãe de Eduardo Campos disse logo a que veio. Fiscalização do TCU não pode resultar na paralisação de obras públicas, ela declarou na época. “O controle deve servir para aperfeiçoar a gestão dos governos e não para paralisá-la, quando não inviabilizando-a, pois é fugaz o tempo de quem governa.”
Menos de um ano depois da posse, em julho de 2012, guiando-se por um voto da ministra Ana Arraes o TCU considerou “regular” um contrato celebrado pela agência de propaganda DNA, que pertencia a Marcos Valério, com o Banco do Brasil. Um negócio de R$ 153 milhões anuais, que vigorou entre 2003, primeiro ano de Lula, e 2005, quando estoutou o escândalo do mensalão.
Na denúncia que deu origem à ação penal do mensalão, a Procuradoria Geral da República sustentara que parte do dinheiro que financiara o mensalão viera de irregularidades praticadas nesses contratos. O próprio TCU já havia apontado irregularidades na transação. Porém, a ministra Ana Arraes deu de ombros para os relatórios do corpo técnico do tribunal e para o parecer do procurador Paulo Bugarin, representante do Ministério Público junto ao TCU.
Divulgada numa época em que o STF se preparava para iniciar, dali a poucos dias, o julgamento do mensalão, a notícia de que o TCU desqualificara uma das provas da Procuradoria repercutiu mal. Poucos dias depois, o próprio TCU suspenderia os efeitos da decisão. A representação do Ministério Público no tribunal recorrera contra a decisão. E o recurso tinha efeito suspensivo.

Em 20 de setembro de 2012, quando os ministros do STF já se debruçavam sobre o mensalão, Eduardo Campos imprimiu suas digitais num manifesto em que o PT acusava a oposição de transformar o mensalão num “julgamento político, golpear a democracia e reverter as conquistas que marcaram a gestão do presidente Lula”. Agora, o aliado de Marina enrola-se na bandeira da decência na política e diz que o PT precisa se atualizar.

Pre-Sal: governo confunde tecnologia nacional com reserva de mercado

Tecnologia brasileira perderá espaço na exploração do pré-sal

João Villaverde
O Estado de S. Paulo - 13/10/2013

Nos discursos oficiais, a exploração e produção de petróleo e gás no campo de Libra, no pré-sal, vai propagar uma nova onda de desenvolvimento da indústria nacional de ponta. Porém, a Petrobrás trabalhará com critérios menos rígidos de conteúdo sofisticado "made in Brazil".
Para evitar um recuo político na estratégia de desenvolvimento das cadeias produtivas brasileiras, por meio da política de conteúdo local mínimo, o governo mudou a composição dos contratos que serão celebrados entre a União e os consórcios vencedores do leilão previsto para o dia 21.
Itens com alto valor tecnológico agregado perderam força, enquanto a obrigatoriedade mínima de requisitos mais simples para a operação no pré-sal foram elevados. Ao final dessa "contabilidade criativa", o governo conseguiu manter no primeiro contrato de partilha do petróleo (que será firmado após o leilão de Libra) os mesmos 37% de conteúdo local mínimo na fase de exploração e de 55% na etapa de produção verificados nos contratos em vigor, feitos sob o regime de concessão.
Para isso, a exigência de "engenharia básica" nacional, que nos contratos antigos era de 50%, no pré-sal saltará a 90%. Por outro lado, o uso de "sistema de controle submarino" nacional na etapa de coleta da produção, altamente sofisticado, caiu de 50%, nos contratos antigos, para 20% no pré-sal
Ao analisar os dados reunidos pelo Estado, Adriano Pires, especialista no setor de petróleo e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), disse que a mudança na composição das planilhas demonstra um esforço do governo para não abrir mão da política de incentivar o conteúdo nacional. "O governo se esforçou para manter os números idênticos na exigência de conteúdo brasileiro, mas afrouxou nos detalhes." De acordo com Pires, a decisão faz sentido para a Petrobrás, que será a operadora única do bloco de Libra. "Ela precisa explorar e produzir, e sem a obrigação de fazer com produto nacional, ela fica menos refém de atrasos na entrega ou de itens mais caros", disse Pires. "A política de conteúdo nacional, inaugurada pelo Lula em 2003, é importante. Mas o governo sempre confundiu conteúdo nacional com reserva de mercado."
Mantra. Quando deu posse a Graça Foster na presidência da Petrobrás, em fevereiro de 2012, Dilma Rousseff entoou o mantra de se aproveitar grandes contratos para agregar valor à indústria nacional.
"A decisão do presidente Lula de que as compras de navios, plataformas, sondas e equipamentos pela Petrobrás deveriam ser orientadas por um percentual produzido no nosso mercado interno, gerando empregos e conhecimentos no Brasil, ajudando a consolidar setores produtivos, mostra que essa estratégia é vencedora. As compras da Petrobrás preferencialmente no Brasil são, sem dúvida nenhuma, vantajosas para a empresa e para o País, e traduzem à perfeição o conceito que defendemos de uma participação das atividades da Petrobrás como indutora do desenvolvimento de setores industriais no Brasil", disse, na ocasião.
Para Luiz Pinguelli Rosa, professor da UFRJ e ex-presidente da Eletrobrás, que também trabalhou com política de absorção de tecnologia para o parque industrial local, a mudança na composição dos compromissos de conteúdo nacional é "evidente", e pode ser resultado de um esforço do governo e da Petrobrás para "compatibilizar as exigências normais com o quadro específico do pré-sal, onde há uma tecnologia mais complexa envolvida na operação".
De acordo com Pinguelli,    a maior abertura para participação estrangeira no fornecimento à Petrobrás não é algo necessariamente ruim. "Falamos de exigência mínima, ou seja, se a cadeia produtiva brasileira for capaz de entregar,- o porcentual será maior. Além disso, a elevação para 90% de engenharia básica brasileira é ótima, porque sinaliza que a concepção geral da operação será feita no País."
Uma fonte graduada do governo afirmou ao Estado que os patamares de conteúdo local para a operação do pré-sal foram definidos após 27 reuniões em Brasília entre a Petrobrás, que elencou a necessidade de equipamentos e serviços que serão usados, e a cadeia de fornecedores, que levantou a capacidade de produção total.

"O que está no contrato é consenso entre as partes envolvidas. Quem vai comprar e quem vai vender concorda com esses números", disse a fonte do governo.

A decadencia do ensino superior (!?) no Brasil - BBC-Brasil

'Geração do diploma' lota faculdades, mas decepciona empresários

Estudante (Foto Reuters)
Número de instituições de ensino superior mais que dobrou desde 2001
Nunca tantos brasileiros chegaram às salas de aula das universidades, fizeram pós-graduação ou MBAs. Mas, ao mesmo tempo, não só as empresas reclamam da oferta e qualidade da mão-de-obra no país como os índices de produtividade do trabalhador custam a aumentar.
Na última década, o número de matrículas no ensino superior no Brasil dobrou, embora ainda fique bem aquém dos níveis dos países desenvolvidos e alguns emergentes. Só entre 2011 e 2012, por exemplo, 867 mil brasileiros receberam um diploma, segundo a mais recente Pesquisa Nacional de Domicílio (Pnad) do IBGE.
“Mas mesmo com essa expansão, na indústria de transformação, por exemplo, tivemos um aumento de produtividade de apenas 1,1% entre 2001 e 2012, enquanto o salário médio dos trabalhadores subiu 169% (em dólares)", diz Rafael Lucchesi, diretor de educação e tecnologia na Confederação Nacional da Indústria (CNI).
A decepção do mercado com o que já está sendo chamado de "geração do diploma" é confirmada por especialistas, organizações empresariais e consultores de recursos humanos.
"Os empresários não querem canudo. Querem capacidade de dar respostas e de apreender coisas novas. E quando testam isso nos candidatos, rejeitam a maioria", diz o sociólogo e especialista em relações do trabalho da Faculdade de Economia e Administração da USP, José Pastore.
Entre empresários, já são lugar-comum relatos de administradores recém-formados que não sabem escrever um relatório ou fazer um orçamento, arquitetos que não conseguem resolver equações simples ou estagiários que ignoram as regras básicas da linguagem ou têm dificuldades de se adaptar às regras de ambientes corporativos.
"Cadastramos e avaliamos cerca de 770 mil jovens e ainda assim não conseguimos encontrar candidatos suficientes com perfis adequados para preencher todas as nossas 5 mil vagas", diz Maíra Habimorad, vice-presidente do DMRH, grupo do qual faz parte a Companhia de Talentos, uma empresa de recrutamento. "Surpreendentemente, terminanos com vagas em aberto."
Outro exemplo de descompasso entre as necessidades do mercado e os predicados de quem consegue um diploma no Brasil é um estudo feito pelo grupo de Recursos Humanos Manpower. De 38 países pesquisados, o Brasil é o segundo mercado em que as empresas têm mais dificuldade para encontrar talentos, atrás apenas do Japão.
É claro que, em parte, isso se deve ao aquecimento do mercado de trabalho brasileiro. Apesar da desaceleração da economia, os níveis de desemprego já caíram para baixo dos 6% e têm quebrado sucessivos recordes de baixa.
Linha de montagem da Ford (Foto BBC)
Produtividade da industria aumentou apenas 1,1% na última década, segundo a CNI
Mas segundo um estudo divulgado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) divulgado nesta semana, os brasileiros com mais de 11 anos de estudo formariam 50% desse contingente de desempregados.
"Mesmo com essa expansão do ensino e maior acesso ao curso superior, os trabalhadores brasileiros não estão conseguindo oferecer o conhecimento específico que as boas posições requerem", explica Márcia Almstrom, do grupo Manpower.

Causas

Especialistas consultados pela BBC Brasil apontam três causas principais para a decepção com a "geração do diploma".
A principal delas estaria relacionada a qualidade do ensino e habilidades dos alunos que se formam em algumas faculdades e universidades do país.
Os números de novos estabelecimentos do tipo criadas nos últimos anos mostra como os empresários consideram esse setor promissor. Em 2000, o Brasil tinha pouco mais de mil instituições de ensino superior. Hoje são 2.416, sendo 2.112 particulares.
"Ocorre que a explosão de escolas superiores não foi acompanhada pela melhoria da qualidade. A grande maioria das novas faculdades é ruim", diz Pastore.
Tristan McCowan, professor de educação e desenvolvimento da Universidade de Londres, concorda. Há mais de uma década, McCowan estuda o sistema educacional brasileiro e, para ele, alguns desses cursos universitários talvez nem pudessem ser classificados como tal.
“São mais uma extensão do ensino fundamental", diz McCowan. "E o problema é que trazem muito pouco para a sociedade: não aumentam a capacidade de inovação da economia, não impulsionam sua produtividade e acabam ajudando a perpetuar uma situação de desigualdade, já que continua a ser vedado à população de baixa renda o acesso a cursos de maior prestígio e qualidade."
Para se ter a medida do desafio que o Brasil têm pela frente para expandir a qualidade de seu ensino superior, basta lembrar que o índice de anafalbetismo funcional entre universitários brasileiros chega a 38%, segundo o Instituto Paulo Montenegro (IPM), vinculado ao Ibope.
Estudantes (Foto BBC)
Especialistas questionam qualidade de novas faculdades no Brasil
Na prática, isso significa que quatro em cada dez universitários no país até sabem ler textos simples, mas são incapazes de interpretar e associar informações. Também não conseguem analisar tabelas, mapas e gráficos ou mesmo fazer contas um pouco mais complexas.
De 2001 a 2011, a porcentagem de universitários plenamente alfabetizados caiu 14 pontos - de 76%, em 2001, para 62%, em 2011. "E os resultados das próximas pesquisas devem confirmar essa tendência de queda", prevê Ana Lúcia Lima, diretora-executiva do IPM.
Segundo Lima, tal fenômeno em parte reflete o fato da expansão do ensino superior no Brasil ser um processo relativamente recente e estar levando para bancos universitários jovens que não só tiveram um ensino básico de má qualidade como também viveram em um ambiente familiar que contribuiu pouco para sua aprendizagem.
"Além disso, muitas instituições de ensino superior privadas acabaram adotando exigências mais baixas para o ingresso e a aprovação em seus cursos", diz ela. "E como consequência, acabamos criando uma escolaridade no papel que não corresponde ao nível real de escolaridade dos brasileiros."

Postura e experiência

A segunda razão apontada para a decepção com a geração de diplomados estaria ligada a “problemas de postura” e falta de experiência de parte dos profissionais no mercado.
“Muitos jovens têm vivência acadêmica, mas não conseguem se posicionar em uma empresa, respeitar diferenças, lidar com hierarquia ou com uma figura de autoridade”, diz Marcus Soares, professor do Insper especialista em gestão de pessoas.
“Entre os que se formam em universidades mais renomadas também há certa ansiedade para conseguir um posto que faça jus a seu diploma. Às vezes o estagiário entra na empresa já querendo ser diretor.”
As empresas, assim, estão tendo de se adaptar ao desafio de lidar com as expectativas e o perfil dos novos profissionais do mercado – e em um contexto de baixo desemprego, reter bons quadros pode ser complicado.
Para Marcelo Cuellar, da consultoria de recursos humanos Michael Page, a falta de experiência é, de certa forma natural, em função do recente ciclo de expansão econômica brasileira.
"Tivemos um boom econômico após um período de relativa estagnação, em que não havia tanta demanda por certos tipos de trabalhos. Nesse contexto, a escassez de profissionais experientes de determinadas áreas é um problema que não pode ser resolvido de uma hora para outra", diz Cuellar.
Nos últimos anos, muitos engenheiros acabaram trabalhando no setor financeiro, por exemplo.
"Não dá para esperar que, agora, seja fácil encontrar engenheiros com dez ou quinze anos de experiência em sua área – e é em parte dessa escassez que vem a percepção dos empresários de que ‘não tem ninguém bom’ no mercado", acredita o consultor.

'Tradição baicharelesca'

Por fim, a terceira razão apresentada por especialistas para explicar a decepção com a “geração do diploma” estaria ligada a um desalinhamento entre o foco dos cursos mais procurados e as necessidades do mercado.

É bastante disseminada no Brasil a ideia de que cargos de gestão pagam bem e cargos técnicos pagam mal. Mas isso está mudando – até porque a demanda por profissionais da área técnica tem impulsionado os seus salários."
Gabriel Rico
De um lado, há quem critique o fato de que a maioria dos estudantes brasileiros tende a seguir carreiras das ciências humanas ou ciências sociais - como administração, direito ou pedagogia - enquanto a proporção dos que estudam ciências exatas é pequena se comparada a países asiáticos ou alguns europeus.
“O Brasil precisa de mais engenheiros, matemáticos, químicos ou especialistas em bioquímica, por exemplo, e os esforços para ampliar o número de especialistas nessas áreas ainda são insuficientes”, diz o diretor-executivo da Câmara Americana de Comércio (Amcham), Gabriel Rico.
Segundo Rico, as consequências dessas deficiências são claras: “Em 2011 o país conseguiu atrair importantes centros de desenvolvimento e pesquisas de empresas como a GE a IBM e a Boeing”, ele exemplifica. “Mas se não há profissionais para impulsionar esses projetos a tendência é que eles percam relevância dentro das empresas.”
Do outro lado, também há críticas ao que alguns vêem como um excesso de valorização do ensino superior em detrimento das carreiras de nível técnico.
“É bastante disseminada no Brasil a ideia de que cargos de gestão pagam bem e cargos técnicos pagam mal. Mas isso está mudando – até porque a demanda por profissionais da área técnica tem impulsionado os seus salários”, diz o consultor.
Rafael Lucchesi concorda. "Temos uma tradição cultural baicharelesca, que está sendo vencida aos poucos”, diz o diretor da CNI – que também é o diretor-geral do Senai (Serviço Nacional da Indústria, que oferece cursos técnicos).
Segundo Lucchesi, hoje um operador de instalação elétrica e um técnico petroquímico chegam a ganhar R$ 8,3 mil por mês. Da mesma forma, um técnico de mineração com dez anos de carreira poderia ter um salário de R$ 9,6 mil - mais do que ganham muitos profissionais com ensino superior.
“Por isso, já há uma procura maior por essas formações, principalmente por parte de jovens da classe C, mas é preciso mais investimentos para suprir as necessidades do país nessa área”, acredita.

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As universidades do Brasil Maravilha são fábricas de luta com diploma

Em agosto de 2010, no comício de inauguração de quatro prédios da Universidade Federal de Dourados, em Mato Grosso do Sul, Lula também reinaugurou a bazófia que se transformaria, de lá para cá, num dos seus mantras prediletos: “No meu último dia de presidente, eu vou olhar para mim e dizer que não tenho curso superior, mas fui o presidente que mais abriu universidade no Brasil”. Depende do critério utilizado.
Se o que vale é quantidade, o palanque ambulante tem razão. Na última década, o número de matrículas em cursos superiores dobrou. Entre 2011 e 2012, 867 mil brasileiros se formaram por alguma faculdade, pública ou privada.
Baseada no critério da qualidade, adotado por quem tem mais de cinco neurônios, uma reportagem publicada pelo site da BBC acaba de implodir a gabolice do maior dos governantes desde Tomé de Souza.
Sob o título "‘Geração do diploma’ lota faculdades, mas decepciona empresários", o texto enfileira informações estarrecedoras. Uma delas: segundo o Instituto Paulo Montenegro (IPM), vinculado ao Ibope, o índice de analfabetismo funcional entre universitários brasileiros chega a 38%. "Isso significa que quatro em cada dez universitários até sabem ler textos simples, mas são incapazes de interpretar e associar informações", espanta-se o redator da BBC.
“Também não conseguem analisar tabelas, mapas e gráficos ou mesmo fazer contas um pouco mais complexas”, prossegue o desfile de assombros.
“De 2001 a 2011, a porcentagem de universitários plenamente alfabetizados caiu de 76% para 62%. E os resultados das próximas pesquisas devem confirmar essa tendência de queda, prevê Ana Lúcia Lima, diretora-executiva do IPM”.
O desastre é ampliado a cada ano pela parceria entre faculdades federais de quinta categoria e cursos particulares criados pela indústria do ensino, com vagas de sobra para premiar com canudos inúteis a procissão de bolsistas que o governo financia com o dinheiro dos pagadores de impostos. O número de acadêmicos não para de aumentar. A taxa de ignorância no campus também.
Vista de perto, o que o pai do Brasil Maravilha chama de universidade é só uma fábrica de lulas com diploma de doutor.

Ajuda ao desenvolvimento costuma atrapalhar o desenvolvimento - Angus Deaton (Book review)

O resenhista não cita William Easterly, ou Peter Bauer, que já tinham alertado CONTRA a assistência ao desenvolvimento. Esperemos que o autor do livro o tenha feito.
Paulo R Almeida

OFF THE SHELF

A Surprising Case Against Foreign Aid




IN his new book, Angus Deaton, an expert’s expert on global poverty and foreign aid, puts his considerable reputation on the line and declares that foreign aid does more harm than good. It corrupts governments and rarely reaches the poor, he argues, and it is high time for the paternalistic West to step away and allow the developing world to solve its own problems.
Patricia Wall/The New York Times
It is a provocative and cogently argued claim. The only odd part is how it is made. It is tacked on as the concluding section of “The Great Escape: Health, Wealth, and the Origins of Inequality” (Princeton University Press, 360 pages), an illuminating and inspiring history of how mankind’s longevity and prosperity have soared to breathtaking heights in modern times.
Mr. Deaton is the Eisenhower Professor of Economics and International Affairs at Princeton. He has spent decades working with the World Bank in creating basic yardsticks for measuring global poverty and with the Gallup Organization in creating survey-based measures of well-being.
The “great escape” of the title, he writes, is “the story of mankind’s escaping from deprivation and early death.” His book gives a stirring overview of the economic progress and medical milestones that, starting with the Industrial Revolution and accelerating after World War II, have caused life expectancies to soar.
Professor Deaton is a fluent writer, but his book is a demanding read. Its guts are his statistical comparisons, region by region and country by country, of how things stand today. They show how, when and whether higher incomes have promoted greater life expectancies and higher well-being across the globe. Professor Deaton tells us that a rising tide has lifted almost all the world’s boats — but some far higher than others. Some have scarcely moved; a few have sunk. Obviously, some developing nations have done phenomenally well, yet, on average, the distance between “rich” and “poor” countries remains the same.
China and India continually come to the fore. For all their extraordinary progress in lifting millions of people out of poverty, it is still the case that about half of the world’s poor are Chinese or Indian.
In today’s world, with all we have mastered in medicine, public health and development, Professor Deaton says, it is also still the case that almost a billion people “live in material destitution, millions of children still die through the accident of where they are born, and wasting and wanting still disfigure the bodies of nearly half of India’s children.”
That troubling statement leads to his indictment of foreign aid, which is jarring and odd only in that nowhere in the first 266 pages of his historical analysis has he even mentioned foreign aid, either positively or negatively. A new character joins the play in its final act and becomes the villain of the piece.
In his considered judgment, global poverty today is no longer a result of lack of resources or opportunity, but of poor institutions, poor government and toxic politics. Though about $134 billion in official aid still flows from donor governments to recipient governments, there is no mystery, he says, as to why foreign aid fails to erase poverty. That is not its mission, he asserts: typically it serves commercial interests at home or buys political allies abroad, too often unsavory ones.
All aid is distorted by politics at both ends, he says, citing the example of Mauritania several years back, when aid was in danger of being cut off. The country’s president hatched the brilliant idea of becoming one of the few Arab countries to recognize Israel. The aid taps were reopened and the reforms rescinded.
THE author has found no credible evidence that foreign aid promotes economic growth; indeed, he says, signs show that the relationship is negative. Regretfully, he identifies a “central dilemma”: When the conditions for development are present, aid is not required. When they do not exist, aid is not useful and probably damaging.
Professor Deaton makes the case that foreign aid is antidemocratic because it frees local leaders from having to obtain the consent of the governed. “Western-led population control, often with the assistance of nondemocratic or well-rewarded recipient governments, is the most egregious example of antidemocratic and oppressive aid,” he writes. In its day, it seemed like a no-brainer. Yet the global population grew by four billion in half a century, and the vast majority of the seven billion people now on the planet live longer and more prosperous lives than their parents did. 
So what should the West do instead of providing aid? Well, it can invest in finding a vaccine for malaria, still a mass killer. It can push drug companies to tackle diseases that threaten poorer countries. It can support the free flow of information about inventions and new management techniques. It can relax trade barriers and provide poor countries with expert advice at the bargaining table. It can ease immigration restraints and accept more newcomers.
Many options exist, but Professor Deaton suggests that the question is fundamentally wrong and self-centered. “Why is it we who must do something?” he wonders. “Who putus in charge?” What the West should do, he says, is stand aside and let poorer countries find their own paths, in fits and starts, at their own pace, to development and prosperity, just as the West had to do a century or so earlier.
That is a powerful argument from a scholar who has done his homework, but it is more provocative than ultimately convincing. Defenders of foreign aid would reply that past efforts have contributed greatly to the enormous gains in life expectancy that the professor celebrates. The professor’s maverick views fly in the face of an enormous global effort, and he paints with a very broad brush. The World Bank counts nearly 12,000 projects under way in 172 countries. It’s hard to believe that all are nearly as flawed or misguided as Professor Deaton suggests. Aid is not a door that should slam shut.

sábado, 12 de outubro de 2013

Vinde a mim os muito ricos, famelicos abstei-vos: as leis de imigracaoem paises europeus

Só ricos são bem-vindos na Europa
UE se fecha para os refugiados, mas países europeus atraem estrangeiros oferecendo cidadania em troca de investimentos
Claus Hecking, do Der Spiegel - O Estado de S.Paulo, 12/10/2013

Quando, às 8 horas, abrem-se os guichês no departamento de imigração da Letônia, eles já estão aguardando: russos, cazaques, chineses abastados acompanhados por seus intérpretes e assessores com contratos de compra e venda à mão. Alguns adquiriram propriedades na Letônia poucas horas antes; muitos estão em Riga pela primeira vez, apenas em trânsito. E todos querem uma única coisa: autorização de residência permanente, seu bilhete de ingresso na Europa Central.
Esse programa atrai milhares de estrangeiros à Letônia. E dificilmente qualquer dessas pessoas viverá ali. Mas qualquer pessoa que comprar um imóvel que custe no mínimo 71.000 (US$96.500) nas províncias, ou o dobro no caso de uma propriedade em cidades grandes como Riga, recebe um visto de residência por cinco anos. E isso significa acesso irrestrito aos 28 países do EspaçoSchengen. O governo letão implementou esse controvertido programa para salvar seu enfermo mercado imobiliário. E agora outros países também o adotaram.
Grécia, Espanha e Hungria têm feito essa oferta para atrair investidores de todo o mundo. O modelo afeta as estritas leis de imigração e asilo da Europa. A tragédia de Lampedusa, onde mais de 330 africanos morreram afogados na semana passada quando seu barco incendiou-se e afundou, mostra como ele é moralmente questionável.
A "fortaleza Europa" procura se defender contra esses refugiados que fogem da pobreza. De acordo com as Nações Unidas, cerca de duas mil pessoas perderam a vida nas águas do Mediterrâneo desde o início de 2011. E, ao mesmo tempo, alguns governos dentro da UE permitem que estrangeiros abastados entrem nos países por vias indiretas.
"Isso é cinismo", diz Karl Kopp, diretor da organização Pro Asyl, que defende os direitos dos refugiados. "Os que realmente precisam de refúgio são repelidos de todas as maneiras. Mas os que têm dinheiro recebem acesso livre".
E são os países da UE sofrendo crises financeiras os interessados no modelo letão: Na Espanha, na terça-feira, entrou em vigor lei com base na qual será fornecida autorização de residência para investidores estrangeiros que aplicarem pelo menos 500 mil na compra de um imóvel. Para especialistas do setor imobiliário, o programa deve atrair pelo menos 300 mil compradores.
Trampolins. Desde a meados deste ano, a Grécia vem concedendo vistos de residência de cinco anos para quem investe 250 mil numa propriedade. Tecnicamente, são concedidos vistos a cidadãos de fora da UE para uma permanência de 90 dias em cada 180 dias em outros Estados da zona deSchengen. Mas ninguém fiscaliza o cumprimento da norma.
Portugal oferece o que chama de "visto de ouro" desde outubro de 2012: mais de dois anos de residência em troca de um investimento imobiliário de ao menos500 mil. O governo de direita da Hungria, que normalmente procura manter os estrangeiros longe do precioso solo húngaro, iniciou em julho a venda de títulos do governo em troca de um visto de permanência. Os estrangeiros interessados precisam injetar no mínimo 250 mil; além disso há outras despesas em torno de 40 mil euros, pagas para empresas duvidosas parceiras do governo e sediadas em paraísos ficais como Ilhas Cayman e Chipre.
"Com programas desse tipo, a Europa está perdendo sua credibilidade", dizBirgit Sippel, porta-voz para a área de políticas de imigração e segurança do grupo parlamentar do Partido Social Democrata alemão (SPD). Em princípio o direito de residência é assunto de cada Estado. "Mas o que vem ocorrendo afeta a Europa toda. Não podemos excluir rigorosamente um grupo de pessoas e por outro lado permitir que todos esses indivíduos com vistos se movimentem por toda a zona de Schengen à vontade".
Na Letônia, em todo caso, dificilmente esses estrangeiros permanecem. Segundo uma pesquisa realizada pelo Departamento de Imigração, nem um quinto das pessoas que participaram do programa permanece em solo letão. Outros alugam suas propriedade imediatamente após a compra ou simplesmente as deixam vazias e mudam-se para França, Áustria ou Alemanha. Mas o programa produz consenso na classe política e cerca de 600 milhões já foram injetados no mercado imobiliário da Letônia.
Ao final, os vistos que dão acesso à zona de Schengen são muito lucrativos para o país desistir do seu programa. / TRADUÇÃO DE TEREZINHAMARTINO
É JORNALISTA

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