quinta-feira, 7 de março de 2024

Eleição na Venezuela expõe democracia de conveniência de Lula - Malu Gaspar (O Globo)

Grato a Augusto de Franco pela transcrição:

Eleição na Venezuela expõe democracia de conveniência de Lula

Malu Gaspar, O Globo (07/03/2024)

Imagine o que seria o cenário político do Brasil hoje se a Procuradoria-Geral da República (PGR) e o Supremo Tribunal Federal (STF), controlados por Jair Bolsonaro, tivessem com uma canetada cassado os direitos políticos de Lula e de Simone Tebet por 15 anos e impedido os dois de disputar as eleições de 2022. Ou que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tivesse trocado a data da votação para 31 de março só para render homenagem à ditadura militar.

Daria para acreditar que uma eleição nessas condições teria um  resultado justo? A pergunta é obviamente retórica e um tanto absurda, já  que tal situação seria impensável no Brasil — onde, apesar da onda  golpista dos últimos anos, ainda temos uma democracia.

Não é o caso da Venezuela, onde a Controladoria-Geral e o Supremo, dominados por Nicolás Maduro,  retiraram da disputa deste ano seus dois principais opositores — e  ainda mudaram a data do pleito, que tradicionalmente ocorre em dezembro,  para 28 de julho, aniversário do falecido presidente Hugo Chávez.

Para Lula, porém, levantar qualquer dúvida sobre a lisura das eleições venezuelanas é prejulgamento.

— Não podemos jogar dúvida antes das eleições acontecerem, que aí  começa discurso de prever antecipadamente que vai ter problema — afirmou  o presidente brasileiro a jornalistas ontem no Palácio do Planalto. —  Temos que garantir a presunção de inocência, até que haja as eleições  para que a gente possa julgar se foi democrática ou decente.

O brasileiro ainda disse que Maduro lhe garantiu que vai “convocar  todos os olheiros internacionais do mundo que quiserem acompanhar as  eleições”.

Lula não é bobo nem mal informado, conhece Maduro de outros carnavais e  tem à disposição um corpo diplomático plenamente capaz de informá-lo de  que a Venezuela mantém cerca de 300 presos políticos e protagoniza a  maior crise humanitária do planeta, com quase 8 milhões de exilados.

A perseguição a opositores, com desaparecimentos e torturas, é uma das  razões por que o governo venezuelano é alvo de uma investigação no  Tribunal Penal Internacional por crimes contra a humanidade.

Na semana passada, Maduro ainda expulsou do país integrantes do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos porque, entre outras razões, protestaram  contra a prisão da ativista Rocío San Miguel, conhecida por denunciar  crimes militares.

Presa há um mês pela polícia de Maduro sob as acusações de “traição à  pátria”, “terrorismo” e “conspiração”, ela ficou semanas incomunicável,  com paradeiro desconhecido. Foi preciso a intermediação da embaixada da Espanha (ela é cidadã espanhola) para que fosse garantido seu direito a receber visitas da família e de um advogado.

Não há sinal, portanto, de que Maduro esteja realmente disposto a  receber olheiros para fiscalizar as eleições — a menos, talvez, que  venham da Nicarágua, da Rússia ou de Cuba.

Por essas e outras razões, não faz nenhum sentido comparar o cenário  político do Brasil ao da Venezuela. Lula, porém, arriscou. Aos  jornalistas, ele disse esperar que a oposição venezuelana não tenha o  mesmo comportamento da brasileira:

— Se o candidato da oposição tiver o mesmo comportamento da oposição daqui, nada vale.

E cutucou:

— Eu fui impedido de concorrer às eleições de 2018. Em vez de ficar  chorando, indiquei um outro candidato que disputou as eleições.

Pois a questão é justamente essa. A diferença entre Lula e a  oposicionista María Corina Machado, que aparecia na liderança das  pesquisas, mas foi sumariamente excluída de eleições na Venezuela pelos  próximos 15 anos, é que Lula não foi impedido de disputar por uma  ditadura, mas por decisão judicial. E, se o Brasil não fosse uma  democracia, nem o PT poderia ter indicado outro candidato para  substituí-lo, nem ele poderia voltar a disputar eleições em 2022 — e  ganhar.

Não chega a ser novo ver Lula fingir que não vê os crimes cometidos por  ditaduras amigas enquanto denuncia os perpetrados por inimigos  geopolíticos.

Mas continua sendo intrigante ver o tom e a ênfase com que defende  Nicolás Maduro. Parece que, quanto mais se acumulam evidências de  monstruosidades cometidas pelo venezuelano, mais o brasileiro se empenha  em absolvê-lo.

Tal postura fica ainda mais esdrúxula considerando que acabamos de  passar por um trauma que poderia ter nos lançado de novo sob uma  ditadura em que o petista certamente não seria o presidente — e que  apoiar Maduro só piora sua imagem diante dos eleitores que de fato  prezam a democracia como valor.

A única explicação possível é que Lula acredita mesmo no que diz e que,  para ele, democracia é um conceito relativo. Só é sagrada se for para  favorecê-lo. Senão, não faz mesmo diferença.

O Holocausto é único na história da Humanidade - Caio Blinder, Jackikao

From: Caio Blinder:

“ Prezado Presidente Lula @LulaOficial, estou na saída do Yad Vashem (Memorial do Holocausto), em Jerusalém.

Não, não é a mesma coisa…mesmo. Não há comparação entre Gaza e o Holocausto.

Recomendo que o senhor visite novamente o Yad Vashem.”

From: Jackikao:

“Se Lula visitasse o Yad Vashem veria com os próprios olhos de que não há nada que se compare ao Holocausto 

Vamos lá, o holocausto se distingue de maneira singular na história da humanidade. O genocídio perpetrado pelos nazistas contra os judeus durante a 2a Guerra não foi apenas um ato de extermínio em massa, mas uma operação sistemática e industrializada com o objetivo específico de erradicar toda a população judaica da Europa.

Diferentemente de outros genocídios, em que a violência e o assassinato em massa podem ser motivados por conflitos territoriais, disputas étnicas ou políticas, o Holocausto foi marcado por uma obsessão ideológica com a "pureza racial" e a eliminação completa dos judeus. O regime nazista estabeleceu metas de morte, construiu campos de extermínio equipados com câmaras de gás e fornos crematórios, e orquestrou a logística para transportar milhões de pessoas de toda a Europa ocupada para esses locais de morte. A invasão de países era frequentemente acompanhada de um cálculo prévio de quantos judeus viviam lá, com o intuito de capturá-los e exterminá-los.”


O que se passa atualmente em Cuba? Uma escassez generalizada nos meios de vida - Carlos Malamud (El Periódico de España)

Não sabemos se o governo brasileiro atual virá novamente em socorro do povo irmão de Cuba, como feito no passado através do programa Mais Médicos, que transferia ao governo cubano praticamente 80% dos pagamentos feitos pelos "médicos cubanos" vindos ao Brasil. (PRA)

No llegan buenas noticias de Cuba

Carlos Malamud

El Periódico de España, 06 mar 2024 

Ni política, ni económica ni simbólicamente los tiempos son los mismos que cuando vivía Fidel Castro.

 

En los últimos años, especialmente tras las movilizaciones del 11 de julio de 2021, solo llegan malas noticias de Cuba, pero las de los últimos días son dramáticas. El 1 de marzo la gasolina aumentó más de un 400% y un 25% la electricidad para los mayores consumidores. Es el preanuncio de un rebote inflacionario, un revés añadido a sumar a los interminables cortes de luz. El 13 de febrero el apagón afectó a más del 45% del país.

El gobierno también solicitó al Programa Mundial de Alimentos (PMA), de Naciones Unidas, leche en polvo para niños menores de siete años, intentando evitar un brote de desnutrición y de anemia infantiles. A lo largo de marzo faltará pan, ya que, según el ministerio de la Industria Alimentaria, hay “situaciones específicas” con “embarques planificados” desde Rusia. Si bien hay un consenso generalizado de que el abastecimiento “está dentro de la normalidad”, la idea se remata señalando que esto “no quiere decir que la normalidad sea buena”. O dicho de otro modo muchos cubanos han normalizado el sufrimiento.

La escasez afecta especialmente a quienes dependen de la libreta de abastecimiento o cartilla de racionamiento, ya que las tiendas privadas disponen de un mayor número de productos de primera necesidad, pero con precios incomparables ni al alcance de cualquiera. El salario medio oficial es de 4.560 pesos cubanos (CUP), equivalentes a 14,25 dólares en el mercado paralelo, mientras el salario mínimo es de 6,77 dólares y la pensión que cobra el 70% de los jubilados, 1.528 CUP, son 4,92 dólares.

El 2 de febrero, el presidente Miguel Díaz-Canel destituyó a Alejandro Gil, viceprimer ministro y ministro de Economía y Planificación, en el cargo desde 2018. Gil encabezó diversas reformas fallidas, incluyendo el duro plan de ajuste anunciado a fines de 2023 y finalmente postergado. Los datos oficiales lo dicen todo: contracción de casi el 2% del PIB, inflación del 30% y un déficit público del 18,5%. En definitiva, unas cifras para temblar. 

Desde la óptica del relato oficial y la defensa de la ortodoxia revolucionaria, recurrir al PMA hubiera sido impensable en vida de Fidel Castro, aunque se tratara de evitar la desnutrición infantil. Esto es hoy solo una muestra más del fracaso del proyecto socialista. Se recurre a este extremo porque la situación política, económica y social es casi terminal. Desde hace tiempo se han agotado los recursos propios, mientras los provenientes de países amigos llegan a cuentagotas.

Como tantas veces, el bloqueo (o embargo) de EEUU es omnipresente a la hora de las justificaciones, aunque internet y las redes sociales han permitido quebrar el monopolio informativo ejercido por el régimen. Si bien se han reconocido errores en política económica y monetaria, se insiste en que todo responde a las sanciones occidentales, pero esta interpretación trillada goza de credibilidad decreciente y escaso interés social. Ante tal cúmulo de desgracias el descreimiento es la respuesta mayoritaria, que en la medida de lo posible se transforma en la búsqueda de una vía de escape, preferentemente a EEUU y Europa. 

El diagnóstico es terrible. Un informe reciente de “Cuba 21”, une la inflación y el crecimiento negativo a una balanza comercial deficitaria, al desplome de las principales entradas de divisas (exportación de médicos, turismo y remesas) y al hundimiento del sector energético, comenzando por el obsoleto sistema eléctrico. Para colmo, un país teóricamente agrícola debe importar casi el 100% de la canasta familiar, según manifestó en setiembre el exministro Gil.

La infraestructura viaria y buena parte del parque de viviendas se desmorona, sin capacidad de arbitrar soluciones efectivas, salvo parchear los casos más urgentes. La salud, la educación y el abastecimiento de agua potable que fueron las joyas de la Revolución, hoy son cascarones vacíos y fuente de graves problemas. A esto se suma el aumento descontrolado de la criminalidad, ya que la apuesta por el “orden público” se centra en la represión y no en la seguridad ciudadana. Todo sirve para explicar el éxodo masivo y el incremento de la protesta social.

El régimen se enrocó en defensa del socialismo y la Revolución y no propone alternativas viables. Pero, ni política, ni económica ni simbólicamente los tiempos son los mismos que cuando vivía Fidel Castro, capaz de abroquelar a las masas en defensa de su proyecto. Su hermano Raúl, con 92 años, tampoco está en condiciones de ejercer un liderazgo activo, ni siquiera delegado, mientras la gestión de Díaz-Canel ni se caracteriza por su eficacia ni por sintonizar con las diezmadas bases revolucionarias.

En estas condiciones, y dada las grandes dificultades que viven los grupos opositores internos para conciliar sus políticas, el futuro es bastante incierto. No hay nadie capacitado para encausar el descontento social ante un gobierno visualizado como incapaz de proveer los bienes públicos demandados. El régimen, sumido en su inmovilismo, carece de las herramientas adecuadas para impulsar la tan necesaria apertura política y económica. De persistir esta sensación de bloqueo, las noticias que lleguen de Cuba serán cada vez más dramáticas.

 

BNDES precisa resistir a tentações dirigistas - Editorial FSP

 

BNDES precisa resistir a tentações dirigistas 

Comando do banco quer dobrar desembolsos, sem chegar ao patamar de Dilma; velhas teses petistas ainda suscitam temores 

Editorial Folha de S. Paulo, 6/03/2024


No terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o BNDES declara buscar um meio-termo entre o gigantismo que levou ao desastre sob Dilma Rousseff e o papel modesto dos últimos anos. O balanço de 2023 do banco oficial de fomento, recém-divulgado, parece ao menos coerente com tal propósito.

A instituição estatal contabilizou um aumento considerável em seus desembolsos, de 17% ante o registrado no ano anterior. Foram R$ 114,4 bilhões em operações de crédito, equivalentes a 1,1% do Produto Interno Bruto. Por este parâmetro, não há tanta diferença em relação ao quase 1% do PIB de 2022.

O presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, estabeleceu como meta elevar o montante a 2% do produto até 2026, retomando o patamar que vigorava durante o governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). A meta soa menos alarmante se comparada aos mais de 4% em 2009-10, mas cumpre examinar como se pretende atingi-la —e com que finalidade.

Bancos de desenvolvimento, que empregam recursos públicos, principalmente, e privados para financiar projetos tidos como de interesse social, não são uma peculiaridade brasileira. Estudos acadêmicos recentes identificaram mais de 500 deles no mundo. Poucas instituições nacionais, no entanto, têm as dimensões do BNDES.

No Brasil, ademais, a intervenção do poder público no setor financeiro está longe de se limitar a um único banco. Como noticiou o jornal Valor Econômico, a participação estatal no crédito voltou a subir e atingiu 42,9% em 2023. Há uma década, a cifra chegava a 56%.

Tamanho peso significa risco igualmente elevado de dirigismo a partir de conveniências políticas ou diretrizes ideológicas, não raro favorecendo empreendimentos antieconômicos de retorno social escasso ou mesmo negativo.

Mercadante — um dos principais nomes do governo Dilma — e sua equipe declaram que não pretendem repetir erros do passado, o que não deixa de ser uma espécie de autocrítica, mesmo vagaA expansão das operações do BNDES, afirmam, será limitada e não se dará com aportes do Tesouro.

No entanto expoentes do PT, a começar pelo próprio Lula, mantêm explícito o apego às velhas teses intervencionistas e protecionistas. A mais recente tentativa de política industrial, embora menos ambiciosa que as antecessoras, repete chavões do assim chamado nacional-desenvolvimentismo.

Nesse contexto, o prometido "BNDES do futuro" ainda está por ser caracterizado na prática e nos próximos balanços.


quarta-feira, 6 de março de 2024

Paulo Guedes e Sachsida finalizam livro sobre a economia no governo Bolsonaro (PRA: não será honesto)

Não creio que o debate será honesto, completo e claro, ainda que os dois tenham tido intenções liberais. O fato é que serviram a um governo que deformou as contas públicas e políticas setoriais na sua sanha eleitoreira por ganhar mais um mandato. Os liberais verdadeiros foram saindo progressivamente desde o início do governo e só sobraram os oportunistas.

Paulo Guedes e Sachsida finalizam livro sobre a economia no governo Bolsonaro

Obra foi anunciada nesta terça-feira, 5, pelo ex-ministro de Minas e Energia em publicação feita em rede social

O ex-ministro da Economia Paulo Guedes e o ex-ministro de Minas e Energia Adolfo Sachsida, que também foi secretário de Política Econômica de Guedes, decidiram colocar em livro a experiência que tiveram no governo.

De acordo com uma publicação feita por Sachsida no Linkedin nesta terça-feira, 5, a obra está em processo de conclusão e de definição da editora e da data de lançamento e recebeu o título provisório de A política econômica no período 2019-2022: Consolidação fiscal e reformas pró-mercado para aumento de produtividade.
“Meus amigos, com muito prazer informo que após quase um ano de trabalho estamos terminando nosso livro sobre a política econômica do período 2019-22. O ministro Paulo Guedes e eu procuramos retratar da melhor maneira possível nossa estratégia de política econômica, seus fundamentos teóricos e sua materialização em medidas legislativas”, afirma Sachsida no post.
Segundo ele, o livro contou com a participação de diversos profissionais que ocupavam posições-chave nos dois ministérios e “ajudaram a elaborar, operacionalizar e implementar” as políticas públicas na época. Sachsida diz que, em breve dará “mais detalhes” sobre a publicação, mas antecipou desde já a estrutura do novo livro.
A obra deverá abordar, de acordo com o ex-ministro, a política econômica centrada no “binômio” consolidação fiscal e reformas pró-mercado; as agendas macro e microeconômica implementadas no governo passado; e o que ele chama de “reformas silenciosas; além de trazer observações sobre o futuro da economia brasileira e mundial e um guia para a implementação de uma política econômica liberal nos governos federal, estaduais e municipais. O livro deve incluir ainda um capítulo à parte para a resposta da política econômica à pandemia e um conjunto de dados comparando os principais indicadores socioeconômicos do País no fim do governo Bolsonaro com os de governos anteriores.
 

Ipea analisa alinhamento entre Brasil e EUA em cooperações militares - Agência Brasil

 Ipea analisa alinhamento entre Brasil e EUA em cooperações militares

IstoÉ Online, 06 de março de 2024

Agência Brasil,  06/03/2024 

"Os Estados Unidos figuram como o principal destino dos postos e missões militares brasileiras no exterior", diz estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Segundo a análise do Ipea, relativa ao período de 2020 a 2023, "a alta recorrência de capacitações e de cooperações militares nos Estados Unidos (EUA) aponta para um desalinhamento entre os objetivos gerais apresentados na PND [Política Nacional de Defesa] e na END [Estratégia Nacional de Defesa], uma vez que concentra as influências políticas, estratégicas e doutrinárias preponderantemente em um único país."

De acordo com o texto para discussão O Setor de Defesa Brasileiro no Exterior: Desafios, Oportunidades e Subsídios para a Revisão dos Documentos de Defesa, a preferência é um resquício do alinhamento do Brasil com os Estados Unidos como ocorria à época da Guerra Fria (1947-1991).

Notícias relacionadas:

"A presença norte-americana tem sido grande historicamente desde o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR), assinado em 1947, criação da OEA [Organização dos Estados Americanos], em 1948, a assinatura do Acordo Militar Brasil-Estados Unidos em 1952 - denunciado [extinto] em 1977 -, a existência das Comissões de Aquisições do Brasil em Washington, e a expansão dos mecanismos institucionais regionais liderados pelos EUA na área de defesa como a Conferência de Ministros da Defesa das Américas, criada em 1995, o William J. Perry Center for Hemispheric Studies, criado em 1997, e a própria Junta Interamericana de Defesa [criada em 1942, antes da OEA]."

Cenário multipolar

A predileção pelos EUA nas cooperações militares fica mais remissa quando considerado o cenário internacional multipolar atual. "Daí defronte a um aumento da competição entre grandes potências, com crescente influência de China, Índia e Rússia, um excessivo e assimétrico vínculo pode não ser tão produtivo quanto buscar diversificação de parcerias, característica tradicional da política externa brasileira."

O estudo foi elaborado com base em registros publicados no Diário Oficial da União, de informações coletadas na Biblioteca da Presidência da República e da base de dados "Concórdia", acervo de atos internacionais do Brasil mantido pelo Ministério das Relações Exteriores. A partir dessas informações, a análise contempla mais de uma dezena de indicadores sobre a atuação internacional do setor de defesa.

Segundo o material apurado, os Estados Unidos são o país em que os militares brasileiros mais fazem cursos de pós-graduação: 27 estudantes nos três anos observados - o triplo do Reino Unido que fica em segundo lugar. No período, 134 militares brasileiros frequentaram algum curso nos EUA, e 97 eram oficiais superiores (com patente a partir de major).

Conselho de Segurança

A aglutinação das cooperações militares nos EUA desfavorece interesses da política externa do Brasil, assinala a publicação. "Ao concentrar em um único parceiro, da forma como verificamos nesse período, perdemos a oportunidade reunir conhecimento sobre países que são importantes no cenário internacional e que estão em espaços de decisão multilaterais, como o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas", descreve o economista Pedro Silva Barros, técnico de planejamento e pesquisa do Ipea, em nota publicada pelo instituto. O economista também tem formação na Escola Superior de Defesa (ligada ao Ministério da Defesa) e escreveu o texto para discussão em parceria com os pesquisadores Paula Macedo Barros e Raphael Camargo Lima

Publicado no fim de fevereiro, o texto "busca contribuir para o debate público", diz Pedro Barros à Agência Brasil. Até o fim deste semestre, o Poder Executivo deverá encaminhar para apreciação do Congresso Nacional a nova Política de Defesa Nacional, a nova Estratégia Nacional de Defesa e o novo Livro Branco de Defesa Nacional - um documento público sobre modernização das Forças Armadas, o suporte econômico da defesa nacional, a participação em operações de paz e ajuda humanitária e outras informações públicas, "que o Brasil apresenta ao mundo, sobre visão e os seus interesses e a sua política de defesa", informa Barros.

Após as conclusões, o estudo traz 14 recomendações políticas para a atuação internacional do setor de defesa, entre as quais a de dar prioridade ao "entorno estratégico brasileiro", que inclui a América do Sul, o Atlântico Sul, os países da costa ocidental africana e a Antártica; a reativação sob novas bases, da Escola Sul-Americana de Defesa"; e "propor mecanismos de colaboração em ensino e capacitação de defesa no âmbito de outras áreas estratégicas para o Brasil", como a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e países banhados pelo Atlântico Sul.


O perigoso excesso de poupança da China - Martin Wolf (Valor Econômico)

Desde os anos 2000, jornalistas e economistas previram muitas crises, bolhas e fracassos da economia chinesa, que nunca ocorreram. Será mais um anúncio exagerado? (PRA)

O perigoso excesso de poupança da China 

Pequim deve ousar escolher remédios radicais

Martin Wolf*


Valor Econômico, quarta-feira, 6 de março de 2024


China é a superpotência global da poupança. No passado, em uma economia em rápido crescimento com oportunidades de investimento excelentes, suas altas poupanças foram um grande ativo. Mas também podem causar grandes dores de cabeça.

Hoje, com o fim do boom imobiliário, gerenciá-las se tornou um desafio. O governo chinês deve ousar escolher remédios relativamente radicais.

De acordo com o FMI, a China gerou 28% da poupança global total em 2023. Apenas um pouco menos do que a participação de 33% dos EUA e da UE combinados. Isso é bastante extraordinário.

Também tem várias implicações. Uma delas é que se a China fosse uma economia de mercado aberto, seus mercados de capitais seriam os maiores do mundo. Outra é que a forma como essa poupança é gerenciada provavelmente será o determinante mais importante das taxas de juros globais e do balanço de pagamentos globais.

Analisei esses desafios subjacentes em uma coluna em setembro. Uma visita recente à China confirmou tanto a importância desse problema quanto a aparente falta de vontade do governo em fazer mudanças decisivas na estrutura de renda e gastos. Portanto, é muito provável que a China continue a ter uma propensão extremamente alta para poupar.

Mas isso não se deve principalmente à frugalidade das famílias chinesas, como muitos pressupõem. Ainda mais importante é a baixa participação das famílias na renda nacional.

Em outras palavras, como Michael Pettis da Guanghua School of Management da Universidade de Pequim frequentemente argumentou, as poupanças da China são em grande parte uma questão de distribuição. Isso pode ser o motivo pelo qual é difícil que reduzam e, portanto, a taxa de poupança permaneça acima de 40% do PIB.

Se a demanda deve corresponder à oferta potencial em tal economia, a soma do investimento doméstico com o superávit em conta corrente deve corresponder às poupanças desejadas.

Se não corresponderem, o ajuste funcionará por meio de atividade econômica fraca —ou seja, uma recessão ou até mesmo uma depressão. Isso é "estagnação secular".

Com poupanças tão altas quanto as da China, é difícil evitar isso. Fazer isso exigiu um enorme superávit em conta corrente antes da crise financeira global de 2008 e, posteriormente, o boom imobiliário alimentado pela dívida do país.

Este último aparentemente acabou. Então, o que vem a seguir? Um curso natural seria a taxa de investimento cair significativamente.

É altamente improvável que a taxa de investimento economicamente lucrativa possa permanecer acima de 40% do PIB em uma economia cuja taxa de crescimento potencial diminuiu pela metade nos últimos 15 anos, no mínimo. Isso não faz sentido. O boom imobiliário mascarou essa realidade. Agora ela está aqui.

Se a taxa de poupança permanecer onde está e a taxa de investimento cair, a "solução" será então um aumento no superávit em conta corrente à medida que as poupanças fluem para o exterior. Os dados oficiais ainda não mostram isso. Mas há dúvidas sobre isso.

Brad Setser do Council on Foreign Relations argumenta que o superávit pode ser o dobro do que os dados oficiais mostram, em 4% do PIB.

Uma razão para seu ajuste para cima são as lacunas não explicadas entre o superávit comercial nos dados aduaneiros e no balanço de pagamentos. Outra é que o aumento das taxas de juros mundiais não está aparecendo no rendimento líquido de ativos estrangeiros.

Um superávit em conta corrente de 4% do PIB não parece grande pelos padrões passados da China. Mas, desde 2007, quando o superávit em conta corrente da China atingiu o pico de 10% do PIB, sua participação na economia mundial (a preços de mercado, que é o que importa aqui) saltou de 6 para 17%.

Portanto, do ponto de vista do resto do mundo, um superávit chinês de 4% do PIB é muito maior do que um de 10% em 2007.

Quem vai administrar os déficits compensatórios? Quem, em particular, os administrará quando o aumento concomitante das exportações for impulsionado pelo investimento em manufaturas competitivas, como veículos elétricos?

A resposta não são países ricos e boa classificação de crédito: eles verão isso como políticas de "cada um por si". O mesmo certamente será verdade para grandes economias emergentes, como a Índia.

Se a China quiser a solução mercantilista para o excesso de poupança, terá que financiar países emergentes e em desenvolvimento menores. Pode fingir que são empréstimos.

Mas grande parte do dinheiro será doações, após o fato. Se acabar financiando energia renovável fora, isso pode ser bom para o mundo. Mas, do ponto de vista da China, seria um presente caro.

Do ponto de vista econômico, uma solução mercantilista simplesmente não funcionará. A China é grande demais para tentar algo assim. Portanto, novamente, se a taxa de poupança permanecer tão alta, a China precisa compensar a queda inevitável na taxa de investimento em propriedades com algo mais.

O que poderia ser isso e como poderia acontecer? Uma solução óbvia e desejável, que de fato já está acontecendo, é uma enorme expansão nos investimentos em energia renovável. Os benefícios para a transição energética global seriam enormes.

A questão é quão grande esse investimento poderia ser e por quanto tempo duraria. Outra possibilidade é um investimento ainda maior na indústria. Mas isso esbarrará nos limites já discutidos nos mercados no exterior.

Como Sherlock Holmes disse: "Uma vez eliminado o impossível, o que resta, por mais improvável que pareça, deve ser a verdade."

Dada a dimensão da China, seu estágio de desenvolvimento e poupança excessiva, uma parte essencial de qualquer estratégia para estabilidade macroeconômica deve ser um salto no consumo privado e público como parte do PIB.

Além disso, dadas as dificuldades financeiras dos governos locais, isso também significará um papel maior para os gastos do governo central.

A China precisa de uma nova estratégia macroeconômica. Não se trata de outro "estímulo". Trata-se de mudar a distribuição de renda e gastos. A liderança não quer fazer isso. Mas os eventos forçarão sua mão no fim das contas.

*Comentarista-chefe de economia no Financial Times, doutor em economia pela London School of Economics


Postagem em destaque

Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...