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domingo, 11 de julho de 2010

A Quarta Frota Americana e a Amazônia Azul

Como nos demais casos já postados aqui, se trata de uma demanda de respostas a questões colocadas por estudante de curso de especialização, achando que eu sou uma sumidade em qualquer assunto (o que obviamente não é o caso, mas parece que eu engano bem...).
Como nos casos anteriores, jamais soube o que foi feito de minhas respostas, como elas foram integradas ao trabalho e qual foi o resultado final.
Bem, considero-me então desobrigado a manter a discrição sobre minhas respostas, e as divulgo neste momento, na suposição de que elas possam interessar a um público mais vasto.
Paulo Roberto de Almeida

A Quarta Frota Americana e a Amazônia Azul
Paulo Roberto de Almeida
(Brasília, 3 de agosto de 2008)
Respostas a questionário submetido por funcionário do Serviço de Documentação da Marinha
Curso Superior da Escola de Guerra Naval (EGN)

1) A nova ordem mundial tem como característica marcante a globalização. Os países buscam na cooperação a solução de problemas comuns, como o terrorismo, o narcotráfico, etc. O senhor acha que o caminho é a cooperação internacional?
PRA: Não há um único caminho para a solução de grandes problemas globais, uma vez que o multilateralismo puro, estilo onusiano, é sempre lento e abre espaço para práticas oportunistas, do tipo free-rider (isto é, países que não cooperam para a solução de problemas comuns, nem assumem os custos de políticas corretivas, mas se beneficiam da ação de outros). Entretanto, nas condições atuais, dificilmente um único país, mesmo poderoso, pode assumir sozinho tarefas de grande magnitude, daí a funcionalidade, ou utilidade da cooperação internacional. Não que ela seja exclusiva ou excludente, mas é o caminho “natural” num mundo que vem afastando cada vez mais as ações unilaterais ou imperiais e afirmando o primado do direito internacional e da cooperação entre países supostamente iguais, segundo os princípios onusianos. Se é para respeitar a chamada soberania nacional, não há como evitar a cooperação, uma vez que dificilmente países poderosos alcançariam legitimidade na busca de soluções unilaterais, que poderiam, teoricamente, infringir a soberania de outros Estados. Esta constatação vale praticamente para a maior parte dos problemas globais, com a possível exceção da segurança e defesa nacional, terreno no qual a cooperação entre os países, ou a ação da ONU, são notoriamente deficientes.

2) Também sob o efeito da globalização, o conceito de soberania está se transformando. Quais os limites aceitáveis de uma cooperação internacional na área de segurança que não venha a infringir a soberania dos Estados?
PRA: A evolução nessa área é muito lenta, e o mundo está longe de abandonar os velhos princípios westfalianos para adotar outras regras de soberania limitada, ou o exercício responsável dessa soberania. Atualmente, sem que haja evolução legal nesse sentido, considera-se, por exemplo, que um governo (ou um dirigente) que impõe sofrimentos enormes ao seu próprio povo corre o risco de se defrontar com sanções externas, ainda que impostas contra a sua vontade, quando não com intervenção forçada nos casos mais extremos. Tal ocorreu em alguns países africanos, de certo modo com o próprio Haiti, e poderia ter sido invocado no caso de Miamar, por ocasião do maremoto do primeiro semestre de 2008. Estes, porém, são casos extremos, quando a própria sobrevivência física das pessoas está em causa, mas se torna difícil de aplicar em casos de governos ditatoriais “normais” ou infração a normas que não sejam absolutamente universais e de adesão obrigatória.
O caso mais flagrante do gênero foi a autorização dada pelo CSNU para uma intervenção contra o governo talibã do Afeganistão, presumivelmente comprometido com os grupos terroristas responsáveis pelos ataques de setembro de 2001 em território americano. O mesmo, no entanto, não ocorreu quando o mesmo argumento foi levantado pelos EUA contra o governo do Iraque, então sob o ditador Saddam Hussein, tendo a autorização do CSNU sido recusada aos EUA para um ataque preventivo dito de auto-defesa. Os limites para o rompimento do principio da soberania parecem ser, assim, o da presunção razoável de que algum Estado ameaça a paz e a segurança internacional de modo efetivo.

3) O Brasil, com seus problemas econômicos e sociais internos, dificilmente poderá deslocar recursos financeiros suficientes e meios efetivos para a solução ou enfrentamento das chamadas “novas ameaças”. Como o senhor vê a situação brasileira quanto a proteção das riquezas encontradas na nossa Amazônia Azul, mais propriamente dos nossos poços de petróleo? Uma saída seria a segurança cooperativa com países das Américas?
PRA: Não creio. Recursos nacionais exclusivos devem ser defendidos com meios exclusivamente nacionais, mas reconheço que nem todos os Estados, sobretudo os menores, possuem recursos suficientes para enfrentar todas as ameaças potenciais. Daí que a solução cooperativa pode ser uma espécie de “second best”, ou seja, um substituto ao ideal. Dito isto, creio que o Brasil possui meios suficientes para defender suas plataformas de petróleo, sendo que a insuficiência alegada pode ser resolvida mediante uma simples inversão de prioridades orçamentárias: os meios técnicos existem, basta uma decisão política para colocá-los em vigor.
Existem, porém, outras ameaças, mais difusas, como as do tráfico de drogas, de ilícitos transnacionais, a gestão de recursos comuns do meio ambiente, que requerem, sim, meios cooperativos nos planos multilateral e regional. A segurança comum às Américas depende de uma percepção também comum de que existem ameaças credíveis ao continente como um todo, vindos de algum agressor externo, o que me parece algo aleatório atualmente. Contemplando a geopolítica atual e sua possível evolução nos próximos anos ou décadas, não se consegue perceber que tipo de ameaças “globais” estariam sendo colocadas na região geográfica do Brasil, qual seja a América do Sul e o Atlântico Sul. As ameaças mais factíveis parecem provir de dentro mesmo do continente, e ai podem até exigir respostas comuns, mas não do tipo que normalmente se identifica como a “grande geopolítica”. Nossos problemas são mais de “pequena geopolítica”.

4) Na sua opinião, quais os motivos que levaram os Estados Unidos a reativarem a Quarta Frota?
(OBS - Apesar do real motivo ser desconhecido até o presente momento, para a monografia me pautei na importância do Atlântico Sul como rota marítima, a recente descoberta de enormes reservas de petróleo em áreas de grande profundidade (conhecidas como “pré-sal”) na plataforma continental brasileira e a questão do destino da Antártica)
PRA: Os EUA, quer eles aceitem ou não a hipótese, constituem um poder imperial, e como todo poder imperial sua visão estratégica é propriamente global. Sua liderança político-militar estabeleceu, desde 1947 pelo menos, que não iria permitir o aparecimento ou a manutenção de nenhum outro poder que pudesse se igualar ao seu poderio militar ou em condições de ameaçar os interesses estratégicos dos EUA, fosse este amigo ou inimigo, não importa. Daí a necessidade de eles perseguirem um nível de preeminência estratégico-militar até exagerado, mas comensurável com o que eles acreditam serem os desafios possíveis.
O Atlântico Sul, rota de trânsito de grande parte do petróleo importado pelos EUA, não dispunha, desde cinco décadas, de uma “cobertura” estratégica, daí a decisão em recriar a IV Frota, que nada mais representa do que um “acabamento” dos cenários possíveis de enfrentamento estratégico. Suponho que a IV Frota não esteja dirigida contra nenhum “grande inimigo” em particular, apenas representa uma apólice de seguro contra reviravoltas na geopolítica internacional. Os EUA não necessitam, certamente, da IV Frota, para administrar o atual problema da Venezuela (um candidato a ditador que se compraz em “enfrentar” o “império”), que será “resolvido” por meios políticos no momento oportuno.
Tampouco se pode conceber o uso da IV Frota para alguma questão no âmbito da Antártida e menos ainda para qualquer pendência bilateral com o Brasil na exploração de recursos advindos da plataforma continental (petróleo e outros). Mesmo um império “autônomo” como os EUA atua em função dos interesses econômicos de suas empresas e estas requerem muito mais soluções cooperativas do que de afirmação colonial. Apenas uma “concepção paranóica” das relações bilaterais e internacionais poderia conceber a IV Frota como funcional para fins de exploração de recursos marinhos e outros.

5) Com a atual situação do Brasil referente a necessidade de meios adequados, em quantidade suficiente para uma presença naval permanente na Amazônia Azul, a presença da Quarta Frota poderia ajudar a acelerar o processo de reaparelhamento da nossa Marinha?
PRA: Não deveria, mas pode servir, nas condições políticas que são as atuais no Brasil, com baixo planejamento estratégico e ainda menor discernimento quanto ao cenário estratégico global. Ou seja, a reação paranóica aludida acima pode levar ao desvio de recursos – totalmente irracionais neste caso – de outras prioridades no plano estratégico e de defesa nacional para uma suposta dissuasão à IV Frota no Atlântico Sul, o que seria tão custoso quanto inútil. Os EUA não são o inimigo estratégico do Brasil, que aliás não parece ter nenhum, estrito senso.
Como no caso da Amazônia “verde”, no entanto, a mesma paranóia quanto a perigos supostos (em alguns casos eles são reais, mas não necessariamente da forma concebida em alguns escritórios de planejamento) pode induzir ao desvio de recursos para uma dissuasão que se revela ilusória. O defeito é de concepção, ou de doutrina, não do emprego de recursos efetivos, que sempre podem ser adaptados para cenários plausíveis ou credíveis, mesmo quando a concepção determina, obviamente, o tipo de recurso, ou de ferramenta, a ser empregado. O Brasil não precisaria ter instrumentos que mimetizem o arsenal das grandes potências, mas este é um argumento difícil de ser admitido por qualquer planejador militar (e mesmo muitos políticos).
O Brasil precisa ter instrumentos adequados ao seu cenário estratégico, que, aparentemente, se situa mais numa perspectiva de cooperação com a grande potência ocidental, e mundial, do que em oposição ou em dissuasão a ela. Mas, fazer tal tipo de afirmação já soa como uma renúncia indevida de soberania, ainda que a economia dos meios armados recomende uma utilização a mais racional possível dos meios escassos à disposição de nossas Forças Armadas. Em outros termos, o Brasil pode estar perdendo a oportunidade de combater seus verdadeiros inimigos – como os “pequenos piratas” que infestam certas paragens de nossas costas – do que inimigos supostos.

6) O Programa Naval de 1934, se fosse realizado, teria modificado substancialmente a nossa participação junto a Marinha Americana na Segunda Guerra Mundial. Frente aos escassos recursos alocados para a Marinha desenvolver o seu programa de reaparelhamento e o desenvolvimento de submarino com propulsão nuclear, poderíamos estar vendo a mesma situação acontecer?
PRA: Não conheço adequadamente o Programa Naval de 1934 para opinar de maneira responsável, mas num possível paralelo com cenários mais atuais, acredito, sim, que qualquer cenário que nos leve a assumir maiores responsabilidades no plano mundial – e isso não tem nada a ver com a defesa do território e das águas nacionais, que me parecem insuficientemente, mas razoavelmente bem defendidos, ou pelo menos “dissuadidos” – conduziria uma a maior cooperação com os EUA, inclusive para a paz e a estabilidade política na própria América do Sul (em relação ao que nossas Forças Armadas são extremamente reticentes).
A Marinha brasileira, como as outras forças singulares, padece de notória falta de recursos e de meios suficientes para um aparelhamento adequado. Ouso formular a hipótese, contudo, que as concepções estratégicas que presidem ao planejamento do uso de recursos escassos sãos as tradicionais, de todo país soberanista digno desse nome. Uma concepção de defesa exclusivamente “nacional”, nas linhas tradicionais, pode custar muito caro, e revelar-se, finalmente, como parcialmente inútil, em face dos perigos efetivos a serem enfrentados, muitas vezes com outros tipos de instrumentos do que aqueles concebidos e implementados segundo a visão tradicional acima mencionada. Por exemplo, uma Marinha de águas azuis, full scope (completa), para o Brasil, pode ser um luxo ocioso, quando perigos mais efetivos parecem exigir uma Marinha de águas marrons ou meios ainda mais heterodoxos do que ferramentas de livro-texto ou de compêndios históricos.
Para ser concreto, não vejo bem como o submarino nuclear possa resolver nossos problemas efetivos – não os supostos – de segurança costeira. Ele pode, por exemplo, dissuadir uma grande potência, pelo menos parcialmente, mas jamais um grupo de terroristas que se dispusesse a afundar uma plataforma petrolífera. Em outros termos, alguns “brinquedos” são muito caros para que a sociedade brasileira tenha uma ilusão de segurança, totalmente desproporcional e aparentemente pouco adaptados aos requerimentos efetivos da segurança nacional. Sei que a tese pode ser inaceitável para os “marinheiros” de águas azuis, mas é como vejo o atual (e futuro) cenário geopolítico no qual se insere o Brasil.

7) Hoje não existem mais inimigos declarados, o estado aparente de paz não reflete a realidade das “novas ameaças”. Em uma situação hipotética, mas nem tanto, de termos nossos poços de petróleo “atacados”, o senhor acha possível o Brasil aceitar um acordo de cooperação em segurança junto a Marinha Americana, visando a proteção das nossas riquezas?
PRA: Não creio que isso seja necessário, mas acordos de cooperação recíproca em troca de informações, treinamento e manutenção, são sempre bem vindos. Nossas riquezas devem ser defendidas exclusivamente com meios próprios, ainda que estes sejam insuficientes. Vejo, sim, a necessidade de uma ampla cooperação na busca e implementação de metas mais amplas, de âmbito mundial, seja em bases puramente bilaterais, seja no quadro de operações da ONU.
Quando se fala, porém, de “ameaças”, qualquer esforço de cooperação deve ser empreendido sempre tendo em conta a natureza específica da suposta ameaça, detectada, para aí então chegarmos à conclusão de qual esquema defensivo ou ofensivo seria melhor adaptado aos interesses nacionais, seja no plano das concepções táticas ou mesmo estratégicas, no domínio das ferramentas a serem utilizadas e com base num entendimento perfeito quanto aos fins que se pretende alcançar. A Segunda Guerra Mundial colocou uma ameaça concreta, que foi respondida de maneira adequada, ainda que de forma modesta (mas comensurável com os nossos meios).
Hipóteses podem e deve ser traçadas quanto à natureza e o poder destrutivo dessas “novas ameaças”, e a partir daí formular as nossas linhas de atuação, que podem, ou não, compreender alguma cooperação com os EUA, sempre em função de uma análise caso a caso. Entendo, pessoalmente, que nenhuma “nova ameaça” pode provir dos EUA, daí que eu preconizaria uma cooperação ampla no plano bilateral, mas sei que reações soberanistas e pruridos nacionalistas minimizam a consecução dessa possibilidade. As hipóteses mais credíveis, portanto, são aquelas de baixa intensidade e de “pequena geopolítica”, para as quais os EUA talvez nem se interessem, mas sempre cabe alguma reflexão conjunta.

8) Quais os limites de cooperação aceitáveis, dentro de um possível acordo de cooperação entre a nossa Marinha e a americana - Quarta Frota, que não venha a infringir nossa soberania?
PRA: Seria preciso definir primeiro o que seja soberania, que tem muitas acepções e nem todos estão de acordo com todas elas. Alguns acreditam, por exemplo, que minério de ferro é um bem tão “estratégico”, que deveria ser preservado sob o controle do Estado ou exclusivamente de nacionais, como forma de preservar a “soberania nacional”. Outros – inclusive um presidente – declararam que telefonia e comunicações, de modo geral, são estratégicos para o desenvolvimento nacional e portanto deveriam também permanecer sob controle nacional, alguns até acham que deveria ser estatal. Todos, ou quase, acham que o petróleo deve permanecer como monopólio nacional por ser estratégico e essencial à nossa “soberania”. Soberania se defende com ações muito simples, com educação de todos, por exemplo, ou com o desenvolvimento nacional, que pode, sim, ser feito com capitais estrangeiros, sem qualquer, ou quase nenhuma, restrição.
Dentro dessa filosofia, eu não vejo sinceramente nenhum obstáculo – que não sejam aqueles normalmente associados à preservação de nossa capacidade autônoma de decisão, onde se situam as comunicações sensíveis de decisores nacionais – a um amplo acordo de cooperação entre as duas marinhas, sobretudo se se partir do princípio de que ambas possuem objetivos relativamente similares, se não coincidentes, quais sejam: preservar a soberania nacional de cada país, assegurar um ambiente de paz e de estabilidade para o exercício das liberdades democráticos e para o pleno desenvolvimento de atividades produtivas, sem qualquer distinção de nacionalidade quanto aos agentes econômicos (tratamento nacional pleno).
O limite da cooperação seria, portanto, o segredo das comunicações sensíveis, mesmo sabendo que criptografia é algo essencialmente dependente da pesquisa científica e dos avanços tecnológicos, que estão justamente mais desenvolvidos na principal potência tecnológica do planeta. Devemos ter consciência, portanto, que os EUA sempre vão cercear nosso acesso às tecnologias sensíveis, por mais cooperativos que possamos ser nos processos conjuntos de treinamento e adestramento. São limites colocados pela própria razão básica da preeminência estratégica: nunca permitir a equiparação. Se assumirmos essa condição “subalterna” nas tecnologias de “última instância”, existe um grande espaço para a cooperação bilateral.

9) Relembrando a Guerra da Lagosta, onde fomos afrontados por um país que não era tido como ameaça, a França - que enviou navios da sua armada para proteger seus pesqueiros dentro de nossas águas, somada a posição americana de chegar a "ordenar" que o Brasil recuasse, abrindo mão de sua soberania. Então a questão é: Como lidar com a soberania nacional e a Quarta Frota em nossas portas?
PRA: Assimetrias sempre vão existir nas relações internacionais e o exercício do poder pode se manifestar de formas excessivamente arrogantes, como vários exemplos a que assistimos ao longo de nossa história, e não apenas na Guerra da Lagosta. Basta recordar as intromissões da Royal Navy em nossas águas, quando nos recusávamos a interromper o tráfico escravo, no século XIX. O Brasil sempre vai ter essas fragilidades no confronto com países mais poderosos. O que se deseja é uma dissuasão suficiente para evitar situações humilhantes como essas. A diplomacia deveria evitar que se chegue a esse tipo de exacerbação das relações, mas nem sempre é possível evitar alguma demonstração de força.
Não se pode partir da hipótese de que a IV Frota venha necessariamente a ameaçar a nossa soberania, posto que ela vai se deslocar em águas internacionais. Se resolver se aventurar em nossas águas, pode ser que não disponhamos de meios suficientes para dissuadi-la, mas por que ela o faria e com quais motivos? Essas forças não são construídas para ameaçar a soberania de outros países, sobretudo amigos, mas para defender os interesses vitais de quem as concebe e desloca no terreno.
A IV Frota não vai estar em nossas portas, mas em águas internacionais, tanto quanto podemos mandar nossa frota para o Atlântico Norte, mas não vejo muito sentido pensar nesse tipo de brincadeira de gato e rato. Países responsáveis pensam menos na soberania em termos abstratos e mais concretamente, o que se obtém com crescimento e econômico e desenvolvimento nacional. Temos tanto direito de explorar recursos marinhos no Atlântico Norte quanto os EUA no sul, desde que de maneira não agressora ao que cada país considera como sendo de sua soberania exclusiva. Os EUA, em algum momento futuro, vão aderir ao Tratado do Direito do Mar, ainda que isso possa tardar mais algum tempo. Eles serão levados a fazê-lo no seu próprio interesse nacional.
Qualquer que seja o desenvolvimento futuro do Brasil, não vejo um modelo ou regime capitalista que seja fundamentalmente oposto ou excludente do capitalismo americano e todos os fluxos tecnológicos, financeiros e comerciais que possam ser estabelecidos entre os dois países. No plano militar, algo semelhante deve ocorrer: ou seja, não vejo nossa defesa nacional como excludente ou oposta aos interesses nacionais americanos, na medida em que nenhum dos países alimenta propósitos a qualquer título marcados pela animosidade em relação ao outro.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 3 de agosto de 2008

Um comentário:

Anônimo disse...

Sugerimos o artigo da PROCEEDINGS MAGAZINE(Issue:June 2009 Vol.135/6/1,276;do U.S. NAVAL INSTITUTE(USNI) "Why Does Brazil Need(s) Nuclear Submarines?"(in:http://www.usni.org/magazines/proceedings/story.asp?STORY_ID=1908).

Vale!