domingo, 8 de agosto de 2010

A Republica Secreta dos Gastos Indevassados

Apenas países muito vagabundos, nos quais o Congresso e os órgãos de auditoria pública não cumprem ou não conseguem cumprir seus deveres constitucionais, permitem esse tipo de secretismo vulgar (e pornográfico) com recursos retirados da coletividade.
Nunca antes neste país se zombou tanto da cidadania, sob o olhar complacente dos guardiões dos recursos públicos.
Estamos sendo rigorosamente ludibriados. Não com a minha complacência...
Paulo Roberto de Almeida

Os gastos ocultos do Planalto
Regina Alvarez
O Globo, 08/08/2010

Em ano eleitoral, a Presidência da República aumentou o sigilo sobre gastos com cartão corporativo. O gasto secreto subiu e soma R$ 3,2 milhões. Menos de 2% das despesas estão detalhadas no Siafi.

Mais de 98% das despesas com cartão corporativo para atender Lula e família não são detalhadas

No ano eleitoral, a Presidência da República reforçou a caixa preta que mantém em sigilo os gastos do gabinete presidencial com cartão corporativo.

A regra de contabilização desses gastos foi alterada, e apenas 1,8% das despesas realizadas para atender às demandas do presidente Lula, de sua família e assessores próximos está detalhado no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), com nome e CPF do funcionário que a executou, e a forma de pagamento: saque em dinheiro
ou fatura. De um total de R$ 3,259 milhões gastos este ano pelo gabinete até julho, apenas R$ 5,7 mil estão detalhados.

Sobre os outros R$ 3,254 milhões (98,2% do total), o registro no Siafi se limita à forma de pagamento (saque ou fatura), sem informar qualquer outro dado do gasto. No Portal da Transparência do governo, aparece a justificativa: informações protegidas por sigilo, nos termos da legislação, para garantia da segurança da sociedade e do Estado.

A lei, de fato, permite que gastos relativos à segurança do presidente da República e de sua família sejam mantidos sob sigilo, mas o fato é que, com a mudança na forma de contabilização dessas despesas em 2010, o percentual de gastos considerados sigilosos aumentou substancialmente em relação aos anos anteriores.

De janeiro a julho de 2009, os gastos do gabinete presidencial com cartão corporativo chegaram a R$ 4,684 milhões, mas R$ 2,042 milhões (43,6%) estão detalhados no Siafi com o autor da despesa e a forma de pagamento.

No mesmo período de 2007 e de 2008, praticamente todos os gastos do gabinete de Lula foram registrados no Siafi com as informações do funcionário que executou a despesa, chamado de ecônomo, e a indicação de como foi usado o cartão corporativo para o pagamento das despesas.

Diretor de ONG: sigilo injustificável
De janeiro a julho de 2008, o gabinete presidencial realizou gastos no valor de R$ 2,225 milhões e apenas R$ 18,4 mil (0,8% do total) não estão com esse nível de detalhamento.

No mesmo período de 2007, foram realizadas despesas no valor de R$ 2,5 milhões, 100% detalhadas no Siafi.

Com a mudança nas regras de contabilização, em 2010 sumiram do Siafi e do Portal da Transparência informações sobre despesas realizadas por ecônomos que ficaram conhecidos no passado recente por terem efetuado saques de grandes quantias em dinheiro para pagar despesas do presidente Lula e da primeira-dama, Marisa Letícia.

Em 2008, quando descobriu-se que ministros do governo Lula usavam o cartão corporativo para pagar despesas pessoais escândalo que resultou na queda da então ministra Matilde Ribeiro, da Secretaria Especial de Políticas da Igualdade Racial também ganharam evidência alguns ecônomos responsáveis pelas despesas do casal presidencial.

É o caso de Maria Emília Matheus Evora, que atendia à primeira-dama; e Clever Pereira Fialho, responsável pelas despesas do presidente Lula, especialmente em viagens.

No ano passado, Maria Emília continuava recordista entre os ecônomos lotados no gabinete presidencial, com despesas de R$ 866 mil de janeiro a julho. Fialho aparecia em segundo lugar, com despesas de R$ 332 mil até julho.

Na opinião do diretor-executivo da ONG Transparência Brasil, Cláudio Weber Abramo, é injustificável catalogar todas as despesas do gabinete presidencial como sigilosas.

Ele não vê motivo para considerar secretas, por exemplo, despesas com alimentação: Para que a despesa seja secreta é preciso justificativa fortíssima.

Os critérios para definir quais despesas podem afetar a segurança do presidente e de sua família são muito vagos, na visão de Abramo, abrindo espaço para ocultação de gastos de outra natureza.

Uma portaria do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, de 2008, define o que seriam gastos do gabinete que precisam ser mantidos em sigilo: são os relativos à segurança das autoridades presidenciais e respectivos familiares, dos titulares dos órgãos essenciais da Presidência e, quando determinado pelo presidente da República, de outras autoridades ou personalidades.

A portaria inclui nessa lista despesas relativas à manutenção das instalações, bens e serviços das residências oficiais do presidente e do vice-presidente da República, bem como dos escritórios regionais em apoio aos respectivos familiares, sempre que possa afetar a segurança e segurança de saúde e alimentar das autoridades presidenciais.

Em fevereiro de 2008, no auge da crise provocada pelo uso indevido dos cartões corporativos por autoridades, o presidente Lula saiu em defesa desse instrumento. Na ocasião, Lula definiu o cartão corporativo como a forma mais séria e transparente de cuidar dos gastos públicos: O que precisamos é, a partir da deficiência, fazer as correções necessárias e continuar colocando na internet para que a população tenha acesso. Acho que todo mundo tem de mostrar corretamente aquilo que gastou todo santo dia.

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