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domingo, 17 de junho de 2012

A crise que se ve e a crise que nao se ve - Bastiat tupiniquim

Gosto de citar o "cacoete" metodológico de Frédéric Bastiat, segundo quem em economia existe o que se vê, mas também existe o que não se vê, que são os efeitos ou condições subjacentes ao mundo econômico que os homens, os responsáveis governamentais, os empresários ou os simples cidadãos ignoram ou fingem não ver.
Pois no Brasil existe uma crise que se vê, externa, mas se ignora a crise que o governo prefere não ver, que é interna, como sublinha este editorial do Estadão.
Paulo Roberto de Almeida

A crise que Dilma não vê

17 de junho de 2012 | 3h 05
Editorial O Estado de S.Paulo
Em mais um esforço para desencalhar a economia nacional, a presidente Dilma Rousseff convocou os governadores e ofereceu-lhes financiamento e facilidades fiscais para investir. O País só escapa de uma crise mais grave, neste momento, porque as famílias ainda consomem - ninguém sabe até quando - e o governo federal continua gastando, embora com a ineficiência costumeira. A indústria vai mal, o nível de emprego nas fábricas é menor que no ano passado e o setor de serviços, segundo a Fundação Getúlio Vargas (FGV), começa a fraquejar. A agricultura, mesmo com pequena redução nas safras de grãos e oleaginosas, continua garantindo um abastecimento tranquilo. Além disso, o agronegócio garante algum superávit no comércio exterior, enquanto o conjunto das exportações empaca e as importações ocupam fatias crescentes do mercado interno. Apesar disso, a presidente se permite bravatas. A economia brasileira está no aquecimento e no fim do ano ganhará medalha pelo Produto Interno Bruto (PIB), disse ela num encontro com atletas classificados para os Jogos Olímpicos de Londres.
Mas não há sinal desse aquecimento. Com o aumento de 0,2% entre março e abril, o índice de atividade econômica do Banco Central (BC), divulgado na sexta-feira, continua inferior ao de dezembro e praticamente igual ao de um ano antes. A FGV reduziu de 3% para 1,8% sua projeção de crescimento do PIB em 2012. Na semana passada, a pesquisa Focus, do BC, realizada com instituições financeiras e consultorias, apontava uma previsão de 2,5%. Um mês antes, o crescimento estimado era de 3,2%.
Não só a presidente se permite bravatas. Segundo o ministro da Fazenda, Guido Mantega, a ação dos governadores deverá somar-se "ao esforço do governo federal para ampliar seus projetos de investimentos. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) tem batido recordes, disse o ministro na sexta-feira, ao divulgar as medidas de financiamento aos Estados.
Houve, de fato, um recorde nos desembolsos do PAC orçamentário, financiado diretamente pelo Tesouro Nacional: R$ 14,2 bilhões até maio, 45% mais que em igual período de 2011. Mas R$ 13,2 bilhões foram restos a pagar. Além disso, o aumento dos desembolsos dependeu essencialmente da liberação de recursos para o programa Minha Casa, Minha Vida, isto é, de financiamentos habitacionais. Esses créditos, R$ 7,4 bilhões, corresponderam a 55% dos pagamentos do PAC no período.
Pode-se discutir se é correto classificar como investimentos os desembolsos para a compra de casas, mas agora o ponto mais relevante é outro. O programa habitacional serve a mais de um propósito, mas outras ações são necessárias, com urgência, para aumentar o potencial de crescimento econômico do País.
O ministro da Fazenda e a presidente da República mostram-se preocupados com o impacto da crise internacional, mas parecem desconhecer ou menosprezar a questão mais grave: a enorme coleção de ineficiências da economia brasileira, a começar pela baixa qualidade da gestão pública, pelo mau uso dos pesados tributos recolhidos em todos os níveis de governo e pela incompetência da maior parte da administração indireta. Um dentre muitos exemplos: a estatal Valec precisará gastar pelo menos R$ 400 milhões para corrigir defeitos da Ferrovia Norte-Sul, um investimento já muito atrasado. Não adianta contabilizar valores investidos, se o dinheiro for mal aplicado.
Diante da crise, o governo reage como se os problemas de crescimento do Brasil fossem conjunturais. É um equívoco. A crise global apenas agrava uma situação já muito ruim. Mesmo sem recessão no mundo rico e desaceleração na China, a indústria brasileira teria dificuldade para competir com fabricantes menos onerados por impostos absurdos, favorecidos por infraestrutura melhor e fortalecidos por políticas educacionais e tecnológicas muito mais eficientes - para mencionar apenas algumas diferenças. O apoio financeiro aos governos estaduais poderá ter algum efeito conjuntural. É preciso mais que isso para aumentar o potencial de crescimento e garantir uma expansão continuada por vários anos.

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