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segunda-feira, 11 de junho de 2012

Brasil-Argentina: de volta ao mercantilismo

A noção de que comércio bilateral precisa ser equilibrado é tão mercantilista, mas tão mercantilista, que parece que o Brasil e a Argentina voltaram ao século XVII, quando ainda nem existiam enquanto países. Deve ser isso: os países não existem, e os burocratas fazem o que bem entendem com os seus empresários, obrigando-os a se submeterem a suas ordens, que desprezam totalmente o desempenho, o mérito, a competitividade construídos pelas próprias empresas. No limite, isso se chama fascismo econômico: empresários privados tendo de seguir ordens e desejos de burocratas estatais.
As pessoas nem percebem que estão sendo perfeitamente fascistas...
Assim segue o mundo do fascismo introjetado...
Paulo Roberto de Almeida

11 DE JUNHO DE 2012 - 8H46 

Mercosul: Brasil quer equilibrar comércio com Argentina


As barreiras comerciais impostas pelo governo de Cristina Kirchner para proteger a indústria argentina, que provocaram fortes críticas de autoridades e empresários brasileiros, começam a gerar um novo rumo na relação comercial entre os vizinhos. Se até agora a resposta brasileira tem sido retaliar pontualmente produtos argentinos, que esperam semanas por autorização de ingresso na fronteira, negociações recentes indicam maior disposição em equilibrar o comércio com o país.


Nos últimos meses, o governo argentino tem buscado frear o ritmo das importações e conter a saída de moeda estrangeira do país, que ameaça a balança de pagamentos. Com isso, adotou medidas de controle de capital e mais barreiras comerciais que levaram o país novamente à mesa de negociação com os vizinhos.
 
Na última sexta-feira (08), em Buenos Aires, o governo argentino anunciou que o Brasil se comprometeu a importar, a partir de julho, camarões e cítricos argentinos, produtos que, segundo a secretária de comércio exterior do país, Beatriz Paglieri, tradicionalmente tiveram problemas para ingressar no Brasil. Outra pauta de negociação foi o acesso de medicamentos argentinos ao mercado brasileiro. Representantes das agências de vigilância sanitária de ambos os países devem se reunir nas próximas semanas.

“O que as duas instituições vão analisar é uma maior integração destes mercados para ver onde podemos ter maior cooperação. O Brasil tem lei de genéricos e a Argentina está começando a se organizar para entrar neste mercado”, explicou aos correspondentes brasileiros em Buenos Aires o secretário-executivo do ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Alessandro Teixeira.

Em consonância com os esforços para aumentar o fluxo de importações provenientes da Argentina, a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) defende o aumento do apoio ao país vizinho: “Equilibrar o comércio é difícil, mas não é uma missão impossível. Podemos comprar mais da Argentina, importando menos de outros países.”, afirmou ao Ópera Mundi o diretor-adjunto de Relações Internacionais da Fiesp, Thomaz Zanotto.

Segundo ele, “a posição da Fiesp é clara e baseada em fatos concretos”: “A Argentina é um dos maiores clientes de produtos brasileiros, comprou 20 bilhões de dólares de manufaturados no ano passado, mas se encontra em uma situação financeira muito parecida com a do Brasil da década de 1980, e é de interesse do Brasil ajudá-los a superar esta fase”, afirma ele, ponderando sobre a necessidade de apoiar o país na maximização do superávit de sua balança comercial e aumento da captação de dólares.

Em um estudo divulgado em maio, a Fiesp também constatou que 24% dos empresários brasileiros optam por importações oriundas de outros países por desconhecerem fornecedores argentinos nos setores de alimentos, bebidas, autopeças, farmacêuticos, químicos e máquinas. O levantamento foi realizado com 221 empresas importadoras de 38 produtos identificados pelo governo argentino como “prioritários” para o aumento do comércio com o Brasil.

Além da realização de rodadas de negócios já iniciadas entre potenciais fornecedores argentinos e empresários brasileiros, Zanotto diz que a Fiesp está levantando a potencialidade de maior comércio de itens argentinos de alto valor, como navios, produtos petroquímicos e combustíveis. Como possibilidade mais remota, menciona a ideia de que ambos os países passem a realizar a troca comercial em moedas locais em vez de dólares.

Queixas

Apesar dos sucessivos recordes anuais no fluxo de comércio entre os países, que somou 39,6 bilhões de dólares em 2011, o Brasil segue tendo superávits consecutivos sobre a Argentina, que aumentou em 1,7 bilhões seu déficit na balança bilateral em relação a 2010, quando registrou uma diferença de 4,1 bilhões de dólares. 

Apesar da queda no fluxo comercial provocada pelo aumento do controle argentino às importações no início do ano e a baixa do ritmo de crescimento de ambas as economias em um contexto global de crise, o Brasil obteve um novo recorde de exportações no primeiro quadrimestre, somando 74,6 bilhões de dólares. Entre os principais compradores no período, a Argentina aparece como terceiro, superada somente pela China e pelos Estados Unidos.

Dentre as queixas de exportadores brasileiros às medidas protecionistas argentinas, estão a demora na liberação de produtos na fronteira, que muitas vezes superam o prazo de 60 dias determinado pela OMC (Organização Mundial do Comércio) e a necessidade de uma autorização da Receita Federal do país para cada importação desejada por empresários argentinos.

O governo brasileiro, por sua vez, recorre a licenças não automáticas para produtos argentinos como vinhos, batatas congeladas e frutas para pressionar o governo de Cristina Kirchner a pôr um fim às barreiras comerciais. O problema já afeta produções de ambos os lados da fronteira, tanto no setor de alimentos, passando por sapatos, eletrodomésticos, automóveis e atingindo até máquinas e bens de capital.

Casamento

Ao anunciar o compromisso na melhora do fluxo comercial, após a reunião bilateral em Buenos Aires, Teixeira afirmou esperar reciprocidade argentina no cumprimento dos prazos de liberação dos produtos parados na fronteira. No entanto, definiu a relação com a Argentina como um “casamento” e afirmou que países com trocas comerciais intensas “sempre têm problemas”.

“Nossas exportações de valor agregado vêm para a Argentina, independente da época e do governo que aqui esteja. Isso é muito claro, independente de quem é o governo do Brasil e da Argentina, estas relações existem, existirão e serão fortes”, garantiu, enfatizando a importância da integração produtiva e concluindo que a melhora da economia argentina beneficiará os negócios brasileiros.

Segundo o secretário, apesar de questionamentos sobre a falta de “dureza” do governo, o foco de atenção e a postura nas relações com a Argentina vêm mudando, devido ao aumento de investimentos brasileiros no país. “No ano passado, a Argentina atraiu cerca de sete bilhões de dólares de investimento e pelo menos 35% a 40% disso são brasileiros. Do ponto de vista de relacionamento, já não somos um mero vendedor para a Argentina, somos um dos principais investidores”, afirma.

OMC

As declarações mútuas para solucionar os entraves entre os sócios estratégicos, no entanto, se restringe aos países membros do Mercosul. Diversos países de fora do bloco mostraram menos paciência com o protecionismo argentino e apresentaram, no fim de março, um documento à OMC no qual exigiam que a Argentina cumprisse as regras do comércio internacional.

Um dos pontos de repúdio dos países que assinaram a queixa, entre eles Estados Unidos e membros da União Européia, remetia a um controle não oficial segundo o qual os empresários devem exportar o mesmo valor importado. Com a lógica de que cada dólar que sai deve voltar para o país é a mesma que levou o governo argentino a controlar a compra da moeda norte-americana no país: evitar a fuga de divisas.

Diretor da consultora econômica Analytica, Ricardo Delgado, classifica seu país como um “fugitivo em série de capital”. Segundo ele, o dólar é um dos totens da política econômica argentina e a recomposição das reservas financeiras na moeda, geradas pelas medidas governamentais, pode ser o início de uma flexibilização das restrições sobre as importações.

“O governo sabe que neste mundo de semelhante inter-relação produtiva entre os países, não é possível manter permanentemente esta política de compensação de dólares importados e exportados”, afirmou ao Ópera Mundi, em relação ao recrudescimento das barreiras comerciais impostas pela Argentina, que se agravaram nos últimos meses. “A intensificação das medidas são claramente um sistema de transição. Não se pode pensar a política externa de um país a partir disso”, garante.

Segundo Delgado, no entanto, os problemas comerciais estruturais na relação bilateral se devem a assimetrias entre ambas as economias e escalas de produção diferentes, levando a um quadro de difícil solução. Outro fator apontado por ele são os diversos programas de subsídios que tornam a indústria brasileira mais competitiva. “Isso é uma coisa que o Mercosul não resolveu e não resolverá nunca”, diz.

Apesar disso, Delgado considera necessárias algumas precauções tomadas pelo governo argentino. “O país não podia continuar em um ritmo de crescimento anual de 40% das importações e de 20% de exportações, porque geraria uma crise de dólares. Então taticamente este cuidado está bom”, afirma, antes de esclarecer que o processo de restrições às importações poderia ser feito de maneira mais criteriosa com sócios estratégicos como o Brasil.

Fonte: Ópera Mundi

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