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sábado, 30 de junho de 2012

O Brasil e o Conselho de Seguranca: um texto de 2005 - Paulo Roberto de Almeida

Um questionário que me foi submetido em 2005; talvez boa parte dos argumentos mantenha ainda validade, por isso posto aqui, unicamente para fins de alimentar o debate.


O Brasil e o Conselho de Segurança da ONU

Paulo Roberto de Almeida
Respostas a questões colocadas por pesquisador brasileiro;
9 de Fevereiro de 2005

1) Com respeito à postulação brasileira ao assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, o sr. acha que o tema ficou enfraquecido na agenda da ONU, daí a falta de insistência no governo FHC, ou o próprio governo convenceu-se de que não teríamos chances? O fato da Argentina, em 1997, ter declarado ser contra a candidatura brasileira tb teria influenciado o discurso brasileiro em trono do tema, de maneira a evitar uma possível crise que prejudicasse o andamento do MERCOSUL. O presidente FHC, chegou a afirmar que "(...) preferia uma boa relação com a Argentina a uma cadeira no Conselho de Segurança."

PRA: Depois de um certo impulso para a reforma da Carta, no momento da derrocada do comunismo, e da constituição de GT especificamente dedicado a essa finalidade, o tema ficou de fato durante vários anos no limbo, provavelmente pelas dificuldades naturais de um processo desse tipo, e não devido ao desinteresse brasileiro pelo tema. O interesse sempre existiu, e vinha sendo concretamente manifestado pelo governo Sarney (que postulou diretamente a candidatura quando compareceu à AGNU em 1988) e reiterado durante o governo Itamar Franco, por iniciativa do então chanceler Celso Amorim (que não mais repetiu a fórmula empregada oficiosamente por Sarney de que o Brasil aceitaria ser membro permanente sem direito de veto). O presidente FHC e em especial o chanceler Luiz Felipe Lampreia davam importância ao tema, mas em face das dificuldades do processo e das próprias limitações intrínsecas brasileiras preferiram não insistir publicamente no assunto. Havia, igualmente, esse “fator Argentina” e o presidente FHC reconheceu publicamente que "preferia uma boa relação com a Argentina a uma cadeira no Conselho de Segurança", como reafirmou ainda em entrevista que me concedeu em maio de 2003 em Washington (consignada no meu trabalho “A relação do Brasil com os EUA: de FHC-Clinton a Lula-Bush”, capitulo 9 (Parte IV: A Inserção Internacional do Brasil) no livro de Fabio Giambiagi, José Guilherme Reis e André Urani (orgs.), Reformas no Brasil: Balanço e Agenda (Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2004; ISBN: 85-2091-609-0, p. 203-228). Mas, em nenhum momento se pensou que o Brasil “não teria chances”, ao contrário: a não insistência se devia ao fato de que justamente se mantinha a convicção de que, uma vez aberto o processo e dado início ao processo de seleção de um candidato “regional”, a candidatura do Brasil seria praticamente incontornável, mesmo se nunca postulamos, diretamente, uma candidatura “regional”, e sim nosso mérito em bases “universais”. Nossas chances eram dadas inclusive pelo fato de que o México, até a presidência Fox (e ainda assim por insistência do chanceler Castañeda) nunca havia considerado ser candidato. A Argentina se opunha ao Brasil apenas por uma questão de prestígio nacional, não por considerar que mantinha chances reais de vir a ser escolhida. 

2) O envio de tropas para o Haiti, sob a liderança brasileira, contribui ou não para o fortalecimento de credenciais do Brasil a um assento permanente? Desde as missões de paz em Suez e em Angola (UNAVEM), não enviávamos efetivos tão numerosos.

PRA: O envio não foi feito “sob liderança brasileira”, mas sim a pedido e mediante arranjos políticos com EUA e França. A decisão interna, aliás, mais se deveu a articulações de setores do governo (identificados com o Palácio do Planalto e o titular da SECOM, em coordenação com o comandante do Exército), do que a negocições diplomáticas conduzidas pelo Itamaraty.
De fato, esse envio contribui para reforçar o papel do Brasil no processo de discussão sobre questões de segurança, ainda que em escala modesta (já que o Haiti não era um problema de ameaça à comunidade internacional, e sim ao seu próprio povo, em primeiro lugar, em seguida aos EUA, em termos de afluxo maciço de refugiados e boat-people). Trata-se de um teste para nosso envolvimento ulterior em operações de peace keeping, mas a operação também apresenta alguma características de peace making, para as quais talvez não estejamos preparados.
            De certa forma, estamos servindo de linha de frente para os governos da França e dos EUA, que não pretendiam se envolver com operações de características quase policiais e assistencialistas. Em suma, não houve um planejamento muito bem feito sobre a extensão, as implicações e as consequencias de nosso envolvimento e tudo foi feito em beneficio do prestigio e para apoiar essa campanha por uma vaga permanente no CSNU.

3) Com respeito à postulação brasileira por um assento no pós-II guerra, mesmo após várias leituras de textos que reuni, ainda, não ficou claro se a candidatura partiu por uma iniciativa brasileira ou se, depois dos EUA cogitarem a possibilidade, o Brasil passou a articular-se com mais ênfase?

PRA:   O Brasil por certo mantinha essa ilusão, aliás desde a Liga das Nações, de vir a integrar o inner circle dos países responsáveis em escala mundial. A postulação preliminar existia, e pode ter sido veiculada talvez por Vargas a Roosevelt, diretamente, mas a candidatura só se tornou mais factível quando o Secretario de Estado assistente Stettinius, de passagem pelo Brasil (no início de 1945, creio), acenou com essa possibilidade, e por isso pediu que o Brasil reconhecesse a URSS e estabelecesse relações diplomáticas. Mas, tanto a URSS como o Reino Unido se opunham a que o Brasil ingressasse no CS, quando nem a própria presença da França estava garantida. Existem menções a essas conversações nos papéis diplomáticos americanos.

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