O BRASIL E OS NOVOS BLOCOS
O Estado de S.Paulo, 11.02/2014
Pela primeira vez em vinte anos, os presidentes do Mercosul
não realizaram o último encontro semestral e o Conselho do Mercosul, nem tem
data para reunir-se neste ano. A crise é tão grave que os presidentes não
conseguem fechar uma proposta conjunta para a União Europeia, tema importante
que permitirá uma aproximação com um grande bloco comercial.
O Mercosul, como inicialmente concebido, está agonizante. O
Tratado de Assunção de 1991 previa, em seu artigo primeiro, a liberalização
comercial e a abertura de mercado entre os países membros.
Hoje por questões politicas e ideológicas, o Mercosul tem
sido um impedimento para a inserção externa do Brasil e dos outros países
membros. Amotivação política dos
governos fez com que as regras passassem a ser desrespeitadas e medidas
protecionistas prevalecessem sem qualquer punição para os países infratores. O
Mercosul representa hoje apenas 8.6% do intercâmbio total do Brasil. O bloco
está se tornando cada vez menos importante para nossas exportações, mesmo para
os produtos manufaturados, que estão perdendo mercado na região pela perda de
competitividade da economia brasileira.
O resultado foi um crescente isolamento do Brasil e do
Mercosul das novas formas de comércio – cadeias produtivas globais, que
representam hoje 56% do comércio global - e das negociações de acordos de livre
comércio bilaterais e de mega-acordos regionais.
O Brasil, nos últimos 12 anos, colocou todas as suas fichas
nas negociações multilaterais da Rodada Doha, no âmbito da Organização Mundial
de Comércio (OMC). A reunião de Bali foi positiva pela preservação da OMC, mas
os desafios são enormes para a retomada das negociações de Doha, para a reforma
que torne a instituição mais eficaz e ágil, e para tentar incorporar, de alguma
forma, os acordos regionais até aqui negociados fora da OMC.Os riscos de nova
paralização continuam grandes. Essa estratégia equivocada de negociação
comercial fez com quenesse período o Brasil e o Mercosul concluíssem negociação
com apenas três países: Israel, Egito e Autoridade Palestina. Enquanto isso, no
mundo mais de 500 acordos estão em discussão, sendo que 354 foram notificados
na OMC.
Os EUA e a Europa passaram a negociar a abertura de
mercados fora da OMC. O alijamento da OMC das discussões das regras que
regulamentarão as trocas comerciais no futuro reveste-se de particular
gravidade porque os países em desenvolvimento não participarão de sua
elaboração e se quiserem associar-se a esse mega grupo em formação terão que
aceitar as regras prontas. Essas regras referem-se a serviços, investimentos,
compras governamentais, propriedade intelectual e de origem.
Na Asia, os EUA estão em negociações adiantadas com 11paises(por
razões politicas, a China não está incluída) para formar a Parceria Trans-Pacífica
(TPP, em inglês). Mais recentemente, foi anunciado o inicio de um processo de
integração ainda mais ambicioso: o acordo de comércio entre os EUA e a União
Europeia que juntos representam metade
do PIB global e quase um terço do comércio internacional. Essas negociações tem
implicações ainda mais graves para os países em desenvolvimento e, em especial,para
o Brasil pelo fato de que em paralelo aos entendimentos comerciais, os dois
gigantes regionais estão discutindo a formulação de regras sobre investimento,
serviços, compra governamentais, propriedade intelectual, de origem, competição
e sobretudo de padronização (standards) fora da OMC.
O Brasil e os países do Mercosul – grande produtores de
produtos agrícolas – sofrerão um impacto adicional. O mercado europeu absorve
grande parte desses produtos mesmo com medidas protecionistas e incentivos
ilegais. A partir do momento em que o bloco transatlântico passar a existir
nossos países terão de enfrentar a concorrência – com preferências negativas –
a principal potência exportadora agrícola do mundo, os EUA.
A Aliança do Pacifico, integrada por México, Colômbia, Peru
e Chile, decidiu dar prioridade `as
negociações com a Asia e com os EUA. Os quatro países tem acordos de livre comércio
com os EUA, a União Europeia e outros países asiáticos, como a Coréia.Evidenciando
uma estratégia mais ativa e moderna, a Aliança resolveu aproximar-sedos países
desenvolvidos e explorar as possibilidades que se abrem com o intercâmbio com a
Asia.
Do ponto de vista comercial, a Aliança terá pouco impacto
inicial sobre os países do Mercosul, ao contrário do que ocorre com os outros
blocos, pelo fato de que os países do Mercosul serem grande fornecedores de
produtos agrícolas. O mercado europeu absorve grande parte desses produtos,
mesmo com medidas protecionistas e incentivos ilegais.
Se as negociações do Mercosul com a Comissão Europeia não
avançarem, por relutância protecionista de qualquer de seus membros, não haverá
alternativa ao Brasil, no âmbito do Mercosul, senão fazer um acordo em separado
com a União Europeia, para resguardar nossos interesses.
Por tudo isso, a percepção empresarial a respeito das
negociações externas está mudando. No trabalho Agenda de Integração Externa
divulgado pela Fiesp, pede-se o aprofundamento dos acordos regionais de comércio
para eliminar a erosão das tarifas para os produtos brasileiros e negociações
com países desenvolvidos, como UE, EUA, Japão, Coréia e outros que podem
aportar conhecimento inovador e novas tecnologias para as empresas brasileiras.
Menos ideologia e mais pragmatismo na área externa é a
demanda empresarial para recuperar as oportunidades perdidas nos últimos anos.
Rubens
Barbosa, presidente do Conselho de Comércio Exterior da Fiesp
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