Reinaldo Azevedo, 19/06/2014
O blog ficou fora do ar ontem um tempão, e as coisas foram se acumulando. Falo rapidamente da decisão tomada ontem pelo STF, que tornou sem efeito uma decisão que me parece legítima e constitucional tomada pelo TSE. Vale dizer: nesse caso, alinho-me com os três ministros vencidos — Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Roberto Barroso.
O que diz o Artigo 45 da Constituição? Isto:
Art. 45. A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes do povo, eleitos, pelo sistema proporcional, em cada Estado, em cada Território e no Distrito Federal.
§ 1º – O número total de Deputados, bem como a representação por Estado e pelo Distrito Federal, será estabelecido por lei complementar, proporcionalmente à população, procedendo-se aos ajustes necessários, no ano anterior às eleições, para que nenhuma daquelas unidades da Federação tenha menos de oito ou mais de setenta Deputados.
Está claro, não? A coisa será feita por Lei Complementar. E havia uma Lei Complementar? Sim! Estava em vigência desde 1993, a LC 78. E o que está escrito lá?
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Proporcional à população dos Estados e do Distrito Federal, o número de deputados federais não ultrapassará quinhentos e treze representantes, fornecida, pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, no ano anterior às eleições, a atualização estatística demográfica das unidades da Federação.
Parágrafo único. Feitos os cálculos da representação dos Estados e do Distrito Federal, o Tribunal Superior Eleitoral fornecerá aos Tribunais Regionais Eleitorais e aos partidos políticos o número de vagas a serem disputadas.
Art. 2º Nenhum dos Estados membros da Federação terá menos de oito deputados federais.
Parágrafo único. Cada Território Federal será representado por quatro deputados federais.
Art. 3º O Estado mais populoso será representado por setenta deputados federais.
Com todas as letras, está claro ali que, por determinação do próprio Congresso, cabia ao TSE fazer o que ele fez em 2013: “Feitos os cálculos da representação dos Estados e do Distrito Federal, o Tribunal Superior Eleitoral fornecerá aos Tribunais Regionais Eleitorais e aos partidos políticos o número de vagas a serem disputadas”.
O TSE usou os dados do IBGE de 2010, os últimos disponíveis. Como houve mudança na população dos Estados, seria preciso fazer o ajuste das bancadas: perderiam uma cadeira na Câmara as bancadas de Alagoas, Espírito Santo, Pernambuco, Paraná, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, e duas cadeiras as bancadas da Paraíba e do Piauí. Já outros cinco Estados ganhariam novas vagas: Amazonas (1), Santa Catarina (1), Ceará (2), Minas Gerais (2) e Pará (4). O atual número de cadeiras se baseia no Censo de 1998.
Muito bem! Os Estados que perderiam parlamentares recorreram com Ações Diretas de Inconstitucionalidade alegando que o Lei Complementar 78 fere o Parágrafo 1º do Artigo 68 da Constituição, que diz o seguinte:
§ 1º – Não serão objeto de delegação os atos de competência exclusiva do Congresso Nacional, os de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei complementar (…)
Epa! Acho que os ministros que votaram contra a resolução do TSE (Rosa Weber, Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Teori Zavascki, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski) interpretaram o texto de modo um tanto estranho: a Constituição não atribui ao Congresso o direito de definir, a seu bel-prazer, a bancada dos Estados: diz que tem de ser proporcional à população. E o Congresso, por sua vez, não delegou ao TSE “poder” nenhum: apenas o de fazer a conta — com base, reitere-se, em números do IBGE.
Ora, vejam a consequência da votação, então: com um mínimo de oito deputados por Estado e um máximo de 70, a representação na Câmara já é distorcida; Roraima tem um deputado para cada grupo de 61.009 pessoas; São Paulo, tem um deputado para cada 600 mil habitantes. Na Câmara, um roraimense vale por 10 paulistas. O equilíbrio federativo é garantido pelo Senado. A Câmara tem de representar os cidadãos.
Agora, nós temos também a distorção da distorção: mesmo no intervalo dado, a distribuição de cadeiras não obedece à proporcionalidade.
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