Paulo Roberto de Almeida
O partido dos neobolcheviques
totalitários, devidamente orientado por um êmulo de Goebbels, montou, como
sabem todos os observadores atentos, um exército de mercenários para atuar no
espaço cibernético. Não temos ideias de quantos são (algumas centenas,
provavelmente, mas podemos errar por otimismo), quanto ganham, seus nomes
verdadeiros ou as instruções precisas que eles recebem (ainda que saibamos quem
as expede), mas seu modo de atuação é muito simples: eles vasculham, de modo
regular e contínuo, a internet, numa tarefa ao mesmo tempo ofensiva e
defensiva.
No plano da defensiva, são aqueles
que sempre comentam abaixo das colunas mais frequentadas de jornalistas
famosos, inserindo mensagens de “cidadãos comuns” reclamando de um ou outro
aspecto da matéria, mas sobretudo defendendo a causa totalitária à qual eles
pertencem, e à qual prestam serviço (pago, obviamente, mas tem também os voluntários,
os true belivers, os criacionistas
políticos que a ela aderem cegamente), e eles já têm respostas prontas,
padronizadas, para “desmentir” o colunista neste ou naquele aspecto menos
vistoso para os chefes da quadrilha, para os líderes do bando, enfim, para os
Stalins Sem Gulag que pululam no partido totalitário. No plano ofensivo, eles
aproveitam o mesmo movimento para sempre encontrar um jeito de atacar aqueles
que eles acreditam serem (ou que são realmente) seus adversários (que eles
tratam como inimigos), sempre também de forma padronizada, trazendo acusações
sobre outras patifarias escabrosas sobre algum líder da oposição.
Mas não só isso: eles também ocupam,
invadam, se disseminam em todos os veículos de comunicação social, sempre com
nomes falsos, identidades construídas, personalidades fabricadas, para fazer o
mesmo trabalho sujo, subterrâneo, mentiroso: defender os chefes de gangue e
atacar os que não pertencem ao partido totalitário ou que não partilham a sua
visão do mundo. Creio que isto é o essencial a ser dito sobre esse exército das
sombras, que melhorou bastante os métodos inventados por Josef Goebbels,
durante a ascensão e consolidação do partido e do poder nazifascistas, na
Alemanha de entre-guerras: mentir, mentir, mentir, sempre atacar os adversários
com os piores golpes sujos, intimidar, assediar, ocupar espaços, enfim, fazer
aquilo que a história e a literatura já nos demonstraram como possível de ser
feito em diversas circunstâncias. Mussolini aprendeu algumas táticas fascistas com
Lênin, sim, com Lênin, e Hitler aprendeu com ambos, e com Stalin, como ascender
na escala do poder, usando todos os métodos abomináveis que os totalitarismos
empregaram para manter o seu poder, com base no terror físico, mas sobretudo na
manipulação dos meios de comunicação, sem o que eles não teriam os votos e o
apoio das massas.
Tenho enfrentado alguns desses
personagens das sombras, em exercícios paralelos de confrontações virtuais que
não devem se distinguir de muitas outras em circunstâncias similares. Sabem todos
os que seguem o meu site, os meus blogs (em especial o Diplomatizzando) e, mais recentemente (sim, acabei me rendendo a
esse instrumento), as minhas postagens no Facebook, que eu tenho opiniões
pessoais sobre alguns assuntos que constituem objeto de meus estudos e
reflexões: políticas públicas, de maneira geral, relações internacionais e
política externa do Brasil em especial, e temas de cultura no sentido lato:
livros, viagens, observações sobre a política mundial e quaisquer outros assuntos
inteligentes (eu decido o que é, e às vezes não é, mas sempre tem sentido
didático o que eu escolho debater). Sempre recebi, no formulário do site ou nas
seções apropriadas do blog, mensagens ou comentários sobre minhas postagens,
sobre meus artigos, sobre minhas opiniões emitidas nesses veículos. Não faço
objeção à maior parte deles, mesmo quando não se conformam a certo padrão de
correção ou cortesia, porque sempre acho que podemos aprender com qualquer
experiência, mesmo as mais “negativas”, digamos assim. Afinal de contas, o
mundo, por mais que não queiramos ser maniqueístas, é sim dividido entre muitos
bonzinhos, alguns poucos malvados e uma vasta maioria de indiferentes, alguns
ingênuos, outros ignorantes (e que parecem preferir continuar assim), a maior
parte preguiçosos, simplesmente.
Pois bem, os mercenários do partido
totalitário podem ser enquadrados facilmente na segunda categoria, embora
alguns só façam aquilo por dinheiro, mas creio que boa parte está sinceramente
motivada pela causa da “igualdade”, da “justiça social”, da correção das
“mazelas” da direita e dos reacionários – incidentalmente, creio que todo mundo
reparou como esse pessoal se aliou rapidamente aos piores representantes da
velha direita reacionária, aos execrados coronéis da velha política – e querem
apenas o melhor para o Brasil. A lavagem cerebral – feita durante anos a fio
pelos gramscianos da academia, e antes pelas saúvas freireanas que pululam nos
dois ciclos anteriores – foi tão bem feita que eles se tornaram criacionistas
políticos, fundamentalistas que não aceitam nenhuma outra verdade senão aquela
ditada pelo partido neobolchevique. E não adianta apontarmos para os piores
atos de corrupção, de malversações, as enormes mentiras e falcatruas ordenadas
e executadas pelos apparatchiks e
pelos chefes de gangue, eles não vão se convencer: são infensos a qualquer
raciocínio lógico, a qualquer evidência documentada de crime político (e até
comum, muitos deles), a qualquer argumento sensato sobre o danoso que tem sido
para o país suportar tantas mistificações continuadas. Eles não se comovem, e
reafirmam os seus propósitos: “ah, sim, isso pode ter acontecido, mas veja aqui
o que fizeram os neoliberais, os reacionários, aqueles que querem fazer o
Brasil andar para trás”. Tivemos vastos e multiplicados exemplos desse tipo de
situação na atual campanha eleitoral, e eu me defronto com esse tipo de atitude
a todo momento, várias vezes por dia.
Nem todo esse povo pertence ao
exército das sombras do partido totalitário: a maior parte é formada por
universitários ingênuos, gente que nasceu ontem, e que acha que sabe tudo sobre
o Brasil e o mundo, porque leu meia dúzia de artigos dos ideólogos mais
conhecidas desse grupo, e foi educada com base naquela literatura rastaquera
que todos sabemos existir na academia brasileira. Eles ainda não viram o mundo,
não sabem como trabalha uma empresa, e em grande medida sequer têm uma ideia
precisa de como funciona o governo, mas eles têm ideias acabadas sobre tudo e
sobre todos, e embora alguns pensem com suas próprias cabeças, nas horas
decisivas eles se juntam na defesa da tropa e das táticas selecionadas para
promover as suas causas. Eles sabem muito pouco sobre as revoluções russa e
chinesa – ou o que sabem foi justamente ditado pela mesma literatura de
terceira classe a que estão acostumados – e não se importam muito em que as
piores ditaduras totalitárias do século XX (e aqui eu não distingo as cores, se
vermelha ou preta) tenham eliminado da face da terra algo como cem milhões de
pessoas inocentes (fora das guerras, estou dizendo). A insensibilidade é
tamanha que eles não se importam com o que está acontecendo agora mesmo em Cuba
ou na Venezuela, e com os sofrimentos impostos a estes e a outros povos por
ditadores que partilham das mesmas convicções anticapitalistas e anti-burguesia.
O que fazer? Este é o resultado da lavagem cerebral imposta aos nossos jovens
desde cedo.
No meu caso, eu fui ganhando, ao
longo do tempo, alguns “seguidores” menos desejados, gente que entrava (anonimamente
cabe registrar) em meus blogs e postagens para atacar, ofender, denegrir,
desmentir, sem contribuir minimamente para o debate em causa – e quando era o
caso, eu postaria, mesmo depreciativamente em face de minhas posições – mas
apenas para tentar rebaixar um trabalho feito de forma voluntária, inteiramente
assumido como missão pessoal, no terreno didático e intelectual, sem qualquer
compromisso com movimentos, partidos ou escolas de pensamento. Quem me segue de
forma regular sabe do que estou falando, e talvez até conheça alguns desses
atacantes, alguns até colegas de carreira (mas sempre anônimos, claro). Enfim,
não caberia recapitular aqui todos os episódios de “embates” com os
desconhecidos virtuais.
Quem são eles? Não sabemos e provavelmente nunca
saberemos. Mas isso não importa muito, assim como pouco importa o que eles têm
a dizer. Os personagens de carne e osso não são tão importantes quanto o que
eles representam, pois isso desvenda um método, e ajuda a entender como
trabalham os totalitários. Se eles podem intimidar, confrontar, rebater,
acusar, mentir, desmentir, enfim, fazer tudo o que eles fazem de modo
“industrial” – ou seja, em massa – tudo bem. Mas certos veículos, e certas
pessoas, pela capacidade eventual que possuem de influenciar opiniões e moldar
atitudes, precisam receber um “tratamento especial”. Acredito que eu me
enquadro nessa categoria, daí eu ter sido designado para esse seguimento
reforçado. Até quando isso vai ocorrer? Eu não sei, e nem mesmo eles sabem, e
provavelmente esteja ligado ao calendário eleitoral. Eu me permito dialogar com
alguns deles, para tentar aprender um pouco mais sobre a psicologia “dessa
gente”, alguns bem intencionados, como disse, muitos outros desempenhando uma
tarefa, ainda que ela seja vil e mentirosa.
Pois bem, o que se pode fazer com os mercenários das sombras?
Provavelmente nada, apenas se divertir um pouco com eles, e esperar que entrem
mais vezes no meu blog, para fazer aquilo que foram instruídos fazer:
intimidar, desencorajar, dobrar “adversários” para melhor sustentar a causa
totalitária que é a deles. Se estivéssemos na época dos nazistas, um pelotão de
milicianos talvez já tivesse sido mandado atrás de mim, com os “remédios” que
os fascistas italianos e os nazistas alemães empregavam contra socialistas,
comunistas, democratas, judeus e outros “inimigos do povo”: ameaças, eventual
violência física, logo mais adiante prisão, campo de concentração, até
eliminação. Não estamos nesse cenário, felizmente, mas infelizmente é o que
vemos sendo montado em ditaduras amigas do partido totalitário, aqui mesmo ao
lado, e com a qual eles nunca se “dessolidarizaram”, mesmo em face das piores
violações das liberdades democráticas e dos direitos humanos.
Este é o mundo deles. Obviamente não é o meu mundo, e vou continuar
lutando com todas as minhas forças – em meu modesto quilombo de resistência
intelectual, como digo sempre – para impedir esses degenerados de alcançarem
seus objetivos, que são aqueles mesmos descritos por dissidentes do mundo
totalitário, começando por Ignazio Silone, Arthur Koestler – de Darkness at Noon –, Eric Blair – o
George Orwell de Animal Farm e 1984 – e tantos outros que lutaram
contra o novo monstro totalitário, aqui mesmo no Brasil, em vários países da
América Latina e em todos os lugares.
Talvez sejam apenas personagens passageiros que logo deixarão de existir,
mas a quem tenho de agradecer, sinceramente, pela oportunidade que me dão de
fazer uma nova reflexão sobre o sentido de minha missão auto-assumida, e que me
permitiu elaborar estes novos comentários sobre um fenômeno recorrente na
internet. Não tenho nada a lhes dizer, a não ser recomendar que continuem lendo
o meu blog – na verdade que eles continuem a ler coisas inteligentes – para
talvez aprender algumas lições de tolerância, de dignidade, de honestidade
intelectual, sempre em defesa de valores democráticos, e de princípios que eu
sei que não são os deles: as economias de mercado, a total liberdade nos meios
de comunicação, a iniciativa individual, a meritocracia, contra os falsos
igualitarismos e o “homem massa”, contra o qual já se revoltava Ortega y
Gasset. Talvez eles aprendam um pouco, não necessariamente me lendo, mas lendo
a história, e simplesmente observando o mundo real. Eles vão aprender, ainda
que tardiamente.
Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 12 de outubro de 2014
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