308. “Macro e microeconomia da
diplomacia”, Espaço Acadêmico (Maringá: UEM,
Ano I, nº 8, ISSN: 1519.6186; janeiro de 2002; links: http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/35903;
pdf para o artigo: http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/35903/20992). Relação de trabalhos nº 839.
Macro e microeconomia
da diplomacia
Paulo
Roberto de Almeida
Autor
de Formação da Diplomacia Econômica no
Brasil
A política externa possui a
sua própria economia, que poderia ser definida como a forma pela qual os
diplomatas organizam seus recursos escassos (talentos, discursos, missões de
representação, reuniões bilaterais, participação em foros multilaterais, enfim
coqueteis e recepções), que poderiam ter usos alternativos, na produção de
determinados “bens” diplomáticos (tratados, acordos, convênios de cooperação),
em função de custos e benefícios percebidos no processo diplomático, segundo
uma alocação “ótima” desses recursos. Esses bens ou “mercadorias” serão depois
distribuídos para o consumo da sociedade que emprega esses diplomatas, sob a
forma de melhores oportunidades de exportação, maior segurança externa, novas
possibilidades de usufruir e de conceder cooperação externa, captura de
talentos externos, fontes adicionais de financiamento, bref, qualquer resultado suscetível de maximizar o bem estar
nacional.
Em função dessa definição
ampla, pode-se ter uma macroeconomia da diplomacia – que trataria, mais bem, do
produto bruto diplomático, do pleno emprego e da renda diplomática, sua
distribuição entre os próprios, bem como das questões de concorrência entre
diplomatas, ou do monopólio que alguns exercem sobre determinadas atividades –
ou uma microeconomia, voltada, por exemplo, para a produtividade marginal do
diplomata (ou seus rendimentos decrescentes), a economia de escala numa
Secretaria de Estado, a especialização, a divisão do trabalho e a
interdependência nas lides diplomáticas, bem como os fatores de depreciação de
um diplomata, que só deveria normalmente intervir depois de uma análise
atuarial sobre sua função de lucros e perdas (sem qualquer abuso contábil,
entenda-se), embora em alguns casos se recomende uma forte injeção fiscal.
No plano internacional
igualmente, o que aliás é o próprio da diplomacia, deve-se considerar as
vantagens comparativas dos diversos serviços diplomáticos, os fluxos de capital
diplomático de um país a outro, os mecanismos de câmbio diplomático (que podem
implicar a desvalorização de alguns e a valorização de outros), as assimetrias
existentes entre os diversos serviços, bem como a atuação dos governos, que
influenciam o desempenho do produto diplomático ou seu posicionamento no
cenário internacional (através de subsídios maciços, por exemplo). Nos tempos
que correm, de globalização das relações exteriores e de neoliberalismo
diplomático, já não são mais operacionais as antigas doutrinas socialistas da
diplomacia, muito embora muitos ainda acreditem no caráter de classe da política
externa, tanto que continuam a achar que os diplomatas são todos uns “punhos de
renda”, que vivem de salto alto pulando de uma recepção para outra. Poucos se
dão conta, entretanto, que com a depreciação das línguas e o acesso disseminado
a recursos externos via Internet – afinal de contas, hoje em dia qualquer um
fala inglês e até cachorro de madame já tem correio eletrônico –, o diplomata
perdeu seu antigo monopólio (e fonte de lucros?), tendo seus salários tão
depreciados que formou-se, nos estratos inferiores ou iniciais da carreira, um
verdadeiro lumpesinato diplomático, verdadeiro exército industrial de reserva
diplomático que moureja em condições pouco condizentes com sua antiga aura de
fama e brilho.
Os exercícios que se seguem
ostentam a preocupação de determinar como os fatores de produção da atividade
diplomática têm seus preços fixados no mercado, o que conformaria, idealmente,
uma teoria da distribuição diplomática. Na prática, porém, as relações de poder
são tão ou mais importantes, na vida diplomática, que as relações de mercado,
que são fortemente condicionadas pela intervenção dos governos, os patronos por
excelência dos diplomatas, que não podem assim exercer livremente seus talentos
(tanto porque o mercado para eles é imperfeito, com vários monopólios
“naturais”). Tentaremos, sem embargo, examinar os modelos alternativos de
distribuição diplomática, sabendo que alguns elementos – vaidade, compadrio,
pistolões – terão de ser deixados de lado, uma vez que dificilmente são
mensuráveis a ponto de permitir sua integração numa equação matemática ou numa
curva de regressão. O autor espera contribuir mediante este esforço para a
conformação de uma verdadeira teoria econômica da diplomacia, vertente pouco
explorada da ciência econômica que ainda aguarda o seu Marx, o seu Keynes, o
seu Hayek ou o seu Friedman (muito embora ela tenha tido entre nós essa figura
híbrida que foi Roberto Campos). Essa teoria da economia diplomática deveria
compreender, ademais das funções conhecidas em economia – basicamente derivadas
das leis da oferta e da procura diplomática – uma teoria do crescimento
diplomático, que enfocaria também os problemas de desenvolvimento dessa
profissão hoje banalizada (com tratamento de itens específicos como a pobreza a
qualidade de vida do diplomata, a discriminação de gêneros nos padrões
ocupacionais e, eventualmente, no plano externo, a questão do tratamento
preferencial e mais favorável para os diplomatas de menor desenvolvimento
relativo).
Aqueles que discordarem dos
cálculos econométricos do autor, podem contatá-lo no seguinte endereço: pralmeida@mac.com. Para maiores
esclarecimentos sobre os fundamentos da teoria econômica aqui desenvolvida,
recomendo consultar os manuais disponíveis no mercado, sendo que o “velho”
livro introdutório de Paul A. Samuelson permanece supreendentemente atual (pelo
menos para os padrões dos diplomatas), mas ele poderia ser utilmente
complementado pela teoria do comércio diplomático estratégico de Paul Krugman.
Algumas
questões de economia diplomática (tratamento sucessivo em capítulos).
1) O Itamaraty
dispõe de um “monopólio natural” no terreno da política externa; não tem
concorrentes no País, ou muito poucos;
2) Ele tem inegáveis “vantagens comparativas
estáticas” para tratar dos assuntos que são os seus, mas outros serviços estão
criando vantagens comparativas dinâmicas;
3) Ele
apresenta “economias de escala”, que podem ser ainda mais otimizadas com a
modernização de seus métodos de trabalho: ele faz bom faz uso de seus recursos
escassos?
4) Quais
“externalidades” influenciam o trabalho do Itamaraty?
5) Pode-se
medir a “produtividade marginal” de um diplomata?
6) Quais seria
a relação de “custo-benefício” do diplomata: a estabilidade é um asset ou uma liability?
7) Como poderia
ser operado o “controle do fluxo produtivo” e o “ciclo dos produtos” no
Itamaraty?; pode-se obter maiores ganhos com uma nova estrutura organizacional
e nova apresentação dos produtos?; uma estratégia de marketing é aconselhável?
8) Como colocar
em funcionamento a “defesa da concorrência” no Itamaraty?; ele pode operar
segundo os princípios da “market contestability”?; havendo maior
osmose/abertura em relação à sociedade civil sua relação capital-produto seria
melhor?
9) Como apresentar a “contabilidade” do
Itamaraty?: nos tempos dos velhos Relatórios do Império isso era mais fácil,
agora é difícil obter-se até mesmo um “relatório aos credores”;
10) Crescimento
zero da diplomacia?; como enfrentar a obsolecência das técnicas produtivas e a
depreciação do capital diplomático?
Respostas tentativas a estas
questões (por certo não exaustivas) nos próximos capítulos deste folhetim.
Paulo
Roberto de Almeida
Washington,
14/12/2001; Relação de Originais n. 839; Relação de Publicados n. 308.
Espaço Acadêmico (Maringá: UEM, Ano
I, nº 8, ISSN: 1519-6186; janeiro de 2002; links: http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/35903;
pdf para o artigo: http://periodicos.uem.ßbr/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/35903/20992).
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