Opinião: A COP 30 no Brasil
Nunca em seus 500 anos o País esteve no centro de discussões sobre temas globais. Neste momento, o Brasil é voz que terá de ser ouvida
Por Rubens Barbosa
Estadão, 28/01/2025 | 03h00
A conferência anual dos países-membros da Convenção da ONU sobre Mudança de Clima, a ser realizada em Belém, em novembro de 2025, começa a apresentar-se como a mais desafiadora de toda a História.
Na sua trigésima edição, a COP do Brasil, e não da floresta, enfrentará desafios importantes na logística do encontro, na geopolítica global e nas negociações em função dos limitados avanços registrados na reunião da COP-16, sobre biodiversidade, em Cali, na Colômbia, e da COP-29, realizada em Baku, no Azerbaijão, apesar do apoio político manifestado na declaração da cúpula do G-20, recentemente realizada. A COP-30 deverá continuar a tratar dos temas de sua agenda, como o cumprimento do Acordo de Paris, de 2015, e a proteção das florestas e das agendas que saíram dos encontros em Cali e Baku, como financiamento climático, mercado de carbono, transição energética e biodiversidade.
A COP-30 ocorrerá assim em um ambiente preocupante, em que a temperatura do planeta pode estar se aquecendo acima do limite de 1,5ºC previsto no Acordo de Paris e as emissões de gás carbono, crescendo na contramão dos compromissos assumidos. Em termos geopolíticos, as dificuldades para a aprovação de financiamento para os países mais vulneráveis aumentaram, e o negacionismo ambiental atingiu o seu máximo com as políticas ambientais de Donald Trump.
Difícil imaginar o que poderá avançar da agenda que incluiria (1) acelerar a descarbonização com compromissos mais ousados para a redução das emissões de gás de efeito estufa até 2030, com o objetivo de limitar o aquecimento global a 1,5ºC; (2) apoiar políticas de adaptação para mitigar os impactos das mudanças climáticas, especialmente em países mais vulneráveis; (3) garantir que o financiamento necessário para os países em desenvolvimento esteja disponível; (4) implementar o artigo 6 do Acordo de Paris com a regulamentação do mercado de carbono para incentivar o investimento em tecnologias verdes e soluções climáticas; e (5) proteger a Amazônia e os biomas tropicais.
Do ponto de vista do Brasil, as questões relacionadas com o financiamento climático, transição energética justa, regulamentação do mercado internacional de carbono, preservação da Amazônia e cooperação entre o Sul Global certamente estarão entre as prioridades. Será o momento de insistir na observância das circunstâncias locais em temas como agricultura tropical e combustíveis fósseis na matriz energética.
Muitas serão as reuniões e discussões preparatórias para a defesa dos interesses brasileiros no encontro de 2025. Em algumas áreas, em função de disputas internas, ainda não estão claras as posições nacionais. Depois de meses de discussão, o embaixador André Corrêa do Lago foi designado como presidente da COP no Brasil e terá a responsabilidade de coordenar as reuniões e iniciativas durante o evento. As incertezas sobre as posições brasileiras continuam. Para definir as prioridades que o Brasil levará para a conferência, será necessário concluir as discussões internas. Será necessário um detalhamento de como se alcançar as metas mais ambiciosas (banda de 59% a 65%) para a redução de emissão de gás de efeito estufa, de investimentos na transição energética, além do Plano do Clima, a Estratégia Nacional de Biodiversidade, o Pacto pela Transição Ecológica, a Estratégia Nacional de Adaptação e Mitigação. Na questão do desmatamento da Amazônia, a redução anunciada para 2024 é significativa, mas as queimadas foram um retrocesso. Os ilícitos na Amazônia (desflorestamento, queimadas e garimpo ilegal) continuam e estão se agravando, sem que o Estado em seus três níveis apresente um plano consistente para assegurar seu poder em toda a região contra o crime organizado. A questão da pesquisa e exploração na Margem Equatorial terá de ser decidida.
O grande desafio para os trabalhos preparatórios e as discussões durante a realização da reunião de Belém está na saída dos EUA do Acordo de Paris e na baixa prioridade de Trump para as questões ambientais e mudança do clima. Donald Trump dificilmente comparecerá ao encontro no Brasil. A participação dos EUA poderá ocorrer com a presença de alguns Estados e instituições ambientais. As posições do presidente Javier Milei, da Argentina, poderão também dificultar a formação de consensos regionais. O risco de esvaziamento político da COP-30 é real.
Nunca em seus 500 anos o Brasil esteve no centro de discussões sobre temas globais. Neste momento, o Brasil é voz que terá de ser ouvida em questões ambientais, de transição energética e de mudança de clima.
A partir dos trabalhos preparatórios da COP-30, com os EUA pouco interessados, abre-se uma grande oportunidade para o Brasil assumir efetivamente a liderança global nas questões ambientais e de mudança de clima. Para tanto, seria necessária uma imediata e bem realizada coordenação entre governo, iniciativa privada e sociedade civil, de forma que se possa concretizar esse objetivo. Essa coordenação será essencial para a definição dos interesses estratégicos do Brasil na conferência. Se o Brasil não ocupar esse vazio político, certamente a Europa, com seu “Green Deal” e as medidas restritivas já adotadas, tenderá a assumir essa liderança.
O Brasil não pode perder mais essa oportunidade.
PRESIDENTE DO INSTITUTO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS E COMÉRCIO EXTERIOR (IRICE), É MEMBRO DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS
https://www.estadao.com.br/opiniao/rubens-barbosa/a-cop-30-no-brasil/
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