Diretores do IBGE entregam cargos insatisfeitos com Pochmann: entenda a crise no instituto
Criação de fundação, mudança de local de trabalho e até cobrança a sindicato foram decididas sem consulta ao Conselho Diretor, apontam críticos, que se queixam de falta de interlocução
Por Mayra Castro e Cássia Almeida
O Globo, 14/01/2025
Após Elizabeth Hypolito e João Hallak Neto, diretora e diretor-adjunto de Pesquisas do IBGE, deixarem seus cargos na última semana, o colunista do GLOBO Lauro Jardim informou ontem que, até o fim do mês, devem sair Ivone Batista e Patrícia Costa, diretora e diretora-adjunta de Geociências. Fontes indicam que faltaria apenas a designação dos substitutos para a saída das diretoras.
Em reunião dos diretores que pediram exoneração com os coordenadores para explicar a decisão, na semana passada, a falta de interlocução com a presidência do órgão, nas mãos do economista Marcio Pochmann, seria o principal motivo para o afastamento. A criação da Fundação IBGE+ nem chegou a passar pelo Conselho Diretor.
Os afastamentos acontecem em meio a uma crise interna do órgão oficial de estatística. O Sindicato Nacional dos Trabalhadores em Fundações Públicas Federais de Geografia e Estatística (Assibge), em nota, disse que, embora os diretores tenham optado por não expor publicamente o que os levaram a essas decisões, a entrega dos cargos “mostra o agravamento da crise no IBGE”, e que eles teriam entregado seus cargos por um “desgaste” com a gestão atual.
Clima tenso
Para Paulo Lindesay, diretor da executiva nacional da Assibge, o clima no ambiente de trabalho está tenso desde que algumas mudanças foram anunciadas, como a transferência dos servidores que trabalhavam no Centro do Rio de Janeiro para o Horto Florestal, local considerado pelos servidores como de difícil acesso, e a criação da Fundação IBGE+:
— A gente entende essa fundação como uma forma de fragilizar o próprio IBGE. A argumentação foi que o instituto não teria um orçamento suficiente para gerir seu próprio plano de trabalho, mas o certo seria o presidente lutar para o governo federal colocar mais recursos, e não criar uma outra fundação para captar dinheiro público e privado.
Na reunião dos diretores com os coordenadores, segundo fontes, outro fator citado teria sido a decisão da direção de cobrar aluguel do sindicato pela sala que eles ocupam em um prédio da Avenida Chile (Centro do Rio), onde funciona boa parte dos núcleos do IBGE. A medida teria sido tomada logo após a audiência pública na Câmara dos Deputados com a participação do Sindicato para debater a Fundação IBGE+.
Em carta aberta divulgada ontem, o sindicato alerta que “decisões recentes da atual direção do IBGE colocam em risco a soberania geoestatística brasileira”, referindo-se à Fundação IBGE+.
“Essa medida foi implementada sem consulta aos quadros técnicos, à comunidade científica e à sociedade civil, configurando um precedente perigoso para a interferência de interesses privados no sistema geoestatístico nacional.”
Segundo fontes do instituto, havia a impressão de que o Conselho Diretor não era considerado. As deliberações que deveriam sair das reuniões eram publicadas quase que imediatamente após o fim da reunião, dizem essas fontes.
Outra questão é o uso da intranet do instituto. Antes usada apenas para troca de dados técnicos, agora está mais voltada para propaganda institucional da presidência, dizem fontes próximas ao caso.
A notícia da saída dos núcleos do instituto do prédio da Avenida Chile foi dada ao Conselho Diretor no mesmo dia no qual o aviso ao locador foi feito.
A ex-presidente do IBGE Wasmália Bivar chamou atenção para o fato de os diretores terem sido escolhidos pelo próprio presidente atual:
— Eu imagino que uma ação coletiva dos diretores da casa saindo é uma manifestação de insatisfação com a gestão. Da mesma maneira como, até agora, o presidente continua tendo dificuldades de ouvir os técnicos, isso também deve ter chegado na direção. Eu, pelo menos, não acredito que o IBGE precisa da Fundação IBGE+. Ele precisa de outras coisas — afirmou.
O IBGE publicou nota em seu site divulgando que o servidor Gustavo Junger da Silva irá substituir Elizabeth Hypolito, e que Vladimir Gonçalves Miranda vai assumir o cargo de João Hallak Neto.
O IBGE, procurado, não respondeu sobre a saída dos diretores.
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