Três datas relevantes na história mundial: 1925, 1945 e 2025
Paulo Roberto de Almeida
Estamos em 2025, possível limiar de um processo voluntário e deliberado de desmantelamento da ordem mundial atual, criada majoritariamente pelos Estados Unidos em 1945, ou seja, 80 anos atrás, por iniciativa de um dirigente que é o exato oposto de Franklin Roosevelt, o presidente que começou nos anos 1930 pela Good Neighbour Policy (dirigida aos países da América Latina, interrompendo, por alguns anos, as intervenções no Caribe e América Central), continuou em 1941 com a Carta do Atlântico, assentando com Churchill as bases conceituais da futura ordem global multilateral das Nações Unidas, e que foi imprescindível na consolidação de uma ordem liberal e democrática que serviu a metade do mundo no pós-IIGM, inclusive ao Brasil, aliado e integrado à hoje menos defendida “ordem global ocidental”.
Volto a cem anos atrás, para 1925, quando um seguidor demencial do Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães, preso pela sua tentativa de tomada do poder na República de Weimar (o “golpe da cervejaria de Munique”), escrevia o programa que adotaria ao chegar ao poder: os desmantelamento da ordem da Liga das Nações, a supremacia e o expansionismo da Grande Alemanha, a destruição da ameaça bolchevique e alguma “solução” (wagneriana) ao “problema judeu”, que ele considerava como responsável pelas “desgraças” do povo alemão. Seu programa, Mein Kampf, seria aplicado metodicamente a partir de 1933, quando Hitler finalmente chega ao poder por vias “legais” (mas pela violência também).
O resultado dessa ascensão foi a destruição da ordem “liberal” anterior, mas também a de metade da Europa e da própria Grande Alemanha.
Em 2025, um outro demencial, armado de um programa tosco, pretende conter um suposto adversário, a China (sendo menos eloquente contra o agressor real da atual ordem internacional, a Rússia de Putin) e quer eliminar o que considera como uma ameaça à “grandeza” americana, que são simples emigrantes ilegais, na maior parte trabalhadores honestos querendo construir uma nova vida para suas famílias.
1925, 1945 e 2025: etapas momentosas na trajetória incerta do sistema internacional, projetos de alteração e de mudanças tentativas das desordens existentes na ordem em vigor em cada momento. Hitler, Roosevelt, Putin e Trump representam personagens-chaves na conformação benéfíca ou maléfica do cenário mundial. O Brasil é mais um espectador passivo do que um protagonista ativo nessas transições, mas sua diplomacia profissional poderia oferecer alguma contribuição positiva para os processos de mudança a cada uma dessas etapas, não fossem lideranças pouco afirmativas nas respectivas datas.
Em 1925, um presidente trapalhão, Artur Bernardes, ordenava a retirada do Brasil da Liga das Nações, contra os argumentos do seu representante em Genebra, Afrânio de Melo Franco.
Em 1945, o ditador do Estado Novo, depois de ter impedido o chanceler Oswaldo Aranha de discutir com Roosevelt a futura ordem mundial que era desenhada em Dumbarton Oaks, em 1944, autorizou a adesão do Brasil à Carta de San Francisco, mesmo se a delegação diplomática do Brasil tinha críticas à ordem dos “mais iguais” declarados vencedores no maior conflito global da História.
Em 2025 (na verdade desde antes), o atual presidente brasileiro declara seu apoio à proposta do violador da Carta da ONU de implementação de uma mal definida “nova ordem global multipolar”, de nítida orientação antiocidental e, portanto, antiliberal e antidemocrática.
O mundo realmente não parece pacífico em 2025, como não o foi em 1925, e como ainda não o era no primeiro semestre de 1945. Os prognósticos continuam incertos neste centenário de preparação de um programa preliminar de mudança unilateral do mundo, assim como um novo dirigente pretende impor uma nova marca unilateral e supremacista de imposição de sua ordem regressiva ao mundo.
Não obstante, cabe esperar que 2025 não seja um prenúncio similar aos 20 anos momentosos que levaram o mundo às destruições registradas até 1945, em 1925 no programa alucinante de um tresloucado supremacista. Um novo supremacista, racial e imperial, assume o poder no país ainda hegemônico, num cenário que também tem impérios concorrentes, como foi o caso cem anos atrás.
Que isso não seja a antecipação de um cenário tão desafiador quanto o foram os anos 1930-45. Não depende esse cenário da diplomacia profissional brasileira, mas ela sempre teve o discernimento adequado para enfrentar os desafios de cada momento, a despeito de incertas políticas externas ditadas por dirigentes nem sempre bem-preparados para cuidar dos interesses nacionais com propósitos afins aos valores e princípios da nação brasileira.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 19 de janeiro de 2025
Nenhum comentário:
Postar um comentário