Na origem da atual ordem mundial: a desordem brutal criada por dois ditadores
Paulo Roberto de Almeida
Lula se prepara para participar com Putin, no início de maio de 2025, das celebrações pelo final da II Guerra Mundial, 80 anos atrás, em grande medida vencida graças aos esforços do povo russo (não existe povo soviético) contra as tropas nazistas que invadiram o seu país em 1941.
De fato, a derrota das forças nazifascistas que deslancharam a guerra europeia e mundial em 1939, dominando grande parte da Europa nos dois primeiros anos, depois estendendo o conflito a outros territórios (URSS e EUA) a partir de 1941, foi o que determinou a articulação militar que acabou gerando, entre 1944 e 1945, a ordem mundial da ONU, que hoje está sendo abalada e fragmentada por repetidas demandas por uma “nova ordem global multipolar”.
Putin pretende fazer da comemoração dos 80 anos do final da guerra no coração da Europa uma espécie de triunfo continuado da Rússia em prol da construção de um mundo de paz baseada na força militar, e Lula faz questão de prestigiar o evento, com sua presença pessoal.
Ambos o fazem na ignorância deliberada de dois eventos que mistificam a data, ao esconder o essencial, tanto na história quanto na atualidade.
Esta última é marcada não pela paz, mas pela guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia, que Lula prefere ignorar por completo, e que é o sinal mais evidente da fragmentação da ordem mundial criada 80 anos atrás, ao cabo da maior guerra global da humanidade (até o presente).
Mais importante ainda: Putin quer fazer esquecer — e Lula deve ignorar totalmente— que a IIGM terminada em 1945 só pôde ser iniciada pelo fato das duas grandes tiranias existentes em 1939, a União Soviética de Stalin e a Alemanha nazista de Hitler, terem concluido um pacto de não agressão oportunista, contendo como cláusula secreta a invasão e divisão da Polônia, o que permitiu o início da guerra uma semana depois.
Comemorar o fim de uma guerra esquecendo o que permitiu que ela começasse é um gesto sórdido de esquecimento deliberado da História, que Lula pretende praticar, ao lado de seu amigo Putin, companheiro no Brics e parceiro na tentativa de desmantelamento da atual “ordem ocidental”, o tirano de Moscou que já foi chamado, justamente, de “Hitler do século XXI”.
Putin prefere negligenciar o papel dos dois ditadores responsáveis pelo início da mais horrenda catástrofe do século XX.
Que Lula se junte a uma mistificação histórica, em nome do Brasil e do povo brasileiro, ademais em meio a uma nova guerra de agressão de certo modo similar à tragédia de 1939, 86 anos atrás, representa uma desonra para o povo brasileiro, que também sofreu as consequências da mais terrível guerra que abalou a humanidade e que destruiu a “ordem mundial” precedente.
Que Lula também pretenda, no mesmo contexto, ajudar a construir uma “nova ordem global”, proposta por um violador da Carta da ONU e das regras mais elementares do Direito internacional, buscado pelo TPI por crimes de guerra e crimes contra a humanidade, revela apenas sua imensa ignorância sobre os pilares fundamentais da ordem mundial atual que ele pretende substituir por algo tão vago quanto essa “nova ordem multipolar” proposta por dois líderes autocráticos.
O Brasil e o povo brasileiro não merecem essa consagração do atual destruidor da ordem mundial existente, pelos mesmos meios, a força bruta e a violação de direitos fundamentais vigentes na época (a Liga das Nações e o Pacto Briand-Kellog), pela adesão ingênua do atual dirigente brasileiro, desprovido de um adequado conhecimento histórico, mas animado de uma dispensável oposição à presente ordem mundial multilateral da qual o Brasil e sua diplomacia se consideram legítimos construtores, 80 anos atrás.
Não cabe esquecer o que motivou essa construção, seis anos antes da data agora mistificada para esconder os gestos sórdidos que estiveram em sua origem.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 29/01/2025
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