A intencionalidade do mal: uma digressão sobre Trump
Paulo Roberto de Almeida
A famosa reportagem de Hannah Arendt na New Yorker sobre o julgamento de Eichmann em Israel, a propósito do qual ela foi muito criticada por inventar o duvidoso conceito de “banalidadade do mal” para o reles funcionário da máquina de matar nazista, responsável pelo Holocausto, decididamente não se aplica a Donald Trump, seja como pessoa, seja como magnata venal, seja como presidente acidental.
Em Trump nada é banal, nada é corriqueiro ou ocasional, tudo é intencional e todos os seus gestos foram devidamente (mal) calculados.
Ele não cumpre ordens, como o vulgar burocrata nazista o fazia. Eichmann era certamente um dedicado servo da máquina nazista de matar e a ela se aplicou com zelo, talvez até por gosto, pois fazia parte de um grande e racional empreendimento, concebido exatamente para aquela finalidade.
Trump faz o mal com gosto, apuro e intencionalidade. Ele tem uma forte necessidade, íntima, deliberada, irresistível, de chocar, de provocar, de provar que pode fazer, ordenar e executar tudo o que está fora dos padrões habituais da sociedade americana. Ele precisa mostrar que é poderoso e provar, de uma vez por todas, mais do que da primeira vez (inconformado com a rejeição de 2020), que é capaz de chocar e de confrontar as elites habituais, políticas, empresariais, intelectuais, que ele é quem manda, e para isso tem de desmantelar o que existe e de oferecer seus mais loucos desejos.
Nada foi mais revelador de sua personalidade doentia do que o vídeo feito por IA sobre a Riviera trumpista que seria construída na Faixa de Gaza, enfim limpa e liberta dos “resíduos” palestinos: dinheiro jorrando do céu, garotas de programa, luxúria, prazer e esbórnia de mau gosto, tudo o que parece conforme à personalidade vulgar do mentecapto que chegou aonde queria. (A ajuda de Putin foi preciosa e providencial.)
Não, Trump ainda não terminou sua obra, e nada nela será banal, como não pode ser banal a construção do mal. Trump é um personagem de romance distópico, mas nem Orwell poderia ter imaginado o enredo.
Será único na história dos Estados Unidos e de grande parte da comunidade internacional.
O mundo não será como antes, em face da não-banalidade do mal que Trump está e continuará causando, antes de tudo e de todos para a pobre Ucrânia e para os ucranianos.
Paulo Roberto Almeida
Brasília, 16/03/2025
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