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segunda-feira, 16 de setembro de 2019

Austeridade fiscal: inimiga do crescimento econômico? - Rodrigo Constantino (Gazeta do Povo)

Rodrigo Constantino
Gazeta do Povo, 16 de setembro de 2019

A Folha de SP trouxe neste domingo em destaque um texto de opinião com o título “Por que cortar gastos não é a solução para o Brasil ter crescimento vigoroso?”. Trata-se da velha e surrada “teoria” de que a austeridade fiscal é inimiga do crescimento, que o governo precisa investir e gastar mais para induzir o crescimento econômico por meio do “multiplicador fiscal”.
Seria a descoberta do moto perpétuo de crescimento: o governo gasta e investe o que não tem, sem se preocupar com o déficit, e isso vai gerar mais crescimento ainda na iniciativa privada. O crescimento maior fará a arrecadação subir, e por isso não precisamos nos preocupar com os rombos do orçamento.
Com base numa “tese” dessas, é realmente espantoso ainda existirem países pobres! E “paradoxalmente”, são justamente os que mais acreditam nessas trilhas para o sucesso. Por que será?
O que os autores heterodoxos não explicam é como justamente na fase expansionista irresponsável de Dilma o país mergulhou na maior recessão da história recente. É mais ou menos como os ladrões que acabaram de realizar o maior roubo a banco de todos os tempos tentarem explicar que investir mais em segurança não é a solução, e ainda culparem outros pelo roubo. Haja cara de pau!
Claro que, com tão pouca sustentação teórica ou empírica, os autores tinham que partir para teorias da conspiração: “a insistência em um diagnóstico e uma política equivocada reflete apenas uma fé cega ou estaria a serviço de determinados interesses econômicos e políticos?”. Quem levanta tal suspeita é justamente a turma que adota fé cega em ideologias e tem vários interesses econômicos e políticos na manutenção do modelo atual falido, que leva aos altos juros e ao rentismo. Eles condenam da boca pra fora o excessivo gasto com juros, como se este não tivesse ligação alguma com o elevado déficit fiscal e sua trajetória insustentável, se não houver reformas estruturais de cunho liberal.
Não adianta quantas vezes a experiência comprove a boa teoria econômica, de que aumento de gastos públicos costumam gerar menos, não mais crescimento sustentável a longo prazo. Sempre haverá quem venda a ilusão de que basta o governo gastar para nos tirar do buraco que o excesso de gastos públicos cavou. Ou acabamos de vez com as falácias da Unicamp, ou a Unicamp acaba com o Brasil. Quase conseguiram com a Dilma, mas não desistiram ainda…
Rodrigo Constantino

terça-feira, 26 de setembro de 2017

O euro pode ser salvo? Livro de um heterodoxo pessimista - Malcolm Sawyer

Este economista europeu, que define a si mesmo como um "economista heterodoxo" -- ou seja, do time da anti-austeridade -- afirma que o euro vem falhando desde a sua concepção, e que essas falhas de desenho intensificam a crise da Eurozona, condenando-a a uma "austeridade auto-derrotada".
Talvez ele prefira uma "self-sustaining expediture", como parecem preferir quase todos os economistas desse clube, esquecendo-se de examinar quem vai pagar a festa. Para ele, o euro não vai se salvar porque existem obstáculos políticos e ideológicos enormes, que certamente ele atribui à tal de austeridade. Ele só não diz como é que conseguiram restabelecer o equilíbrio fiscal Espanha e Portugal, e como a Grécia se safou do abismo (talvez ele prefira que os alemães continuem sustentando os anti-austeridade.
Não pretendo comprar o livro, nem com desconto, assim que quem preferir examinar o dito cujo pode aproveitar o meu código de desconto abaixo indicado.
Paulo Roberto de Almeida


 Social Europe Ltd.
Dear reader
we would like to draw your attention to a new publication by our partners from Polity Press.

The economies of the Eurozone countries are plagued by multiple crises, which cast major doubts over the future of the Euro. In this engaging new book, leading heterodox economist Malcolm Sawyer argues that the entire policy framework of the Eurozone was fundamentally flawed from its foundation. He shows how these ‘design faults’ intensified the effects of the crisis, made an effective response to the crash almost impossible, and are now locking in perpetual self-defeating austerity.
Sawyer proposes a bold alternative agenda for reviving the continent’s economic prosperity and saving the Euro, centred on a Federal fiscal policy and deep reform of the European Central Bank. He argues, however, that these solutions would require a fundamental transformation that is almost certain to encounter huge ideological and political obstacles. He therefore concludes that Europe faces a bleak economic future, blighted by low growth, high unemployment and social division.
This major contribution to one of the key economic and political issues of our time will be essential reading for everyone interested in Europe’s future.
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Social Europe Ltd., 31-33 High Holborn, London, London WC1V 6AX, UNITED KINGDOM

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Franca, Brasil e a tal de austeridade: mesmos problemas, mesmos erros? - Editorial Estadao

O Brasil e a França, não como países, mas pelos seus supremos mandatários, eram plenamente solidários nos equívocos econômicos: recusa da austeridade, aumento dos gastos públicos, subsídio ao consumo, proteção e apoio às indústrias nacionais, enfim, todas as medidas keynesianas para supostamente sustentar o crescimento.
Deu certo?
Na França ou no Brasil o crescimento é mínimo, e as contas públicas continuam desequilibradas.
Bem, com exceção de aventuras extra-conjugais, até aqui os dois governantes se pareciam.
Não mais: Hollande já se rendeu à austeridade, segundo consta.
E no Brasil, quando será?
Paulo Roberto de Almeida

Hollande se rende à austeridade
Editorial O Estado de S. Paulo, 16/01/2014

Quando tomou posse como presidente da França, em maio de 2012, o socialista François Hollande disse que "a austeridade não tem por que ser uma fatalidade para a Europa". Hollande elegera-se prometendo elevar os gastos do Estado como forma de impulsionar a economia, em meio à grave crise europeia. Menos de dois anos depois, a fatalidade se abateu sobre a França de Hollande, e o presidente se viu obrigado a anunciar um plano de contenção de despesas públicas, entre outras medidas ortodoxas.
Na entrevista coletiva anual em que comentou as mudanças, o constrangimento de Hollande não se limitou ao recuo de suas promessas de campanha - ele se viu obrigado a responder a questões embaraçosas sobre sua vida amorosa. E a vida de Hollande, que ademais enfrenta baixíssima popularidade, em meio ao maior índice de desemprego da história da república francesa, não está nada fácil. Assim, ele manteve a compostura e gastou com essa questão menos de três minutos de uma entrevista que durou três horas, durante as quais explicou os pontos daquilo que os jornais franceses qualificaram de "virada de 180 graus" em sua política econômica.
Hollande anunciou um corte de 30 bilhões em encargos trabalhistas para as empresas e a simplificação da burocracia para realizar empreendimentos. Outros impostos que têm impacto na produção serão reduzidos - o que é irônico para um presidente que passou o início de seu mandato a aumentar impostos. Além disso, haverá corte de ao menos 50 bilhões de gastos públicos até 2017, aliviando essa carga que hoje representa 57% do PIB, uma das mais altas do mundo. Somente neste ano, a redução prevista é de 15 bilhões.
Tudo isso será feito, segundo as palavras de Hollande, para impulsionar o "pacto de responsabilidade" que ele anunciou ter feito com os empresários do país no último dia do ano passado. Com esse pacto, qualificado por ele de "o maior compromisso social em décadas", o presidente espera que sejam criados empregos suficientes para reverter o quadro de estagnação econômica, além de fazer com que as empresas francesas retomem a competitividade.
Várias das medidas de Hollande, como o corte de encargos trabalhistas, constavam do programa de governo do conservador Nicolas Sarkozy, seu adversário na eleição presidencial de 2012. Na ocasião, Hollande ironizou Sarkozy: "Como imaginar que o corte de contribuições do empregador poderia, em uma canetada, melhorar nosso comércio exterior?".
O caso da redução das despesas públicas, porém, é o recuo mais significativo. Alinhado à dura política de austeridade da chanceler alemã, Angela Merkel, Sarkozy, então presidente e candidato à reeleição, prometera fazer da França um exemplo de rigor fiscal. Sua derrota nas eleições para o socialista Hollande, que entendia ser necessário ampliar os gastos estatais para enfrentar a crise da dívida, foi um marco político europeu, pois sinalizou que os eleitores de países ricos do continente estavam inclinados a apoiar medidas de estímulo ao crescimento econômico.
Não foi necessário muito tempo para que a realidade se impusesse, a ponto de fazer o jornal Le Monde agora se perguntar: "Hollande adotou a política econômica de Sarkozy?". Há quem esteja chamando o presidente francês de "François Blair", numa alusão a Tony Blair, o premiê trabalhista britânico responsável por reformas liberalizantes.
A guinada do presidente, contudo, não foi uma novidade para os socialistas franceses. Em 1983, apenas dois anos depois de tomar posse e de ampliar drasticamente a presença do Estado na economia, o presidente François Mitterrand teve de aceitar a pílula amarga da austeridade. "Eu prefiro ser impopular a falhar no meu dever", disse Mitterrand, sobre a necessidade de debelar a inflação e fazer o país voltar a crescer sem a mágica do dinheiro fácil que jorra dos cofres públicos.

Hollande dobrou-se diante de semelhante imposição, mas tentou ao menos manter a pose. "Continuo socialista", disse ele aos jornalistas. "Não fui vencido pelo liberalismo

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

A Italia gastadora e os "ayatollahs" de Bruxelas: seria comico, se nao fosse patetico...

A Italia quer ter o pudim, e comer o pudim. Assim os ingleses resumem essas histórias de pessoas que querem ter todas as vantagens do consumo e da poupança ao mesmo tempo, como se isso fosse possível no mundo real.
Paulo Roberto de Almeida

Italy Rejects E.U. Warnings
The New York Times, November 22, 2013

BRUSSELS — Finance ministers from the euro area pushed Friday for centralized management of the currency bloc even as Italy rebuffed warnings from European Union authorities about their finances.
The tensions over Italy’s budget grew after Enrico Letta, the country’s prime minister, warned Friday that “ayatollahs” in Europe were seeking to promote austerity even though it was killing Italy’s chances of recovery.
The finance ministers’ meeting in Brussels came one week after Olli Rehn, the E.U. commissioner for economic and monetary affairs, warned that Italy and Spain faced debt and deficit problems under their current spending plans for 2014. The main topic on the agenda was whether the verdicts by Mr. Rehn, who has gained authority to review national spending plans, should be followed.
“Some countries may have to do more, and we will discuss all these countries,” said Jeroen Dijsselbloem, the head of the group of ministers from countries using the single currency. “I think part of the process is also that we question each other on what further measures could be taken and about how the ministers assess the risks in their budgets.”
Italy has pushed back hard against Mr. Rehn’s findings and his refusal to grant the country an exemption that would have enabled it to spend additional billions of euros already included in its budget for next year, saying that he failed to take into account revenue from privatizations and a spending review.
Mr. Rehn dryly rebutted Mr. Letta’s “ayatollahs” comment, rejecting any suggestion he was too tough on Italy. “I trust Mr. Letta meant the negotiations on the Iranian nuclear program,” Mr. Rehn said in an interview Friday with the Finnish broadcaster Yle. “It is very important that all E.U. member states, including Italy, aim at the stability of their public finances.”
Fabrizio Saccomanni, the Italian minister of economy and finance, reiterated Friday that his country’s budget would not need to be modified to comply with the commission’s recommendations. In recent days, Spain has also said the warnings from Mr. Rehn were overdone.
The meeting of the finance ministers was part of a newly introduced process in Europe of vetting budgets of euro area members before they are approved by national parliaments.
European Union states agreed to the new system seeking to do a better job enforcing rules on deficits that were flouted during the past decade by major countries, including Germany. Those lapses were widely seen as setting a bad example to Greece and others that had far more vulnerable economies.
“For European insiders, today’s Eurogroup meeting is historic as it marks the next step of the first implementation of the euro zone’s new fiscal surveillance framework,” said Carsten Brzeski, a senior economist in Brussels for ING Bank. Even so, the commission was being “very cautious in using its newly won powers.”
Mr. Brzeski was referring to Mr. Rehn’s decision earlier this month not to require Italy, Spain or any other country to revise their budget plans.
Concerns about Italy and Spain come amid scant signs that market stability in Europe over the past year is translating into a solid and sustained economic recovery. The euro zone emerged from recession in the second quarter of this year, but growth has since been barely perceptible.
There are also growing concerns about France, which has the second-biggest economy in the euro area. The French economy contracted 0.1 percent in the July to September period, disappointing hopes for a sustained recovery just months after the country broke out of a shallow recession.
Pierre Moscovici, the French finance minister, said Friday that his country was pursuing a vigorous economic policy that would promote growth and allow France to meet an E.U.-mandated target for a budget deficit of less than 3 percent in 2015.
Mr. Moscovici also said meetings of euro area ministers needed a permanent, long-term president — rather than a part-time chairman like Mr. Dijsselbloem — as another step toward formalizing and enhancing management of the currency bloc.

“We have to improve the governance of the euro zone,” said Mr. Moscovici, who noted that the move to appoint a full-time head for the euro zone meetings already had the support of Italian and German leaders.

domingo, 22 de setembro de 2013

Austeridade: uma simples questão de bom senso, nao de capitalismo

Você aí leitor: quando não tem mais dinheiro sobrando, continua gastando sem contar, pois tem alguma tia rica para quem mandar a conta?
Pois é: contrariamente a Keynes, em Bretton Woods, os Estados Unidos se recusaram a ser a tia rica da Grã-Bretanha, no que fizeram muito bem, do contrário o capitalismo ocidental não teria conhecido as três décadas de prosperidade, dos anos 40 aos 70. O keynesianismo destruiu isso, razão da volta a políticas de austeridade, que os beócios chamam de neoliberalismo.
E contrariamente aos que recomendam mais facilidades, hoje, a Alemanha se recusa a ser a tia rica de Grécia, Portugal e outros, no que ela faz muito bem: do contrário, eles continuariam a viver acima de seus meios, como aconteceu durante muito tempo com os americanos.
O título da matéria, portanto, está errado, mas não o sentido, caro leitor, e não se trata de uma idéia perversa do capitalismo, e sim de simples bom-senso, aplicável a qualquer sistema econômico, em qualquer tempo e lugar, no setor público, ou privado, coletivamente ou individualmente.
Quem pode viver acima dos seus meios? Ninguém, nem Deus...
Paulo Roberto de Almeida

Cenário

Austeridade: a ideia poderosa que dá vida ao capitalismo

Veja, 21/09/2013

Às vésperas das eleições na Alemanha, modelo econômico defendido por Angela Merkel se mostra certeiro — apesar de doloroso; sua intensidade é colocada em xeque, mas não sua eficácia

Silhueta da chanceler alemã Angela Merkel durante uma declaração na Chancelaria em Berlim, em 2007
Angela Merkel: eleições devem consagrá-la pela terceira vez no comando do país (Hannibal Hanschke/AP/Pool)
Quando um indivíduo cheio de dívidas e inadimplente se vê forçado a reduzir seus gastos e vender bens para saldar débitos e ‘limpar o nome’, pode-se dizer que ele se torna austero – que passa a mostrar rigor e disciplina. Convertida em doutrina econômica, a austeridade talvez não tenha muito charme, mas é uma ideia poderosa. A adoção dessa doutrina é o que tem garantido que nações como Grécia e Irlanda consigam reduzir seu endividamento público para retomar, no futuro, uma trajetória de crescimento sustentável. A Alemanha é encarnação da austeridade. E a chanceler Angela Merkel, que deverá ser reconduzida ao poder neste domingo, é sua maior defensora. A provável vitória de Merkel – com o aplauso de outros países europeus – evidencia a consciência europeia de que ‘cortar na carne’, por vezes, é um mal necessário.
Apesar de se mostrar uma alternativa dolorosa, especialmente para os países guiados pelo modelo de bem-estar social, a austeridade se faz necessária para manter o mundo – onde as economias estão cada vez mais interligadas – em certo equilíbrio. Ela tem defensores e críticos eloquentes, sobretudo porque os países que implementaram os cortes para reduzir a dívida ainda não deram sinais de crescimento. O professor de Relações Internacionais da Universidade de Brown, nos Estados Unidos, Mark Blyth, em seu livro Austerity – The History of a Dangerous Idea(Austeridade – A História de uma Ideia Perigosa), cita o economista britânico John Maynard Keynes para embasar suas restrições ao modelo. “Keynes estava certo ao dizer que a austeridade é, sim, necessária. Porém, em períodos de crescimento acelerado da economia, e não quando há crise”, diz Blyth.
O surgimento - O professor de origem escocesa fez uma ampla pesquisa sobre as origens do modelo de austeridade e constatou que suas raízes estão fincadas na Grã-Bretanha do século XVII, nas mãos do filósofo John Locke, o pai do estado liberal. “Locke era um revolucionário econômico. Ele fundamentou no direito à propriedade privada toda a sua noção do que constitui uma regra legítima. Sem isso não haveria liberalismo econômico, separação entre mercado e estado e o capitalismo como o conhecemos hoje”, escreve o professor. Blyth explica que Locke foi o primeiro a atentar para o fato de que os gastos da realeza criavam uma dívida que era paga pelos impostos da população e que isso impedia os mercadores de prosperar, não importasse a ‘vontade de Deus’. “Ele era contra os ganhos do estado a todo custo e acreditava que era preciso diminuir a capacidade de o estado de extrair mais recursos da  população”, afirma o autor. A redução do papel do estado na economia é um dos principais pilares da doutrina que hoje é aplicada aos países europeus em crise.
Além de Locke, dois escoceses  tiveram papel primordial no desenho do que viria a ser a austeridade. Primeiro, o filósofo e economista David Hume, a quem o endividamento público causava repulsa. Hume era contra a emissão de dívida não só porque, para ele, se tratava de um artifício arriscado, mas também porque era politicamente hipócrita, já que permitia que governos se endividassem para agradar aos eleitores, quando, na verdade, a real necessidade era de aumento de impostos. O segundo, contemporâneo de Hume, foi Adam Smith — que não apenas criticou o endividamento público, como também encontrou uma solução para ele. “Para Smith, o dinheiro fácil conseguido por meio da rentabilidade de títulos da dívida subvertia a parcimônia, que, para ele, era o motor do crescimento e do progresso. É por isso que ele defendia que a dívida pública fosse combatida e que a austeridade, na forma de parcimônia, fosse adotada”, escreve o autor.
A prática - A doutrina só saiu do papel e foi, de fato, aplicada na década de 1930, durante a Grande Depressão que sucedeu a crise de 1929, nos Estados Unidos. Por uma década, a economia americana e se contraiu como resultado de intensos cortes de gastos e a taxa de desemprego chegou a 25%. Na segunda metade da década, o Congresso americano aprovou novos cortes, aumentou impostos e conseguiu eliminar um déficit de 5,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Como resultado, a economia recuou 11% entre 1937 e 1938. A retomada só aconteceu na década de 1940, período em que o keynesianismo ganhou força, tendo como oponente a escola austríaca, cujo principal nome foi Friedrich Hayek.
A Alemanha também foi uma das primeiras a colocar em prática a política de austeridade para tentar conter a hiperinflação e uma década de política anticíclica estimulada pelo governo. O então líder do partido de centro, Heinrich Bruning, escolhido como chanceler em 1930, implementou uma série de reformas e cortes de gastos que pegaram de surpresa uma população acostumada com o expansionismo econômico desde o final da Primeira Guerra. Para Blyth, foi essa austeridade abrupta e desmedida que permitiu a chegada ao poder do Partido Social Democrata de Adolf Hitler. “Eles eram os únicos que não defendiam a austeridade e tinham alguma chance de ganhar”, escreve o autor.
Após a Segunda Guerra, a Europa escondeu e enterrou qualquer vestígio de aperto fiscal. Parcimônia, como previa Adam Smith, foi um conceito esquecido até a chegada da crise financeira de 2008. Durante a segunda metade do século XX, países como França, Alemanha e Grã-Bretanha tiveram de ampliar o déficit fiscal para arcar com os benefícios previdenciários de uma população envelhecida. No caso da Grécia, houve outro tipo de agravante: maquiagem nas contas públicas e a entrada para a zona do euro, o que impedia o país de desvalorizar sua moeda para aumentar sua competitividade. Segundo o economista Otaviano Canuto, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e do Banco Mundial, diante do cenário pós-crise de 2008, depois que todos os erros já haviam sido cometidos, a única saída para os países – sobretudo os periféricos – era cortar gastos, estivesse Keynes de acordo ou não. “Quando o crédito bancário secou, toda uma estrutura de financiamento do consumo que estava pautada no ingresso de dinheiro deixou de existir. Diante disso, não havia outra saída a não ser passar pela austeridade. O que cabe discutir é se o processo de ajuste poderia ser menos doloroso”, afirma.
A intensidade - As críticas sobre o quão intensos foram os cortes recaem, em especial, sobre a Alemanha de Merkel. Ela foi a responsável por orquestrar, junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI), as contrapartidas que os países resgatados seriam obrigados a cumprir para receber os aportes financeiros para sanar suas contas. Com o desemprego na Grécia atingindo 27%, e na Espanha 30%, além de uma previsão de contração de 0,6% para a zona do euro em 2013, muitos economistas que outrora levantavam a bandeira da austeridade acima de todas as outras, como o pesquisador de Harvard Kenneth Rogoff, começam a questionar não o modelo, mas sua intensidade. O ponto crucial é a crença de que a política de austeridade alemã foi implementada de maneira tão truculenta nos países periféricos para que a própria Alemanha receba deles o pagamento pelos títulos públicos que detêm. “A Alemanha precisa aceitar e desistir de receber pelos títulos. Ela nunca vai conseguir receber tudo. Se a situação fosse oposta e a Alemanha fosse o devedor, a filosofia em torno da austeridade seria outra”, afirma Rogoff.
No início de 2013, Rogoff foi alvo de um bombardeio no mundo econômico (ao lado da também economista Carmen Reinhart) justamente devido ao tema da austeridade. Em janeiro de 2010, Rogoff e Reinhart produziram um estudo intitulado Crescimento em Tempos de Dívida, que afirmava que um endividamento público superior a 90% do Produto Interno Bruto (PIB) era nocivo para as economias. O texto foi amplamente utilizado pelos governantes europeus e pelo partido Republicano nos Estados Unidos para justificar políticas de aperto fiscal num ano em que o mundo ainda sofria os efeitos recessivos da crise. Mas um novo artigo publicado no início deste ano pelo economista Thomas Herndon apontava erros no estudo da dupla Rogoff e Reinhart. Assim, muitos defensores de políticas de estímulo aproveitaram o novo texto para desqualificar não só a teoria da austeridade, como também os renomados economistas. “Foi um ataque sem fundamentos e usado politicamente, cheio de omissão seletiva de informações, má interpretação e declarações falsas”, disse Rogoff ao site de VEJA.
A questão envolvendo os economistas norte-americanos evidencia o entusiasmo que o tema evoca em tempos de economia cambaleante. Em Austerity, Mark Blyth escolhe claramente um lado da discussão: ao valer-se de argumentos técnicos e históricos, mostra, de maneira até mesmo passional, que a austeridade nem sempre é o melhor caminho em momentos de crise. Contudo, recai no clichê ao afirmar que a escolha pela austeridade sempre está nas mãos de governantes que dificilmente terão suas vidas modificadas pela piora dos serviços públicos decorrente de um aperto fiscal. Assim, Blyth reduz a discussão à retórica da luta de classes. Como alternativa, sugere que a austeridade seja substituída pelo aumento de impostos. Mas não explica como, sem cortes de gastos, é possível impedir que um país minúsculo como a Grécia dê o calote em sua dívida e arraste consigo um continente inteiro, numa espiral de pânico e derretimento da economia mundial.

sábado, 30 de março de 2013

França, de 1983 a 2013: austeridade, ainda que tardia

Mars 1983 – mars 2013, une « trop longue crise »
Françoise Fressoz
Le Monde, 29 Mars 2013

Il y a trente ans, presque jour pour jour, François Mitterrand prenait le tournant de la rigueur après avoir défendu pendant deux ans une politique de relance censée changer la vie.

Jeudi, sur France 2, François Hollande n'a pas pris le tournant de la rigueur pour la simple raison que la rigueur s'est imposée à lui dès le début de son quinquennat. Il n'a pas hésité à l'engager, contrairement à son lointain prédécesseur, parce que le niveau de la dette ne permettait plus à la France de tergiverser.

Mais il a pu mesurer, comme François Mitterrand, le coût politique et social de cette politique de remise en ordre des comptes publics. Comment incarner le progrès et insuffler l'espoir quand les usines ferment, que le chômage explose, que le pouvoir d'achat baisse, que la croissance est en berne et que le déficit de la balance commerciale sanctionne un inquiétant retard de compétitivité ?

Entre mars 1983 et mars 2013, les termes du débat n'ont pas fondamentalement changé : c'est le rapport à l'Allemagne qui est posé, avec en filigrane le décrochage français, qui nourrit une sorte de désespérance et crée dans tout le pays les germes de la division.

Une partie de la gauche crie à la trahison, la droite se radicalise, le Front national réussit une percée locale. Et cette répétition, à trois décennies de distance, est une désespérance supplémentaire.

François Hollande, qui connaît bien son histoire, sent le drame se nouer. Il reconnaît que "la crise a été trop longue". Il injecte autant qu'il le peut des antidotes, se veut rassembleur pour deux et réconfortant pour trois. Il "croit en la grandeur française" et nie que "l'Allemagne soit plus forte que nous".

Il "se bat" pour la croissance et rejette farouchement le mot d'austérité, exactement comme François Mitterrand en mars 1983, mais avec un handicap supplémentaire.

A l'époque, le président socialiste avait reporté tous ses espoirs sur l'Europe qu'il s'était mis à bâtir à coups d'Acte unique et de monnaie unique. François Hollande n'a plus la chance de cette utopie.

L'Europe est l'objet d'un ressentiment croissant. Elle semble paralysée, inerte face à la montée du populisme et incapable d'assurer la prospérité. La relation franco-allemande s'est délitée au point que le président se veut le chef de file des pays du Sud qui se rebellent contre la potion allemande.

François Mitterrand rêvait de faire l'Europe de la croissance en complicité avec l'Allemagne. François Hollande se fixe pour objectif de combattre l'Europe de l'austérité en confrontation avec Angela Merkel. C'est toute la différence.

par Françoise Fressoz


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segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

A frase da semana: "A luta contra a austeridade custa dinheiro"

Ouvido do militante trotsquista Alain Krivine, fundador da Liga Comunista Internacionalista, da França, em entrevista na Radio France Info, reclamando contra a falta de dinheiro que hoje aflige o sucessor desse partido da esquerda radical, o Novo Partido Anticapitalista:

"Lutter contre l'austerité ça coûte de l'argent..."

Ironia involuntária, talvez inconsciente, do autor, sem dúvida. Os revolucionários acham que é preciso recolher muito dinheiro, antes, para poder, depois, lutar de maneira mais eficiente contra a austeridade. Pois é, essas coisas custam dinheiro, e como dizia Milton Friedman, there is no free lunch.
Como vocês vêem, é preciso gastar dinheiro para poder fazer austeridade.
É o triunfo da lógica e da coerência...
Mas não nos enganemos: o economista e Prêmio Nobel Paul Krugman pensa a mesma coisa...
Paulo Roberto de Almeida

domingo, 30 de setembro de 2012

Perguntar nao ofende: aos manifestantes da Grecia, da Espanha, de Portugal e de outros lugares....

Aos milhares de manifestantes -- OK, milhares não dá, apenas dois ou três --  que saem às ruas de Atenas, de Madri, de Roma, de Lisboa, protestando contra as políticas de austeridade, os cortes de gastos, o aumento de impostos, enfim, as políticas recessivas e ortodoxas -- exatamente aquelas políticas condenadas como insuficientes, ineficazes, ou inadequadas, ou tudo isso ao mesmo tempo, por uma presidente que adora dar lições aos outros governantes, como se estes gostassem de aplicar voluntariamente essas políticas, como se eles fossem néscios, ingênuos ou perversos --, a todos esses, ou a dois ou três, eu gostaria de perguntar o seguinte:

-- Vem cá, ô meu chapa: como é que você faz, na sua casa, quando você gasta mais do que ganha? Você pede para uma tia rica pagar o seu cartão de crédito? Você pede dinheiro emprestado ao seu banqueiro? Assim, indefinidamente? E ele empresta, bonzinho que é, com juros camaradas? Mas isso por quanto tempo? Ou você vende as jóias e o casaco de pele de madame? Vende a bicicleta das crianças? Vende o seu carro? Enfim, diminui o seu patrimônio para continuar gastando? É isso mesmo, que você faz? Assim, sem qualquer limite de valor ou de tempo?

Pois é, eu me pergunto o que essas pessoas esperam do governo que elas não praticam consigo mesmo, em relação a seus próprios ativos. Será que elas só sabem fazer contabilidade individual, ou familiar, mas não social, coletiva, estatal?
Ou será que elas pensam que o governo possui uma árvore de dinheiro, ou uma cornucópia, de onde jorra leite e mel indefinidamente?
Elas acreditam em milagres, em viver acima dos meios?

Será ingenuidade, ou estupidez, mesmo?
Enfim, não quero ofender ninguém, mas quando vejo dezenas de milhares de pessoas nas ruas protestando contra políticas de austeridade, eu me pergunto se elas se perguntaram, a si mesmas, ou aos seus representantes políticos, de onde elas acham que sai o dinheiro para todas as bondades do governo?
Quando elas fizerem o raciocínio completo, e descobrirem que, cada vez que elas pedem aos políticos que lhes dêem um "vale-isso" e mais um "vale-aquilo outro", os políticos aceitam, alegremente, e depois vão buscar nos seus bolsos, e no caixa das empresas, os recursos para fazerem essas bondades, quando elas conseguirem completar o círculo do pensamento, acho que elas vão despertar, e parar de pedir coisas ao governo e parar de manifestar também.
Tempo de trabalhar, e de não mais entregar o seu dinheiro ao governo.
Pescaram?
Ou preciso desenhar, como diria o outro?
Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 30 de setembro de 2012