Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
O que é este blog?
Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.
segunda-feira, 24 de maio de 2010
O debate sobre o racismo oficial (1) - Renato Janine Ribeiro
Sou contra o que escreve o autor, inclusive porque acredito que a politica racialista do governo conduz à criação de um Apartheid no Brasil, e considero ridícula sua assertiva de que as cotas tem prazo para acabar (segundo ele, dez anos).
Mas coloco seu artigo, para poder debater em seguida.
Sem preconceito nem ódio
Renato Janine Ribeiro
O Estado de S.Paulo, 24 de maio de 2010
Demétrio Magnoli, analisando um artigo inédito meu, pergunta o que penso do que ele chama "ensino do ódio", que consistiria em criar artificiosamente divisões raciais no Brasil, opondo, num país miscigenado, supostos descendentes puros de brancos a outros puros descendentes de escravos (13/5, A2).
Considero justo beneficiar grupos historicamente discriminados com uma ação afirmativa que reverta a tendência a continuar a discriminação. Isso vale para as mulheres, os negros, os indígenas, os pobres, para citar só algumas categorias. A ação afirmativa, nos EUA, é procedimento mais complexo do que a mera quantificação de beneficiários ? que chamamos de "cotas" ? e mudou profundamente aquele país. Vejam-se as séries de TV, sempre com negros em posição de destaque, mais que no Brasil. Veja-se o presidente dos EUA.
Apoio, por isso, a política compensatória. Se deixarmos as coisas meramente seguirem seu curso, o preconceito continuará. Mas há cuidados a tomar. Primeiro, uma política de cotas deve ter prazo de validade. Isso porque seu cerne é compensatório. É mais do que um paliativo, mas não muito. Se dermos aos afrodescendentes um bônus de dez pontos num vestibular, ajudaremos os que estão a um passo de passar na prova ? não aqueles, muito mais numerosos, que discriminados estão e assim continuarão. Tornaremos mais multicores as salas de aula, acostumaremos brancos e negros a conviver, teremos mais negros na direção da política e da economia. Isso é bom. Mas não resolveremos a discriminação como um todo.
Por isso sustentei, quando estava na Capes e participei de algumas reuniões no Ministério da Educação sobre a reforma universitária, em 2004, que as cotas não deviam durar mais que dez anos. E também que a nota de corte para os cotistas não fosse muito inferior à dos não-cotistas. Numa certa universidade, tinham entrado cotistas com um quarto da nota dos últimos não-cotistas. Esse caso é injusto, eticamente, e um desastre em termos educacionais.
Não concordo com Demétrio nem com nossa amiga comum Yvonne Maggie, autora com ele e outros do livro Divisões Perigosas, que a diferença entre brancos e negros no Brasil seja de todo artificiosa. Quem me convenceu disso foi Elio Gaspari, num artigo neste jornal há talvez dez anos, em que ele dizia que nunca, para discriminar negativamente os negros, houve grande dificuldade no País. Qualquer porteiro sabe quem ele deve mandar subir pelo elevador de serviço. A dificuldade de saber quem é negro, quem é branco começou quando se cogitou de discriminar a favor ? afirmava ele. É por isso que me parecem legítimas as ações afirmativas. Mas só com prazo máximo no tempo e distância justificada nas notas de corte, em torno de 10%, penso eu.
Por que as limitações? Por duas razões. A primeira é que, se é legítimo discriminar afirmativamente quem antes o foi negativamente, caso essa política se perpetue, forçará a criação de grupos ditos raciais, antagônicos entre si ? ou seja, se essas políticas forem radicais, Demétrio e Yvonne acabarão tendo razão e se construirão identidades artificiais, divisões, sim, "perigosas" num país que, afinal, é bastante miscigenado.
A segunda é que, curiosamente ao contrário do que Demétrio parece me atribuir, sou frontalmente contra qualquer exacerbação de identidades. O que acho mais positivo em nosso tempo é termos a liberdade, cada um de nós, de assumir identidades contraditórias e até mesmo provisórias. Antigamente, alguém da classe média paulista, com chance de educação superior, estudaria Direito, Medicina ou Engenharia, casar-se-ia e teria filhos, seria católico e apoiaria, digamos, o Partido Republicano Paulista. Hoje, uma pessoa nessa condição pode fazer cursos bem diferentes, ter filhos ou não, ser heterossexual ou homossexual, pertencer ao partido e à religião que quiser, até ser ateu... Isso é admirável. Nunca tivemos tanta liberdade. Ela traz riscos, porque deixa as pessoas inseguras. Viver na contradição é difícil, mas é mais verdadeiro do que se tornar, cada pessoa, um parque temático. Permite uma realização pessoal maior. Uma das iniciativas que tentei nessa direção foi um projeto de graduação interdisciplinar em Humanidades proposto na USP, que não foi aprovado na universidade, mas tem inspirado projetos de bacharelado interdisciplinar bem-sucedidos em outros Estados. Era um curso que contestava justamente a ideia de identidade.
Por isso mesmo, embora eu aprove o espírito e mesmo a letra de várias medidas preconizadas no Estatuto da Igualdade Racial ? na verdade, um projeto que em 70 artigos mencionava a palavra "negro" ou "negra" 79 vezes, subestimando assim outras etnias ?, não acho conveniente uma lei específica que repete o que já está em outras ou exige políticas direcionadas só para uma parte da população, preconizando, por exemplo, "a redução de mortes violentas entre jovens negros". Por que não a redução de mortes violentas entre todos os jovens? Perdemos todos quando se perde o sentido universal que devem ter, como regra, as políticas sociais. Por outras razões, sou um pouco cético quando o estatuto manda ensinar História Africana: nosso ensino básico é tão deficiente que seria melhor reforçar o conhecimento das duas linguagens básicas, o Português e a Matemática, como plataforma para estudar as demais ciências, antes de impor novos conteúdos a professores e alunos.
Finalmente: o meu texto que Demétrio Magnoli analisou não foi publicado. Apresentei-o num colóquio entre pesquisadores brasileiros e britânicos das ciências humanas, fruto de acordo que assinei, em nome da Capes, com a British Academy, que é a equivalente da Royal Society para as ciências humanas e sociais. Os papers deveriam ter sido editados em português e inglês, internacionalizando mais a pesquisa brasileira em humanas e abrindo uma rotina de encontros nossos com os britânicos. Infelizmente, o acordo não teve continuidade. Fico contente que pelo menos um dos artigos então apresentados tenha saído da gaveta, graças à crítica de Magnoli.
PROFESSOR TITULAR DE ÉTICA E FILOSOFIA POLÍTICA DA USP
Europeus vivem melhor do que americanos, certo?
Os brasileiros, sempre tão prontos a copiarem idéias erradas, acham (principalmente os sindicalistas) que devemos adotar os métodos e estilos de vida europeus, e não os americanos, pois os primeiros seriam mais "humanos", ou mais "civilizados", e os segundos seriam mais "selvagens", mais capitalistas, enfim.
Como diriam alguns, no longer...
Os europeus começam a enfrentar as consequências de suas políticas generosas: mais desemprego, mais dívida pública, perspectivas sombrias pela frente.
Acho que eles precisariam trabalhar mais e se queixar menos.
Eu também acho que a Europa é mais "agradável" do que os EUA, mas se os europeus quiserem aguentar o seu estilo, vão precisar pensar rápido em como aumentar sua produtividade no trabalho, do contrário vão enfrentar problemas muito em breve (aliás, já estão enfrentando).
Abaixo, por especialistas, um artigo que evidencia que a legislação rígida de trabalho (justamente aquela que temos no Brasil e que ainda queremos ampliar) está contribuindo para maior desemprego e baixa produtividade.
Work and Leisure in the U. S. and Europe: Why so Different?
Alberto Alesina
Edward Glaeser
Bruce Sacerdote
IDEAS, Department of Economics, University of Connecticut
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Abstract:
Americans average 25. 1 working hours per person in working age per week, but the Germans average 18. 6 hours. The average American works 46. 2 weeks per year, while the French average 40 weeks per year. Why do western Europeans work so much less than Americans? Recent work argues that these differences result from higher European tax rates, but the vast empirical labor supply literature suggests that tax rates can explain only a small amount of the differences in hours between the U. S. and Europe. Another popular view is that these differences are explained by long-standing European “culture,” but Europeans worked more than Americans as late as the 1960s. In this paper, we argue that European labor market regulations, advocated by unions in declining European industries who argued “work less, work all” explain the bulk of the difference between the U. S. and Europe. These policies do not seem to have increased employment, but they may have had a more society-wide influence on leisure patterns because of a social multiplier where the returns to leisure increase as more people are taking longer vacations.
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Sindicatos e ecologistas sao a favor do desemprego
No Brasil, como em outros países -- nem preciso falar da França, especialista nesse tipo de bobagem sindical -- eles estão ativos tentando nos fazer acreditar que a redução das horas de trabalho vai criar mais emprego e tornar a vida de todos melhor. Estão errados, obviamente, e o que vai ocorrer é o contrário.
Mas, eles não estão sozinhos. Os verdes, esses românticos especialistas em salvar minhocas (deles mesmos), também partilham algumas das monumentais bobagens econômicas dos sindicalistas.
Nosso jovem economista de Chicago desmantela esses mitos, com a ajuda de algumas simples ilustrações...
Simple pictures against bad ideas
Tino Sanandaji *
Super-Economy
Kurdish-Swedish perspectives on the American Economy.
Monday, May 17, 2010
The Green Party is doing exceptionally well in Sweden right now. Educated voters, especially women, like their mix of environmentalism, social liberalism and perceived economic centrism.
Unfortunately and despite their rhetoric, the Green Party has a lot of bad economic ideas. One in particular is work sharing, a government regulation that forces everyone to work as standard no more than 35-hours per week. Their idea is that if you force people to work fewer hours, there will be more job for others.
The consensus belief among academic economists is that work sharing does not work.
Unemployment does not arise because there are too many people. It is because there is some imperfection in the market (either policy induces or due to market failure) that causes the market to generally not be able to match jobs to people.
We have to remember that normally in functioning economies, there are very strong forces that create jobs for everyone who wants to work. To illustrate this for non-economists, please allow me to put up a graph with a high "duh" factor (but which really is quite important).
This is the relationship between number of working age adults in 2007 and number of jobs in 2007, for the OECD countries. Source is as usual OECD.
The correlation between potential workers and jobs in the OECD is 0.99!
I have also done the same plot without the U.S and Japan so you can see the individual countries better.
To an economist this is trivial, and just says that there is no connection between employment rate and country size among the OECD countries. But savor the pictures for a moment. They have a profound implication. It means that there are extremely powerful forces in market economies that create jobs for ordinary people, no matter how many people we have, and regardless of if we can perfectly understand these forces.
It is not easy to describe this magic when people demand "where will jobs come from?". You may even sound naive if you say that "the market will take care of it", and refer to history or to the graph above. But in this case what sounds naive is in fact the most profound answer. Empirically, we can observe that the market does seem to take care of creating jobs.
The problems that cause unemployment is never the number of people, it is things like the skill composition combined with wage rigidity, cyclical demand conditions, search friction, taxes and regulations, and market imperfections. None of the core economic forces that create unemployment is affected by permanent work sharing for all workers.
Let me also look at this a little more directly. Here is average hours worked for workers and the unemployment rate, again for OECD, and again for 2007.
There is no statistically significant relationship between the typical workday and unemployment rate (p value 0.52). Countries that have reduces the average hours worked have not been able to achieve lower unemployment rate. Now, correlation is not always causation. Maybe the unemployment rate in France would have been even higher if they worked more hours. But I strongly doubt it.
Work sharing is guaranteed to harm the economy, by making everyone earn less and by dramatically lowering tax revenue for health care etc. Meanwhile there is no evidence that it reduces the unemployment rate, and strong suggestive evidence that indicates that it has no effect.
If people choice to work less, great! But legislation to shorten the workweek like the Greens in Sweden propose to do is very bad economic policy.
* Tino Sanandaji is a 29 year old PhD student in Public Policy at the University of Chicago, and the Chief Economist of the free-market think tank Captus.
Desconstruindo mitos economicos: Joseph Stigltiz e a luta contra o "neoliberalismo"
Bem, eles ficariam encantados com esse "velho" professor de economia que resolveu, justamente, desancar a globalização e o neoliberalismo imaginário, exercendo toda a sua cota política para falar bobagens.
No limite, não se trata apenas de bonagens econômicas, mas de desonestidade intelectual.
Vejamos este artigo atacando um de seus livros mais recentes...
Paulo Roberto de Almeida
The Invention of Pop Economics
Guy Sorman
The City Journal, 26 March 2010
Joseph Stiglitz should win a second Nobel Prize, this time for fiction.
Freefall: America, Free Markets, and the Sinking of the World Economy
by Joseph E. Stiglitz (Norton, 361 pp., $27.95)
Joseph Stiglitz, Nobel Prize winner in economics, has created a new literary genre—call it pop economics. In his new book, Freefall, he narrates the 2008 financial crisis as a struggle to the end between good and evil. The forces of evil are greedy Wall Street bankers who try to impose not just on the U.S. but on the world the satanic ideology of “market fundamentalism.” Their god is Milton Friedman and their chief propagandist is George W. Bush.
Scholars usually consider economics a complex field: not Stiglitz. Scorning details and nuance, he doesn’t hesitate to distort the facts to prove his point. On one page, he writes that the real-estate market crumbled because new owners could obtain 100 percent mortgage credit, putting nothing down; on the next page, he commiserates with the “millions of home owners who have lost the savings of their life” when they could not repay their loans. But they had no savings to start with, as Stiglitz has just explained!
Economists disagree among themselves, of course, but Stiglitz goes beyond mere disagreement. He raves against all free-market economists because they failed to predict the recession. But economists don’t tend to make predictions; prophets and media pundits do. Most economists consider making predictions an expression of the “fatal conceit” that Hayek warned against. Scholarly economists tend to express their disagreements by opposing one theory against another, using facts, figures, and statistics—reality, in other words. Stiglitz hovers above these vulgar debates. He is guided only by his own strong opinions and personal experiences, reminding the skeptical reader (if any will read him) that he has travelled everywhere, seen everything, and occupied very important positions at the World Bank.
Stiglitz makes bizarre recommendations: the U.S. should look to the example of Trinidad, which tends to the well-being of its people without becoming obsessed by the quantitative measure of its GDP. He praises Ethiopia, one of the poorest countries on earth, for its new freeways, which he hopes will inspire public infrastructure programs in the United States.
Stiglitz must be seeking popularity with a left-leaning audience. One can hardly find any other rationale for the book. Freefall is of no help in understanding the origins of the current crisis or in determining how to remedy it. When Stiglitz attacks market fundamentalism as the cause of all evil, he does not stop to consider how such a regime led the world into unprecedented economic growth from 1983 to 2008. He overlooks the 2007 oil and commodity price spikes, which may have started the recession. Most free-market economists today perceive the 2008 financial crisis as a consequence of the recession and not the cause of it. Inflated real-estate prices, and the financial derivatives based on them, made the crisis global and severe. But such complexity would not fit with Stiglitz’s black-and-white plot. To build his case, such as it is, he mixes up causes and consequences. When he lays responsibility for the 2008 crash on “deregulators,” he fails to explain why some heavily regulated banks had to be bailed out, while others were able to evaluate their financial risk responsibly and avoid bankruptcy. Perhaps some were better managed than others? Stiglitz shows no interest in such mundane considerations. Some regulated banks did not take excessive risks; others did and had to be bailed out
Markets are highly imperfect, free-market economists agree, and some regulation is necessary, but Stiglitz makes no distinction between good and bad regulation. All regulation, in his pop economics, is good by definition, while all deregulation is evil. No proofs are needed.
Lehman Brothers was undoubtedly a poorly managed, probably unethical, and possibly lawless company. None of that justifies Stiglitz’s outlandish contention that “the fall of Lehman Brothers on September 15, 2008, is the equivalent of the Fall of the Berlin Wall: the end of market fundamentalism after the end of communism.” How dare Stiglitz write that Eastern Europeans have been the victims of the Washington consensus imposed by market fundamentalists, when the free market has drawn Eastern Europe out of poverty? How does he explain Poland, the most free-market country in Europe and one not dramatically affected by the crisis?
Stiglitz feels compelled to remind the reader that he is not a socialist: he only advocates a better world. His utopia would replace the failed market fundamentalism by striking the right balance between market and state. What would such an arrangement look like? Stiglitz doesn’t elaborate, but he hints repeatedly that the world would be a better and more ethical place if he were in charge. For those who already fear the Obama administration’s anti-market bias, think how much worse it could be: Stiglitz could be working there! We better keep him writing fiction and basking in the cheers of Greek audiences, to whom he recommends that their country not repay its debt.
One receives the Nobel Prize in economics for research in a specific area, Milton Friedman used to say, but prize winners then tend to believe that they’ve been implicitly granted the right to express their personal, nonscientific opinions about everything. Stiglitz’s Nobel Prize on market asymmetry was well deserved. His opinions on everything else are just opinions and deserve to be treated as such.
Guy Sorman, a City Journal contributing editor, is the author of numerous books, including Economics Does Not Lie.
Desconstruindo mitos economicos: Paul Krugman e a falsa analogia do Japao com os EUA
O artigo abaixo critica as posições de Krugman e não se refere exatamente ao artigo transcrito no meu post imediatamente precedente. Mas os problemas são os mesmos.
Paulo Roberto de Almeida
Japan's problem is supply, not demand
Tino Sanandaji *
Blog Super-Economy
Kurdish-Swedish perspectives on the American Economy.
Sunday, May 23, 2010
Paul Krugman wrote in the NYT that we are talking too much about Greece: "Despite a chorus of voices claiming otherwise, we aren’t Greece. We are, however, looking more and more like Japan."
According to Krugman the U.S risks ending up like Japan, because of "policy makers... doing too little".
First the cheap shot. A year ago, Krugman wrote "Well, I’m sure I’m not the only person to notice this: Japan doesn’t look so bad these days."
Does the U.S risk becoming a new Japan if we don't pursue even more Keynesian spending and borrowing policies?
Let's first look at the lost decade, 1991-2000. When the rest of the world was having rapid, IT-fueled growth, Japan was stagnating. Here are the growth rates in real GDP between 1991-2000:
For all the nice years Japan had 9.6% growth compared to 38.7% for the U.S and 22.7% for the EU.15. The U.S grew by an average of 3.7% per year, Japan only 1.0% per year.
But as most of you know Japan is undergoing a rapid demographic transition. The country was and is aging. Because the old and children cannot work, when we want to compare countries with very different demographic characteristics instead of calculating GDP per capita, it makes sense to calculate GDP per working age adult (people aged 15-65).
Whereas the number of potential workers in the U.S increased by 13% during Japans "lost decade" (1991-2000), and by 3% in for example France, the Japanese potential workforce actually shrank during these years. Adjusting for this, the growth in Japan was 9.8%, compared to 16.9% in Germany, 17.3% in France, 16.3% in Italy and 23.2% in the United States. The U.S grew by twice, not four times of Japan (remember that these were the best years of the U.S and the worst years of Japan).
The importance of the demographic transformation in Japan is even more clear if we include the entire 1990-2007 period.
In non-population adjusted figures, Japan's real GDP grew by 26% in total these years, the lowest in the OECD. In comparison the figures are 63% for the U.S and 44% for the EU.15.
But during this period the U.S saw it's potential labor force (the number of people between 15-65) increase by 23% and the EU.15 by 11%, while Japan had a decrease of 4%.
Between 1990-2007, GDP per working age adult increased by 31.8% in the United States, by 29.6% in EU.15 and by 31.0% in Japan. The figures are nearly identical!
Japan has simply not been growing slower than other advanced countries once we adjust for demographic change.
Also notice Italy (who does better than we think) and Ireland (who does worse, much of the growth was due to their young population).
Nor did productivity grow any slower in Japan than Europe.
Someone could ask why Japan did not outgrow the U.S, since they started at a lower level, or why the old Japanese don't work more to keep up income. But there has really been no dramatic change in institutions during this period, and thus little reason to expect Japan to catch up with the U.S. Japan is already as rich as Europe, so there is no catching up there. And at any case, there is nothing Keynesian deficit policies can do about a shrinking workforce.
Next, to Krugman's point that the problem is "policy makers... doing too little" (by which he means spending too little). Japan has been running Krugman-Obama sized deficits averaging about 5% of GDP for a decade and a half.
Here is their national debt as a share of GDP. Europe 4 are Germany, U.K, France and Italy.
Clearly, it did not work. Krugman is simply dogmatic when he claims that Japan's policy of massive deficits failed because the deficits were not large enough(!). What if someone wrote that the deregulation of the American financial markets did not work just because they did not go far enough? Would Krugman accept this line of reasoning?
Krugman is obsessed with demand, and ignores the (usually) far more important factor, which is supply.
Does the U.S. risk being the next Japan? Probably not, since the American workforce is growing. And at any case adjusting for population Japan has simply not been doing that badly in growth terms. Their problem now is their debt, which they have thanks to Keynesian policies.
Capacity utilization is high in Japan, including a low unemployment rate. Stimulating Demand just won't do it when the problem is supply. If Japan wants growth they have to go for supply factors, including hours worked.
* Tino Sanandaji is a 29 year old PhD student in Public Policy at the University of Chicago, and the Chief Economist of the free-market think tank Captus.
Desconstruindo alguns mitos: Premios Nobel de economia tambem dizem bobagens
Isso acontece mais frequentemente com economistas e literatos, que, depois de ganharem um Prêmio Nobel, se acham no direito, e até no dever, de escreverem e falarem sobre qualquer coisa, mesmo as mais improváveis, e aquelas coisas que, segundo o Peter principle, se situam no limite ou além de sua capacidade.
Saramago é um exemplo típico: já falava bobagem antes, mas com o Prêmio Nobel passou a falar muito mais bobagens, em quantidades industriais.
Economistas são outra espécie: ganham o prêmio por suas pesquisas e inovações juvenis na ciência econômica, geralmente alguma nova "lei" ou equação complicada que "explica" (assim dizem) alguma relação complexa no mundo real: eles simplificam um pouco a coisa, metem tudo dentro de uma regressão linear, e zut, voilà, extraem uma fórmula mágica que parece explicar a realidade durante certo tempo (não importa se mais adiante ela deixa de funcionar, mas o ato os deixa famosos por alguns anos).
Eles passam então a agir como políticos, personalidades públicas que se permitem opinar sobre tudo, abandonando a pesquisa e até o bom senso econômico.
Paul Krugman é um desses, que levou seu militantismo "liberal" (no sentido americano, isto é, social-democrata, o que lá é considerado esquerdista, até um xingamento) aos limites da irracionalidade econômica (deveria talvez devolver o Prêmio Nobel.
Joseph Stiglitz é outro, que levou o seu combate contra o FMI aos limites das bobagens fiscais keynesianas.
Nos dois posts seguintes, com a ajuda de especialistas, vou tentar desmantelar essas duas vacas sagradas da economia.
Mas, antes vou postar um artigo de Krugman, justamente criticado no post seguinte.
Reparem que tudo o que ele diz não tem o mínimo apoio em demonstrações econômicas. É política pura. Seria reprovado num exame de primeiro semestre de Economics 101.
ANÁLISE
EUA não são a Grécia, mas podem virar um Japão
PAUL KRUGMAN - DO "NEW YORK TIMES"
Folha de S.Paulo, 22.05.2010
Deflação sugere que país pode estar a caminho de uma década perdida em estilo japonês, aprisionado em uma era longa de desemprego elevado e crescimento lento
A despeito do coral que alega o contrário, não somos a Grécia. Mas estamos cada vez mais parecidos com o Japão.
Nos últimos meses, boa parte dos comentários sobre a economia vem repetindo um tema central: as autoridades econômicas estão fazendo demais. Os governos precisam parar de gastar, é o que nos dizem.
A Grécia é usada como exemplo cautelar, e cada pequena alta nos juros que incidem sobre os títulos do Tesouro norte-americano é tratada como indicação de que os mercados estão se voltando contra os EUA devido aos nossos deficit.
Enquanto isso, há alertas contínuos de que a inflação está a caminho e que o Federal Reserve (Fed, o BC dos EUA) precisa recuar em seus esforços de apoiar a economia e dar início à chamada "estratégia de saída", apertando o crédito por meio da venda de ativos e elevação das taxas de juros.
E quanto ao desemprego quase recorde, com um dos piores índices de longa duração desde os anos 30? E quanto ao fato de que os avanços no emprego dos últimos meses, ainda que bem-vindos, até o momento recuperaram menos de 500 mil dos 8 milhões ou mais de empregos perdidos depois da crise financeira? Ah, preocupar-se com os desempregados é tão 2009...
Mas a verdade é que as autoridades econômicas não estão fazendo demais; estão fazendo menos do que deveriam.
Dados recentes não sugerem que os EUA estejam se encaminhando a um colapso da confiança dos investidores, em estilo grego. Em lugar disso, sugerem que podemos estar a caminho de uma década perdida em estilo japonês, aprisionados em uma era longa de desemprego elevado e crescimento lento.
Juros
Falemos primeiro sobre as taxas de juros. Em diversas ocasiões, ao longo dos 12 últimos meses, fomos informados, depois de alguma alta modesta nos juros, de que o mercado estava começando a reagir e que os EUA precisavam reduzir seu deficit imediatamente ou sofreriam as consequências.
Mais recentemente, muito se falou sobre a alta nos juros dos títulos de dez anos do Tesouro norte-americano, de 3,6% para quase 4%. "Medo quanto à dívida causa alta dos juros" foi a manchete do "Wall Street Journal", embora não existisse indício real de que o medo quanto à dívida fosse responsável pela alta.
Desde então, os juros recuaram para abaixo da marca que mantinham antes da alta mais recente. Na quinta-feira, os juros sobre os títulos de dez anos eram de 3,3%.
Eu gostaria de dizer que a queda nos juros reflete otimismo quanto às finanças federais americanas. Mas o que ela reflete é uma alta no pessimismo quanto às perspectivas de recuperação econômica, um pessimismo que fez os investidores fugirem de qualquer coisa que possa ser considerada arriscada -o que explica a queda no mercado de ações- e optassem pela segurança de uma aposta nos títulos de dívida pública norte-americana.
Europa
O que justifica esse novo pessimismo? Em parte ele reflete os problemas da Europa, que se relacionam menos do que temos ouvido às dívidas dos governos. Os líderes europeus impuseram uma moeda única a economias que não estavam preparadas para essa mudança.
Mas também houve sinais de alerta em casa, o mais recente dos quais no relatório da quarta-feira sobre os preços ao consumidor, que mostrava um indicador crucial de inflação em queda para menos de 1%, sua marca mais baixa em 44 anos.
Isso não deveria surpreender, na verdade: a expectativa é que a inflação caia diante de desemprego em massa e capacidade produtiva excedente. Mas é uma má notícia ainda assim.
Inflação baixa, ou pior, deflação, tende a perpetuar as crises econômicas, porque encoraja as pessoas a acumular dinheiro em lugar de gastar, o que mantém a economia deprimida e conduz a mais deflação.
O círculo vicioso que descrevi não é hipotético: pergunte aos japoneses, que entraram em uma armadilha deflacionária nos anos 90 da qual, a despeito de episódios ocasionais de crescimento, ainda não conseguiram sair. A mesma coisa poderia acontecer nos EUA.
Por isso, o que deveríamos estar realmente perguntando agora não é se vamos nos transformar na Grécia. Em lugar disso, deveríamos estar perguntando que medidas estão sendo tomadas para evitar que nos transformemos no Japão. E a resposta é: nenhuma.
Instinto de aperto
Não que é o risco não seja compreendido. Suspeito fortemente de que alguns dos dirigentes do Fed percebam com clareza o paralelo com o Japão e desejem fazer mais em apoio à economia.
Mas, na prática, tudo que podem fazer é conter o instinto de aperto monetário de seus colegas, os quais (como os dirigentes dos bancos centrais na década de 30) continuam a temer desesperadamente a inflação, a despeito da ausência de qualquer indício de alta de preço.
Suspeito, também, que os economistas do governo Obama gostariam muito de ver um novo plano de estímulo. Mas sabem que um plano como esse não teria chance de aprovação em um Congresso que foi levado ao medo pelas palavras da linha dura quanto ao deficit.
Em resumo, o medo de ameaças imaginárias impediu qualquer resposta efetiva ao verdadeiro perigo que nossa economia está correndo.
O pior vai acontecer? Não necessariamente. Talvez as medidas econômicas já adotadas bastem para realizar a tarefa e dar impulso a uma recuperação capaz de se sustentar sem ajuda. Com certeza é isso o que todos nós esperamos. Mas esperança não é plano.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
Politica Fiscal: mexer na Previdencia e no gasto publico - Arminio Fraga
SAMANTHA LIMA - DO RIO
Folha de S. Paulo, 23/05/10
Armínio Fraga, entrevista: "Sem mexer na Previdência, país terá crise no futuro"
O ECONOMISTA, QUE PRESIDIU O BC ENTRE 1999 E 2002, DIZ QUE EDUCAÇÃO DEVE SER PRIORIZADA
Presidente do Banco Central entre 1999 e 2002, sócio da Gávea Investimentos, o economista Armínio Fraga, 52, afirma que, se o próximo governo não enfrentar uma reforma na Previdência, permitirá criar a base para uma nova crise no futuro. Fraga defende a imposição de limite ao endividamento do governo e diz que o Brasil, hoje, é obrigado a desacelerar o crescimento porque, além de investir pouco, deixou de cuidar da educação. Leia os principais trechos da entrevista.
Folha - O Brasil levou 40 anos para voltar a crescer ao ritmo do Milagre Econômico [de 1968 a 1973]. Agora, temos que desacelerar para não gerar inflação. O que faltou?
Armínio Fraga - Investir mais e educar melhor. Não há país bem-sucedido que não tenha feito esforço importante na educação ou que tenha se desenvolvido só com recursos naturais.
Está claro onde temos que trabalhar para que a economia sustente um ritmo maior de expansão, principalmente em infraestrutura. Há investimentos estrangeiros previstos no Brasil em energia, mineração, recursos naturais. A tendência é duradoura ou apenas moda?
AF - Os estrangeiros estão entusiasmados porque temos passado pelas crises melhor do que o nosso histórico. Tem oportunidade na China, na Índia, no Leste Europeu. Mas somos o mais ocidental dos emergentes, é mais fácil. Às vezes o entusiasmo é excessivo. Não sou pessimista, mas não podemos relaxar. Caminhamos para um deficit em conta-corrente maior, os juros são altos.
Quando fala de juros, o sr. vê como resultado da estrutura de dívida e gasto público, e não da atuação do BC, não é?
AF - Exatamente, o juro que o BC controla sobe por questões estruturais. No longo prazo, o trabalho do BC tem ajudado a reduzir a taxa porque reduz a incerteza sobre o país. Temos uma história ruim, pressões fiscais. Isso vai exigir um esforço de natureza estrutural.
Os dois candidatos à presidência mais bem colocados nas pesquisas criticam ou já criticaram a política monetária. O que podemos esperar?
AF - Não vejo nenhum político conectado com a realidade disposto a se arriscar deixando a inflação subir. As pessoas sabem que inflação corrói o dinheiro, e os pobres perdem mais.
O sr. vê ameaça à atuação do BC no futuro?
AF - Fala-se em aventura nessa área, em função de declarações dos candidatos. Mas se referem a circunstâncias extremas, e não ao dia a dia do BC. O BC não tem independência formal, mas temos autonomia operacional. Eu aposto que isso continuará.
Que pergunta o sr. faria ao futuro presidente?
AF - É uma pergunta antipática, que cabe a todas as lideranças do mundo: “Qual é sua visão de um futuro fiscal tranquilo para o país?”.
Qual é o problema mais urgente a ser resolvido, na área macroeconômica?
AF - O crescimento do gasto público.
E qual reforma institucional relativa à área econômica deve ser tocada no início do próximo governo?
AF - Reforçar a Lei de Responsabilidade Fiscal, impondo limite à dívida pública federal, e incorporar a discussão da previdência.
No caso da previdência, o sr. acha que algo mudou?
AF - Não, com tendência de piorar, se o fim do fator previdenciário não for vetado. É um tema difícil para um político, e não só no Brasil. O presidente Fernando Henrique avançou, mas pouco porque a oposição fez críticas agressivas. O envelhecimento da população dos principais países é uma questão gravíssima e não vem sendo discutida de forma razoável.
A previdência pode gerar crises no futuro?
AF - Pode, sim. Lá fora já se vê reação. Os governos da Alemanha e da França já discutem isso. A Europa levou uma sacudida de confiança nunca imaginada, mas vai reagir positivamente.
A crise da zona do euro pode ser debelada antes que extrapole para outras regiões?
AF - Há riscos para nossa economia porque a Europa é o maior mercado de nossas exportações. Temos deficit em conta-corrente, e isso pode dificultar o financiamento.
Com gastos do governo em alta, o BC está sobrecarregado no controle da inflação?
AF - O acompanhamento do BC é um trabalho minucioso. Chegou a hora de dar uma segurada, e por isso subiram os juros para 9,5%. O anúncio do corte de gastos pelo governo é positivo porque alivia a inflação.
SAIBA MAIS
Fraga administra R$ 10 bilhões em investimentos
Criada por Armínio Fraga em 2003, quando deixou o comando do Banco Central, a gestora de recursos Gávea Investimentos tem sido alvo de recentes rumores envolvendo uma possível venda de seu controle.
O comprador seria a gestora de recursos norte-americana Highbridge. Questionado, Fraga diz que não pode comentar o assunto.
A Gávea tem R$ 10 bilhões sob sua administração, em fundos de investimentos e de participações em empresas, como a cadeia brasileira do McDonald’s, a Aliansce (participações em shoppings) e a Azul Linhas Aéreas.
Na avaliação de Fraga, os setores mais promissores para investimentos no Brasil são o de petróleo, o agronegócio e o de infraestrutura. “Aqueles ligados ao consumo também têm boas oportunidades. Difícil imaginar uma área desinteressante”, afirma.
Apesar do histórico de sucesso, a Gávea traz pelo menos um mau investimento no currículo: a BRA, empresa aérea em recuperação judicial desde 2007.
Fraga afirma que não pensa em deixar a Gávea e que não foi sondado para integrar equipe econômica no próximo governo. Mas que, no futuro, gostaria de voltar. “Se acharem que posso.”
Festival de gastanca em Brasilia: um baile (da ilha) fiscal permanente
O Brasil vai pagar muito caro pela irresponsabilidade atual na condução da política fiscal (que de fiscal nãoo tem nada, e de política, menos ainda).
Um corte de mentirinha
Editorial O Estado de S.Paulo
23 de maio de 2010
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou um corte de mais R$ 10 bilhões nos gastos federais deste ano, a imprensa noticiou e muita gente acreditou. Antes dele, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, havia falado em redução de despesas para moderar o ritmo de crescimento e conter as pressões inflacionárias. Mas era uma brincadeira de 1.º de abril com mais de um mês de atraso. Não há corte nenhum. Há só um ajuste do gasto programado à nova estimativa de receita. É uma exigência da Lei de Responsabilidade Fiscal, como explica o Ministério do Planejamento no Relatório de Avaliação do Segundo Bimestre.
Verificada a arrecadação até o fim de abril, os técnicos fizeram uma nova projeção de receita para o ano. O cálculo foi baseado numa estimativa de crescimento econômico de 5,5% e de inflação também de 5,5%. O resultado foi uma redução de R$ 9,39 bilhões na receita primária esperada para 2010, excetuada a contribuição para o Regime Geral da Previdência. Descontada a transferência obrigatória a Estados e municípios, sobram R$ 9,24 bilhões.
O passo seguinte foi o ajuste exigido por lei. Programou-se um corte de R$ 7,61 bilhões nas despesas discricionárias. Uma redução adicional (e meramente contábil) de R$ 2,43 bilhões foi obtida com a reestimativa dos gastos obrigatórios, excetuados os benefícios previdenciários. Está aí a diminuição de R$ 10 bilhões prometida pelo ministro Guido Mantega.
Não era séria a promessa de seriedade. Na semana passada, até os críticos do governo tomaram como boa a declaração dos ministros a respeito da contenção de gastos. Vários economistas julgaram insuficiente o congelamento de R$ 10 bilhões, mas ninguém pôs em dúvida a palavra das autoridades. Parte-se do pressuposto de que o governo não se arrisca a perder a própria confiabilidade.
Mas esse não é todo o problema. Por que o governo elevou sua estimativa de crescimento de 5,2% para 5,5%, apenas, quando a maioria das projeções do setor privado indica uma expansão na faixa entre 6% e 7%?
O ministro Guido Mantega deve ter-se esquecido de contar sua nova história ao secretário da Receita, Otacílio Cartaxo. O secretário anunciou há poucos dias que a arrecadação do mês passado foi de R$ 70,9 bilhões, 16,7% maior que a de um ano antes e a mais alta para um mês de abril. Além disso, ele prognosticou uma sequência de recordes.
A arrecadação de R$ 259,2 bilhões no quadrimestre - também um recorde - resultou, segundo Cartaxo, do aumento dos salários e do consumo, da elevação da lucratividade das empresas e também da inflação mais acelerada.
No cenário considerado pelo pessoal da Receita, disse Cartaxo, a economia crescerá 6% em 2010, impulsionando a arrecadação. Em sua fala otimista, ele chegou a propor um aumento da meta de superávit primário, fixada em 3,3% do PIB. Mas não compete à Receita, ressalvou, analisar a política fiscal.
Com a ressalva ele demonstrou disciplina funcional, mas não desmentiu sua visão otimista do crescimento econômico e da arrecadação. Essa visão coincide com boa parte das projeções de especialistas independentes e é compatível com a linguagem usada há poucos dias pelo ministro da Fazenda.
O governo, disse na semana passada o ministro, agiria para evitar um crescimento superior a 7%. Esse risco, segundo o novo relatório de avaliação bimestral, parece ter sido logo descartado pelas autoridades econômicas.
Ainda há poucos dias, o ministro Guido Mantega disse haver recebido do presidente Lula o aval necessário a uma contenção de gastos. A informação parecia fazer sentido: a economia ainda cresceria de forma satisfatória e o governo poderia mostrar ao público uma novidade - um ajuste fiscal para conter a inflação.
Mas essa história parece agora estranha. O ministro não precisaria de aprovação para um mero acerto periódico exigido pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Outra versão é muito mais crível: a cúpula do governo decidiu continuar gastando - porque a receita continuará crescendo - e nada fazer para limitar a expansão da economia num ano de eleição.
O Banco Central continuará sozinho no combate à inflação.
domingo, 23 de maio de 2010
Republica Sindical do Brasil: avancando, sempre... (claro, com o seu, com o meu, com o nosso dinheiro)
A matéria abaixo é, digamos assim, apenas instrutiva, sobre a máquina de extração de dinheiro criada por uma legislação permissiva, a esperteza de muitos e a licensiosidade, se me permito dizer, de quem nos governa atualmente.
Sob risco de despertar a ira de alguns (o que pouco me importa, na verdade), vou ser bem claro no que vou dizer agora:
Sindicatos são máquinas de criar desemprego e de enterrar empresas produtivas.
Nas condições institucionais do Brasil, eles têm um papel essencialmente negativo na economia nacional, contribuindo, com todo o seu poder extrativo, para afundar as possibilidades de aumento da produtividade, crescimento econômico e prosperidade geral, pois que se dedicam apenas a redistribuir a riqueza criada por trabalhadores (em grande medida não sindicalizados) e empresários (muitas vezes sindicalizados em outros aparelhos cuja única função é arrancar dinheiro do Estado, ou seja, de todos nós).
As duas vertentes sindicais, patronais e de trabalhadores, têm muito a ver com a cultura da máfia, ou seja, uma entidade dedicada apenas a extrair dinheiro de clientes (que somos todos, como consumidores ou contribuintes compulsórios).
O Brasil se afunda lentamente na decadência.
Não foi outro o caminho escolhido pela Argentina para sua lenta (por vezes acelerada) e longa (já dura mais de 80 anos, e precede até mesmo a República Sindical peronista, criada naquele país) decadência, um caso dos mais extraordinários na história econômica mundial: um país, uma sociedade, que escolheu voluntariamente se subdesenvolver, de afundar na decadência, no atraso, na corrupção e na desesperança...
O Brasil talvez siga o mesmo caminho...
Paulo Roberto de Almeida
(Shanghai, 24.05.2010)
Sindicato vira negócio lucrativo e País registra uma nova entidade por dia
O Estado de S.Paulo, 23 de maio de 2010
BRASÍLIA - O imposto sindical, um bolo tributário de quase R$ 2 bilhões formado por um dia de trabalho por ano de toda pessoa que tem carteira assinada, alimenta um território sem lei. Os 9.046 sindicatos que dividem esse dinheiro não são fiscalizados.
Resultado: abrir uma entidade sindical transformou-se em negócio lucrativo no País. Levantamento feito pela reportagem do Estado identificou sindicatos de todos os tipos: de fachada, dissidentes por causa de rachas internos e entidades atuando como empresas de terceirização de mão de obra.
Os dirigentes das centrais admitem que o imposto está por trás da proliferação sindical, o que transforma alguns sindicatos em verdadeiros cartórios. A reportagem constatou ainda que, só neste ano, o Ministério do Trabalho registrou um novo sindicato a cada dia, 126 no total, o que revela uma indústria debaixo da chamada liberdade sindical garantida pela Constituição.
A proliferação acirrou-se a partir de 2008, quando o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu formalizar as centrais - a fatia do bolo que elas recebem é proporcional ao número de entidades filiadas. E tudo ficou mais fácil quando Lula decidiu que as centrais não precisam prestar contas do dinheiro que recebem.
"Parte dos sindicatos é constituída sem representatividade, só com o objetivo de arrecadar os recursos dos trabalhadores através das taxas existentes", admitiu o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Artur Henrique da Silva Santos. "Está havendo desmembramento de sindicatos, muitos deles artificiais e piratas", concorda Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT) e do Sindicato dos Comerciários de São Paulo. "É o banditismo sindical."
Meio de vida. Estima-se que metade dos sindicatos em operação no País tem como função apenas o recebimento de tributos. Dirigir uma entidade passou a ser meio de vida de algumas pessoas, como no caso de Djalma Domingos Santos.
Ele dirige um sindicato que faz intermediação de mão de obra para empresas do agronegócio. Os abusos são tão flagrantes que a entidade está sob investigação do Ministério Público do Trabalho. Santos também preside sindicatos de trabalhadores da movimentação de mercadorias em pelo menos cinco cidades.
"Não é impossível, mas é pouco provável", disse o secretário-adjunto de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho, André Luis Grandizoli, ao ser questionado sobre como uma pessoa pode presidir tantos sindicatos ao mesmo tempo - e todos devidamente registrados. "Não temos como avaliar."
Ainda segundo Grandizoli, o governo evita qualquer ação que possa parecer interferência na atividade sindical: "Temos de observar a Constituição, que garante a liberdade sindical."
Debaixo desse guarda-chuva constitucional, a criação de sindicatos galopa. O Ministério do Trabalho requer apenas "um mínimo de democracia" no processo de abertura, como disse Grandizoli. É preciso realizar uma assembleia, convocada em jornal de grande circulação e no Diário Oficial, para pedir a formalização. A candidatura da entidade a um registro formal, que lhe dará acesso ao imposto sindical, é submetida a uma audiência pública por 30 dias.
A checagem da documentação do futuro sindicato é apenas formal. Nenhum fiscal verifica, por exemplo, se o endereço informado existe. As investigações sobre irregularidades com o dinheiro do imposto sindical são feitas pelo Ministério Público e pela Polícia Federal, informou Luiz Antônio de Medeiros, ex-secretário de Relações do Trabalho.
Veto. A frouxidão com que os sindicatos são acompanhados pelo governo não é recente. O banco de dados do Ministério do Trabalho sobre entidades sindicais só foi criado em 2005. Segundo Grandizoli, houve um período, no final da década de 1990, em que os sindicatos nem eram registrados no ministério, pois a legislação é vaga a esse respeito.
A Constituição diz que "a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical." Não está claro se o órgão competente para registro é o Ministério do Trabalho.
Essa mesma passagem da Constituição foi a base do veto que Lula impôs ao artigo 6º da Lei 11.648, que regulamentou as centrais sindicais. O texto previa a prestação de contas do dinheiro da contribuição sindical ao Tribunal de Contas da União (TCU). Mas o Planalto considerou o artigo inconstitucional, por representar uma interferência do Poder Público nas centrais. Posteriormente, o Congresso confirmou o veto.
Ao serem formalizadas, as centrais passaram a disputar uma fatia de até 10% da contribuição sindical. De acordo com dados do Ministério do Trabalho, no ano passado elas receberam R$ 81 milhões. A maior fatia, de R$ 26,8 milhões, foi para a CUT.
As centrais sindicais tiveram papel fundamental no apoio a Lula durante o escândalo do mensalão. Prometeram tomar as ruas caso prosperasse a ameaça de impeachment do presidente.
Desconstruindo a educacao brasileira: a marteladas, ao que parece
domingo, 9 de maio de 2010
Descontruindo a educacao brasileira
O comentarista escreve, anonimamente, comme il faut (ou seja, quando se pretende apenas criticar, sem assumir os custos do comentário publicamente), mas é preciso que se dê o devido destaque ao que ele escreve. Ele começa, e isso eu preciso agradecer, por transcrever o que eu mesmo disse, ainda que de forma incompleta, como comentário à matéria transcrita no post original. Agradeço por dar destaque a uma humilde nota de rodapé, que deveria ser ampliada e desenvolvida (o que vou fazer in due time):
Anônimo deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Descontruindo a educacao brasileira":
[PRA: aqui sou eu que estou escrevendo:] " [os países desenvolvidos] não esperaram por Piaget para construir um sistema educacional eficiente e democrático com base em alguns princípios muito simples: o mestre ensina, didaticamente, explicando direitinho para as crianças o que elas precisam saber em termos de língua pátria, matemáticas e ciências elementares, enfia tudo aquilo na cabeça delas, se preciso for um pouco na base da decoreba e da repetição, e depois cobra o que foi ensinado, distribuindo notas boas e más em função do resultado. Quem não aprendeu, é obrigado a refazer a lição até aprender.
Simples não é? Não precisa Piaget para fazer isso. Aliás, não precisa nem de quadro negro, ou quase: só precisa um professor competente e dedicado." [fim PRA]
[Aqui entra o Anônimo correspondente:] SALVAI-NOS ÓH DEUS, É DE FAZER ATEU REZAR!
QUANTO DISPARATE! RASGUEM O DIPLOMA DELE!
SÓ COMPROVA QUE, COMO ELE DISSE, O ENSINO VAI MAU DA GRADUAÇÃO AO PhD, PRINCIPALMENTE LÁ NA BÉLGICA ONDE FORMARAM ELE, POR QUE AQUI NO BRASIL NÃO DERAM O DIPLOMA NÃO...INTERROMPIDO NÉ?
Comento (PRA):
Não preciso acrescentar mais nada. Esse tipo de coisa apenas reforça minha convicção de que a situação da educação brasileira é muito, mas muuuuiiiito pior do que sequer podemos imaginar.
As pessoas sequer têm consciência de quanta "ruindade" se esconde atrás de tudo isso, atrás do que elas próprias pensam...
Paulo Roberto de Almeida
Jared Diamond - Entrevista sobre o destino das civilizacoes
Algumas dessas coisas são realmente curiosas, e ameaçam ficar...
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Paulo Roberto Almeida
Entrevista: Jared Diamond
A liberdade enriquece
André Petry, de Los Angeles
Veja, 26 de maio de 2010
O cientista e escritor diz que, para enriquecer, os países quentes precisam vencer as doenças tropicais e que sem democracia nem a China vai muito longe
Lynn Goldsmith/Corbis/Latinstock
"Os Estados Unidos tiveram mais sorte que o Brasil, mas questões históricas e culturais também explicam a diferença entre os dois países"
O professor Jared Diamond, da Universidade da Califórnia, vive numa bela casa, quase no meio do mato, numa rua sem saída nos arredores de Los Angeles. De manhã, passa até duas horas caminhando pela região, observando e ouvindo os pássaros. De volta para casa, cuja sala é carregada de enfeites de Papua-Nova Guiné, trabalha no seu próximo livro. Duas vezes por semana, estuda italiano. Biólogo, geógrafo e historiador, ele é autor de Armas, Germes e Aço, em que explica por que a sociedade europeia deu certo, e Colapso, no qual mostra como civilizações se exauriram ao devastar o meio ambiente. Seu novo livro, a ser publicado em 2012, tratará da vida nas sociedades tradicionais, como tribos indígenas, em oposição à vida nas sociedades com estado. Com tamanho leque de interesses – de passarinhos à língua italiana, de Papua-Nova Guiné à biologia –, o professor, de 72 anos, é um dos mais brilhantes explicadores do sucesso e do fracasso de países e civilizações.
Brasil e Estados Unidos são países novos, continentais, colonizados por europeus e que começaram com agricultura sob regime de escravidão. Com tantas semelhanças, por que os EUA são tão mais ricos que o Brasil?
Há vários fatores, e um deles é a geografia. As pessoas tendem a imaginar que os países tropicais deveriam ser mais ricos que os de clima temperado, já que nos trópicos se planta o ano inteiro, não é preciso trabalhar tão duro e, com inverno ameno, gasta-se menos com aquecimento. Mas os países de clima temperado são, em média, duas vezes mais ricos que os tropicais. Uma razão é que, nos trópicos, a produtividade agrícola é mais baixa. Há pestes, insetos, doenças, e os solos tropicais tendem a ser menos produtivos. Na América do Sul, os países mais ricos em agricultura são os de clima temperado: Argentina, Uruguai, Chile e a metade sul do Brasil. O poder econômico no Brasil não fica na zona tropical, nas regiões Norte ou Nordeste. Fica mais ao sul, onde o clima é mais temperado. Obviamente, isso não quer dizer que as pessoas no Rio ou em São Paulo sejam mais inteligentes. É pura geografia.
Os EUA então, favorecidos pela geografia, tiveram mais sorte que o Brasil?
Tiveram mais sorte, mas a geografia não é tudo. Questões históricas e culturais também explicam a diferença entre os dois países. A América Latina foi colonizada pelos espanhóis e pelos portugueses, e a América do Norte teve a vantagem de ser colonizada pelos ingleses e, em parte, pelos franceses. É uma vantagem porque Nova York fica mais perto de Londres do que o Rio de Janeiro de Lisboa. Isso permitiu uma troca maior entre metrópole e colônia. A Revolução Industrial começou na Inglaterra, não em Portugal ou na Espanha. Os espanhóis, aliás, temendo deixar de lucrar com suas terras imensas, resistiram à Revolução Industrial. A Inglaterra se tornou uma democracia efetiva, fazendo investimento pesado em educação, muito antes de Portugal e Espanha, que até recentemente nem eram democracias. Essas circunstâncias todas, aliadas à geografia, fizeram a diferença.
Como não se mudam a geografia nem a herança cultural e histórica, estamos condenados ao atraso?
Um país tropical que queira enriquecer precisa, em primeiro lugar, pensar em saúde pública, para evitar doenças tropicais. Se as pessoas adoecem durante metade do ano, com malária, febre amarela ou dengue, elas morrem mais cedo. Pegue-se o exemplo de um engenheiro que se forme aos 28 anos. Na África, pela expectativa de vida em alguns lugares, esse engenheiro morrerá aos 36 anos. Terá oito anos de vida profissional. No Japão, o engenheiro morrerá aos 81. São 53 anos de exercício de profissão. É indiscutível a vantagem. Malásia e Singapura são países tropicais do Sudeste Asiático. Há meio século, eram paupérrimos. Hoje, Singapura tem nível de Primeiro Mundo, e a Malásia está perto. Uma das primeiras coisas que os dois fizeram foi combater doenças tropicais. Depois, perceberam que sua vocação econômica não era plantar nem criar gado e viraram países de comércio e manufatura.
O autoritarismo pode favorecer o desenvolvimento?
Numa ditadura, pode-se fazer tudo rapidamente. Numa democracia, não. Os Estados Unidos levaram dez anos discutindo os males provocados pelo chumbo na gasolina até conseguir eliminá-lo. Na China, a ditadura mandou, e o problema se resolveu em um ano. É um exemplo da força positiva desse tipo de governo. Mas nas ditaduras as decisões podem ser rápidas, porém nem sempre são positivas. Há décadas, os ditadores chineses fizeram a estupidez de abolir o sistema educacional e despacharam os professores para a zona rural, onde aprenderiam coisas supostamente valiosíssimas cortando arroz ao lado dos camponeses. Foi o caos. A educação na China regrediu décadas. Nos EUA, nem no governo de George W. Bush seria possível fechar as escolas por dois anos. Nem no Brasil. Se o presidente brasileiro quisesse abolir as universidades e mandar professores cortar cana-de-açúcar, não conseguiria. É a força da democracia. Se tudo o que se faz numa ditadura fosse bom, ela seria melhor que a democracia. O problema é que não é. A ditadura reduz o mercado das ideias, a competição de ideias. A democracia tem vantagens a longo prazo.
Por ser uma democracia, a Índia tem vantagem sobre a China?
A democracia é uma vantagem da Índia sobre a China, sim. A economia chinesa, hoje, corresponde a 30% da americana. Será fácil para a China chegar ao dobro, mas será muito difícil chegar aos 120%, passando a economia americana, como preveem por aí. Será difícil por causa da ditadura, que não tem competição de ideias. Agora, entre a China e a Índia, há outras diferenças além de democracia e ditadura. A Índia fica mais ao sul que a China, seu clima é mais seco, há desvantagens ambientais. A China tem 2 000 anos de unidade nacional. Na Índia, há muitos que se consideram sikhs ou punjabis antes de se considerar indianos.
Entre os países do Bric (Brasil, Rússia, Índia e China), o Brasil, embora seja o mais jovem, é o único que conjuga unidade nacional e democracia. Isso significa que poderá saltar à frente?
As quatro nações têm vantagens e desvantagens. O Brasil tem feito coisas boas. A democracia brasileira é funcional. O candidato que perde a eleição não faz uma revolução. Cai fora e se prepara para a próxima eleição. É um avanço enorme. Nas últimas décadas, o progresso industrial também foi imenso. A melhor metáfora é quando tomo um avião da Embraer. Se há cinquenta anos alguém tivesse me dito que os aviões nos EUA um dia seriam brasileiros, eu teria dado risada da piada. Com os biocombustíveis e os automóveis flex, o Brasil trilha outro bom caminho. Nesse assunto, vocês estão anos-luz à frente dos EUA.
O senhor diz que um país pode definir seu futuro pelo modo como trata o meio ambiente. O Brasil cuida bem da Amazônia?
É um quadro ambíguo. O Brasil tem tido um comportamento responsável quando evita o desmatamento para a produção de biocombustíveis ou para a criação de gado. São bons sinais. Ao mesmo tempo, os piores desmatamentos do mundo hoje acontecem no Brasil. O desmatamento altera o ciclo hidrológico, reduzindo as chuvas, o que aumenta as secas e a erosão do solo. Digamos que, se eu fosse argentino e tivesse razões para detestar o Brasil, criaria uma entidade de defesa do desmatamento da Amazônia. Seria um desastre econômico para o país, e os maiores prejudicados seriam os próprios brasileiros. E eu, como argentino, ficaria feliz. Estou falando de argentino apenas como alegoria, por favor.
É válido aceitar um pouco de desmatamento em troca de um pouco de desenvolvimento econômico?
O erro é supor que o meio ambiente e a economia estão em oposição um ao outro. A verdade é o inverso. A razão mais forte para cuidar do meio ambiente é que não fazê-lo sai caríssimo. Conter a degradação ambiental nas fases iniciais é barato e fácil. Nos estágios avançados, é caro e, muitas vezes, impossível. Por dez anos, a prefeitura de Nova Orleans, o governo de Louisiana e a Casa Branca se recusaram a gastar 300 milhões de dólares para arrumar os diques da cidade a fim de evitar inundações. Diziam que era muito caro. Veio o Katrina, e a conta subiu para perto de 200 bilhões de dólares, sem contar as mais de 1 000 mortes de americanos. As corporações empresariais, como Coca-Cola e Walmart, estão descobrindo que a ecologia pode ser um bom negócio. O Walmart é um dos maiores varejistas de frutos do mar do mundo, e é do seu interesse combater a pesca predatória, o que tem sido feito.
O Walmart tem interesse em frutos do mar hoje como tinha há dez anos. Por que só agora essas providências de proteção ao meio ambiente estão sendo tomadas?
É uma questão de cultura empresarial, que leva tempo para mudar. Conheço Rob Walton, filho do fundador do Walmart e hoje dirigente da empresa. Somos membros do conselho de uma entidade ecológica, a Conservação Internacional. Até alguns anos atrás, Rob não tinha interesse especial em questões ambientais. Um dia, o executivo da Conservação Internacional o convidou para uma viagem aos riquíssimos corais da Indonésia e Nova Guiné. Em duas semanas de barco nessa região remota, Rob viu três tubarões. É ridículo. Deveria ter visto três a cada cinco minutos, mas a pesca predatória dos japoneses vem dizimando a região. Rob acordou para o assunto. Hoje, o Walmart só compra frutos do mar de área com pesca sustentável. É uma cultura nova.
Os EUA são um império no começo do declínio?
A dianteira americana está diminuindo, não tanto pelo declínio americano, mas pela ascensão dos demais países. Nos anos 70, visitei a Espanha, sob a ditadura franquista. Antes, visitei Portugal, sob o regime de Salazar, país então muito pobre. Os dois hoje são nações de Primeiro Mundo. Na Ásia, além de Malásia e Singapura, há a Coreia do Sul, a Tailândia, Taiwan, sem falar na própria China, que está chegando lá. Isso reduz a vantagem da liderança americana, mas existem coisas preocupantes nos EUA. A Universidade da Califórnia foi o motor do salto tecnológico. As pessoas se mudavam para o Vale do Silício, em parte porque podiam mandar seus filhos a escolas de primeira linha e estudar na Universidade da Califórnia. Hoje, o governo está reduzindo as verbas da instituição. Por um ou dois anos, dá para aceitar. Mas, se isso se prolongar, será um desastre.
Por que isso está acontecendo?
Em parte, isso decorre do anti-intelectualismo americano e do fundamentalismo evangélico. O fundamentalismo evangélico é muito forte, tem ampla influência, inclusive sobre o conteúdo dos livros escolares. A base da biologia é a teoria da evolução de Darwin. Ela ensina que as coisas vivas evoluem. Não é possível ser biólogo, nem um bom médico, se você não acredita na evolução. É o mesmo que um físico não acreditar nas leis de Newton. Ou um químico duvidar da tabela periódica de Mendeleiev. Não dá para ser astrônomo se você acha que o mundo é plano. Mesmo assim, o fundamentalismo evangélico de direita se opõe ao ensino da evolução nas aulas de biologia. Isso acontece no Texas, para dar um exemplo. É um absurdo. É o fundamentalismo evangélico associado ao anti-intelectualismo.
Mas não estão aqui as melhores universidades do mundo?
Somos um país complexo. Nunca tivemos um presidente com Ph.D. E, se algum deles o tivesse, esconderia do eleitorado. Nenhum candidato ao Senado ou a um governo estadual exibe publicamente um título de Ph.D. Por quê? Porque pega mal. Na Alemanha, onde morei por alguns anos, a propaganda de um candidato anuncia "doutor em economia e ciência política". A chanceler da Alemanha é a "doutora Angela Merkel", acho que tem Ph.D. em física. Os alemães preferem votar em alguém com alta escolaridade. Nos EUA, não. A melhor prova é o sucesso de Sarah Palin. Ela tem orgulho de mostrar que é tola, meio imbecil. E sua popularidade decorre exatamente disso.
Destinos pos-eleitorais: o mundo espera febrilmente...
Lula articula seu futuro na ONU ou no Banco Mundial
KENNEDY ALENCAR - DE BRASÍLIA
Folha de S.Paulo, Domingo, 23 de maio de 2010
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva iniciou articulações com líderes mundiais para definir seu futuro após deixar o governo. Lula gostaria de se tornar secretário-geral de uma nova Organização das Nações Unidas ou presidir o Banco Mundial, informa Kennedy Alencar.
A Folha apurou que Lula já tratou dos dois temas com outros presidentes e primeiros-ministros.
Lula negocia para assumir a ONU ou o Banco Mundial
Líderes de França, Espanha e Portugal apoiam indicação do brasileiro
Tanto o petista como o chanceler Celso Amorim já tocaram no tema com outros líderes mundiais e diplomatas próximos
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva iniciou articulações com outros líderes mundiais para definir seu futuro após deixar o cargo. Gostaria de virar secretário-geral de uma renovada Organização das Nações Unidas ou de presidir o Banco Mundial.
A Folha apurou que Lula já tratou dos dois temas com outros presidentes e primeiros-ministros. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, também fala com diplomatas estrangeiros.
A avaliação de Lula, Amorim e alguns líderes mundiais é que o brasileiro conquistou cacife político que o credencia a assumir um posto internacional de relevo.
Não interessaria a Lula virar secretário-geral da ONU no atual formato, muito dependente dos EUA e dos outros vencedores da Segunda Guerra Mundial -Reino Unido, França, Rússia e China.
Mas, se for aprovada uma reforma da ONU, a começar pelo Conselho de Segurança, Lula trabalhará para disputar a secretaria-geral.
O Brasil, hoje membro rotativo do CS, quer uma cadeira permanente. O obstáculo é que essa mudança dificultaria o poder deliberativo do órgão, pois seria preciso buscar consenso entre mais países.
Lula defende ainda mais poder para a FAO (Organização da ONU para a Agricultura e Alimentação), que considera pouco aparelhada para combater a miséria na África.
Na Europa, três líderes endossam a postulação de Lula para secretário-geral: o presidente de governo da Espanha, José Luis Rodríguez Zapatero, o premiê de Portugal, José Sócrates, e o presidente da França, Nicolas Sarkozy.
"Lula tem capital político tão importante no mundo que seria um grande desperdício não aproveitá-lo", disse o premiê de Portugal. Das potências emergentes, ele conta com a simpatia do premiê Manmohan Singh (Índia).
Diversos presidentes da América do Sul já sugeriram a Lula seguir esse caminho, de Hugo Chávez (Venezuela) a Cristina Kirchner (Argentina). Chávez disse à Folha que, se Lula quiser ser candidato a secretário-geral, terá o seu "apoio entusiasmado".
Há atritos na relação entre o Brasil e os EUA, mas, na opinião do governo brasileiro, eles poderiam ser superados para o petista ir para a ONU ou o Banco Mundial.
"Se a ONU continuar assim, vamos ter problemas sérios", disse Lula na quarta sobre a articulação dos EUA para aprovar sanções contra o Irã: "É preciso mudar, mas quem já está sentado na cadeira não quer mudar".
O Itamaraty acha que o presidente Barack Obama teria, no mínimo, disposição de conversar sobre o tema.
Existem óbices, no entanto, para que Lula ocupe essas posições. O atual secretário-geral da ONU, Ban Ki Moon, tem mandato até o final de 2011 e pode ser reconduzido.
Do ponto de vista de Lula, a presidência do Banco Mundial permitiria o financiamento de projetos nos países pobres. Ele já disse que montará um instituto no Brasil, a exemplo de seu antecessor. Empresários brasileiros procuram um prédio na zona sul de São Paulo para ser a sede.
Lancamento de livro sobre o Brasil e os Brics
Renato Baumann (org.):
O Brasil e os demais BRICs: Comércio e Política
(Brasília: CEPAL-Escritório no Brasil/IPEA, 2010, 180 p.)
Sumário
Introdução, 5
1. As Relações Comerciais do Brasil com os demais BRICs, 9
Renato Baumann, Raquel Araujo e Jhonatan Ferreira
2. A competitividade do Brasil e da China no mercado norte-americano: 2000-2008, 47
Marina Filgueiras e Honorio Kume
3. Abertura comercial e Inserção internacional: os casos do Brasil, China e Índia, 61
José Tavares de Araujo Jr. e Katarina Pereira da Costa
4. A inserção no comércio internacional do Brasil, da Índia e da China (BIC): notas acerca do comércio exterior e política commercial, 79
Ivan Tiago Machado Oliveira, Rodrigo Pimentel Ferreira Leão e Emílio Chernavsky
5. China na América Latina: uma análise da perspectiva dos investimentos diretos estrangeiros, 109
Márcio Holland e Fernando Barbi
6. O Bric e a substituição de hegemonias: um exercício analítico (perspectiva histórico-diplomática sobre a emergência de um novo cenário global), 131
Paulo Roberto de Almeida
7. Brasil e polos emergentes do poder mundial: Rússia, Índia, China e África do Sul, 155
Maria Regina Soares de Lima e IUPERJ
O livro será lançado no dia 28 de maio, das 9h30 as 13hs, no Auditorio do Ipea em Brasília, Edifício-Sede do BNDES, Setor Bancário Sul, subsolo, com a presença do organizador, de autores e de jornalistas, que debaterão os capítulos. Acredito que o meu será criticado pelo representante do MRE, que certamente não concordará com meus argumentos, e vai dizer que o Bric é um elemento importantíssimo da estratégia brasileira de inserção internacional. Mantenho meus argumentos.
Rezando para Sao Bolivar fazer chover, e poluindo a atmosfera...
Não sei se deu certo, mas voltou a chover um pouco.
Enquanto isso, para desgosto dos ecologistas e de todos os que rezam pela cartilha da redução de emissões poluentes, os venezuelanos foram acumulando centrais térmicas que passarão a usar o diesel como combustível, altamente poluente, e tóxico, portanto.
Ironias da história: rezando por uma chuvinha, e poluindo a atmosfera...
Paulo Roberto de Almeida
El embalse del Guri subió 9 centímetros
Venezuela pasó la barrera de los 5 mil megavatios térmicos
Prensa Bolivariana, 22.05.2010
Presidente Chávez: Próximamente se eliminarán los racionamientos eléctricos los fines de semana y los días feriados. Posteriormente se anunciará la suspensión del racionamiento eléctrico en todo el país, en la medida en que se recuperen los embalses y se amplíe el parque termoeléctrico
Venezuela ha pasado la barrera de los 5 mil megavatios térmicos, una cifra que nunca antes había experimentando el país en materia de generación de energía eléctrica, informó el presidente de la República Bolivariana de Venezuela, Hugo Chávez.
“Ayer batimos récord en generación termoeléctrica. Nunca en Venezuela habíamos pasado de 5 mil megavatios de generación térmica, porque siempre hemos dependido del Guri, de la generación hidroeléctrica. Ayer pasamos la barrera de 5 mil megavatios térmicos. Vamos a ir equilibrando lo hidroeléctrico con lo termoeléctrico”.
Para consolidar la generación termoeléctrica China y Venezuela construirán varias plantas generadoras de electricidad empleando el coque petrolero generado en la Faja Petrolífera del Orinoco. Además, se instalarán otras termoeléctricas solamente para las empresas de Guayana, y se inaugurarán Las Picuras, en Vargas, y La Raiza, en los Valles del Tuy.
El jefe de Estado anunció que próximamente se eliminarán los racionamientos eléctricos los fines de semana y los días feriados. Posteriormente se informará la suspensión del racionamiento eléctrico en todo el país, en la medida en que se recuperen los embalses y se amplíe el parque termoeléctrico.
Las fechas serán acordadas en la reunión que sostendrá el Presidente con los integrantes del Estado Mayor Eléctrico, al término del acto de inauguración de la industria electrónica Orinoquia.
El mandatario nacional dijo que la represa del Guri subió 9 centímetros más, cifra que contribuye al alejamiento del colapso eléctrico, al tiempo de hacer referencia al aumento del nivel del agua, en 18 centímetros, del embalse Uribante-Caparo.
“Ya no hay riesgo de colapso eléctrico, gracias a Dios, a la Revolución y a los trabajadores eléctricos y al pueblo. Salimos del riesgo del colapso”.
Prensa Presidencial / 22 de mayo de 2010
sábado, 22 de maio de 2010
Gradacoes da democracia - um exercicio de classificacao
Paulo Roberto de Almeida
Democracias, ma non troppo
O mundo, obviamente, ainda não se ajustou ao “fim da História”, no sentido da convergência da maioria dos países para regimes políticos e para sistemas econômicos próximos das democracias de mercado (capitalistas), como sugeria, tentativamente, Francis Fukuyama. Ele o fará, gradualmente, já que o núcleo central da tese de Fukuyama é basicamente correto – retirando-se a metáfora hegeliana do “fim da História”, resta que o desenvolvimento socioeconômico e a consolidação da prosperidade social, permitidos justamente por uma economia de mercado dinâmica, trazem naturalmente um regime político mais conforme à atomização dos poderes e dos mercados capitalistas (baseados, institucionalmente, em mecanismos de representação, de negociação e de conciliação).
Já tratei dessas questões em outro trabalho e não vou voltar a elas neste momento (ver: Paulo Roberto de Almeida, “O Fim da História, de Fukuyama, vinte anos depois: o que ficou?”, Meridiano 47, n. 114, janeiro 2010, p. 8-17; link: http://sites.google.com/a/mundorama.net/mundorama/biblioteca/meridiano-47/sumariodaedicaono114%E2%80%93janeiro2010/Meridiano_114.pdf?attredirects=0&d=1). Essa transição quase natural para a democracia política é, no entanto, um mundo ideal, para o qual caminharemos muito gradualmente. Ele está baseado em uma adequada educação política dos cidadãos, o que, sabemos, é uma mercadoria ainda relativamente rara nas comunidades existentes neste planeta persistentemente pobre; de fato, as possibilidades de desenvolvimento econômico inclusivo não encontram grandes obstáculos técnicos à sua consecução, mas os políticos e sociais são formidáveis. No mundo real, ainda convivemos com um número lamentavelmente grande de regimes autoritários ou de ditaduras abertas.
Uma evolução positiva
Cabe, entretanto, reconhecer uma evolução positiva, que não deixa de ser um fato histórico: numa linha contínua, que levaria, de um lado, do despotismo mais exacerbado, da tirania mais execrável, até, na outra ponta, a uma democracia perfeita, podemos constatar que o mundo avançou de modo razoável no último meio século. O número, ínfimo, de democracias estáveis no período anterior à Segunda Guerra Mundial, cresceu regularmente desde então, especialmente depois da implosão e virtual desaparecimento do último sistema “escravocrata” da era contemporânea: o socialismo real. Este existiu em diversas modalidades, sendo seu modo mais tirânico o representado pelos totalitarismos stalinista e maoísta, mas também teve Estados policiais perfeitamente “weberianos” – como a ex-Alemanha oriental – e socialismos burocráticos que evoluíram ao longo do tempo (como o modelo “gulash” na Hungria e o nacionalismo estatizante da ex-Iugoslávia).
A evolução nesses países outrora dominados por um partido único – comunista, obviamente – não deixa de ser um fato auspicioso na história da humanidade, embora dois pequenos bastiões do totalitarismo comunista resistam ainda na sua irrelevância anacrônica, ao lado de várias outras tentativas de implantar, senão ditaduras abertas, pelo menos regimes politicamente fechados, caracterizados pelo cerceamento de liberdades elementares em regimes plenamente democráticos. Estes se caracterizam pela liberdade de organização, de expressão e de manifestação, pela representação livre de todos os interesses sociais presentes na sociedade, inclusive a defesa dos direitos das minorias (sociais, étnicas, religiosas, políticas), que é o que distingue verdadeiramente uma democracia plena.
Tentações totalitárias
Regimes e situações não democráticos não desapareceram, como é óbvio para quem observa o mundo como ele é. Alguns países, que tinham conhecido uma saudável evolução democrática – na América Latina, na África e na Ásia, sobretudo – voltaram experimentar desenvolvimentos autoritários. Países de democracia frágil, não consolidada, ou submetidos a conjunturas mais ou menos traumáticas de instabilidade, no seguimento de crises econômicas e sociais, ou de rupturas políticas fora da normalidade – sim, porque existem rupturas políticas dentro da normalidade, como aquela conhecida no Brasil em 2002 – podem reverter o relógio da história e recair em tentações totalitárias (não pela vontade de seus cidadãos, por certo, mas pela manipulação que fazem de massas não educadas líderes tendencialmente autoritários).
O que são esses regimes? São ditaduras “eleitas” – sim existe, como vimos ainda bem perto do Brasil –, populismos personalistas baseados na manipulação propagandística e na “compra” (literalmente) dos mais humildes e despolitizados, cesarismos plebiscitários, enfim, uma variedade sempre criativa de regimes que, no fundo, representam um decréscimo de qualidade da democracia formal – em vários casos apresentando inúmeras deficiências substantivas –, mesmo coexistindo com a manutenção do voto universal (que pode ser, como frequentemente é, manipulado). De resto, apenas o voto não caracteriza um regime democrático, como os exemplos da Albânia nos tempos de Enver Hodja, da URSS nos tempos de Stalin, ou ainda hoje na Cuba dos irmãos Castro, podem amplamente confirmar...
Um exercício de classificação dos regimes
Com base nas considerações anteriores, posso tentar agora oferecer um quadro declinante – sim, reconheço meu viés valorativo – dos regimes políticos, indo dos mais democráticos aos mais autoritários. Não vou tentar explicitar todas as razões de porque coloquei alguns países em uma “janela” e não em outra, inclusive porque este exercício não é exatamente “científico”, correspondendo mais bem às minhas percepções pessoais de como vejo o mundo e a qualidade de seus regimes políticos.
(A) Democracias plenas
Não tem adjetivos, e não tem ameaças aparentes ao seu funcionamento e à sua estabilidade. Países nórdicos, Reino Unido, Canadá, Holanda, Suíça, boa parte dos países europeus, mas não todos.
(B) Democracias com disfuncionalidades leves
São países grandes ou com deformações no modo de funcionamento de seus sistemas políticos, ou imigrações “selvagem” e certo grau de corrupção e de atos delinqüentes, ou ação agressiva de lobbies e grupos de interesse manipuladores. Eu colocaria nessa situação os Estados Unidos, possivelmente o país mais livre do mundo, e um dos mais democráticos, pelo fato de que se trata de um pais enorme, com muitas desigualdades internas e algumas disfunções derivadas de seu excessivo conservadorismo político (ou anacronismo religioso, por exemplo, o que pode levar a absurdos na educação científica e histórica, com fortes pressões criacionistas, para citar apenas um caso). A Itália, uma democracia de baixa qualidade, pela mediocridade de seus políticos e a corrupção disseminada, também entra nessa categoria, assim como diversos outros países europeus, geralmente da franja meridional ou oriental. O Japão é possivelmente um candidato pleno na categoria.
(C) Democracias de baixa qualidade
Corrupção extensiva, manipulações políticas, concentração de poder, baixo grau de representatividade, mau funcionamento das instituições de controle, e uma miríade de outros problemas derivados do baixo grau de educação política da maior parte da população. Estão nesse caso Índia e Brasil, amiúde citados como “duas grandes democracias em países em desenvolvimento”, o que deve ser tomado com certa caução. A Argentina e o México também entram nessa categoria, assim como grande parte dos países latino-americanos e vários asiáticos e a África do Sul.
(D) Regimes autoritários abertos
Uma gama imensa de situações, respondendo aos mais diversos fatores de concentração de poder, em alguns casos por falta de tradição democrática – seria o caso da Rússia, por exemplo –, em outros por regressão populista momentânea (como vem ocorrendo em alguns países da América Latina). Esses países podem tanto evoluir para uma democracia de baixa qualidade, quanto descambar para situações ditatoriais mais ou menos fechadas. É o caso, por exemplo, do Irã, país dotado de uma sociedade civil muito ativa, mas atualmente dominado por uma teocracia regressista que pode colocá-lo, conjunturalmente, na categoria seguinte, uma quase ditadura.
(E) Ditaduras disfarçadas
Conservam certa aparência de democracia, mas consolidaram grupos ou personalidades no poder que manipulam os processos políticos, perseguem os opositores, concentram todo o poder e literalmente desmantelam as instituições em seu benefício exclusivo. O exemplo mais notório é, obviamente, a Venezuela, que muitos confundem com um regime progressista de esquerda, mas que nada mais é senão um triste exemplo do velho fascismo por demais conhecido nos anos 1930. O caudilho destrói todas as instituições, ou as coloca a seu serviço exclusivo.
(F) Regimes autoritários fechados
Sistemas infensos ao voto popular ou com monopólio político de um grupo ou partido no poder: Birmânia (ou Miamar), Síria, Egito, China, grande parte dos países africanos e alguns poucos asiáticos, como alguns saídos do casulo soviético (mas mantidos com os mesmos aparatchiks do velho sistema comunista). Alguns já foram totalitários, mas se tornaram menos “carnívoros”; outros eram democracias de fachada que não resistiram ao líder providencial e candidato a insubstituível.
(G) Países totalitários
Nem é preciso explicar por que: Cuba, Coréia do Norte se enquadram perfeitamente no modelo mais lamentável que o socialismo bolchevique deixou como herança do início do século 20. Devem desaparecer, mas o sofrimento em que incorrem ou incorreram (como a China nos tempos de Mao) seus povos é indizível.
Nessas diferentes categorias, não parece haver problemas classificatórios nos escalões A, B e G, mas os estratos intermediários sempre colocam problemas, já que as dinâmicas políticas, em países não totalmente estruturados politicamente, podem tanto aproximá-los formalmente de modelos passavelmente democráticos (ainda que de baixíssima qualidade), ou, no outro sentido, fazê-los cair nas malhas das ditaduras mais ou menos abertas ou disfarçadas. Outra ainda é a situação de Estados falidos – vários africanos, ou o Haiti, no hemisfério ocidental – que sequer possuem instituições normais de um Estado em funcionamento mínimo, para atender serviços básicos de sua população, retrocedendo para a guerra civil ou vivendo de assistência pública internacional, numa espécie de tutela dos organismos internacionais (com esmolas adicionais introduzidas pelas ONGs).
Por fim, ainda que isto ofenda os “brios democráticos” de muitos brasileiros – sobretudo aqueles que vivem circulando em torno do parlamento ou que vivem de empregos ou favores do governo –, não tenho nenhuma hesitação em classificar o Brasil como uma democracia de baixa qualidade, ainda que seja uma categoria relativamente esdrúxula nos anais da ciência política: o Brasil tem todas as características dessa categoria, e atende todos os requisitos de uma democracia de baixa qualidade, inclusive porque tem muita gente ativíssima na arte de construir um regime fechado ou autoritário à solta por aí; então não há porque promovê-lo, por enquanto, para o grupo das democracias com algumas disfuncionalidades, categoria a que pertencem países que são em geral considerados perfeitamente democráticos.
Sorry, folks, mas minhas exigências democráticas são muito altas, e eu não me contento com pouco...
P.S.: Quem quiser criticar minha abordagem, é obviamente livre de fazê-lo, mas eu apreciaria receber argumentos mais consistentes do que gritos indignados. Ou seja, aceitam-se reclamações justificadas, inclusive dos pequenos déspotas que circulam por aí, fazendo a infelicidade de seus povos...
Paulo Roberto de Almeida
Shanghai, 2145: 22-23 maio 2010, 4 p.
Deveres do Professor - Escola Sem Partido
Por isso transcrevo aqui este post do Escola Sem Partido.
Deveres do Professor
Escola Sem Partido - Educação sem Doutrinação
22.05.2010
Ao lado da liberdade de ensinar, está a liberdade de aprender, ambas asseguradas pelo art. 206 da Constituição Federal.
A doutrinação político-ideológica em sala de aula constitui claro abuso da liberdade de ensinar; abuso que implica o cerceamento da correspondente liberdade de aprender, já que, numa de suas vertentes, essa liberdade compreende o direito do estudante de não ser doutrinado.
Ora, só um estudante consciente dos seus direitos poderá defendê-los contra a ação abusiva de professores militantes. Por isso, o EscolasemPartido.org elaborou a relação (obviamente não exaustiva) de Deveres do Professor que se vê abaixo.
Peça à sua escola ou à escola de seu filho que mande imprimir e afixar cartazes contendo essa relação de deveres em locais onde possam ser vistos por alunos e professores. Se a escola se recusar, você saberá do lado de quem ela está.
______________________
DEVERES DO PROFESSOR
1. O professor não abusará da inexperiência, da falta de conhecimento ou da imaturidade dos alunos, com o objetivo de cooptá-los para esta ou aquela corrente político-ideológica, nem adotará livros didáticos que tenham esse objetivo.
2. O professor não favorecerá nem prejudicará os alunos em razão de suas convicções políticas, ideológicas, religiosas, ou da falta delas.
3. O professor não fará propaganda político-partidária em sala de aula nem incitará seus alunos a participar de manifestações, atos públicos e passeatas.
4. Ao tratar de questões políticas, sócio-culturais e econômicas, o professor apresentará aos alunos, de forma justa – isto é, com a mesma profundidade e seriedade –, as principais versões, teorias, opiniões e perspectivas concorrentes a respeito.
5. O professor não criará em sala de aula uma atmosfera de intimidação, ostensiva ou sutil, capaz de desencorajar a manifestação de pontos de vista discordantes dos seus, nem permitirá que tal atmosfera seja criada pela ação de alunos sectários ou de outros professores.