O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sábado, 29 de junho de 2013

O relativismo, essa falacia epistemologica - Gustavo Ioschpe (via Orlando Tambosi)

Agradeço a meu amigo e colega de combates racionalistas, a transcrição em seu blog (aqui) deste artigo de Gustavo Ioschpe, na revista Veja de 26/06/2013, sobre o relativismo, que de outra forma me teria passado despercebido. Trata do relativismo, essa praga que invadiu universidades e vem se reproduzindo como... uma praga, justamente.
Reproduzo integralmente o conteúdo do post.
Paulo Roberto de Almeida

Orlando Tambosi, link

Na Veja da semana passada, Gustavo Ioschpe publicou um artigo - que vale a pena reproduzir integralmente - analisando uma questão epistemológica fundamental: a verdade. "Afinal, a verdade existe?", pergunta o título. Para o relativismo radical, negador de verdades universais, só há verdades relativas. Ioschpe se refere particularmente ao pensamento reinante nas escolas de segundo grau, mas o fato é que esse relativismo fincou raízes nas universidades, devastando as ciências humanas em geral. Fui testemunha dessa estupidez, contra a qual lutei quase que solitariamente na universidade a que pertenci, muitas vezes sendo chamado de positivista, reacionário etc. Muitos posts foram dedicados a esse tema no blog. Escrevi também um ensaio acadêmico sobre "jornalismo e teorias da verdade", que pode ser acessado aqui. A propósito, o relativismo deixou essa área mais próxima das ideologias que das ciências.

Há muitos anos, dei uma palestra a professores de uma rede estadual de ensino. Muita gente, ginásio grande. Apresentei a saraivada de dados em que me baseio para estabelecer um diagnóstico da educação brasileira. Depois da fala, abriu-se espaço para perguntas. Lembro-me da primeira delas como se fosse hoje: “O palestrante que esteve aqui ontem nos advertiu de que números são como palavras: são criações humanas. E que por trás de toda criação humana existe a intencionalidade da pessoa que a criou. Qual é a sua?”.

É uma visão de mundo preocupante. Fruto do pensamento pós-modernista de viés marxista, postula que não existe uma verdade objetiva, depreendida do estudo de fatos através das ferramentas da ciência. O resultado dessa investigação científica seria apenas uma verdade, a versão inventada pelo homem branco ocidental para ajudá-lo a subjugar os povos subdesenvolvidos e as minorias dos países ricos. Existem, para os pós-modernistas, “verdades”, no plural, ditadas pelas características históricas, culturais e econômicas de cada pessoa ou grupo. A crença de um aborígine de que um trovão é uma manifestação do descontentamento de uma deidade qualquer tem, portanto, o mesmo grau de verdade da descoberta de que o trovão é causado pela ionização e pelo aquecimento do ar que envolve um raio, gerando sua rápida expansão e a consequente onda de som.

Para que seja possível pensar assim, é preciso ignorar que existem fatos e que números, estatísticas, são apenas descrições quantitativas desses fatos. Se eu digo que a população brasileira em julho de 2012 era de 193 milhões de pessoas, segundo o IBGE, não se pode dizer que eu (ou os coconspiradores do IBGE) estou “criando” esse dado como se criasse um soneto. Não, as pessoas existem e estão lá! O número é apenas a maneira mais simples de comunicar esse fato, sem precisar mostrar fotos de todos os cidadãos nem repetir a contagem a cada instante. Se entendemos que fatos existem, e se notamos que os fatos corriqueiros do mundo que nos cerca já apresentam uma variedade e uma complexidade inenarráveis - da estrutura atômica e subatômica das partículas ao movimento das marés ou de planetas -, então necessitamos de um método impessoal e objetivo para perceber e compreender esses fatos. Esse método precisa ser peculiar: deve ser feito por seres humanos imperfeitos - com paixões e vilezas, sem visão de raio X nem audição perfeita - para superar as próprias limitações e chegar o mais próximo possível de observar o fato real, sem distorções ou falhas de interpretação. A criatura precisa superar o criador. Como fazê-lo? Perseguindo os fatos de maneira objetiva e técnica, gerando hipóteses sobre o mundo que só podem ser confirmadas através da medição. Porque, confiando em um método objetivo e em dados oriundos de medições, os resultados podem ser reproduzidos por diferentes pessoas em diferentes épocas, e as conclusões espúrias ou os métodos defeituosos podem ser expostos, corrigidos ou descartados. Sim, esse método a que me refiro é a ciência.

Os pós-modernistas empenham-se em destruir o edifício da ciência. Não mostrando os erros metodológicos ou quantitativos dos estudos científicos, porque a maioria dos adeptos da causa não tem competência técnica para isso (“Errar é humanas”), mas simplesmente atacando a credibilidade dos “especialistas”. E isso se faz necessário não apenas porque, sem os guardiães do conhecimento embasado em fatos, qualquer Quixote pode descrever moinhos inexistentes que devem ser derrubados, mas também porque as investigações mais recentes de várias ciências, especialmente a biologia, desconstroem muitas ideias que são caras aos pós-modernistas e marxistas em geral. Entre elas, especialmente aquela de que o ser humano é um bicho fraterno e igualitário por natureza, e não o ser competitivo e movido pela busca de status e hierarquia em seu grupo social que a psicologia evolutiva não se cansa de demonstrar em estudos e experimentos (sugestões de leitura em twitter.com/gioschpe). Claro, se o fato não existe, o cientista ou especialista só pode ser um impostor, que inventa dados para justificar algum viés inconfessável. Para os ideólogos, toda neutralidade é uma farsa. Quem aponta um erro de um pós-modernista não pode estar certo: necessariamente, deve ser um tarado neoliberal. O marxismo e seus derivativos formam um sistema fechado. Para os crentes, quem aponta seus erros o faz por algum interesse de classe, etnia ou nação e, portanto, pode ser imediatamente descartado. Só poderá apontar os erros quem for confrade. Mas, obviamente, quem é confrade não percebe os erros.

As pessoas dessa inclinação acreditam que a ciência é uma religião, uma fé cega. Que os racionalistas apenas trocaram um deus crucificado por outro abstrato: o método científico. Mas esse é um engano fundamental e dantesco. Porque a marca da religião (e da ideologia) é justamente o dogma, a ideia inquestionável e infalsificável, porque revelada por uma entidade superior. A ciência se move por dúvidas, não por certezas: tudo é questionável e precisa ser demonstrado e reproduzido. Não há crença em entidades superiores. Pelo contrário: a ciência moderna se faz pela sobreposição de vários e pequenos esforços. Até que uma teoria ganhe respeitabilidade e passe a ser aceita como uma boa descrição dos fatos, precisa ser replicada por muitos pesquisadores, que podem estar espalhados por todo o planeta. É sempre assim que funciona? Claro que não. Quem conhece a história das ideias sabe que cientistas e pesquisadores sofrem dos mesmos vícios da humanidade em geral. São seduzidos pelo poder político e econômico, sucumbem a ideologias, aferram-se a teorias patentemente equivocadas por questões pessoais ou até mesmo estéticas. Mas, por mais que ideias tortas tenham vida longa, algum dia elas não resistem ao acúmulo de evidências contrárias e morrem, vão para o lixo da história, substituídas por formulações mais corretas.

Algumas pessoas acham que não se pode confiar na ciência porque “uma hora eles dizem uma coisa, outra hora dizem outra”. Mas isso é causado mais por um viés da publicação dos resultados do que pelos resultados em si. É mais culpa da imprensa (leiga e acadêmica) do que de pesquisadores: é a velha história de que quando um homem morde um cachorro é notícia, mas não vice-versa. Os resultados mais divulgados são frequentemente os mais destoantes do senso comum e da pesquisa anterior. É bom que sejam publicados, porque arejam o debate, mas na maioria dos casos acabam sendo a exceção que comprova a regra. Não é verdade que o processo científico é um eterno pingue-pongue de versões antagônicas. O conhecimento avança, chegamos a consensos. Dificilmente se verá algum estudo sério sugerindo que fumar faz bem à saúde. É verdade que os consensos não são perenes e que talvez vamos propor ações equivocadas por baseá-las em pesquisas que depois se descobrirão equivocadas. Mas no mundo real sabemos que a perfeição é inatingível. A questão, portanto, não é acabar com o erro, pois isso é impossível, mas minimizá-lo. E certamente uma ação baseada em evidências sólidas vai errar menos do que aquela inspirada em intuições e inclinações pessoais.

Que pessoas ignorantes repitam essa linha do “cada um com a sua verdade” é até compreensível, saturados que estamos, aqui nos tristes trópicos, de gente que compartilha essa cosmovisão. Na terra da cordialidade, pega mal defender a existência de uma verdade e o consequente erro daqueles que defendem seu oposto. Parece até arrogância. Que professores pensem assim já é mais triste e preocupante, pois uma tarefa fundamental do sistema escolar é transmitir ao alunado o conhecimento acumulado ao longo de séculos de trabalho árduo de pesquisadores e pensadores, que muitas vezes perderam a vida defendendo suas ideias “hereges”. Também são os professores que deveriam propagar o método científico, para que seus alunos possam empreender o mesmo caminho da busca da verdade trilhado pelos gigantes intelectuais que nos precederam.

Mas que líderes públicos pensem assim, e ajam ao arrepio daquilo que a pesquisa já estabeleceu, aí não é apenas triste ou lamentável: é criminoso. Na área da educação posso dizer com tranquilidade: a maioria dos nossos gestores públicos despreza totalmente os milhares de estudos objetivos sobre o que funciona em educação. Insistem em gastar fortunas com ideias que a experiência, documentada em estudos rigorosos, já se encarregou de demonstrar serem inócuas. O Ministério da Educação agora cria um “Programa Nacional de Alfabetização na Idade Certa” que quer alfabetizar na idade errada (8 anos, em vez de 6) e defende um aumento radical do financiamento em educação que não terá nenhum impacto na melhora da qualidade do ensino (em breve escreverei artigo a respeito). Prefeituras insistem em alfabetizar com o método construtivista, quando o fônico tem se mostrado mais eficaz. Em diminuir o número de alunos em sala de aula ou colocar dois mestres por turma, o que não dá resultado. Em carregar nas ferramentas tecnológicas que não têm comprovação alguma, sem nem ao menos fazer uma escolha criteriosa do livro didático ou prescrever o bom e velho dever de casa, ambos com custo perto de zero e eficácia comprovada.

Muitos o fazem por desconhecimento e preguiça, outros por conveniências políticas, outros ainda por motivos inconfessáveis (não há fornecedor de dever de casa para dar uma mãozinha no financiamento da próxima campanha...). Mas, no frigir dos ovos, eles só podem se safar de sua irresponsabilidade porque sabem que grande parte dos eleitores está convencida de que fatos são criados de acordo com a intencionalidade de cada um e que, portanto, vontades são mais importantes do que resultados e que as boas intenções dos inventores de factoides compensam o divórcio entre seus objetivos e suas realizações. Mas os dados existem. A verdade existe. E até os pós-modernistas mostram saber disso. Cada vez que tomam um remédio ou visitam um médico para tratar de uma doença, em vez de consumir uma beberagem prescrita por um pajé, estão dando às próprias ideias a credibilidade que merecem. Ignoramos esses dados, e os muitos recados que nos mandam, por nossa conta e risco. Países não morrem nem vão à falência por teimar em ignorar a realidade. Mas podem estagnar ou retroceder, como mostra a história recente de alguns de nossos vizinhos. Se não acordarmos para a realidade, em breve haveremos de fazer-lhes companhia.


P.S.: Thomas Jefferson, um dos founding fathers dos EUA, escreveu que “onde a imprensa é livre, e todo homem capaz de ler, tudo está seguro”. Roberto Civita lutou para que cumpríssemos essas duas missões por toda a sua vida adulta. O Brasil perdeu um grande homem, mas o legado fica. Em boas mãos: a existência desta coluna, que irrita a tantos há anos, só é possível em uma organização que preza a verdade antes de agradar a leitores ou poderosos

Maquiavel e a Arte da Guerra - Marco Cepik

Arte da guerra

A questão militar ocupa um lugar central nas preocupações de Maquiavel, que acredita que os conflitos são próprios à natureza da política. Sua contribuição singular para o pensamento político está na dimensão ética da articulação entre fins e meios.
Por: Marco Cepik
Ciência Hoje, 26/06/2013
Arte da guerra
No sexto artigo desta série, que comemora os 500 anos de 'O príncipe', o cientista político Marco Cepik apresenta as ideias de Maquiavel sobre o fazer da guerra. (arte: Ampersand)
Escrito entre 1519 e 1520, A arte da guerra foi publicada enquanto Maquiavel (1469-1527) ainda vivia. Suas máximas concisas e conselhos práticos ao príncipe e aos cidadãos são semelhantes a passagens encontradas no general e filósofo chinês Sun Tzu. Entretanto, apesar de sua influência sobre líderes e pensadores, a obra nunca rivalizou em popularidade com O príncipe, o livro mais conhecido de Maquiavel, muito menos com o Ping-Fa, de Sun Tzu, ambos encontráveis nas prateleiras de qualquer livraria de aeroporto ao redor do mundo. Vejamos então por que é importante conhecer as ideias de Maquiavel sobre o fazer da guerra.
Em primeiro lugar, a mensagem mais importante de Maquiavel nesse livro ecoa um tema presente nas demais obras histórico-políticas do autor: a intencionalidade da ação, o seu planejamento, uma visão que hoje se convencionou chamar de estratégica. Tudo isso aparece como uma qualidade da ‘virtú’ e uma necessidade de se construir meios consistentes com os fins para enfrentarmos as surpresas da ‘fortuna’, dois conceitos que atravessam seu pensamento.
Nas palavras de Maquiavel, aqui transcritas da edição da Editora Universidade de Brasília, “(...) quem pretende fazer alguma coisa deve primeiramente preparar-se de modo que, surgindo a ocasião, tenha condições de satisfazer suas intenções”.
A queda do governo republicano da cidade, em 1512, e o banimento de Maquiavel da vida governamental tornaram mais claro ainda esse princípio. Nas obras que escreveu nesse período, como destacou Newton Bignotto em Maquiavel republicano, evidencia-se a sua convicção de que o “processo de fundação e conservação de uma república não é independente da escolha de sua estratégia de defesa”.
Livro 'A arte da guerra'Seja em O príncipe (1513), nos Discursos sobre a primeira década de Tito Lívio (1513-1519) ou na Arte da guerra (1519-1520), a questão militar ocupa um lugar central nas preocupações de Maquiavel, cuja contribuição singular para o pensamento político reside no realismo de sua concepção sobre as relações existentes entre força e convencimento, bem como na dimensão ética da articulação entre fins e meios.
Como observou o autor Félix Gilbert, longe de tentar eliminar os conflitos, inclusive a guerra, Maquiavel os considera próprios à natureza da política, encontro da liberdade humana com a natureza e as necessidades. A conquista e a conservação dos objetivos políticos são possíveis, mas o poder da fortuna limita a liberdade de ação e não permite o conhecimento completo. Portanto, a ética é constituída pela própria conduta na ação política, pelo conteúdo dos fins estabelecidos, pela maneira de lidar com as necessidades e pelo resultado objetivo que a ação ajuda a estruturar no tempo e no espaço.

O papel dos cidadãos

O segundo motivo mais importante para se ler A arte da guerra com atenção ainda hoje diz respeito ao papel dos cidadãos na defesa da república. O crescimento das empresas militares privadas no mundo contemporâneo e as recomendações para a conformação de forças armadas “enxutas e profissionais” atualizam a questão.
Escrevendo no alvorecer da era moderna, o secretário florentino ocupou-se da guerra e da organização militar desde 1500, quando uma nova fase da guerra entre Pisa e Florença levou-o a defender a criação de milícias regulares, não mais compostas principalmente por mercenários.
O segundo motivo mais importante para se ler A arte da guerra com atenção ainda hoje diz respeito ao papel dos cidadãos na defesa da república
Na verdade, a partir de 1505 dedicou-se pessoalmente a executar planos para o rearmamento de Florença. Dentre outros escritos, destaca-se o seu Discurso sobre a preparação militar florentina, de 1506. Nomeado para o Conselho dos Dez das Milícias, concentrou-se nas tarefas práticas de organização de uma força militar consistente com o duplo requisito da estabilidade dos Estados: a justiça e as armas.
Interpretando fatos da época e reinterpretando a história da República romana, Maquiavel estava convicto de que não se poderia fundar e manter uma República moderna confiando apenas em mercenários e senhores da guerra (condittieri), pois somente um exército de conscritos poderia garantir a independência das cidades-estado italianas.
Os aspectos financeiros, logísticos, táticos e morais do exército de conscritos também não escaparam à Maquiavel. Não apenas afirma ele que “na guerra, a disciplina pode mais do que o ímpeto”, mas vê no armamento e na conscrição de elementos urbanos e rurais, bem como nas formas de treinamento e comando de tal força pública, um elemento de enfraquecimento relativo das classes abastadas e de amalgamento de elementos populares ao tecido institucional, moral e social do qual é feito o governo.
“A descoberta de Maquiavel não é, portanto, a da importância de uma boa milícia, mas sim de que uma boa milícia exige uma forma democrática de governo”, escreve Bignotto. O apelo ao patriotismo dos cidadãos-soldados só é possível se as instituições militares são consistentes com as instituições políticas. Portanto, se refaz o nexo entre o chefe militar e o chefe político (que o subordina), seja ele o príncipe ou o povo, conforme o tipo de Estado e de regime do país.

Aceitação questionável

Por outro lado, também é possível mencionar pelo menos dois elementos que dificultam a aceitação das ideias de Maquiavel sobre a guerra por parte do leitor contemporâneo. Em primeiro lugar, o fato mesmo de que as suas prescrições e lições não chegam a configurar uma teoria moderna da guerra, entendida como um programa de pesquisa científico, o qual desenvolve-se apenas no século 19, especialmente a partir da obra de Clausewitz (1780-1831).
O autor de Vom Krieg conhecia e respeitava as posições de Maquiavel, mas ainda que tenha deixado sua obra inacabada, uma leitura mais cuidadosa mostra a recusa de Clausewitz em subordinar a análise conceitual e empírica da guerra a preceitos gerais de caráter normativo que teriam validade universal, erro incorrido por Maquiavel e que o leva, por exemplo, a não considerar adequadamente o papel revolucionário da artilharia e das armas de fogo, focado que estava na evocação da infantaria e da condução dos assuntos militares na República romana antiga como contraponto à prioridade dada à cavalaria no fazer a guerra da aristocracia medieval.
Armas de fogo
Alguns pontos relacionados à conduta de Maquiavel podem levar ao questionamento de suas ideias sobre a guerra. Um deles foi o fato de não considerar adequadamente o papel revolucionário da artilharia e das armas de fogo na época. (imagem: Wikimedia Commons)
Em segundo lugar, a própria forma utilizada por Maquiavel para redigir A arte da Guerra dificulta o acesso do leitor contemporâneo. A obra é dividida em um prefácio e sete livros (capítulos), na forma de um diálogo socrático que ocorre nos jardins construídos na década de 1490 para os aristocratas e humanistas florentinos.
O diálogo ocorre entre Cosimo Rucellai e Fabrizio Colonna (alter-ego de Maquiavel?) com outros patrícios e capitães da então recente república florentina, remetendo aos méritos das legiões romanas e procurando refutar a asserção de que a artilharia tornaria obsoletos os métodos clássicos.
Seja como for, vale estudar Maquiavel depois de 500 anos, lembrando, para citar palavras suas, que “os bons comandantes nunca se empenham numa batalha se a necessidade não os impele, ou a oportunidade não os chama”.

Marco Cepik
Diretor do Centro de Estudos Internacionais sobre Governo (CEGOV)
Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Alianca do Pacifico vs Mercosul? - Bruno Hendler


Boletim Mundorama 29 Jun 2013 05:00 AM PDT
Passados dois anos da criação da Aliança do Pacífico (AP), muito ainda precisa ser feito no tocante à integração de seus países membros, Chile, Peru, Colômbia e México. Porém, a convergência entre eles tem sido responsável por atrair a atenção de especialistas sobre os rumos da América Latina. Encabeçada por países que possuem relações especiais com os Estados Unidos e que têm sido governados por partidos de direita ou da chamada “Nova Esquerda” (BRESSER-PEREIRA, 2000), a iniciativa surge como um contraponto, planejado ou não, ao MERCOSUL e à Aliança Bolivariana das Américas (ALBA).
A maré de crescimento econômico dos países da AP gera euforia entre os críticos mais mordazes da politização do MERCOSUL, que relacionam “o fracasso” do bloco liderado pelo Brasil com “o sucesso da Aliança do Pacífico” (SETTI, 2013). Porém, dois anos é um prazo deveras curto para atribuir sucesso a qualquer iniciativa de integração regional – pode-se afirmar, no máximo, que se está diante de uma ideia promissora.
A AP surge em um contexto de ascensão econômica da Ásia, recuperação econômica dos EUA pós-crise de 2008/2009 e crise institucional do MERCOSUL. Se a Venezuela é o motor da ALBA (75% do PIB do bloco) e o Brasil o motor do MERCOSUL (80% do PIB) respectivamente, a AP não tende a gravitar em torno de uma única economia, ainda que o México seja responsável por 60% do PIB do bloco. Isso decorre não apenas da menor assimetria econômica entre os membros, mas principalmente do escopo liberal de integração e da não contiguidade territorial entre os países. Ademais, há um maior equilíbrio entre os membros deste bloco, ou seja, o menor PIB da AP (Peru) responde por cerca de 10% do total, enquanto os menores PIBs do MERCOSUL (Paraguai) e da ALBA (Dominica) não passam de cerca de 1% do total.
Segundo Felipe Bulnes, Embaixador do Chile nos EUA, e Harold W. Forsyth, Embaixador do Peru nos EUA [1], a proximidade entre os quatro países decorre mais de afinidades políticas e princípios compartilhados do que da integração econômica propriamente dita. Dado o pouco tempo de existência do bloco, é natural que o estreitamento de laços comerciais, financeiros e de circulação de pessoas não esteja consolidado. Enquanto o comércio intrabloco do MERCOSUL já chegou a 25% (em 1998) e hoje está em torno de 15%, o comércio entre os membros da AP é ainda muito baixo. Porém, uma série de iniciativas ambiciosas pretende reduzir as distâncias que os separam. As principais são (ETONIRU, 2013):
- Liberalização do comércio intrabloco. Em janeiro de 2013 os países membro concordaram em eliminar barreiras tarifárias para 90% das mercadorias que circulam dentro da AP.
- Circulação de pessoas. Com vistas a promover o turismo, a circulação de empresários e o intercâmbio de estudantes, planeja-se eliminar a necessidade de vistos para estadia de até 180 dias entre os quatro países, além da criação de 100 bolsas de estudo anuais para as universidades dos países membros.
- Integração de mercados financeiros. Desde maio de 2011 os três membros sul americanos (Chile, Peru e Colômbia) combinaram seus mercados financeiros em uma bolsa de valores, o Mercado Integrado Latino-Americano (MILA), visando facilitar e incrementar os investimentos estrangeiros. Ainda que o MILA tenha surgido fora do âmbito da AP, a possibilidade de adesão do México tem sido influenciada diretamente pela criação do bloco.
Outro fator é a relação especial com os EUA, seja em termos de comércio ou de segurança. Antes mesmo da criação do bloco, os quatro países já haviam celebrado acordos de livre comércio com os EUA. Os impactos desses acordos são variados mas, em geral, facilitam a entrada de investimentos e estreitam as relações comerciais com a economia norte-americana.
Na esfera da segurança, México e Colômbia são aliados tradicionais dos norte-americanos no combate ao narcotráfico e, ao longo das últimas duas décadas, passaram a receber treinamento, assessoria, material e, no caso da Colômbia, bases militares. O “Plano Colômbia”, por exemplo, adquiriu, com o financiamento dos norte-americanos, um viés militarista e policial, deixando de lado o caráter socioeconômico e dando margem a casos de desrespeito aos direitos humanos por grupos paramilitares como as Autodefensas Unidas de Colombia (AUC) (RIPPEL, 2004, p. 3-4). De forma similar, o fluxo migratório de mexicanos para os EUA passou a ser tratado como questão de segurança, sem considerar que muitos emigrantes e traficantes optam por esses caminhos em decorrência da falência e da perda de competitividade da agropecuária mexicana após a adesão do país, sem fundos compensatórios, ao NAFTA (PETRAS, 2009).
Se as relações bilaterais com os EUA são fortes, o mesmo ainda não se pode dizer da relação em bloco com este país. Embora a AP se encaixe na estratégia norte-americana de se aproximar de governos de direita e de centro na América Latina, a última reunião de cúpula do grupo, em maio de 2013 na cidade de Cali, teve a ausência de representantes dos EUA na condição de observadores – status ocupado por países como Espanha, Austrália, Japão, Canadá, Nova Zelândia e Uruguai, além de Estados postulantes a adesão como Costa Rica, Panamá e Guatemala.
De todo modo, a América Latina continua (e continuará) sendo uma região de nítida predominância militar dos EUA. Porém, assim como na Ásia Oriental, no Oriente Médio e na África, o papel desempenhado pela China, tanto em termos econômicos quanto em termos de capital político, tende a crescer. Em outras palavras, a AP pode ser útil aos EUA como contraponto à ALBA e ao MERCOSUL, mas também pode tornar-se o canal de aproximação da China com a América Latina – e a localização geográfica dos membros da AP, bem como as declarações oficiais de seus líderes, favorece essa possibilidade.
A aproximação com a Ásia, e mais especificamente com a China, está no discurso e nos números da AP. Para o Embaixador da Colômbia nos EUA, Carlos Urrutia, o bloco não é apenas um “acordo de livre comércio”, mas um processo dinâmico que busca profunda integração regional e inserção internacional, especialmente com a Ásia-Pacífico[2]. Embora ainda não haja uma aproximação coordenada do bloco com esta região, seus membros já possuem acordos bilaterais de comércio com inúmeros países asiáticos, como Japão, Coreia do Sul e a própria China (KOTSCHWAR et. al, 2013). Ademais, de 2000 a 2011, as exportações dos países da AP para os EUA caíram em termos relativos, de 77% para 58%, enquanto que China e ASEAN passaram de 1% para 7% (idem).
Portanto, ao enfatizar o escopo econômico da AP, seus líderes deixam claro que pretendem manter a relação de proximidade política com os EUA e de indiferença, ou mesmo rejeição, às alternativas do MERCOSUL e da ALBA. Porém, reconhecendo a gradual transição da riqueza mundial dos EUA para a Ásia, Chile, Peru, Colômbia e México demonstram que não pretendem perder o bonde da história e se preparam para encurtar as distâncias entre os dois lados do Oceano Pacífico.

Referências
BRESSER-PEREIRA, Luiz C. A nova Esquerda: uma visão a partir do sul. Revista Filosofia Política, nova série, vol. 6, p. 144-178, 2000.
ETONIRU, Nneka. Explainer: what is the Pacific Alliance? 17 de maio de 2013. Disponível em: http://www.as-coa.org/articles/explainer-what-pacific-alliance Acesso: 10/06/2013.
KOTSCHAWAR, Barbara; SCHOTT, Jeffrey J. The next big thing? The Trans-Pacific Partnership & Latin America. Americas Quarterly, 2013.
PETRAS, James. US-Latin America relations in a time of rising militarism, protectionism and pillage. Global Research, 2009. Disponível em: http://www.globalresearch.ca/us-latin-american-relations-in-a-time-of-rising-militarism-protectionism-and-pillage/13601 Acesso: 25/05/2013.
RIPPEL, Márcio P. O Plano Colômbia como instrumento da política norte-americana para a América Latina e suas consequências. Escola de Guerra Naval, 2004.
SETTI, Ricardo. México, Colômbia, Peru e Chile mostram ao Brasil o que deveria ser feito em vez de permanecer atolado no Mercosul. Revista Veja, 02/06/2013. Disponível em: http://veja.abril.com.br/blog/ricardo-setti/vasto-mundo/mexico-colombia-peru-e-chile-mostram-ao-brasil-o-que-deveria-ser-feito-em-vez-de-permanecer-atolado-no-mercosul/ Acesso: 05/06/2013.
VII Encontro de Chefes de Estado da Aliança do Pacífico. Disponível em http://csis.org/multimedia/audio-pacific-alliance acesso em 31/05/13.

Bruno Hendler é mestre em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília – UnB e professor do curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Curitiba – Unicuritiba (bruno_hendler@hotmail.com).


[1] Áudio da 7ª reunião de cúpula presidencial da Aliança do Pacífico, disponível em http://csis.org/multimedia/audio-pacific-alliance acesso em 31/05/13.
[2] Áudio da 7ª reunião de cúpula presidencial da Aliança do Pacífico, disponível em http://csis.org/multimedia/audio-pacific-alliance acesso em 31/05/13.

A visao realista da crise social, politica, moral atual - Percival Puggina (Zero Hora)


QUAL BOLHAS DE SABÃO
Percival Puggina
Zero Hora, 30 de junho de 2013

            Volta e meia, anos a fio, eu criticava, aqui, a péssima gestão federal dos negócios públicos. O governo ia mal nas coisas importantes. E o que ia bem lhe caía no colo de presente. Presente chinês. O gigante oriental acordara e arrancava o Brasil de seu berço esplêndido. Quanto ao resto - Segurança, Responsabilidade Fiscal, Probidade, Educação, Saúde, Infraestrutura, Tecnologia, Relações Exteriores, as coisas iam mal. Muito cacarejo publicitário e pouco ovo.

            Nós, os poucos que expúnhamos com objetividade a situação nacional, exercíamos tarefa resignadamente inglória. O marketing do governo trovejava informações que nos contradiziam. Afrontávamos a opinião majoritária. Sabíamos que distribuir dinheiro não resolve os problemas nacionais porque o Brasil não é um programa de auditório! Mas o Planalto festejava ao menos um plano mirabolante e bilionário por semana. Até a mídia mundial comprava por bom o discurso oficial! As oposições, ora, as oposições! Primeiro, Lula lhes bateu a carteira ao fazer seu o programa de governo do FHC. Depois, quando Lula passou a sacrificar a austeridade fiscal em favor das reeleições petistas, instalou-se a chamada Brasilha da Fantasia, ou a Fachada de Prosperidade (nas palavras do Financial Times). Mas a oposição política formal, já então, arquejava seu desânimo em meia dúzia de vozes, se tanto, no Congresso Nacional. Enfim, nossa trincheira era tão despovoada que se um gritasse o outro não ouviria. E o petismo ainda nos chamava de golpistas.

            Pois eis que o povo sai às ruas. Os satisfeitos do Bolsa Família e do Bolsa Louis Vuitton ficam em casa. Entende-se. Entende-se, também, os motivos pelos quais os grupos radicais que acionaram a alavanca de partida foram para a marginalidade quando o povo, com suas camisas brancas, tomou conta do pedaço. Assistimos uma surpreendente apropriação pela cidadania de algo que iniciou em mãos erradas. Com raras exceções, a multidão nas ruas repete o que vínhamos dizendo. Claro, há os paus mandados que se infiltram e tentam desviar o foco para cima dos governos não petistas; há os que conscientemente usam a violência para fins políticos e há os que se aproveitam das vidraças quebradas para sua atividade criminosa. A multidão nas ruas embasbacou dois grupos: os detentores de poder e os comentaristas, ingênuos ou militantes da causa, que há anos recebiam os resultados das pesquisas de satisfação como prova suficiente de que tudo ia bem. Pesquisas de satisfação, senhores, tem a ver com mercado. A realidade nacional precisa ser aferida em outras fontes, e tem a ver com o futuro do país em horizontes de curto, médio e longo prazo.

            Rudyard Kipling perguntou certa vez num poema - "O que podem conhecer sobre a Inglaterra os que só conhecem a Inglaterra?". Pois o brasileiro médio sempre se pareceu um pouco com esses ingleses de Kipling. Nos últimos anos, porém, com o dólar barato, milhões de brasileiros saíram a conhecer o mundo. E conheceram melhor o Brasil... Essa massa, da qual Lula se considera santo benfeitor, pôde fazer comparações e concluir que, aqui, exceto os luxuosos palácios do poder, tudo que é público está em frangalhos. Que aqui, impostos coletados em percentuais de Primeiro Mundo se desperdiçam no supérfluo. E que o restante se entrega ao Submundo, sob zelo da mais irretratável impunidade. Ilusões publicitárias são como bolhas de sabão.

A frase da semana: os males do Brasil

Muita ideologia e pouca filosofia, os males do Brasil são!

Maria do Espirito Santo

Popolo mobile: pesquisa de opiniao politica: to the brink, inesperadamente

Brazil Focus – David Fleischer
Special Report-29-06-13 

New Datafolha Poll – Dilma down 27 points

Datafolha conducted a new poll on 27-28 June - two weeks after the massive street demonstrations began that reached over 100 cities in Brazil, complaining that “we don’t feel represented by the political class” – meaning the three powers of the federal government as well as the state and municipal governments.

This poll interviewed 4,717 voters in 196 municípios with a two-point margin of error.  The previous poll was conducted on 6-7 June – where the approval rating of Pres. Dilma declined by eight points (65%57%).  The Folha de São Paulo published this poll on Saturday, 29th June and the results should have a very heavy impact on the strategies of the Dilma government as of 1stJuly.

In this latest poll, her approval rating fell by yet another 27 points to just 30%, while the “Bad/Terrible” rating jumped up 9%25%.  This is the most dramatic change ever detected byDatafolha in such a short (three-week) period – since March 1990, when Pres. Collor imposed his economic plan that confiscated Brazilians’ savings (71%36%)!!!

In December 2005, after the explosion of the mensalãoscandal, Lula’s approval rating dropped to 30%.  The worst approval rating for Pres. Cardoso was 13% in September 1999.  

On the other hand, 68% of those interviewed favored the convocation of a national plebiscite.

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Comments by Tim Power: 

DataFolha: the way they present the numbers is never easy to digest. It's best to subtract ruim/péssimo from ótimo/bom (and leave out the regulares) to get the net approval (positives minus negatives). It would look like this overall:

in March: net +55 points of popularity
on June 6-7: net +46
and now June 27-28: net +5 (the largest recorded drop since Plano Collor)

Doing the same by region with the newest numbers:

Southeast:  +4
South:  -1
Northeast:  +24
North/Center-West: +4 (always distorted by DF)
Overall:  +5

And then the same with MW income brackets:

less than 2 MW: +12
from 2-5 MW: +3
from 5-10 MW: -6
over 10 MW: -12
Overall: +5

These numbers are very interesting: they are like peeling an onion. When things go wrong and you strip away the "soft" support for a popular president, you see the "hard core" of the loyal base. The hard core for Dilma looks an awful lot like the hard core for Lula.

Lula underwent his only popularity meltdown in 2005 because of the mensalão. Here is his "bad year" from May 2005 to the point at which he recovers previous levels of net popularity in mid-2006 (the scandal broke on June 6, 2005):

LULA NET POPULARITY
May-05    21.00
Jun-05    21.00
Jul-05    20.30
Aug-05    16.05
Sep-05    11.80
Oct-05    7.05
Nov-05    2.30
Dec-05    6.90
Jan-06    11.50
Feb-06    16.10
Mar-06    14.80
Apr-06    13.50
May-06    16.23
Jun-06    18.97

So it took Lula about 5 months of twisting in the wind with the mensalão scandal to get to his lowest point, which was +2. Dilma is more or less there already, and it took her 3 weeks, not 5 months. So the Dilma collapse is much more spectacular than Lula's: it's like the difference between running out of gas versus running into a telephone pole.

A few quick thoughts:

1. In terms of distance from the onset of crisis (June 2005 and June 2013) to the next presidential election, the electoral calendar is identical: each president had/has a time horizon of 15 months before facing reelection.

2. It took Lula about 7 months to recover the popularity he enjoyed before the onset of mensalão: a long time, but still with time to spare before the campaign heated up.

3. BUT: Lula needed 7 months at the very height of the commodity boom. The economy was then growing at around 4% with inflation also around 4%: rising expectations. Dilma will probably have equivalent numbers of 2% and 7% over the next year: not as easy to claw her way back in the current economic scenario.

4. On the positive side for Dilma, the numbers for the poor and for the Northeast show a very similar firewall for both presidents. Lula had an obvious base onto which he could retreat and then rebuild from there; that's what he did in 2006. He got beat up badly in the South but it didn't matter much in the end. The numbers show pretty much a similar scenario for Dilma. She remains in a comfortable position among the poor and very secure indeed (+24 points) in the Northeast.

5. If these trends hold for a while, they might (a) make it difficult for a challenger to emerge from the Northeast (like Eduardo Campos), and (b) encourage a future opposition candidate, predictably, to start building off the "old" middle class and the South/Southeast. That's a losing strategy, as Geraldo Alckmin showed us in 2006.

6. But: you can't beat somebody with nobody. So far the wave of protests has not advantaged any single party or candidate in a meaningful way, and that is good news for Dilma. There is still a path to reelection by default.

7. Never underestimate the capacity of the Brazilian political system to absorb dissent!

Warning: in the current scenario, these comments have a short shelf life. I am only certain about the last one :-)


Tim
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Calor do asfalto ‘derrete’ Dilma e reabre 2014
Josias de Souza
29/06/2013 08:28

Digamos que há três semanas Dilma Rousseff tinha fama de gerentona, 57% de popularidade, uma coligação gigantesca, uma reeleição garantida e um padrinho chamado Lula. A situação dela agora é a seguinte: precisa verificar, urgentemente, o que Lula vai fazer quando voltar de sua viagem à África. Ele pode ser a única coisa que lhe resta.
O Datafolha informa que a popularidade de Dilma desabou 27 pontos percentuais em três semanas –de uma altura de 57%, despencou para 30%. E pensar que em março ela colecionava 65%! O último presidente a viver a experiência de um mergulho tão radical foi Fernando Collor. Entre março e junho de 1990, a popularidade dele ruiu 35 pontos –de 71% para 36%.
No caso de Collor, a explicação estava na cara: o confisco da poupança. No caso de Dilma, não há explicações peremptórias. Há no máximo duas probabilidades: o asfalto e a inflação. Se as ruas ensinaram alguma coisa na última quinzena foi que a irritação e a cobrança já não admitem ficar trancadas no Facebook.
Quanto à economia, relatório divulgado nesta semana pelo BC rebaixou a previsão do PIB anual e e elevou a da inflação. E o eleitor, agora tomado de rigores insuspeitados até bem pouco, grita nas esquinas. De acordo com o Datafolha, caiu de 49% para 27% a avaliação positiva da gestão econômica de Dilma.
Assim, a não ser que ocorra o milagre da combinação de um PIBão com uma carestia mixuruca, a vida de Dilma dificilmente voltará a ser como antes. Hoje, se dependesse da vontade da maioria do PT, o candidato do partido à Presidência da República se chamaria Lula.
Antes do tsunami de protestos, a especulação sobre uma eventual derrota de Dilma em 2014 era um desafio à lógica. Era algo equivalente a uma previsão de que o Brasil, jogando no Maracanã, perderia para a seleção do Taiti um jogo em que o juiz seria o Felipão.
O despertar das ruas –na verdade um bocejo de gigante que levou a felicidade do petismo junto com o ar— teve um quê de punição antecipada. Mostrou a Dilma e Lula que a arrogância não é boa conselheira. E informou ao PT que o meio-fio não tem dono.
A elevação da temperatura das ruas produziu em Dilma uma espécie de meltdown –termo incorporado pelo economês na década de 90 para simbolizar a situação de uma economia que desanda e começa a derreter. Mal comparando, pode-se dizer que Dilma está derretendo. O que faz de 2014 uma janela de oportunidades.

- Atualização feita às 17h06 deste sábado (29): medido em intenções de voto, o tombo de Dilma Rousseff mede 21 pontos percentuais, informa o Datafolha. Em três semanas, a ex-favorita despencou de 51% para 30%. Principal beneficiária da erosão, Marina Silva ganhou sete pontos. Foi de 16% para 23%. Aécio Neves beliscou três pontos. De 14%, foi a 17%. Eduardo Campos oscilou um ponto. Tinha 6% e foi a 7%. Se a eleição fosse hoje, haveria um segundo turno, disputado entre Dilma e Marina. Mas a disputa só ocorrerá daqui a um ano e meio. E as ruas informaram que, no Brasil, hoje parece anteontem. Quer dizer: pode acontecer tudo. Ou o contrário.

Brasil: da confusao mental à deterioracao cerebral acelerada (acho que nao tem mais volta)...

Não quero dizer que é terminal, pois essa gente pode ainda descer mais fundo na demência individual e nos delírios coletivos. Mas o que contemplo, o que leio, o que registro, nesta tela tão pequena de meu laptop me faz temer, seriamente, pela deterioração acelerada da saúde mental (não dos brasileiros, mas de certos brasileiros) de altas esferas de nossa tão conspurcada República.
Isso me faz lembrar os tempos de Lima Barreto (que acho que começou a beber e ficou louco de tanta loucura contemplada), autor de memoráveis palavras sinceras (ainda que trágico-cômicas) sobre nossa República tão infeliz. Acho que vamos pelo mesmo caminho, na literatura e na vida real.
Espero não ter o mesmo destino de Lima Barreto, não sem antes escrever algumas páginas tão memoráveis quanto as que ele redigiu naqueles tempos confusos...
E agora? Seria trágico-cômico, ou cômico-trágico?
Paulo Roberto de Almeida

Reinaldo Azevedo, 28/06/2013

Depois de se encontrar com os Rimbauds das catracas, a presidente Dilma Rousseff abriu as portas do palácio para outros “movimentos da juventude”, a maioria chapa-branca mesmo, ligada ao PT, ao PCdoB ou ao MST. Todos saíram de lá defendendo, claro!, o plebiscito para a reforma política. À esquerda da presidente, estava sentado Gilberto Carvalho, secretário-geral da Presidência. Faz sentido. Afinal, é ele quem “interlocuta” com os ditos movimentos sociais. À direita, adivinhem… Aloizio Mercadante. Tudo deve andar tão bem na educação que ele pode agora se dedicar às suas funções de primeiro-ministro. Não é uma posição formalizada. Parece ser, assim, uma coisa mais de afinidades eletivas com a chefe. Entre os representantes do “povo” que agora têm voz no Planalto, estava uma jovem que representa a Marcha das Vadias. Brasília é sempre um lugar em que a vadiagem assume um sentido muito particular, não é mesmo? No dia 8 de julho, o governo lança um canal na Internet chamado “Observatório Participativo”.
Leio no Globo Online:
“Os grupos de juventude apresentaram a Dilma uma variada pauta de reivindicações, que passa pela taxação de grandes fortunas, descriminalização do aborto, repressão à violência policial e mais investimentos em políticas para os jovens. O Conselho Nacional de Juventude (Conjuve), se comprometeu a enviar para a presidente um relatório sobre os excessos cometidos pela polícia durante as manifestações país afora.”
Eu nunca vou entender a obsessão dessa gente por matar fetos. Por que os ditos socialistas fazem tanta questão dessa pauta? Nem dá para dizer que seja um resquício de selvageria porque os animais irracionais matam ou para se defender ou para comer. Infelizmente, é um traço humano — de certos humanos — reivindicar o direito de matar quem não tem como se defender. É claro que se trata de uma escolha moral.
Quanto ao mais, olho a lista das entidades, publicada no Globo Online:
Conselho Nacional de Juventude (Conjure), UBES, Movimento Sem-Terra (MST), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Marcha Mundial das Mulheres, Coordenação Nacional de Entidades Negras (Conen), Levante Popular da Juventude, Rede Fale, Hip Hop, Forum de Juventude de BH, União da Juventude Socialista (UJS), Juventude do PT (JPT), UPL, JSB, JSPDT, JPMDB, UNE, PJ, CTB, Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Marcha das Vadias, Fora do Eixo e Agência Solano Trindade.
Boa parte, aí, recebe, direta ou indiretamente, dinheiro público. No próximo post, falarei de um grupo em particular: o “Levante Popular da Juventude”.
Gays
A presidente recebeu também representantes do movimento gay e se disse contra qualquer discriminação — ainda bem! Leio no Globo Online o que segue em vermelho. Volto em seguida:
(…)
Representantes de movimentos gays recebidos pela presidente disseram que saem satisfeitos com o encontro. Segundo eles, a presidente disse que é dever do Estado impedir violência e discriminação contra à comunidade LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros). Os participantes disseram, no entanto, que quando eles criticaram o polêmico projeto que propõe a “cura gay”, que tramita no Congresso, Dilma não se pronunciou sobre o assunto.
“Saímos daqui felizes. A presidente disse que o Estado tem o dever de impedir a violência e a discriminação de qualquer natureza”, disse Toni Reis, da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT).
O grupo levou à presidente uma pauta que pede, entre outras coisas, a criminalização da homofobia. Presente ao encontro, a ministra da Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres, Eleonora Menicucci, disse que Dilma cobrou iniciativas para aumentar as estatísticas existentes sobre a violência praticada contra esses grupos.
(…)
Voltei
É impressionante que a imprensa continue a reportar a existência de um projeto de “cura gay”. Isso não existe. A verdade é bem outra, como já deixei claro aqui. Algumas pessoas se irritam quando confrontadas com os fatos? Fazer o quê? Acredito que sua causa pode conviver com os fatos. O projeto contra a homofobia é o PLC 122, que continua autoritário mesmo na versão versão de Marta Suplicy. “Ah, não adianta você criticar porque o primeiro vai ser recusado, e o segundo aprovado”, escreveu anteontem um rapaz, que me dirigiu algumas ofensas. Ainda que seja assim, por que eu deveria dizer que existe um projeto que não existe e que é democrática uma proposta autoritária? Eu  não escrevo para ganhar ou perder. Nem ganho nem perco nada. Escrevo o que acho que devo escrever. Não vou endossar uma inverdade só para não chatear as pessoas… Convenham, não é? Os militantes da causa não precisam do meu apoio. Já contam com a esmagadora maioria da imprensa a seu favor.
Quanto às estatísticas, já passou da hora de fazer um trabalho rigoroso, e isso quer dizer que não pode ficar nas mãos de militantes e prosélitos. As circunstâncias das mortes — a esmagadora maioria de gays masculinos — precisam ser esclarecidas. Até porque, quando um michê mata um cliente, a caracterização de “crime de homofobia” fica um tanto prejudicada — a menos que se considere que o profissional era heterossexual. Era? Mas esse é apenas um aspecto da agenda do dia.
Encerrando
Conforme venho afirmando desde a segunda, dia 17, quando teve início, digamos assim, a nacionalização dos protestos, os vetores políticos todos passaram a apontar para, como é mesmo?, o “progressismo”!
No Brasil, meus caros, a última coisa que a gente vai ver é gente se mobilizando para pedir que o estado intervenha menos nas nossas vidas. O que se quer é justamente o contrário: mais babá!!! Isso dá certo? Resulta em boa coisa? É claro que não!

Mas meus amigos liberais estão encantadíssimos com o momento! Queria muito que eles estivessem certos, e eu, errado.

Humor marquissista para encerrar noite com alguns sorrisos

Eu já resenhei um livro desse portento dos fricotes filosóficos da Fefelech: posso garantir a vocês, foi duro terminar.
Agora uma gozação desse jornalista odiado por gregos e goianos do marquissismo tupiniquim.
Paulo Roberto de Almeida 
Paulo Arantes é um professor de aposentado de filosofia socialista. O que é isso? Não sei. Como Marilena Chaui, ele se quer marxista mesmo, de verdade, do tipo que acredita no socialismo — mas com liberdade, é evidente, menos, suponho, para recalcitrantes. Por isso, migrou do PT para o PSOL. Marilena continua na nave-mãe.  É este senhor aqui, ó.

Já está com 71 anos. Fez parte da geração uspiana que achou que os petistas iriam fazer a revolução — sem sangue se possível; com ele, se necessário, porque vocês sabem como esses brasucas são teimosos e insistem em não reconhecer o valor daqueles que querem libertá-los. Arantes passou 20 anos na USP pregando a chegada do PT ao poder e, desde 2003, é um crítico do partido porque acha que ele não teve coragem de ir à esquerda o bastante.
A gente pensa num senhor de 71 anos e o imagina se comovendo com o sorriso de uma criança, de um netinho, mesmo sem perder o rigor intelectual. Nada disso! Com Arantes, nem rigor nem sorriso. Ele agora resolveu imitar Jean-Paul Sartre nas jornadas de Maio de 1968, na França, quando havia se convertido a uma seita maoista e distribuía o jornal “La Cause du Peuple” (“A Causa do Povo”). O povo não tinha a menor ideia do que eles falavam. Tanto é assim que, ao fim das jornadas, quem se elege presidente da França, em 1969, é o conservador George Pompidou. Vejam estas imagens. Volto em seguida.

Aos 63 anos, um pouco mais jovem do que Arantes, Sartre se junta aos maoistas e passa a pregar a revolução. De Gaulle, um direitista decente, deu ordens para que não o metessem em cana: “Não se pode prender Voltaire”, exagerou. A direita sempre tão generosa com essa gente… Se pudessem, eles teriam prendido De Gaulle


Duas páginas do jornaleco maoista que faz a exaltação da luta violenta, mais ou menos como temos visto Brasil afora. Acima, lê-se: “Alain Geismar nos mostra o caminho da honra”. O caminho, como se vê, é o confronto. Geismar se tornou depois uma figura influente do Partido Socialista Francês e chegou ao Ministério da Educação
A exemplo do filósofo francês — que, à época, já havia conquistado fama mundial —, Arantes, em busca ao menos da fama municipal ao menos, decidiu, nesta quinta, dar uma aula em praça pública sobre “passe livre”. É constrangedor.
Um grupo de umas 300 pessoas acompanharam a cascata do Sartre caipira, em frente à Prefeitura. Também falou Lúcio Gregori, que foi secretário de Luíza Erundina quando prefeita e defendia a tarifa zero. Ele só não explicou por que ele próprio não a implementou, mas acredita que outros podem fazê-lo. Arantes, que tem uma formação intelectual respeitável, não quer mais saber de filosofia faz tempo. Quer ação. Já há alguns anos, seus textos, pra lá da linha do compreensível — não porque falte inteligência ao leitor, mas porque falta objeto ao autor —, insinuam que a reflexão é só uma modo de procrastinação. Esse portento revolucionário que vocês veem lá no alto quer é luta, ação.
O evento teve o apoio do Passe Livre, que trabalha, não custa lembrar, em parceira com o PSOL e outras legendas de extrema esquerda. Assim como Sartre admirava Daniel Cohen-Bendit (o Ruivo), um dos líderes da revolta estudantil de Maio de 68, Arantes tenta, digamos assim, se alimentar da juventude dos coxinhas radicais do Passe Livre.

Daniel Cohen-Bendit, o ruivo maoista de Jean-Paul Sartre

Matheus Preis, o loirinho passe-livrista de Paulo Arantes
A história, claro, não se repete, mas as comédias costumam ter semelhanças estruturais. Em 1968, Cohen-Bendit — que a imprensa chamava de “Dany, Le Rouge” (“Dani, o Vermelho, porque de extrema esquerda e porque ruivo) — subiu num grande leão de Bronze na praça Denfert-Rochereau (imagem abaixo), para liderar uma grande passeata. E convocou todas as correntes que estavam na rua: trotskistas, maoistas, socialistas moderados… E emendou: “A canalha stalinista vai para o fim do cortejo”, deixando clara a hostilidade à esquerda tradicional. O Partido Comunista da França retirou o apoio aos protestos depois de algum tempo porque eles se voltaram também contra a esquerda tradicional.

Assim, não me peçam para rir de uma comédia a que já assisti. Não me peçam para rir de uma farsa que estruturalmente se repete. O fato de o Passe Livre criticar também os petistas não me comove — porque se trata de uma crítica feita pela esquerda. Hoje, usam a catraca como símbolo porque isso é parte de uma estratégia de luta. Eles mesmos confessam que o transporte é apenas o instrumento de “superação do capitalismo”.
Eu não acho que o capitalismo corra risco por causa desses bananas. Mas acho um absurdo que se sintam no direito de infernizar a vida de milhões de pessoas com sua “utopia” aloprada, que, de resto, vai acabar punindo os mais pobres.
Paulo Arantes e outros babões de sua estirpe fracassaram no exercício do ódio como instrumento de pensamento. E agora tentam reunir o que lhes resta de seiva supostamente revolucionária para fazer da catraca um instrumento de mudança do mundo. Espero que não comece a aparecer em público com o elástico da cueca à mostra. Nunca sei qual é o limite dessa gente.
É patético! Chegou ao Brasil, reitero, o pensamento de alguns neomarxistas que asseguram que o grande inimigo da “liberdade” não é o mais o capitalismo, mas a democracia representativa. E parte da imprensa, pondo uma corda no próprio pescoço, comprou essa causa!

sexta-feira, 28 de junho de 2013

Marx contra os marquissistas e os keynesianos de botequim (e os de clube de ricos também)

Quando Marx refutou Keynes e os atuais marxistas
por , Instituto Von Mises Brasil, segunda-feira, 27 de maio de 2013

 

marx1.pngMarxistas, social-democratas e demais defensores do intervencionismo estatal sempre afirmaram que determinados setores da economia — principalmente saúde, educação e segurança, mas também o setor elétrico e de telecomunicações — não podem ficar por conta do livre mercado e da livre concorrência porque a ganância e a busca pelo lucro não apenas são incompatíveis com tais setores, como também levariam a preços absurdamente caros, o que prejudicaria principalmente os mais pobres.
Já os economistas seguidores da Escola Austríaca sempre afirmaram categoricamente que é justamente a busca pelo lucro em um ambiente sem protecionismos, sem privilégios, sem agências reguladoras e sem subsídios o que gera serviços da alta qualidade e preços baixos.
E a explicação é simples: como empresários, no geral, não gostam de concorrência, eles sempre se mostram ávidos por fazer lobby e utilizar o poder estatal em seu próprio interesse com o intuito de banir a concorrência e solidificar sua posição de domínio.  Eles conseguem isso por meio de tarifas protecionistas, subsídios e agências reguladoras que cartelizam o mercado e impedem a entrada de concorrentes.
Já o livre mercado, arranjo em que não há protecionismo, subsídio e agências reguladoras, é um sistema em que são os consumidores que controlam os empresários.  No livre mercado, as empresas não têm opção: ou elas servem o consumidor de maneira eficaz ou elas fecham as portas.  E servir o consumidor de maneira eficaz significa estar sempre ofertando bens e serviços de qualidade crescente a preços cada vez menores.
É justamente o governo — com seus subsídios, privilégios especiais (como tarifas protecionistas e execução de obras públicas com empreiteiras privadas) e restrições à concorrência (por meio de agências reguladoras e exigências burocráticas) — quem promove monopólios e oligopólios, e consequentemente preços altos e serviços de baixa qualidade.  Sendo assim, se você quiser serviços de qualidade a preços cada vez menores, você tem de defender o livre mercado.
Sabe quem concorda com tudo isso?  Ninguém menos que Karl Marx.  Não deixa de ser curioso constatar que Marx entendeu perfeitamente essa realidade.  Mais ainda: ele foi explícito em demonstrar isso.  No quesito "efeitos benéficos da livre concorrência", Marx concorda com os austríacos e discorda de todos os atuais marxistas e demais intervencionistas.  Veja o que ele escreveu logo nas páginas iniciais do Manifesto Comunista:
A burguesia, pelo rápido melhoramento de todos os instrumentos de produção, pelas comunicações infinitamente facilitadas, arrasta todas as nações, mesmo as mais bárbaras, para a civilização. Os preços baratos das suas mercadorias são a artilharia pesada com que deita por terra todas as muralhas da China, com que força à capitulação o mais obstinado ódio dos bárbaros ao estrangeiro. Compele todas as nações a apropriarem o modo de produção da burguesia, se não quiserem arruinar-se; compele-as a introduzirem no seu seio a chamada civilização, i. é, a tornarem-se burguesas. Numa palavra, ela cria para si um mundo à sua própria imagem.
Em suma: além de creditar à burguesia e aos seus instrumentos de produção — isto é, ao sistema de lucros e prejuízos — a façanha de retirar nações da barbárie e levá-las à civilização, Marx afirma categoricamente que o modo de produção burguês — que nada mais é do que a busca pelo lucro — gera mercadorias a preços baratos.  E não apenas isso: ele afirma que o sistema de lucros e prejuízos compele todas as nações a adotarem este modo de produção, sob pena de se arruinarem por completo caso não o façam.
Ou seja, o real problema dos atuais marxistas e demais intervencionistas que se dizem contrários a serviços de saúde, educação, segurança, energia e telecomunicações serem ofertados em um ambiente de livre concorrência, pois seriam caros e inacessíveis para os pobres, é que eles certamente não leram Marx.  Se leram, não entenderam.  Marx entendeu perfeitamente que a busca pelo lucro sob um arranjo de livre concorrência leva ao barateamento dos produtos e serviços, e que tal barateamento é "a artilharia pesada com que [o sistema de lucros] ... compele todas as nações a apropriarem o modo de produção da burguesia [e se tornarem civilizadas], se não quiserem arruinar-se."
Ao contrário dos marxistas atuais que defendem a estatização de vários serviços sob o argumento de que isso reduziria seus preços, Marx entendeu que é a busca pelo lucro o que realmente derruba os preços, e não a estatização destes serviços.
Como se não bastasse, Marx também disparou um petardo contra keynesianos defensores de estímulos fiscais e de políticas de endividamento estatal.  Marx zombou o keynesianismo antes mesmo de este sistema ter sido criado — algo possível porque não havia absolutamente nada de original nas ideias de Keynes.
Eis o que escreveu Marx em O Capital, capítulo 24, seção 6, "A Gênese do Capitalista Industrial":
A única parte da chamada riqueza nacional que realmente está na posse coletiva dos povos modernos é a sua dívida pública.  Daí ... a doutrina moderna de que um povo se torna tanto mais rico quanto mais profundamente se endividar.  A dívida pública torna-se o credo do capital.  E, com o surgir do endividamento do Estado, vai para o lugar dos pecados contra o Espírito Santo — para os quais não há qualquer perdão — o perjúrio contra a dívida do Estado.
Como com o toque da varinha mágica, [a dívida pública] reveste o dinheiro improdutivo de poder procriador e transforma-o assim em capital.  ... [Mas] a moderna política fiscal... traz em si própria o germe da progressão automática. A sobretaxação não é um acidente, mas sim um princípio.
Conclusão
Eis, portanto, as duas crenças que um genuíno seguidor de Karl Marx deve apresentar: a busca pelo lucro em um ambiente de livre mercado gera redução de preços, e políticas fiscais keynesianas, além de serem um método de escravização, fazem com que dinheiro improdutivo seja ilusoriamente visto como capital gerador de riqueza.  Mais ainda: segundo Marx, criticar o endividamento do estado passou a ser visto pelos defensores da gastança estatal como um ato equivalente a uma blasfêmia contra o Espírito Santo.
Logo, se você é um marxista defensor dos pobres e quer que eles tenham acesso a bens e serviços de qualidade a preços baixos, você tem de defender o livre mercado.  Se você defende que o povo tenha poder sobre as empresas, você tem de defender o livre mercado.  E se você é contra a escravização do povo pelas elites financeiras, você tem de defender que os gastos do governo sejam restringidos ao máximo. 
Agora, se você defende que o governo regule o mercado e gaste demasiadamente, você estará defendendo os interesses das grandes empresas e das elites financeiras, e estará defendendo que elas tenham privilégios sobre os pobres e que elas os oprimam com a abolição da concorrência, com preços altos e com serviços precários.
Palavras de Marx.

Leandro Roque é o editor e tradutor do site do Instituto Ludwig von Mises Brasil.