Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
sábado, 15 de novembro de 2025
Confissões não agostinianas - Paulo Roberto de Almeida
Uma opinião puramente subjetiva sobre o mal absoluto - Paulo Roberto de Almeida
Uma opinião puramente subjetiva sobre o mal absoluto
Paulo Roberto de Almeida
A Rússia não é um Estado normal, nunca foi, jamais passou por qualquer tipo de “iluminismo”, ou seja, uma concepção admitida de humanismo. É uma espécie de barbarismo que adotou a aparência de um Estado, mas que no fundo continua bárbaro, no sentido mais objetivo da expressão, um comportamento de animal predatório, selvagem, no mais alto grau: tudo lhe é permitido: matar, esfolar, decepar, esquartejar, trucidar, enfim, cometer todo tipo de barbarismo, não talvez o súdito comum, mas os chefes e seus imediatos servos submissos. Sempre foi assim desde os tempos de Ivan, o Terrível, continua sendo assim com Putin, o cleptocrata da KGB, o chefe de máfia de St. Petersburg, o tirano de Moscou, o invasor desapiedado da Ucrânia, o destruidor da ordem política criada em 1945, na Carta da ONU. O autocrata com pretensões a entrar para a história como o único senhor do maior Estado do planeta.
Paulo Roberto de Almeida
Ode às estatais, artigo de Elisa Vieira Leonel e Lea Vidigal; critica de Marcelo Guterman
Ode às estatais
Marcelo Guterman, 14/11/2025
(artigo: Estatais: o mito liberal e as realidades do mundo)
Elisa Vieira Leonel e Lea Vidigal
Fazia tempo que não via uma defesa explícita da existência de empresas estatais. As autoras, uma burocrata do atual governo e uma doutora pela USP, demonstram onde estão os corações e mentes do governo e da universidade.
Um artigo como esse é útil para sistematizar as falácias dos que defendem a necessidade de empresas estatais. A começar pelo comando constitucional. As articulistas preferem citar uma genérica “ordem econômica voltada à justiça social, à redução da desigualdades e à soberania nacional”, como se a existência de estatais fossem o único meio de atingir esses objetivos, e deliberadamente esquecem o artigo 173: “Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.” Ou seja, estatal é exceção, que deve estar fundamentada, não regra.
O artigo continua, vomitando uma série de estatísticas sobre como o mundo inteiro tem empresas estatais. Malandramente, não destaca o papel da China nessas estatísticas. Nos países desenvolvidos, com a possível exceção da Noruega e sua estatal do petróleo, a presença de estatais na economia é marginal. Aqui, Petrobras, Banco do Brasil, Caixa e, até outro dia, Eletrobras, estão entre as maiores empresas brasileiras. E isso se considerarmos somente o que temos hoje. De acordo com a mentalidade das articulistas, ainda teríamos o sistema Telebras, a Vale, a Embraer e quase todo o sistema siderúrgico nas mãos do Estado. Seríamos quase uma China tropical, sem a competência dos chineses.
E por falar em competência, as articulistas insistem que o problema não são as estatais em si, mas a eficiência da governança. A ironia é a citação da Lei 13.303/16 como um marco nesse sentido. Ora, essa lei foi aprovada pelo governo Temer, justamente para desfazer a lambança que os governos do PT fizeram nos anos em que comandavam as estatais. Essa mesma lei teve seus efeitos suspensos por liminar do então ministro petista Ricardo Lewandowski, o que permitiu ao governo do qual uma das articulistas faz parte nomear políticos para cargos nas estatais. Uma lição de governança, sem dúvida.
Um outro argumento usado para defender as estatais é o fato de não focarem nos lucros de curto prazo e, por isso, seriam instrumentos de investimentos de longo prazo. Daí eu pergunto: quem tem mais chance de sucesso em investimentos de longo prazo, investidores com o skin in the game, ou burocratas seguindo ordens do político que está circunstancialmente sentado na cadeira presidencial? Apontar, por exemplo, o pré-sal como sucesso de investimento estatal de longo prazo é fazer uma avaliação sem o contrafactual. A pergunta correta é: quantos barris de petróleo estaríamos produzindo hoje se a Petrobras fosse privada?
A ladainha a favor das estatais continua com o surrado argumento, sempre brandido e nunca cientificamente provado, de que as estatais proporcionam “externalidades globais positivas”. Uma ou outra, como a Embrapa, pode ser. Mas no conjunto, o que temos é simplesmente destruição de valor. Os prejuízos que a Petrobras teve por seguir políticas de governo, e que fizeram parte relevante da gigantesca recessão que enfrentamos, certamente não foram compensadas por “externalidades globais positivas”. Os Correios, com a velha desculpa de “entregar cartas em lugares remotos”, causam prejuízos insanos. Devem ser as cartas mais caras do mundo. E os brasileiros que vivem no meio da merda a céu aberto, estão até hoje em busca das “externalidades globais positivas” proporcionadas pelas estatais estaduais de saneamento.
Mas é uma expressão perdida no meio do artigo que revela o principal motivo para a existência de estatais: os seus próprios funcionários. Ao qualificar o emprego que as estatais proporcionam, as articulistas usam o termo “justo”. “Essas empresas [estatais] empregaram, DE FORMA JUSTA, mais de 441 mil pessoas”. Daí se conclui que as empresas privadas empregam de forma injusta. Está aí, de forma sutil mas clara, o motivo pelo qual as estatais são defendidas com unhas e dentes. Afinal, é o único lugar do Brasil que trata os funcionários de maneira justa. Às custas, claro, das outras centenas de milhões de brasileiros que não têm a sorte de ter um “emprego justo”.
Brasil: um crescimento decepcionante em 40 anos - Silber, Luna e Zagha (Valor Econômico)
Na edição do Jornal Valor de 24/09/2025, o artigo "Um crescimento decepcionante em 40 anos", de autoria de Luque, Silber, Luna e Zagha.
Valor Econômico, 14/11/2025
No primeiro parágrafo:
O professor Hélio Dias, Presidente do Instituto de Valorização da Educação e Pesquisa do Estado de São Paulo, apresentou ao professor Carlos Luque, presidente da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), um gráfico resumindo o crescimento de vários países nos últimos 40 anos, com a pergunta: o que explica a estagnação do crescimento no Brasil?
Enquanto a China, Índia, Indonésia e outros veem seu PIB per capita crescer a taxas que chegam a 4%-6% ao ano, o Brasil cresce muito lentamente, ao ponto de, como discutido em julho num artigo nesse jornal, o país estar se aproximando do grupo de países de baixa renda.
O crescimento brasileiro tem uma enorme dicotomia. Durante 80 anos, a economia brasileira teve a segunda maior taxa de crescimento do mundo. Duplicou sua renda per capita entre 1900-1940 e a quintuplicou entre 1940-80, saindo de um país pobre para um país de classe média.
Enquanto no período 1945-80, a média do crescimento do PIB per capita girou em torno de 4,5% ao ano, a partir de 1981 o crescimento da renda per capita cai para algo como 1% ao ano. Desde o começo dos anos 1980, o Brasil perdeu sua capacidade de crescimento.
Penúltimo e último parágrafos:
Partindo do princípio que o desenvolvimento é uma tarefa conjunta do setor público e privado, algumas etapas seriam importantes:
1. Recuperar o papel do planejamento econômico que foi perdido à medida que os orçamentos públicos começaram a ficar muito comprometidos;
2. Promover uma discussão mais ampla envolvendo todos os setores da sociedade, setor privado, Poder Executivo, Legislativo, Judiciário, para fazer um esforço comum para superar nossas dificuldades. E tentar convencer o óbvio, de que com o crescimento econômico todos ganham;
3. Procurar reduzir a taxa de juros com o objetivo de ampliar os investimentos públicos e privados;
4. Recuperar a capacidade de crescimento da economia, que seja obtida com uma substancial melhoria da justiça social.
O ponto central da discussão é que não podemos pensar em desenvolvimento econômico pensando apenas no papel do setor público. O desenvolvimento depende tanto do setor público como do setor privado e é tarefa de todos.
Apresento abaixo uma nota para discussão interna, que fiz quando trabalhava no Inmetro, em 2020, intitulado "O Inmetro e o Índice de Ambiente de Negócio do Fórum Mundial Econômico", para as discussões que o órgão participava desde o governo Itamar Franco, que continuou no governo seguinte de Jair Bolsonaro, sobre a adesão do País à OCDE.
Muito ancorado nos pilares deste índice e de outros, como elaborado por aquela instituição, pelo Banco Mundial e pela própria OCDE. O objetivo é mostrar que os maiores gargalos que travam a economia brasileira podem ser resolvidos por uma administração pública mais técnica e menos ideológica!
"O Inmetro e o Índice ambiente de negócio do Fórum Mundial Econômico.
Com a Quarta Revolução Industrial (4RI), a humanidade entrou em uma nova fase. A 4RI tornou-se uma realidade vivida por milhões de pessoas em todo o mundo e está criando novas oportunidades de negócios para governos e indivíduos.
Neste contexto, o Fórum Econômico Mundial introduziu um novo Índice de Competitividade Global (GCI 4.0), uma bússola econômica muito necessária. O índice integra aspectos bem estabelecidos com alavancas novas e emergentes que impulsionam a produtividade e o crescimento. Ele enfatiza o papel do capital humano, inovação, resiliência e agilidade, não só como impulsionadores, mas também como características definidoras de sucesso econômico no 4RI.
Apela para uma melhor utilização da tecnologia para saltar adiante, mas também adverte que isso só é possível como parte de uma abordagem holística com outros fatores de competitividade. Finalmente, ele oferece dados objetivos e análise para uma abordagem desapaixonada, orientada para o futuro e racional elaboração de políticas.
Os resultados do GCI 4.0 revelam uma conclusão sóbria de que a maioria das economias está longe da fronteira de competitividade, o ideal no agregado de todos os fatores de competitividade. De fato, a média global de pontuação de 60 sugere que muitas economias ainda precisam implementar as medidas que melhorariam seu crescimento e resiliência a longo prazo e ampliar as oportunidades para as suas populações.
Além disso, os países têm um desempenho misto nos doze pilares do índice e que o desenvolvimento de longo prazo, como instituições que funcionam bem, continuam a ser um atrito de longo prazo. No entanto, existem pontos brilhantes - sob a forma de economias que superam seus pares e apresentam casos valiosos estudos para aprender mais sobre métodos para implementar os fatores de competitividade.
A Metodologia
Com os fatores de produtividade mais importantes determinantes do crescimento e da renda a longo prazo, o novo Índice de Competitividade Global 4.0 (GCI 4.0) lança luz sobre um novo conjunto de fatores críticos para a produtividade na Quarta Revolução Industrial (4RI) e fornece uma ferramenta para avaliá-los. O GCI 4.0 renovado resume a nova ferramenta, bem como os resultados revelados para os países em si e comparativamente a nível global e regional.
Novos conceitos e novos esforços de coleta de dados, o GCI 4.0 fornece insights novos e com mais nuances sobre os fatores que irão crescer em importância com a 4RI, que reúne: capital humano, inovação, resiliência e agilidade. Estas qualidades são capturadas através de um número de novos conceitos criticamente importantes (por exemplo, cultura empreendedora, empresas que abraçam ideias disruptivas, colaboração multistakeholder, pensamento crítico, meritocracia, confiança social), complementando componentes mais tradicionais (por exemplo, C&T e infraestrutura física, estabilidade macroeconômica, direitos de propriedade, anos de escolaridade).
Novos benchmarks. O GCI 4.0 introduz uma nova pontuação de progresso variando de 0 a 100. A fronteira (100) corresponde ao máximo da meta para cada indicador e normalmente representa um objetivo de política. Cada país deve visar maximizar sua pontuação em cada indicador, e a pontuação indica seu progresso atual contra a fronteira, assim como a distância restante.
Doze pilares de competitividade. Há um total de 98 indicadores no índice, derivados de uma combinação de dados de organizações internacionais, bem como do parecer executivo do Fórum Econômico Mundial Pesquisa. Estes são organizados em 12 pilares no GCI 4.0, refletindo a extensão e complexidade dos condutores da produtividade e do ecossistema de competitividade. São eles: instituições; infraestrutura; adoção de TIC; estabilidade macroeconômica; saúde; habilidades; mercado de produtos; mercado de trabalho; sistema financeiro; tamanho do mercado; dinamismo dos negócios; e capacidade de inovação.
Dos 98 indicadores que compõem estes doze pilares e, consequentemente, o GCI 4.0, 44 são provenientes do Fórum Pesquisa de Opinião Executiva e 54 baseiam-se em estatísticas fornecidas por fontes externas confiáveis. O cálculo do GCI 4.0 é baseado em sucessivas agregações de escores normalizados de indicadores (o nível mais desagregado) até ao nível global de pontuação do GCI. As pontuações infra pilar e no GCI são expressas em uma escala de 0 a 100 e são interpretadas como "pontuações de progresso", indicando quão perto um país está do estado ideal. A pontuação geral do GCI é a média simples dos 12 pilares, então o peso implícito de cada pilar é 8,3% (1/12).
Uma igualdade de condições para o desenvolvimento para todos os países parecia relativamente clara a partir da segunda metade do século XX: as economias de baixa renda deveriam se desenvolver através da industrialização progressiva, alavancando a mão de obra pouco qualificada. No contexto da 4RI, a sequência tornou-se menos clara, particularmente com relação aos baixos custos de tecnologia e capital, como nunca ocorreram na história, mas os seus usos bem-sucedidos dependem da reunião de um número de outros fatores.
O GCI 4.0 reflete essas complexidades da priorização de políticas através da ponderação de pilares da mesma forma, de acordo com a dinâmica particular de cada país em fase de desenvolvimento. Em essência, o índice oferece a cada economia uma igualdade de condições para definir o seu caminho para o crescimento. Enquanto o sequenciamento depende da prioridade de cada economia, o índice afirma que as economias precisam ser holísticas em suas abordagens à competitividade, em vez de se concentrarem em um fator específico sozinho.
Um forte desempenho em um pilar não pode compensar um fraco desempenho em outro. Por exemplo, investir em tecnologia sem investir em habilidades digitais não produzirá ganhos de produtividade significativos e nenhuma área pode ser negligenciada.
Resumo do resultado do Índice
Dez principais economias: Os Estados Unidos são a economia mais próxima da fronteira, o estado ideal, com um índice de 85,6, a 14 pontos da fronteira de 100. A economia mais bem classificada ainda tem espaço para melhoria. Seguem Cingapura (83,5) e Alemanha (82,8). Suíça (82,6) chega em 4º lugar, seguido pelo Japão (82,5), Holanda (82,4), Hong Kong (82,3). Reino Unido (82,0), Suécia (81,7) e Dinamarca (80,6).
A pontuação mediana é de 60,0, entre os EUA (85,6, 1º) e o Chade (35,5, 140º)
Alcançar a igualdade, sustentabilidade e crescimento juntos é possível, mas precisa de visão proativa e liderança. Há a necessidade de um modelo mais holístico de progresso econômico que promova padrões de vida mais altos para todos, respeitando os limites planetários. É possível ser pró-crescimento e pró-equidade.
A relação entre desempenho no GCI 4.0 e em medidas ambientais é menos conclusiva. As economias mais competitivas e as de maiores coberturas ecológicas não são as mesmas, e as mais eficientes nessas coberturas por unidade do PIB são as mais baixas. Isto é, portanto, a incumbência dos seus líderes é estabelecer prioridades e esforços proativos para criar ciclos virtuosos entre igualdade, sustentabilidade e crescimento.
Brasil: Desempenho no GCI 4.0
- 72º lugar, perdeu 3 posições em relação a 2017
- Manteve-se em penúltimo lugar no G20, apenas acima da Argentina e em último dos BRICs
- 5 lugares abaixo da África do Sul (67°), mesmo este país tendo perdido 5 lugares
- Seu índice atingiu 59,5, portanto, 0,5 abaixo da mediana
O Azerbaijão é o país que seu índice atingiu 60 e está 3 posições acima do Brasil, 69°. Mas o objetivo do Brasil, externado na última reunião do Fórum Econômico Mundial, é de ocupar uma das 50 primeiras posições no GCI 4.0. O 50° lugar é ocupado pelo Bahrein com o índice de 63,6, portanto, para figurar entre os cinquenta melhores países neste ranque, o Brasil deve superar a marca atual do Bahrein ou adicionar mais de 4,5 em seu índice, para subir 22 posições.
O Brasil, a maior economia da América do Sul, tem sua pontuação impulsionada pelo tamanho relativamente grande do mercado (80,9, ranque 10) e desempenho no pilar Saúde (79,6, ranque 73). No pilar da capacidade de inovação, o país está classificado em 40º no geral, porém permanece abaixo do seu potencial, por causa de sua integração deficiente de suas políticas e falta de coordenação entre os setores público e privado, que estão entre os fatores institucionais que inibem seu desempenho.
Por outro lado, o Brasil ocupa o 9º lugar na América e 108º no geral no pilar de dinamismo de negócios, com uma pontuação de 52,4. Promovendo a inclusão de mais empresas no ecossistema de inovação, o Brasil poderia capitalizar ainda mais o seu potencial de inovação e estimula…
[18:57, 11/11/2025] Paulo: O Inmetro e sua influência nos Pilares, nos Indicadores e nos Ranques do Brasil
O Índice:
- Pontos e Ranque por pilar do Brasil:
- Mediana: 60 pontos
- 69° (Ranque/Azerbaijão): 63,6 pontos
- 50° (Ranque/Bahrein): 63,6 pontos
- CGI4.0: 59,5 pontos (72° lugar, Brasil)
- Pilares:
- Institucional: 49,7 pontos (93° lugar)
- Infraestrutura: 64,3 pontos (81° lugar)
- C&T: 55,6 pontos (66° lugar)
- Estabilidade Macroeconômica: 64,6 pontos (122° lugar)
- Saúde: 79,6 pontos (73° lugar)
- Qualificação: 56,0 pontos (94° lugar)
- Mercado de Produto: 51,0 pontos (114° lugar)
- Sistema Financeiro: 63,2 pontos (57° lugar)
- Tamanho de Mercado: 80,9 pontos (10° lugar)
- Dinamismo dos Negócios: 52,4 pontos (108° lugar)
.O Inmetro tem participação importante nestes três pilares e nos cinco indicadores. As classificações do Brasil nos ranques de 4 destes 5 indicadores são preocupantes, especialmente no indicador de Ônus da Regulação Governamental, onde o país ocupa o último lugar, e no indicador de Prevalência de Barreiras não Tarifárias, onde o país beira o último lugar.
Fiscalizam as importações e exportações, o peso do Inmetro é significativo. A reportagem com a presidente e com o Diretor Interino da Dconf do Inmetro publicada no Valor Econômico e no Estado de São Paulo e o estudo: “Os Custos dos Órgãos Anuentes no Comércio Exterior Brasileiro”, não deixam dúvidas da importância da atuação do órgão no comércio exterior e na classificação do Brasil neste indicador.
O seguinte trecho do sumário deste estudo dá um panorama deste ônus: “Os chamados órgãos anuentes são as instituições que participam do processo de concessão das licenças necessárias para as operações de comércio exterior, exercendo controle sobre certas mercadorias a serem importadas ou exportadas. Tal denominação, portanto, abrange todos os órgãos que exercem que exercem algum tipo de controle ou fiscalização no processo de obtenção da licença de importação ou registro de exportação.
Os encargos cobrados por órgãos anuentes são vistos pelo setor privado como um dos entraves mais críticos ao comércio exterior no Brasil. Dentre os obstáculos relacionados a trâmites aduaneiros, tais encargos não superam apenas o peso dos custos de uso de infraestrutura de portos e aeroportos, conforme a pesquisa “Desafios à Competitividade das Exportações Brasileiras” realizada pela CNI, em 2016, e que motivou o desenvolvimento deste estudo”.
Obviamente que o Inmetro, também, tem muito para melhorar a classificação do Brasil no indicador Eficiência no Desembaraço de Cargas, na questão relacionada às licenças não automáticas de importações, que por sinal, inclusive pode ser não mais exigida
Finalmente, nos dois últimos indicadores – Custo e Tempo de Iniciar um Negócio – o Inmetro teria alguma ingerência quando o negócio em questão dependesse para seu funcionamento de avaliação de conformidade e registro de seus produtos pelo Inmetro."
Mercosul e Brasil em face dos "acordos" comerciais trumpistas - Paulo Roberto de Almeida
Não sei ainda o que foi exatamente estabelecido no "acordo comercial" dos EUA (Trump) com a Argentina (Milei), justamente devido ao conteúdo personalista desse estranho "acordo".
Só pressinto, mas sem ter elementos fiáveis de informação, que suas consequências práticas afetarão não apenas o Brasil, mas igualmente o Mercosul, que está cada vez mais esvaziado.
Lamento, não como diplomata, mas como simples observador do comércio exterior do Brasil, a "implosão" do Mercosul - o mais importante projeto estratégico da diplomacia do Brasil no último meio século.
Trump implodiu, se não destruiu, a cláusula de nação mais favorecida, o que não é geral, pois a maioria dos países continua aderente a esse esteio básico do sistema multilateral de comércio, mas esses "acordos", impostos por Trump, acabam por simplesmente destruir outros compromissos bilaterais e plurilaterais (como o do Mercosul) com terceiros países. Como os EUA mantém – a despeito da atual preeminência da China no comércio internacional – um espectro praticamente mundial nas relações econômicaos (ou seja, não apenas comerciais) com uma ampla gama de países, os EUA de Trump são capazes de desmantelar cadeias de valor e fluxos tradicionais de comércio em setores específicos, o que afeta o planejamento microeconômico.
Do ponto de vista do Brasil, o que afeta realmente nosso planejamento diplomático, não é tanto a ruptura dos fluxos comerciais, mas a incerteza derivada das políticas demenciais de Trump (e de associados subservientes como Milei), que nos impedem de planejar nosso futuro comercial e o destino (se por acaso existe algum) do Mercosul.
sexta-feira, 14 de novembro de 2025
Politica Externa e Interesse Nacional - debate com Vitelio Brustolin, Karina Stange Calandrin e Paulo Roberto de Almeida
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A New Economic Playbook for Policymakers - Tim Besley, Andrés Velasco (Project Syndicate)
A New Economic Playbook for Policymakers
A New Economic Playbook for Policymakers
TIM BESLEY and ANDRÉS VELASCO
Project Syndicate, Nov 13, 2025
The Washington Consensus assumed that economic growth would automatically follow market liberalization. That belief has not aged well, and a new policy approach must include innovation, good jobs, climate stability, gender equality, and a state empowered to provide effective regulation and high-quality public services.
LONDON – Voters in many countries are furious. Democratic leaders, lacking a playbook, seem unable to address the causes of that fury. The only people benefiting from this vacuum are populists and wannabe strongmen.
In Britain, the Labour government looks like it wants to go back to the tax-and-spend solutions of the past, while some Conservatives pine for a revival of Margaret Thatcher’s free-market policies. Both appear clueless in articulating a vision that is attractive to today’s voters.
Especially damning is the perception, common in many countries, that governments, hamstrung by political paralysis or excessive regulation, cannot get anything done. If democratic politicians are all talk and no action, then populists, with their boasts (rarely fulfilled) of decisive action to come, offer an appealing alternative.
To help create a new playbook, we asked a group of leading economists what the world should have learned in the 35 years since the so-called Washington Consensus became a policy lodestar. Their answers, which have just been published in book form, constitute the London Consensus, offering hope that a new policy approach, based on sound economic principles, can help push back against authoritarian populism.
Like its predecessor, the London Consensus holds that an economy with low inflation, prudent fiscal policies, and openness to world trade offers the best hope for human flourishing. But unlike the Washington Consensus, the new playbook showcases a transformed approach to economics that includes innovation, good jobs, gender equality, a focus on climate, and a political economy that empowers the state to deliver.
A first order of business is getting economies to grow again. Despite being cursed as “neo-liberal” by its critics, the Washington Consensus had surprisingly little to say about economic growth. Its assumption that growth would automatically follow market liberalization has not aged well.
Over the last 35 years, thanks largely to the work of the most recent Nobel laureates, including our London Consensus co-author Philippe Aghion, we have learned that “getting the prices right” is not enough. Growth depends on innovation, which requires striking the right balance between competition and rewards for new ideas. Governments play a role by supporting research, education, and a financial system that allows firms to invest and adopt new technologies.
Although growth and well-being are linked, that connection, too, is no longer viewed as automatic. People care about incomes and consumption. But they also care about the health of their communities and the sense that policies and national politicians treat “people like them” fairly. A new approach must focus on how economic systems shape both prosperity and the social fabric that holds communities together.
Left-behind regions require a great deal more than cash transfers. The loss of jobs and businesses weakens local communities and affects people’s lives and sense of dignity in ways that money alone cannot fix. Place-based policies should be a central component of the new playbook. We need to take good jobs to where people are, not vice versa.
People want stability as well, so moderating the ups and downs of the economy should also be a main goal of policy. The Washington Consensus focused only on one kind of instability, caused by irresponsible fiscal and monetary policies, but that was too narrow. Today we understand that financial crises, health emergencies, and even climate change can also be major sources of shocks.
By serving as an insurer of last resort, as they did during the COVID-19 pandemic and the 2007-09 global financial crisis, governments can protect citizens from losing their jobs, savings, or access to health care. But advocating such an activist fiscal policy is not the same as claiming that anything goes. On the contrary: to supply last-resort insurance, governments must be able to borrow during crises, which in turn requires that they run surpluses and cut their debts in good times.
The Washington Consensus gave the impression that the state’s role should be minimal, but that was always too simplistic. An effective government should be small enough not to get in the way of the private sector, but strong and capable enough to do all the things government needs to do in a modern economy, which includes providing effective regulation and high-quality public services. In turn, building government capacity requires long-term investment in people, institutions, and systems.
The quality of governance also depends on political institutions, which to be successful must evolve along a narrow corridor. When power is too fragmented, reaching agreement on matters of common interest becomes impossible. And when power is concentrated in too few hands, without effective checks and balances, unresolved grievances accumulate, driving citizens to seek untried alternatives.
The London Consensus believes that good economics cannot be separated from good politics. Insofar as it assumed that adopting sound economic policies would automatically cause political problems to sort themselves out, the Washington Consensus was naive. The political origins of economic policies make a big difference. Reforms imposed from above, without local support or legitimacy, usually fail.
Moreover, what may seem like good economic policies can have bad political effects if they increase inequality or resentment. Rather than treating politics as an obstacle, economists should see it as essential to making fair and lasting economic choices.
We do not claim that the Washington Consensus caused the current wave of populism. But when it comes to addressing today’s challenges, it does not provide the answers. For that, we need to go beyond the old recipes. The London Consensus provides a fruitful alternative.
The Miracle of Economic Growth - Leonidas Zelmanovitz Academia.edu
Joshua Banerjee deservedly cheered their award in these pages.
Professor Mokyr's insights explained how human societies have escaped stagnation to achieve sustained growth.
The Nobel Foundation and the other prize-awarding institutions stated on their website:
Over the past 200 years, the world has witnessed more economic growth than ever before. Its foundation is the constant flow of technological innovation; sustained economic growth occurs when new technologies replace old ones as part of the process known as creative destruction. This year’s laureates in economic sciences explain, using different methods, why this development was possible and what is necessary for continued growth.
The award celebrates the causes of sustained economic growth. At the same time, Carl Benedikt Frey’s new book, How Progress Ends: Technology, Innovation, and the Fate of Nations, investigates why it eventually stalls.
Frey’s book opens as a counterpoint to Mokyr’s optimism about unending technological progress. Mokyr has long argued that despite headwinds — wars, depressions, totalitarianism — the twentieth century proved to be the most successful in human economic history. As he put it in an interview with Russ Roberts on EconTalk, “you ain’t seen nothing yet.”
Frey, however, if not exactly questioning that confidence, warns that guided by the historical record, it cannot be taken for granted. His central concern is why the same societies that once led technological revolutions later fell behind or stagnated. The book’s thesis is that progress does not end because human ingenuity runs out, but
because political and institutional arrangements evolve in ways that inhibit innovation. The result is a compelling, deeply researched study of the “political economy of progress.”
Frey’s emphasis lies squarely on institutions rather than culture. For instance, the subsidiarity principle is not mentioned in the book, but a federal form of government is. He does not dwell on the moral or philosophical causes of stagnation, but instead explores how the very structures that enable progress — such as political stability, bureaucratic efficiency, and centralized coordination — can eventually suppress it. He states that “the institutional arrangements conducive to innovation are not the same as those conducive to growth.” Once a society begins to grow, vested interests emerge; these groups then utilize political power to safeguard their privileges, resisting disruptive change. This public-choice dynamic explains why innovation often slows in mature economies.
To illustrate his thesis, Frey traverses economic history, comparing China’s Song dynasty (960–1273 CE) and early modern Europe. During the Song period, China achieved remarkable technological feats — gunpowder, movable type, shipbuilding, and the magnetic compass. Yet, as Frey recounts, these innovations were followed
by a period of centralization that prioritized bureaucratic control over experimentation. By the fifteenth century, Chinese authorities imposed “sea bans” that curtailed maritime exploration, effectively turning their back on the world. The result was stagnation despite immense technical capacity.
In contrast, Europe’s fragmented political landscape fostered competition among states. Monarchs unable to fully tax or control their territories had to bargain with local elites, resulting in decentralized governance. When one state suppressed innovation, another might seize the opportunity. This political decentralization underpinned Europe’s later dominance during the Age of Discovery and the Industrial Revolution.
Frey’s comparison is more than historical: it suggests that decentralization — what political theorists might call “polycentricity” — is crucial for sustaining innovation. His analysis builds upon earlier arguments by Mokyr and Douglass North, adding empirical depth through examples from taxation systems, navigation, and industrial policy.
One of Frey’s strongest arguments is that decentralized political systems are more conducive to technological breakthroughs, while centralized systems excel at scaling them. As he notes in the epilogue, “discoveries thrive in decentralized systems, while scaling and production need centralization.” The challenge for any society is to transition between these stages without stifling innovation through rent-seeking or bureaucratic inertia.
The book’s exploration of nineteenth-century Germany is particularly instructive. Frey attributes the differences in development between northern and southern German states to varying degrees of corporatism. In the south, entrenched guilds and corporatist interests resisted competition, stifling growth. Modernization, he argues, often followed defeat or crisis — such as the Prussian reforms after Napoleon’s victories. Yet his account of how Germany eventually surpassed Britain is less convincing. Frey attributes the shift largely to bureaucratic meritocracy, but this explanation, while plausible, underplays the role of entrepreneurial culture and trade networks.
Frey draws a provocative parallel between the contemporary United States and China, arguing that both risk succumbing to the same stagnation that befell earlier civilizations. In China, innovation remains constrained by centralized political control and a lack of judicial independence. The Communist Party’s monopoly prevents genuine institutional competition. Meanwhile, in the United States, entrenched interests, lobbying, and the sheer size of government have created barriers to disruptive innovation.
The contrast between California’s innovation ecosystem, where non-compete agreements are forbidden, and more rigid states like Michigan exemplifies Frey’s broader point: institutional flexibility matters. By allowing labor mobility and competition, decentralized jurisdictions foster the kind of creative destruction that sustains progress.
Yet both systems, Frey warns in Chapter 13, “The Veneer of Progress”, may already be on the path toward stagnation. Technologies that enhance bureaucratic control—such as data mapping and AI-driven oversight—risk concealing new discoveries rather than enabling them. The same tools that once drove progress may now be turning inward, serving to preserve the status quo.
Frey devotes significant attention to property rights and their institutional flexibility. Too rigid a conception of property discourages experimentation; too loose a one undermines incentives. The balance between these extremes determines whether innovation flourishes or falters. In this respect, Frey echoes classical liberal economists, such as Friedrich Hayek, and modern institutionalists, like Daron Acemoglu and James Robinson.
The size of the state also matters. The more resources a government commands, the greater its capacity to distribute rents and the more powerful vested interests become. Frey thus offers a cautionary message for contemporary democracies: expansive bureaucracies, even those motivated by egalitarian aims, can unintentionally entrench privilege and inhibit change.
In his concluding pages, Frey summarizes his thesis with characteristic clarity: “Our pathway to riches has been paved by technological progress… From 1800 to the present day, the real income of the average person on this planet has grown by a factor of ten”. Yet history shows that no society has remained at the technological frontier for long. The endurance of progress depends on citizens’ faith that its benefits are broadly shared. “Without this elief,” Frey warns, “resistance to change becomes likely.”
Frey closes with a plea for civic engagement: “My hope is that this tome will play a small part in enlisting more citizens to rally to the defense of progress”. It is a fitting conclusion to a work that bridges economic history, political science, and, we may say, moral philosophy. I read How Progress Ends not as a chronicle of decline, but as a meditation on how societies might avoid it.
Frey’s achievement lies in synthesizing an immense range of historical and contemporary material into a coherent theory of innovation and decline. His writing is clear, his examples vivid, and his argument logically consistent. The book’s only weaknesses are interpretative: at times, Frey’s institutional explanations risk crowding out the cultural and moral dimensions of progress. Nonetheless, his work remains a significant contribution to the study of economic history and institutional design.
For readers of Mokyr, Aghion, or North, Frey’s book will feel both familiar and urgent. It reminds us that progress is not self-sustaining — it depends on political courage, institutional adaptation, and the constant defense of the sphere of liberty, that is, individual human rights, including private property rights, against the depredations of those who do not understand how fragile progress is.
Leonidas Zelmanovitz is a Senior Fellow at Liberty Fund and a part-time instructor at Hillsdale College.
O Retrocesso Invisível: Como o Governo Ignora o Saneamento Enquanto Discursa Sobre Saúde e Clima na COP30 - André Medici
O Retrocesso Invisível: Como o Governo Ignora o Saneamento Enquanto Discursa Sobre Saúde e Clima na COP30
MEDICI ANDRE
International Senior Consultant in Health Economics and Health Development Strategy - Author @ Monitor de Saude Blog | PhD in Economic History
November 13, 2025
André Medici
As reuniões do Ministério da Saúde na COP30, em Belém, foram marcadas por discursos grandiosos, painéis inspiradores e um entusiasmo diplomático raro. O governo apresentou-se como líder global na integração entre saúde e meio ambiente, lançou o Plano de Belém e defendeu a importância da resiliência climática para proteger populações vulneráveis.
Mas havia um silêncio ensurdecedor no centro de tudo. O Ministério da Saúde evitou qualquer menção ao maior fracasso ambiental e sanitário do próprio governo — o retrocesso na política de saneamento básico.
Ao exaltar compromissos internacionais, o governo Lula deixou de reconhecer que a reversão do Marco Legal do Saneamento, promovida desde 2023, enfraquece exatamente os pilares que seu discurso internacional pretende defender: proteção da saúde pública, prevenção de doenças ambientais e adaptação aos eventos climáticos extremos.
É difícil liderar o mundo quando se ignora o que acontece no quintal. O Brasil segue paralisado na área de saneamento básico e o governo finge que não vê. O saneamento básico é a infraestrutura mais essencial para a saúde humana. Água potável e esgoto tratado salvam mais vidas do que qualquer nova tecnologia, política climática ou programa emergencial. Ainda assim, o país convive com indicadores que beiram o inaceitável:
quase 35 milhões de brasileiros sem água potável,
mais de 100 milhões sem coleta de esgoto,
em vários estados, menos de 15% do esgoto é tratado,
e boa parte das perdas de água ultrapassa 40%, puro desperdício.
Em vez de acelerar as reformas estruturais aprovadas em 2020, o governo Lula decidiu desmontá-las. Dois decretos — 11.466 e 11.467 — reabriram contratos diretos com estatais sem licitação, enfraqueceram requisitos de solvência e reabilitaram um modelo de saneamento que, por décadas, deixou o país parado no século XIX.
Enquanto isso, na COP30, falava-se em inovação, justiça climática e prevenção de doenças. Faltou apenas mencionar o óbvio: não há política climática possível sem saneamento. Quando não se investe em saneamento, a conta aparece na saúde.
O Ministério da Saúde parece não perceber — ou prefere não admitir — que a falta de saneamento é hoje a principal fragilidade ambiental e sanitária do Brasil. A diarreia infantil, as parasitoses, as hepatites e a leptospirose continuam atormentando famílias pobres. Os surtos pós-enchentes se repetem.
Somado às mudanças climáticas, o problema se agrava: mais calor, mais chuva, mais água parada, mais esgoto exposto, mais vetores. A proliferação de dengue, chikungunya e zika não é um desastre natural — é o resultado direto desta infraestrutura deficiente.
A OMS estima que cada R$ 1 investido em saneamento gera até R$ 4 de economia na saúde. Mas o governo escolheu o caminho oposto: preservar estatais ineficientes, travar privatizações e deixar municípios sem alternativa competitiva. Enquanto a COP30 celebrava “resiliência ambiental”, o SUS se preparava para mais surtos de epidemias evitáveis.
Em Belém, o Brasil se apresentou ao mundo como potência moral e diplomática em saúde e clima. Mas o país que discursava sobre resiliência climática é o mesmo que:
mantém córregos de esgoto a céu aberto nas grandes cidades,
não consegue expandir redes na Amazônia e no Nordeste,
permite que enchentes espalhem doenças,
e tolera indicadores sanitários comparáveis aos países mais pobres do mundo.
O contraste é gritante. O Ministério da Saúde falou longamente sobre adaptação climática, mas não dedicou um minuto àquilo que mais impacta a adaptação no Brasil: saneamento urbano, drenagem, esgoto, abastecimento seguro. Sem isso, tudo o resto vira marketing climático.
Quem mais sofre com a política atual? São as crianças periféricas, indígenas e ribeirinhos, moradores do semiárido, favelas sem drenagem e populações expostas a enchentes e contaminação.
Ao restaurar monopólios estatais e travar investimentos privados, o governo ampliou o hiato entre ricos e pobres. Os indicadores não mentem. Onde houve concessões privadas (Alagoas, Rio de Janeiro, Pará e São Paulo[i]), a cobertura de saneamento cresceu mais em três anos do que as estatais haviam conseguido em trinta. Mas esse fato inconveniente não foi lembrado nas reuniões sobre saúde e meio ambiente em Belém.
O saneamento é a obra invisível. Ninguém tira foto inaugurando, mas ele salva mais vidas do que hospitais. É a base para saúde, para educação, para produtividade, para clima, para dignidade. Negligenciar saneamento é perpetuar doenças, desigualdade e atraso. O governo Lula poderia ter usado a COP30 para reconhecer erros, ajustar rota e colocar saneamento no centro da agenda climática.
Mas, como sempre, preferiu a omissão. O resultado é um Brasil que, na vitrine internacional, promete resiliência mas, nos bastidores, continua permitindo que milhões vivam entre esgoto, mosquito e descaso. Se o país realmente quer liderar a agenda de saúde e clima, precisa começar dizendo a verdade: não há adaptação climática sem saneamento, e não haverá universalização e equidade na saúde se o país continuar insistindo em modelos de gestão no saneamento que fracassaram por cinquenta anos.
[i] No caso de São Paulo, a SABESP foi privatizada em 2024, mas os resultados na melhoria do saneamento já são visíveis. O contrato prevê 99% de abastecimento de água para a população e 90% de esgoto tratado até 2029.
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