O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

iPad zero?: o que tinha de acontecer, aconteceu...

Bem, eu tinha quase certeza de que isso iria acontecer, mas não quis parecer "ave de mau agouro" ao expressar dúvidas, ceticismo, até certo derrotismo quando li, estupefato, que uma fábrica de Taiwan iria investir 12 bilhões de dólares para produzir iPads2 no Brasil até setembro. Pensei comigo: deve ser uma piada, ou então: alguém ouviu mal essa história e interpretou um desejo como sendo manifestação da vontade...
Enfim, esse é o resultado da "economia política nazista" -- desculpem a expressão um pouco forte, mas eu acho que já expliquei o que entendo por isso -- e da chantagem de capitalistas inescrupulosos que se combinam para resultar em fracassos fragorosos desse tipo.
Quando não se assegura um ambiente de negócios são, no plano geral, e se pretende fazer espertezas em benefício de alguns, esse é o resultado esperado.
Esperemos que sirva de lição, mas temo que não. Vão continuar tentando more of the same...
Enfim, lamento pelos brasileiros, que em lugar de iPad1 ou 2, vão continuar tendo iPad zero...
Paulo Roberto de Almeida

Negociações para abertura de fábrica de iPad no Brasil estão com impasses
Rosana Hessel e Gustavo Henrique Braga
Correio Braziliense, 23/08/2011

Os brasileiros que adiaram a compra do iPad, na esperança de obter aparelhos mais baratos e fabricados no Brasil até o fim do ano, devem ficar a ver navios. Os planos da Foxconn de produzir aqui os objetos de desejo da marca norte-americana Apple, com custo até 30% menor do que os cobrados atualmente, podem naufragar. As negociações entre o governo e a fabricante taiwanesa entraram em um impasse, diante de exigências feitas pela empresa, deixando claro o despreparo da equipe da presidente Dilma Rousseff para alinhavar o acordo.

Houve um atropelo nas tratativas para que o megainvestimento de US$ 12 bilhões (R$ 19,2 bilhões) fosse anunciado, em tempo recorde, durante a viagem da presidente à China, em abril. Detalhes foram deixados de lado, como o fato de a empresa ser de Taiwan, ilha que vem tentando desde 1949 ver reconhecida sua independência da China continental. Para especialistas, chega a ser estranho um investimento tão vultoso vir de um país cujos diplomatas, turistas e investidores precisam ir até a embaixada brasileira em Pequim para conseguir permissão para viajar ao Brasil.

A falta de arremates no acordo deixou várias rebarbas que agora comprometem o sucesso da empreitada, encabeçada pelo ministro da Ciência e Tecnologia (MCT), Aloizio Mercadante. Na época, o ex-senador disse que a produção nacional de iPads e iPhones começaria em novembro. A companhia taiwanesa chegou a sinalizar que daria o pontapé inicial na fábrica em setembro para colocar os produtos na prateleira até o Natal, mas os planos já foram adiados. Se produzido aqui, com benefícios fiscais concedidos pelo Processo Produtivo Básico (PPB), o modelo mais barato do iPad custaria R$ 990 ao invés dos atuais R$ 1,6 mil.

Apesar do impasse nas discussões, que também têm a participação do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), ninguém quer jogar a toalha. Em nota, o MCT afirmou que as conversas “continuam avançando significativamente” e que só dará informações quando todas as etapas forem concluídas. Uma fonte ligada à equipe de negociação demonstrou preocupação porque a Foxconn quer ser praticamente paga pela fábrica, deixando o governo na encruzilhada entre ceder ou passar pelo vexame de anunciar a desistência de um investimentos no país.

A companhia estaria exigindo que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) entre como sócio e não somente financie o empreendimento. O BNDES evitou comentar o assunto e limitou-se a afirmar que “as negociações não terminaram”.

Para o especialista em Tecnologia da Informação Ivair Rodrigues, o fracasso do projeto da Foxconn era previsível. “O volume do investimento não condiz com o tamanho do mercado atual de tablets no mundo. Ele ainda é muito pequeno, especialmente aqui, e os custos brasileiros ainda são proibitivos para uma fabricação local. Com o dólar a R$ 1,60, é mais barato importar”, comentou o diretor da consultoria ITData.

A Foxconn, que sofre protestos de estudantes em Hong Kong contra más condições de trabalho, também não comenta. A empresa possui uma fábrica em Campinas, interior de São Paulo, onde monta computadores e notebooks para a Dell e a HP. “A companhia já sofreu denúncias de que há trabalhadores chineses morando dentro da fábrica”, lembrou um especialista.

A nova unidade seria construída em Jundiaí, próxima a Campinas, e outro motivo do atraso seria a dificuldade da empresa de conseguir contratar engenheiros no país. “O pano de fundo da falta de mão de obra é desculpa. A empresa está querendo barganhar mais incentivos para que o governo evite o constrangimento de anunciar que perdeu a fábrica de iPads”, comentou uma fonte do setor.

O misterio do fazedor de notas: equilibrio entre todas as partes

O Mistério do Fazedor de Notas

Sempre tive curiosidade em saber quem estava por trás das notas elegantes que são liberadas pelo governo e divulgadas regularmente na imprensa, explicando esta ou aquela tomada de posição das autoridades do setor. Eu o imagino um redator onisciente, dotado de uma capacidade indescritível de pronunciar-se sobre os mais diferentes assuntos, sempre com aquela linguagem tão rigorosa, tão escorreita, tão cheia de subentendidos, que seria preciso uma Wikipédia inteira para decifrar suas meias palavras e suas sugestões pouco explícitas.

Estou carente, por exemplo, de notas explícitas que me expliquem um pouco das tomadas de posição em relação a eventos dramáticos da atualidade: pessoas que se movimentam, de um lado para o outro, soldados que também o fazem, no sentido inverso, e algumas vítimas pelo caminho (enfim, collaterals, diria alguém...).
Ainda assim tenho saudade daquelas notas que deploram a perda de vidas, que instam as partes a resolverem suas diferenças por métodos pacíficos, que preservem o diálogo, o respeito aos direitos humanos e os princípios democráticos. Afinal de contas, uma nota sempre é melhor do que nada.
Paulo Roberto de Almeida

Assad broke word, U.N. chief says
UNITED NATIONS — U.N. Secretary General Ban Ki-moon on Monday accused Syrian President Bashar al-Assad of failing to live up to his pledge to halt all security operations against protesters, saying the Syrian leader “has not kept his word.”

Assad assured Ban in a telephone conversation Wednesday that all police and military operations had stopped. On Friday, Syria’s U.N. envoy, Bashar al-Jafari, repeated the assertion.

But there has been no visible slowing of the crackdown. U.N. High Commissioner for Human Rights Navi Pillay said Monday that the steadily mounting death toll in Syria had topped 2,200 civilians, including 39 demonstrators killed since Assad made his pledge to the U.N. chief.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Uma politica industrial fracassada (antes de comecar)

O título do post é meu, sempre crítico, como se deve.
O verdadeiro título do artigo está abaixo.
Paulo Roberto de Almeida

Falta estratégia no ''Brasil Maior''
Sandra Polónia Rios
O Estado de S.Paulo, 22 de agosto de 2011

O Plano Brasil Maior, divulgado no dia 2 de agosto de 2011, pretende dotar o País de uma nova política industrial, tecnológica, de serviços e de comércio exterior para o período de 2011 a 2014. De acordo com o documento de divulgação, o plano foca "no estímulo à inovação e à produção nacional para alavancar a competitividade da indústria nos mercados interno e externo".
Ainda segundo o documento, "o Plano Brasil Maior organiza-se em ações transversais e setoriais. As transversais são voltadas para o aumento da eficiência produtiva da economia como um todo. As ações setoriais, definidas a partir de características, desafios e oportunidades dos principais setores produtivos, estão organizadas em cinco blocos que ordenam a formulação e implementação de programas e projetos".
Apesar da roupagem metodológica que precede a apresentação das medidas, sugerindo rigor e visão estratégica, é exatamente esse tipo de visão que falta à nova política industrial. A leitura das 35 medidas anunciadas leva à percepção de que foram reunidas, sob um único guarda-chuva, diversas iniciativas que vinham sendo discutidas em diferentes áreas do governo e que respondem a demandas e preocupações diversas.
O Plano não aponta para a indústria que se pretende ter no futuro. O horizonte temporal é curto para transformações relevantes e os instrumentos têm efeitos potenciais contraditórios entre si.
Os mecanismos anunciados indicam que o governo parte de um diagnóstico geral correto - o de que a indústria brasileira sofre com a deterioração das condições de competitividade e de que é preciso desonerar a produção industrial, as exportações e os investimentos, além de incentivar a inovação e a participação das pequenas e das médias empresas no comércio exterior. Entretanto, particularmente no que se refere ao comércio exterior, os instrumentos incorporados ao programa são tímidos e contraditórios: enquanto alguns buscam aumentar a competitividade das manufaturas brasileiras no mercado internacional, outros, voltados à proteção da indústria doméstica, tendem a resultar em perda de eficiência e aumento de custos no processo produtivo.
Diante da dificuldade de enfrentar a conhecida agenda de competitividade - desoneração tributária das exportações e dos investimentos; desoneração da folha de pagamentos; melhoria das condições de infraestrutura e logística; e redução da burocracia e dos custos acessórios no processo exportador -, o governo adota medidas parciais e pontuais. Diante da incapacidade de lidar com os problemas sistêmicos, as autoridades optam por mecanismos pontuais, alguns voltados para o aumento da proteção. Mas, ao fazê-lo, vão de encontro com os objetivos de aumento de competitividade.
Alguns traços vão se consolidando na política industrial e de comércio exterior brasileira:
- recuperação do corte setorial dos instrumentos de política industrial;
- intensificação do uso de mecanismos direcionados ao aumento do conteúdo nacional dos produtos industriais;
- e reforço do viés discricionário na aplicação dos instrumentos, mesmo daqueles que podem ser considerados como transversais.

No que se refere à recuperação do corte setorial, chama a atenção o fato de que, também nesse caso não se apresentam escolhas definidas. Há instrumentos específicos para diferentes setores, dando a impressão de que as diversas demandas foram atendidas:
- redução dos custos tributários para bens de capital, novo regime especial para o setor
automotivo
- desoneração da folha para setores intensivos em trabalho, preferências nas compras governamentais para setores e atividades elegíveis
- novos programas de financiamento para um conjunto variado de atividades industriais.

Além dos traços mais gerais, dois aspectos chamam a atenção na condução da política de
comércio exterior recente no Brasil e que tendem a se perpetuar com a nova política:
déficit de implementação e transitoriedade dos mecanismos.
Os agentes econômicos que atuam no comércio exterior brasileiro sofrem com as dificuldades de operacionalização de instrumentos que são anunciados, mas não são implementados. Muitas vezes é difícil, inclusive, identificar se os instrumentos estão ou não em vigência. Dentre as medidas incluídas no anúncio do Plano Brasil Maior, algumas já foram divulgadas anteriormente - é o caso da preferência para produtos e serviços nacionais nas compras do setor público, incluída no "Pacote de Competitividade" de maio de 2010 e que continua em processo de regulamentação.
Além disso, muitos dos mecanismos têm caráter transitório. No plano divulgado, diversos benefícios têm prazo de vigência previsto para terminar em dezembro de 2012. Essa transitoriedade gera incertezas e desestimula a adoção pelas empresas de estratégias exportadoras mais duradouras.
Diante das dificuldades para promover reformas de caráter horizontal que eliminem as distorções do regime tributário brasileiro, reduzam os custos assessórios com a burocracia e enfrentem as graves deficiências de transporte e logística, vai-se costurando uma colcha de retalhos com medidas muitas vezes incoerentes entre si.

É DIRETORA DO CENTRO DE ESTUDOS DE INTEGRAÇÃO E DESENVOLVIMENTO (CINDES

A "democracia" deles: um Carlos Magno que nao honra seu antecessor

Um Carlos Magno que desconheço exatamente quem seja, mas que se revela um desses intolerantes antidemocráticos típicos em certos partidos ascendentes (por enquanto), escreveu um comentário em um dos meus posts.
Não importa qual seja, agora, pois seus comentários tem muito pouco, ou quase nada de aproveitável. Trata-se de uma assemblagem de invectivas contra meu direito de expressar uma opinião no meu blog, pois ele ficou visivelmente possesso por eu não defender os seus pontos de vista. Que pena: isso o deixou irritado.
Mais do que isso, furibundo contra minha liberdade de opinião.
Deixo de lado suas invectivas impressionistas, já que não contêm nenhum argumento que valha a pena reproduzir -- justamente pela ausência de argumentos, apenas ofensas -- e me concentro na única coisa de concreto que ele disse.
Em linguagem diplomática, transcrevo o que é o seu parágrafo operacional, este aqui:

"Por fim, se esquece de diplomatas que defendem a não intervenção do estado na economia, seguidores da Escola Austríaca!?. A primeira coisa que o estado deveria fazer era parar de pagar o salário desse tipo de idiota. Aliás, esse tipo de ´´gente`` deveria ser privatizada, vendida para algum museu ou zoológico, ou melhor, pra um ferro velho mesmo."

Eis um perfeito retrato da "democracia" deles: na verdade um totalitarismo mal disfarçado.
Contrariado com a ideia (maluca?) de que alguém, no caso eu mesmo, possa defender a não intervenção do Estado na economia, ele recomenda a demissão pura e simples, ou pelo menos a interrupção dos vencimentos.
Creio que tudo está dito. Este é o totalitarismo que nos aguarda...
Paulo Roberto de Almeida

Imprensa: 8, 9, 10 x Governo: 0 (apenas antecipando)

Calma, não estou apostando nada ainda, e não me cabe derrubar ministros: isso o governo faz, depois que a imprensa já os demitiu...
Decididamente, isso tudo está virando uma mania...

Revistas alvejam tres ministros do governo Dilma
Políbio Braga, 22/08/2011

As revistas semanais resolveram alvejar ministros diferentes em suas atuais edições, mas sobrou a pior para a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, flagrada em grampos telefônicos pouco republicanos com o ex-deputado Nelson Goetten, atual prisioneiro dos cárceres de Santa Catarina.

Veja - A reportagem de Veja procura detonar o ministro das Cidades, Mário Negromonte, que estaria oferecendo mensalão de R$ 30 mil para que deputados do seu Partido, o PP, apóiem sua permanência no governo. A revista não alinha um só nome e uma só pova que comprovem as denúncias.

IstoÉ - A reportagem de seis páginas é extremamente bem editada e devastadora. "As articulações de Ideli" revelam advocacia administrativa e relações corrosivas com o ex-presidente catarinense do PR, o ex-deputado Nelson Goetten, preso este ano sob acusação de pedofilia. Ideli conta como enfiou na presidência da Eletrosul o seu ex-marido Eurides Mescolotto.

Época - O ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, teria usado o avião de uma empreiteira para viajar pelo país no ano passado, quando ainda comandava o Ministério do Planejamento no governo Luiz Inácio Lula da Silva. A informação é da revista "Época" desta semana e se baseia no relato de dois parlamentares, um da base do governo no Congresso e outro da oposição. A mulher de Paulo Bernardo, a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, também teria usado o mesmo avião, um turboélice King Air, prefixo PR-AJT, durante sua pré-campanha para o Senado pelo Paraná, onde fica a sede da dona do avião, a construtora Sanches Tripoloni.

Um neoliberalismo canhestro, defeituoso, envergonhado: governo do PT

Quando eu escrevi, ainda antes das eleições do 2002, mas já prevendo a eleição de Lula, que o governo do PT seria neoliberal, ouvi protestos e xingamentos daqueles setores que vocês imaginam, ou seja, a quase totalidade da academia brasileira. Saiu no meu livro A Grande Mudança (escrito antes das eleições, mas publicado logo em seguida).
Novo embate se deu em torno dos mesmos conceitos: foi no encontro da Anpocs, em Caxambu, em outubro de 2003. Cheguei até a ser vaiado, o que me confirmou nas minhas previsões: o PT seria mesmo neoliberal, e teria problemas com os malucos da academia.

Bem, preciso me redimir: pensei que o PT fosse ser neoliberal de verdade, assumindo os ônus e bonus das novas posições. Não imaginei que eles continuariam trapalhões, fraudadores e mentirosos. Praticam o neoliberalismo desbragadamente, mas o fazem de modo incompleto, deformado, tentando enganar os incautos, que são muitos como se sabe.
Eles continuam praticando o neoliberalismo sem convicção. Mas, afirmo e reafirmo: vai chegar o dia em que eles vão sair do armário e se assumir pelo que são: neoliberais.
Paulo Roberto de Almeida

Governo discute privatização de federalizadas
Por Josette Goulart
Valor Econômico, 22/08/2011

A possibilidade de privatização de alguns ativos do setor elétrico começa a se tornar uma opção viável e a ser estudada dentro do governo federal. O alto escalão já considera essa a melhor alternativa para as distribuidoras federalizadas que atuam em seis Estados do Norte e Nordeste do país, que estão hoje sob o guarda-chuva da Eletrobras. Mesmo petistas de carteirinha, em cargos estratégicos no setor elétrico, já aceitam a ideia e inclusive a defendem.

O Valor esteve com seis fontes importantes na Eletrobras, na Agência Nacional de Energia Elétrica e no Ministério de Minas e Energia. Todos dizem a mesma coisa: "sim, a privatização é possível". Esse, admitem, seria o caminho para melhorar a qualidade do serviço prestado pelas distribuidoras Amazonas Energia, Boa Vista Energia, Eletroacre, Ceron (Rondônia), Cepisa (Piauí) e Ceal (Alagoas).

A pecha da "privatização" é o maior obstáculo - por ser político - a ser superado e por isso ainda nenhum estudo formal foi solicitado. Mas se no governo de Luiz Inácio Lula da Silva qualquer discussão sobre o assunto era terminantemente proibida, desde que a presidente Dilma Rousseff apoiou e determinou o programa de concessão dos aeroportos a postura entre os colaboradores da presidente no setor elétrico mudou.

A ideia circula por várias instâncias e conversas com executivos de importantes fundos de pensão já foram travadas

Diversas soluções estão sendo vislumbradas para se fugir dessa questão política. Entre elas, uma das preferidas é a de tratar a privatização como uma "parceria público e privada", ou seja, vender o controle mas deixar a Eletrobras como sócia - a exemplo do modelo dos aeroportos em que a estatal Infraero será sócia dos investidores privados.

A ideia circula por várias instâncias e até conversas informais com executivos de importantes fundos de pensão já foram travadas para se saber o interesse nesse tipo de negócio. Os fundos se interessam, mas o modelo de negócios a ser definido seria fundamental, pois eventualmente envolveria a abertura de capital dessas empresas. Fora dos fundos de pensão, há também interesse. Comprar empresas como a Cepisa, que atua no Piauí, sempre foi um desejo declarado, por exemplo, da Equatorial Energia, que hoje é dona da Cemar (Maranhão), vizinha à Cepisa, e que ainda não conseguiu expandir sua atuação no setor elétrico.

Se a decisão for levada adiante e, principalmente, aceita politicamente, a expectativa do setor privado é de que a privatização comece a ser aceita também dentro de governos estaduais que têm hoje distribuidoras de energia com sérias dificuldades econômico-financeiras ou problemas com qualidade do serviço. Entre os exemplos estão a CEB, que enfrenta os problemas de anos sem investimentos que culminaram com queda na qualidade dos serviços.

A Celg, que atua em Goiás, também enfrenta problemas e busca um sócio para capitalizar a empresa que está altamente endividada, mas tem sido difícil conseguir sócios sem entregar o controle. A empresa de distribuição de Goiás precisa apresentar um plano de recuperação para a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e evitar um processo de caducidade da concessão, em que o Estado poderia perder o direito de operar a companhia. As eleições em Goiás, entretanto, foram marcadas pelas promessas de não se privatizar ativos.

O fim das concessões a partir de 2015 também pode ser usado como caminho para se buscar uma alternativa à privatização. Em entrevista publicada na semana passada pelo Valor, o diretor da Aneel, Julião Coelho, propôs que o governo permita a possibilidade de prorrogação desde que a agência tenha a prerrogativa de analisar, com base em critérios objetivos de qualidade e capacidade financeira, aqueles que podem permanecer com a concessão. Com isso, as empresas em dificuldades poderiam ter seus controladores alterados em novos processos de licitação e os atuais donos receberiam indenização pelos investimentos que realizaram e não foram amortizados.

Toda essa discussão em torno de privatização começou a se fazer necessária depois que a administração da Eletrobras começou a perceber que seus esforços para melhorar a qualidade de suas distribuidoras não surtiram efeitos. São seis as concessionárias que há anos sangram o caixa da empresa. Desde 2008, só em conversão de dívidas em capital, as distribuidoras já consumiram cerca de R$ 5 bilhões da estatal, sem contar volume parecido que foi investido ao longo dos últimos dez anos. Mesmo assim, os prejuízos têm sido constantes e os índices de qualidade e perdas não estão a contento. A mais problemática é a Amazonas Energia, que tem sob seu atendimento toda a indústria da Zona Franca de Manaus.

Apesar das injeções de capital em anos anteriores nas distribuidoras, os balanços publicados em 2011 pela Eletrobras apresentaram um dado preocupante. Até o primeiro trimestre, o passivo de curto prazo estava a descoberto em R$ 750 milhões. Situação que levou os auditores privados da empresa a descreverem, pela primeira vez em suas notas de balanço, que há dúvidas sobre a continuidade operacional dessas companhias. O então diretor presidente das distribuidoras, Pedro Hosken, quando esse passivo se apresentou pela primeira vez, afirmou que, sendo essas empresas públicas, só no longo prazo seria possível resolver o problema. Mas a Eletrobras já administra a situação dessas companhias há mais de dez anos.

O presidente da Eletrobras, José da Costa Carvalho Neto, diz que a empresa está empenhada em fazer investimentos para melhorar a qualidade dos serviços. Neste ano, vai investir R$ 897 milhões nas empresas e, entre 2012 e 2014, mais de R$ 1,1 bilhão.

Preparados para o iPad3? (Sorry Brazilians, not you...)

Sim, o governo brasileiro ainda está empenhado -- tristemente, devo dizer -- em assegurar que algum fabricante taiwainês, qualquer um, mas um em particular, ainda venha se instalar no Brasil para fabricar o iPad1 (!), mas só se for com 80% de componentes nacionais, e custando um pouco menos do dobro do original...
Bem, brasileiros, vocês perdem tudo por esperar, mas o que esperar com o governo que vocês têm?
Paulo Roberto de Almeida

Apple Developing New iPad
Lorraine Luk
The Wall Street Journal, August 19, 2011

TAIPEI--Apple Inc. is working with component suppliers and its assembler in Asia for the trial production of its next generation iPad from October, people familiar with the situation say, as it looks to stay ahead of the competition in the fast-growing tablet computer market.

The Wall Street Journal reports that Apple is working with component suppliers and its assembler in Asia for the trial production of its next generation iPad. WSJ's Yukari Kane joins digits to discuss.

The Cupertino, Calif., company has ordered key components such as display panels and chips for a new iPad it is aiming to launch in early 2012, said the people.

The next generation iPad is expected to feature a high resolution display - 2048 by 1536 compared with 1024 by 768 in the iPad 2 - and Apple's suppliers have already shipped small quantities of components for the sampling of the iPad 3. Suppliers said Apple has placed orders for a 9.7-inch screen device.

One component supplier to Apple said the company has already placed orders for parts for about 1.5 million iPad 3s in the fourth quarter.

"Suppliers will ramp up production and try to improve the yield rate for the new iPad in the fourth quarter before its official launch in early 2012," said a person at the supplier.

Apple, like many other big personal-computer and consumer-electronics brands, doesn't actually make most of its products. It hires manufacturing specialists - mainly companies from Taiwan that have extensive operations in China - to assemble its gadgets based on Apple's designs. They use parts from other outside suppliers, many of which also are from Taiwan and elsewhere in Asia. The arrangement frees Apple and its fellow vendors from running complicated, labor-intensive production lines, while the ability of Taiwanese companies to slash manufacturing costs helps cut product prices over time.

Taiwan's Hon Hai Precision Industry Co. assembles the iPad. A company spokesman declined to comment.

Apple reported blowout earnings for its fiscal third quarter ended June 25 in part due to the popularity of its iPad. The company sold 9.3 million units in the quarter, nearly triple what it sold a year earlier. Together with the robust sales of the iPhone smartphone and other electronics devices, Apple's net profit for the period more than doubled to $7.31 billion from $3.25 billion a year earlier.

Still, the next-generation iPad would be coming at a time when there's more competition in the market. Companies from Samsung Electronics Co., Motorola Mobility Holdings Inc., ZTE Corp. and Toshiba Corp. have launched similar devices using Google Inc.'s Android software. Apple is also embroiled in several lawsuits spanning various countries with Samsung Electronics over alleged patent infringement.

Bem, agora falta mais um (entre muitos outros, claro...)

Agora que um desses amigos se foi, não se sabe bem para onde, mas isso é o que menos importa agora, falta um outro amigo se mancar, e também tomar a estrada do exílio, antes que seja muito tarde, e antes que mais algumas dezenas, ou centenas de pessoas, também sejam mortas inutilmente.
Que ele vai cair, isso é inevitável.

Mas não seria inevitável que certos serviços diplomáticos fiquem acompanhando a trajetória de declínio até o final. Afinal de contas, dizem que temos direitos humanos entre nossos princípios constitucionais...
Ah, também tem "não interferência nos assuntos internos de outros Estados"...
Sempre é bom lembrar. Ainda bem que observamos tudo isso...

Paulo Roberto de Almeida

Livros que encantam os idiotas (e muitos outros mais, infelizmente...)

Este blog é também, não esqueçamos, sobre livros, de preferência sobre livros com ideias, ainda mais ideias inteligentes, que são as que naturalmente prefiro, isto é evidente.
Mas, de vez em quando devemos tratar também dos livros idiotas, e das ideias imbecis, pois eles e elas também existem, e aliás costumam ocupar um espaço desmesuradamente amplo nesta nuestra América Latina, como gostam de dizer alguns desses idiotas, armados de ideias imbecis.

Mais abaixo eu coloquei um post sobre o livro que estou lendo, atualmente:

Leandro Narloch e Duda Teixeira:
Guia Politicamente Incorreto da América Latina
(São Paulo: Leya, 2011, 336 p.)

Recomendo, claro, e estou lendo aos pedaços, escolhendo um ou outro idiota ao acaso, indo e voltando, porque nunca é demais combinar várias épocas históricas e descobrir que, ao longo de cinco séculos, conseguimos produzir uma quantidade anormalmente alta de idiotas e de ideias imbecis, intermináveis, infindáveis, irritantemente recorrentes, uns e outras...

Mas nesse post eu também falei do outro livro (de 1996) que iniciou o ciclo de desmantelamento (sem conseguir por inteiro, ou sequer parcialmente) dessas ideias e desses livros:

Plinio Apuleyo Mendoza, Carlos Alberto Montaner e Álvaro Vargas Llosa:
Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano
(muitas edições, na América Latina, na Espanha, no próprio Brasil).
O livro teve um retorno, aliás chamado "El Retorno del Idiota", sim porque no intervalo outros idiotas surgiram, aqui ao lado, por sinal.

Mas, como este blog é sobre livros, permito-me reproduzir aqui, sem fazer propaganda,:

Los diez libros que conmovieron al idiota latinoamericano
que figuram no primeiro Manual, que eles desmantelam comme il faut...

1) La historia me absolverá (Fidel Castro)
2) Los condenados de la tierra (Frantz Fanon)
3) La guerra de guerrillas (Ernesto "Che" Guevara)
4) ¿Revolución dentro de la revolución? (Régis Débray)
5) Los conceptos elementales del materialismo histórico (Marta Harnecker)
6) El hombre unidimensional (Herbert Marcuse)
7) Para leer al Pato Donald (Dorfman y Mattelart)
8) Dependencia y desarrollo en América Latina (Cardoso y Faletto)
9) Hacia una teología de la liberación (Gutiérrez)
10) Las venas abiertas de América Latina (Galeano).

Este último é o maior de todos, claro, uma síntese de todas as idiotices produzidas por todos os demais e por todos os idiotas que pulularam na América Latina desde a chegada dos espanhóis.
Eu poderia acrescentar vários títulos a essas idiotices consumadas, mas vou me conter por enquanto.
Um dia desses ataco...
Paulo Roberto de Almeida

domingo, 21 de agosto de 2011

Perspectivas das relacoes Brasil-EUA nos proximos 10 anos - Rubens A. Barbosa

As perspectivas das relações Brasil-EUA nos próximos dez anos
Rubens Antônio Barbosa
revista Interesse Nacional (ano 4. n. 14, julho-setembro 2011)

Historicamente, as relações entre o Brasil e os EUA nos últimos 165 anos não foram tão tranquilas como geralmente se supõe. Elas podem ser caracterizadas como um processo marcado por desconfianças e suspeitas recíprocas, na maior parte do tempo. Não cabe fazer aqui um retrospecto da evolução do relacionamento entre os dois países. O presente ensaio examinará as perspectivas dessas relações nos próximos cinco a dez anos, levando em conta as transformações ocorridas nos últimos anos no cenário mundial. Os fundamentos da política externa da maioria dos países estão se modificando pelos efeitos da globalização, pela importância dos países emergentes, entre os quais o Brasil, e pela transferência do eixo político e econômico-comercial do Atlântico para o Pacífico, em especial pela crescente influência da China. A crise econômica global, iniciada nos EUA em 2008, acelerou esse processo de transformação e trouxe uma relativa perda de poder dos EUA. O mundo se tornou multipolar, com diversos centros de poder que contrabalançam a predominância dos EUA e da Europa. Os EUA preservam incontrastável seu poderio militar e estratégico, mas devem compartilhar as decisões nas áreas política, econômica e financeira com países emergentes como a China, a Rússia, a Índia, o Brasil e outros. As incertezas no panorama global aumentaram, não só pela instabilidade no Oriente Médio, pela persistência do conflito entre Palestina e Israel e pelo terrorismo, assim como, mais recentemente, pelos movimentos populares que estão ocorrendo no norte da África e no Oriente Médio. A instabilidade política dessas regiões repercute na volatilidade dos preços do petróleo, cujo aumento pode afetar a recuperação da economia dos países desenvolvidos. A mudança de clima pode vir a afetar a produção de alimentos, agravando ainda mais a disponibilidade e o preço das commodities agrícolas. Os desafios que as relações entre os dois países deverão enfrentar sempre existiram e poderão aumentar, em decorrência das mudanças já mencionadas no cenário internacional e da crescente projeção externa do Brasil. As oportunidades também poderão crescer via transformações econômicas, políticas e sociais pelas quais passam o Brasil e os EUA. Três desafios se colocam para o desenvolvimento das relações Brasil–EUA na próxima década: como conectar os interesses reais dos dois paises; modificação das percepções sobre o Brasil nos EUA e o que o Brasil vai querer das relações com os EUA.

O primeiro desafio será o de conectar os interesses dos dois lados

A análise das relações entre o Brasil e os EUA indica que, com exceção de curtos períodos e por razões específicas, os interesses reais que podem promover uma efetiva aproximação bilateral não estão claramente identificados. Embora os dois países defendam valores convergentes, como democracia e direitos humanos, na prática, em diversas situações, nem sempre eles são respeitados por se chocarem com os interesses de Washington e de Brasília. Nos próximos anos, os entendimentos entre as burocracias governamentais deverão se concentrar em como aproximar os interesses concretos que possam atrair a atenção dos agentes econômicos. No curto prazo, a tarefa de identificar esses interesses é ainda mais árdua pelo fato de o novo governo de Washington estar concentrado fortemente na estabilização e recuperação da economia, nas questões da guerra no Iraque e no Afeganistão, no conflito no Oriente Médio, no terrorismo e na crise dos movimentos populares no norte da África e no Oriente Médio. Como resultado dessa situação, a América Latina não está na tela dos radares dos formuladores de política em Washington, uma vez que não representa qualquer ameaça à segurança nacional dos EUA e porque não oferece grandes oportunidades de negócios para as empresas norte-americanas. Com o fortalecimento das economias na América do Sul, no entanto, a situação dá sinais de se modificar e a região começa a despertar a atenção das empresas e de investidores norte-americanos. Com mais de 55% do PIB da América do Sul, o papel que o Brasil deverá desempenhar será fundamental para o aprofundamento do processo de integração, para o desenvolvimento econômico dos países da região, para a melhora das condições sociais e para o aperfeiçoamento das instituições. O crescimento sustentado trará maiores oportunidades para os parceiros externos. Nos últimos dois anos, os EUA conseguiram crescentes superávits comerciais com o Brasil. Nos próximos cinco anos, mantidas as recentes taxas de crescimento, o Brasil ultrapassará a Itália, a França e a Inglaterra e se projetará como a quinta economia mundial em termos de PIB, o que fará com que os interesses brasileiros se diversifiquem e sejam vistos como de maior relevância pelos parceiros externos. A crescente presença da China no continente sul-americano, por outro lado, poderá representar um fator de convergência de interesses entre o Brasil e os EUA. Numa perspectiva de médio e longo prazo, os dois países terão interesses comuns para assegurar o suprimento interno de recursos minerais estratégicos, alimentos e petróleo, cada vez mais atraentes para a economia chinesa. As transformações ocorridas na América do Sul, nos últimos dez anos, em consequência da emergência dos movimentos sociais, e o aumento da insegurança jurídica pelo não cumprimento dos contratos e dos acordos em vigência, reforçaram a percepção do Brasil como importante fator moderador e de equilíbrio político e social para a estabilidade dos paises sul-americanos. Do lado do governo brasileiro, a administração Dilma Rousseff, nos seus primeiros meses, já deu alguns sinais de correção de rumos na política externa. Não deverá haver modificação no discurso sobre sua visão do mundo, nem sobre a prioridade aos países em desenvolvimento (Sul–Sul). A prioridade atribuída ao relacionamento com a América do Sul continuará sendo apresentada como uma política de Estado. Certas qualificações, contudo, diferente dos oito anos anteriores, podem ser notadas na questão dos direitos humanos, nas relações com o Irã e no tratamento dispensado aos EUA. Tudo indica que a política externa será mais pragmática, abandonando-se gradualmente os preconceitos ideológicos que guiaram a política do governo anterior. Caso isso venha de fato a ocorrer, a identificação de reais perspectivas de cooperação em áreas de interesse do Brasil e dos EUA vai se apresentar como uma prioridade.

O segundo desafio diz respeito à gradual mudança da percepção que os EUA têm até aqui sobre o Brasil

O Brasil permanece, em larga medida, desconhecido dos norte-americanos em geral e dos centros de decisão de Washington. Com exceção dos que se ocupam diretamente dos assuntos regionais, há elevado grau de desinformação sobre a realidade, os objetivos e a importância do Brasil para os interesses dos EUA. A correção dessa deficiência é o primeiro requisito para a elevação do relacionamento bilateral a um patamar compatível com a relevância política e econômica de ambos os países. A questão que surge, do lado dos EUA, é como administrar as relações com o Brasil em ascensão e com crescente projeção externa fora das Américas. As premissas que balizaram o relacionamento bilateral estão sendo rapidamente superadas e devem se transformar significativamente. O Brasil é visto em Washington como uma força moderadora e de estabilidade numa região que atravessa um período de mudança com a emergência da Aliança Bolivariana para as Américas (Alba), crítica dos EUA. Apesar disso, os EUA terão de conviver com agendas diferentes e mesmo conflitivas, como ocorre hoje na América Latina, onde as políticas dos dois países não coincidem em relação a Cuba, Venezuela, Colômbia, Honduras e no tocante às novas instituições políticas, como a União de Nações Sul-americanas (Unasul), o Conselho de Defesa Sul-americano e a Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos (Celac), que excluíram os EUA. Com uma política econômica de sólidos fundamentos até aqui, podendo projetar um razoável e sustentável crescimento econômico para os próximos anos, o Brasil saiu mais forte da crise. Com o respaldo de uma economia estabilizada e uma ação externa mais ativa, o país vem se afirmando internacionalmente e aumentando sua presença internacional. Reconhecido como uma potência regional e um país com peso econômico global e com importante papel em alguns dos principais temas da agenda internacional, como mudança de clima, meio ambiente, energia (renovável e petróleo), direitos humanos e reforma dos organismos internacionais, a percepção sobre o Brasil deverá modificar-se gradualmente. Os pontos focais da relação dos EUA com o Brasil continuarão a ser comércio e investimentos, segundo os interesses tradicionais dos dois países, com crescentes convergências de interesses na região (estabilidade econômica e social, democracia e segurança regional). Por todas essas razões, será de interesse de Washington atribuir um tratamento diferenciado ao Brasil no contexto latino-americano. Essa diferenciação poderá levar, no médio prazo, a uma nova atitude, mais realista e menos estereotipada. É possível antecipar que o descolamento do Brasil do resto da América Latina deverá acarretar a inclusão de nosso país em novas parcerias empresariais globais com os EUA e com outros países dentro e fora da região.

O terceiro desafio é definir o que o Brasil quer de suas relações com os EUA

O novo papel que o Brasil começa a desempenhar no cenário internacional fará com que venha a se encontrar com os EUA mais seguidamente fora do ambiente regional com posições que, mais do que separá-los, deverão aproximar os dois países. Não acredito em rótulos batidos, como relações especiais ou alianças estratégicas, para definir o que vai ocorrer no futuro. A crescente afirmação do Brasil no mundo vai gradualmente tornar mais claro como melhor atender e defender o interesse nacional, a exemplo do que ocorre com os EUA. Isso fará com que sejam abandonadas grandes ideias e projetos políticos (como a Alca e o último deles: Pathways for Growth in the Americas) para que os esforços dos dois governos sejam concentrados em interesses reais comuns. Do ponto de vista da política externa brasileira, o grande desafio do momento é o de identificar e definir o nosso interesse no contexto da globalização e da crise internacional. O Brasil terá de assumir suas responsabilidades ao mesmo tempo como potência econômica emergente e como potência regional. Isso não quer dizer que o Brasil deva adotar uma atitude de acomodação passiva ou reativa às transformações em curso, mas, sim, a de antecipar-se a elas, tendo sempre presente o interesse nacional. Nesse contexto, o Brasil terá necessariamente de redefinir suas relações tanto com os EUA quanto com a China, nosso principal parceiro comercial e potência com crescentes investimentos e interesse no país. É sintomático que a China tenha sido o primeiro país visitado pela presidente Dilma Rousseff fora da América do Sul. A definição pelo Brasil de uma política de médio e longo prazo com os EUA deverá ocorrer pelos crescentes interesses econômicos e comerciais e também porque a projeção externa e a diversificação de interesses mútuos em outras regiões como a África, o Oriente Médio e a Ásia farão aumentar as possibilidades de diferenças e de colaboração. O eventual fornecimento de petróleo do pré-sal aos EUA, nos próximos cinco a dez anos, poderá ter profundo impacto estratégico, político e comercial nas relações entre os dois países. A identificação de interesses concretos, pelo governo e pelo setor privado, tornará o Brasil mais relevante para a política externa dos EUA. Defesa do interesse nacional e respeito mútuo deverão balizar nossa parceria em novas bases de modo que o potencial a ser explorado possa ser adequadamente identificado. Washington não deve ver no Brasil, contudo, um aliado pronto a alinhar-se automaticamente nos tópicos de seu interesse. Nem o Brasil deverá perseverar no equívoco dos últimos anos de colocar-se como uma opção aos EUA, buscando a lealdade dos vizinhos em detrimento do apoio que esses países oferecem aos EUA. Os instrumentos para dar corpo a essa parceria em novas bases já estão criados pelos dois países e foram agora ampliados. Desde 2003, houve a decisão de institucionalizar uma cooperação mais desenvolvida e sofisticada. Durante a visita do presidente Lula a Washington foi criado um conjunto de mecanismos (encontros presidenciais com seus ministros, grupos de trabalho em grande número de áreas, cooperação hemisférica e em temas globais de interesse mútuo) que poderão ser ativados e ampliados, de acordo com o que foi anunciado durante a visita do presidente Obama ao Brasil, com a criação de grupo na área da defesa e dos diálogos estratégicos na área econômica e política. No âmbito do setor privado, foi criado o Fórum de Presidentes de empresas para a discussão de uma agenda positiva a ser recomendada aos dois governos. E a negociação de acordos de bitributação e de investimentos está com alta prioridade nessa agenda.

As oportunidades aparecerão

Uma vez reconhecidos os desafios existentes e, de alguma forma, examinadas e encaminhadas respostas para superá-los, as oportunidades não só aparecerão como poderão ser melhor aproveitadas. Na área da política externa, os encontros do Brasil com os EUA em outros continentes, fora da América do Sul, vão permitir, na maioria dos casos, maior cooperação em países em que o Brasil disponha de vantagens comparativas, como na África, onde é possível prever um aumento da cooperação triangular em setores como educação, saúde e governança. Nos organismos internacionais, embora nem sempre os interesses sejam convergentes, é possível prever maior cooperação nas questões de paz e segurança, de meio ambiente e mudança de clima, de energia, no G-20 e nas questões de assistência e cooperação técnica. Caso o cenário de cooperação bilateral se concretize, e o Brasil assuma as responsabilidades derivadas de sua projeção externa, certamente deverão diminuir as reservas contra a admissão do Brasil como membro permanente do Conselho de Segurança, quando a comunidade internacional, liderada pelos EUA, decidir reformar o órgão mais importante das Nações Unidas. Se isso vier a ocorrer, estará afastada uma das questões políticas mais difíceis no relacionamento bilateral. É interessante notar que as principais prioridades do governo americano, anunciadas no State of the Union Address, em janeiro de 2011, no tocante a inovação, educação e infraestrutura, são as mesmas do Brasil, o que propicia que projetos concretos sejam desenvolvidos entre empresas dos dois países. A decisão de Washington no sentido de revolucionar a matriz energética interna para, em 2035, concentrar 85% do consumo doméstico em energia renovável e diversificar as fontes de suprimento de combustível fóssil abrirá amplas possibilidades para o Brasil se tornar um fornecedor no longo prazo de etanol e de petróleo para a economia norte-americana. O mesmo pode ocorrer com as enormes reservas de gás natural encontradas off shore nas camadas de pré-sal. Atraídas pelo crescente mercado brasileiro, empresas norte-americanas poderão associar-se a companhias brasileiras em áreas de ponta, onde a inovação e a transferência de tecnologia poderão tornar os produtos brasileiros mais competitivos (tecnologia da informação, telecomunicações, biotecnologia, nanotecnologia). Na área de energia (biomassa, gás e petróleo (pré-sal), usinas hidrelétricas), haverá imensas oportunidades de investimento para as empresas norte-americanas no Brasil e de brasileiras nos EUA. A realização no Brasil da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos abre oportunidades na área de infraestrutura, segurança e transportes. No comércio exterior, o potencial de ampliação das exportações dos EUA deverá aumentar, como evidenciado nos últimos dois anos, quando a balança bilateral mostrou crescentes saldos positivos para os EUA. Corrigidas as distorções domésticas que geram a perda da competitividade dos produtos brasileiros no mercado internacional, os manufaturados e os bens de capital poderão voltar a ter, nos EUA, um mercado significativo. As diferenças relacionadas com as restrições protecionistas em ambos os países, como vem ocorrendo no mercado dos EUA em relação ao algodão, suco de laranja, etanol, aço e camarão, deverão continuar e mesmo aumentar, mas serão sempre canalizadas para a Organização Mundial do Comércio (OMC), fórum apropriado para tratar das controvérsias e da defesa comercial. Com as decisões contrárias da OMC, no caso dos três primeiros contenciosos, e com as transformações no cenário internacional, no médio e longo prazo, é possível prever a liberalização no comércio desses produtos para atender aos interesses dos consumidores domésticos nos EUA e a eliminação de irritantes nas relações bilaterais.

Áreas de convergência

O utros setores poderão representar importantes áreas de convergência e de cooperação no médio e longo prazo: meio ambiente, minerais estratégicos (terras raras, urânio) e pesquisa e exploração de minérios no fundo do mar, espaço, não proliferação, usinas nucleares e defesa. No tocante ao meio ambiente e à mudança de clima, o Brasil vai sediar em maio/junho de 2012 a Rio+20, evento de grande significação para o avanço de propostas que limitem as emissões de gás carbono de efeito estufa que agravam os impactos da mudança de clima. Depois de vinte anos da primeira reunião do Rio, as metas de redução de emissões ainda não foram cumpridas. Há poucos meses, chegou-se a uma declaração que reconhece a necessidade de ampliar as áreas de proteção e a soberania de cada país sobre as espécies da biodiversidade em seu território, bem como a necessidade de compartilhar resultados em caso de exploração – mas ainda faltam regras práticas para esse compartilhamento. O desmatamento no mundo caiu para cerca de sete milhões de hectares anuais, mas ainda continua alto. Brasil e eua poderão, sem preconceitos, estabelecer uma ampla colaboração para obter avanços concretos nessas áreas durante a cúpula Rio +20, em 2012. Nas outras áreas mencionadas (minérios estratégicos, espaço, não proliferação), nos últimos dez anos, o Brasil passou a ter uma política não defensiva, abrindo amplas possibilidades para a colaboração com os eua em organismos internacionais, e para a ampliação de negócios entre as empresas dos dois países. Seguindo o exemplo do que estão fazendo outros países, como a Índia e a China, o Brasil estará aberto a apoiar projetos nessas áreas com duas condicionalidades: transferência de tecnologia e parceria entre empresas dos dois países para produção local. Essa política deverá ser aplicada para eventuais investimentos e parcerias na exploração de terras raras e urânio, prospecção no fundo do mar e defesa. No tocante a oportunidades de negócios nas áreas de espaço, política nuclear, construção de usinas nucleares e não proliferação, a cooperação poderia ser ampliada seguindo o modelo desenvolvido pelos eua com a Índia. A reconstrução da base de Alcântara, para viabilizar lançamentos, a preços competitivos, de satélites comerciais, de interesse de empresas norte-americanas, poderia estimular a cooperação com indústrias dos eua, depois de superadas as dificuldades para a assinatura de um acordo de salvaguarda tecnológica entre os dois países. A visita do presidente Obama ao Brasil em março passado, embora em contexto de incertezas e instabilidades globais, pode ser considerada como um marco nas relações Brasil–eua pelas perspectivas que prometeu abrir no médio e longo prazo. Os governos de Brasília e de Washington, depois de um período de tensões que durou a maior parte do governo Lula, gerado por motivações ideológicas antiamericanas e por desencontros na política externa e comercial, decidiram inaugurar uma nova etapa nas parcerias bilaterais, deixando aparentemente para trás as dificuldades dos últimos anos.

Parceria global

O comunicado conjunto, firmado pelos dois mandatários e divulgado ao final da visita, apresenta um roteiro para uma nova parceria global e bilateral. E não, como foi reconhecido de maneira pragmática, a reafirmação de uma aliança estratégica, que inexiste e pressupõe uma lenta construção entre iguais. Cabe ressaltar que durante a visita do mandatário norte-americano os presidentes tomaram a decisão de elevar a nível presidencial o diálogo em algumas áreas prioritárias, como parceria global, econômico-financeira e energética. Dez acordos foram assinados com a intenção de explorar novas possibilidades de cooperação nas áreas de comércio, educação, inovação, infraestrutura, transporte aéreo, espacial, grandes eventos esportivos, biocombustível para aviação, cooperação em terceiros países, sobretudo da África. Desses acordos, quatro merecem ser ressaltados: o Acordo-Quadro Bilateral para a Cooperação dos usos pacíficos do Espaço Exterior e o anúncio do início de negociações para um acordo para proteger tecnologia de operação de lançamento; o Trade and Economic Cooperation Agreement – Acordo de Cooperação Econômica e Comercial (Teca), cujo objetivo principal é facilitar o acesso de produtos dos EUA e do Brasil aos mercados dos dois países, cria mecanismos para examinar dificuldades nas questões comerciais e de investimento, avaliar barreiras fitossanitárias, simplificar processos alfandegários e para a harmonização de normas técnicas; o acordo de cooperação em terceiros países nas áreas de educação, segurança alimentar, agricultura, nutrição, saúde e fortalecimento institucional; o acordo para produção de biocombustível para a aviação. O desafio de conectar os reais interesses dos dois países, aludido anteriormente, começou a ser respondido. O governo norte-americano está interessado em tornar-se um cliente importante do petróleo produzido no pré-sal, e o governo brasileiro poderá levar adiante o seu programa espacial, reconstruindo a Base de Alcântara, com a colaboração de empresas dos EUA. Grandes projetos de infraestrutura deverão atrair investimentos e empresas norte-americanas e poderão ajudar o Brasil a cumprir os prazos rígidos para as obras da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos. O Pentágono, o maior comprador de querosene de aviação do mundo, busca segurança energética com a produção de biocombustível de aviação, o que poderá abrir grandes oportunidades para o setor privado dos dois países. Nos encontros Dilma–Obama foram lançadas as bases em que as relações deverão evoluir nos próximos anos, abrindo a possibilidade de avanços concretos que venham a beneficiar os governos e o setor privado dos dois países, aproveitando as grandes transformações que ocorrem no mundo. No melhor interesse dos dois países, foram mencionadas parcerias em áreas que, se de fato vierem a ocorrer, poderão propiciar uma mudança na qualidade do relacionamento bilateral, com ganhos concretos para ambos os lados. Segundo estudos do National Intelligence Council, de Washington, em 2025, o Brasil será uma potência econômica global, na qualidade de uma das cinco maiores economias em termos de PIB. O Brasil é visto como um Estado-modelo, por sua democracia vibrante, economia diversificada e instituições econômicas sólidas. O sucesso ou o fracasso do Brasil em conciliar medidas a favor do crescimento econômico, com uma ambiciosa agenda social que reduza a pobreza e a desigualdade de renda, terá um profundo impacto no desempenho econômico e na governança da América do Sul nos próximos quinze anos. Nesse cenário, a posição do Brasil na região tenderá a tornar-se cada vez mais ativa e importante. A emergência do Brasil como potência econômica global até 2025 colocará novos desafios para sua política externa e para a política comercial externa do Brasil e dos EUA, contribuindo para a construção de uma profícua parceria. Cabe aos formuladores das decisões nos dois países identificar interesses concretos adicionais para expandir e diversificar ainda mais as relações bilaterais em um mundo que promete ser cada vez mais complexo e diferente daquele em que vivemos hoje.

RUBENS BARBOSA foi embaixador em Washington (1999-2004).

Os amigos se vao: quem ele vai abracar, agora?

Bem, eu conheço (não pessoalmente, claro), um alto personagem -- ou seria um auto-personagem? -- que está perdendo um velho amigo.
Vocês sabem: ele prometeu lutar até a última gota de sangue (de seu povo), mas parece que esses apelos já não colam mais. O futuro pode ser o TPI, da Haia.

Sobra ainda um velho amigo, mas que anda em tratamento médico, atualmente, nas terras de outro amigo, que tampouco parece ter vida longa pela frente.

Quando os amigos se vão, as possibilidades de viagem se reduzem...

Sobram só esses loiros de olhos azuis, pouco frequentáveis...

Paulo Roberto de Almeida

A destruicao da escola publica pela universidade - Jose Maria e Silva

Um importante artigo sobre a tragédia educacional brasileira.

ESCOLA PÚBLICA
Vítima indefesa das universidades
José Maria e Silva
Jornal Opção (Goiânia), 21/08/2011

O Ideb na porta das escolas não vai medir o mais grave problema da educação brasileira: a pedagogia da destruição que as universidades impõem ao ensino público

O go­ver­no go­i­a­no, por in­ter­mé­dio da Se­cre­ta­ria Es­ta­du­al de Edu­ca­ção, ado­tou uma me­di­da pi­o­nei­ra no Pa­ís — a trans­for­ma­ção do Ín­di­ce de De­sen­vol­vi­men­to da Edu­ca­ção Bá­si­ca (Ideb) nu­ma es­pé­cie de DNA das es­co­las. A par­tir de ago­ra, to­das as es­co­las es­ta­du­ais se­rão obri­ga­das a os­ten­tar uma pla­ca com a no­ta ob­ti­da no Ideb, tor­nan­do pú­bli­co seu su­ces­so ou fra­cas­so no re­fe­ri­do ín­di­ce. Co­mo pai da ideia, o em­pre­sá­rio e eco­no­mis­ta Gus­ta­vo Ioschpe, pen­sa­dor ad hoc da edu­ca­ção, es­te­ve em Go­i­â­nia res­pal­dan­do a de­ci­são do se­cre­tá­rio de Edu­ca­ção, Thiago Pei­xo­to. Em seu Twit­ter, no fi­nal da tar­de de se­gun­da-fei­ra, 15, Ioschpe não es­con­deu o en­tu­si­as­mo: “Sa­in­do de Go­i­â­nia. Ideb na Es­co­la lan­ça­do na re­de es­ta­du­al de Go­i­ás. Pri­mei­ro Es­ta­do. Gran­de vi­tó­ria. Va­mos em fren­te”.

A pro­pos­ta de Gus­ta­vo Ioschpe ga­nhou for­ça en­tre as au­to­ri­da­des do Pa­ís e ten­de a vi­rar lei fe­de­ral, va­len­do pa­ra to­das as es­co­las bra­si­lei­ras. É o que pre­vê pro­je­to de lei do de­pu­ta­do fe­de­ral Ro­nal­do Cai­a­do (DEM), apre­sen­ta­do na Câ­ma­ra dos De­pu­ta­dos em 7 de ju­nho. No mes­mo dia, o de­pu­ta­do Ed­mar Ar­ru­da, do PSC do Pa­ra­ná, apre­sen­tou pro­je­to se­me­lhan­te, que foi apen­sa­do ao do par­la­men­tar go­i­a­no. Uma se­ma­na de­pois, em 15 de ju­nho, foi a vez do de­pu­ta­do Fer­nan­do Tor­res, do DEM da Ba­hia, apre­sen­tar pro­je­to pra­ti­ca­men­te idên­ti­co, tam­bém apen­sa­do ao de Cai­a­do. E na mes­ma da­ta, cou­be à se­na­do­ra Lú­cia Vâ­nia, do PSDB de Go­i­ás, inau­gu­rar es­sa dis­cus­são no Se­na­do, com um pro­je­to de lei do gê­ne­ro.

Além des­sas ini­ci­a­ti­vas no Con­gres­so Na­ci­o­nal, di­ver­sas As­sem­blei­as Le­gis­la­ti­vas e Câ­ma­ras Mu­ni­ci­pa­is pe­lo Pa­ís afo­ra es­tão dis­cu­tin­do pro­je­tos se­me­lhan­tes, to­dos eles ins­pi­ra­dos na pro­pos­ta de Gus­ta­vo Ioschpe. No ca­so dos pro­je­tos de lei que tra­mi­tam no Con­gres­so Na­ci­o­nal, o mais ou­sa­do é o de Ro­nal­do Cai­a­do, pois ele obri­ga to­das as es­co­las do en­si­no bá­si­co — não só as pú­bli­cas, mas tam­bém as par­ti­cu­la­res — a exi­bir a no­ta ob­ti­da no Ideb. Se apro­va­do, o pro­je­to de Cai­a­do exi­gi­ria adap­ta­ções no Ideb, pois a Pro­va Bra­sil, um dos in­di­ca­do­res que com­põ­em o ín­di­ce, é apli­ca­da por amos­tra­gem no en­si­no pri­va­do e não uni­ver­sal­men­te, co­mo ocor­re no en­si­no pú­bli­co ur­ba­no.

LEIAM A ÍNTEGRA neste link.

Minha concepção da Historia: comeco de um debate

Coloquei, num post dedicado ao "fim de Bretton Woods" (1971-1973), este comentário muito rápido, que agora transcrevo a seguir:

Se me perguntassem quais os mais importantes eventos, fatos ou processos do século XX, eu não hesitaria em alinhar:

1) Primeira Guerra Mundial (e suas consequências econômicas)
2) O desastroso Tratado de Versalhes (que abriu caminho à Segunda)
3) A depressão dos anos 1930 (vejam bem, não é a crise de 1929)
4) A Segunda Guerra Mundial (que na verdade é mera consequência de Versalhes)
5) Bretton Woods, em 1944 (como pilar da nossa ordem econômica, ainda hoje)
6) A tomada do poder pelos comunistas na China, em 1949 (e os desastres que se seguiram)
7) O "fim de Bretton Woods", em 1971-73 (e a bagunça financeira mundial)
8) O fim do comunismo em 1991 (vejam bem, não é a implosão da URSS, que é mera consequência)

Enfim, depois eu desenvolvo a minha "concepção" da história.


Recebi, a este propósito, um comentário anônimo assim redigido:
Anônimo disse...
o fim do comunismo é um evento importante, mas o início não é? Muito estranho seu critério.
Domingo, Agosto 21, 2011 2:17:00 PM


Respondi, brevemente, desta maneira (mas o debate está aberto):

Minha concepção da história tem variáveis que explicarei muito bem em trabalhos futuros.
O começo do comunismo é totalmente desimportante. Foi, em primeiro lugar, um evento fortuito, totalmente dependente da guerra na frente oriental e da estratégia alemã de neutralizar a Rússia (o que foi muito bem sucedido). Em segundo lugar, houve apenas um putsch, um golpe militar, e a substituição de um governo provisório por outro, muito confuso, enredado numa guerra civil durante tres anos, e sem a certeza de que iria sobreviver. Pelo menos até 1924 ou 1927, não se sabia se o comunismo seria um sistema viável na Rússia, e de fato não foi, nunca foi, a não ser pelo "despotismo oriental" criado por Stalin, uma escravidão moderna.
O comunismo poderia, por exemplo, ter desaparecido sob os tanques hitleristas, se as democracias ocidentais (EUA e UK) não tivessem ajudado a sobrevivência de Stalin e de seu regime.
Ou seja, até 1945, pelo menos, o comunismo soviético não conta, como força efetiva na história, a não ser pela criação de dezenas de partidos comunistas ao redor do mundo, que teriam sua importância, mas já na Guerra Fria, quando a URSS se torna, aí sim, uma grande potência.
Ou seja, o nascimento do comunismo não teve maior impacto na história mundial, e se deveria, então, agregar, como consequência da Segunda Guerra Mundial, a ascensão da URSS como grande ator internacional, mas isso foi um processo também mais fortuito do que inevitável.
O que teve importância, sim, foi a derrocada do comunismo, que em certo sentido representou, efetivamente, um "fim da História".
Desenvolverei esses pontos mais adiante...
Paulo Roberto de Almeida

Guia Politicamente Incorreto da America Latina - Leandro Narloch e Duda Teixeira

Recebi, de presente, e estou lendo, com bastante prazer, este livro:

Leandro Narloch e Duda Teixeira:
Guia Politicamente Incorreto da América Latina
(São Paulo: Leya, 2011, 336 p.)

Enfim, o prazer é meu, pois além de informações novas, desconhecidas para mim (até certa medida), os dois autores se empenham em desmantelar as grandes mentiras, as deformações e os equívocos (de natureza histórica e outras) que cercam a história de nosso continente (que aliás não existe, estrito senso), tarefa que eu mesmo faço em muitos outros textos meus de feição mais acadêmica, como por exemplo nesta série:

Falácias acadêmicas: ensaios sobre alguns mitos correntes

Imagino, porém, que outra categoria de leitores, se por acaso acederem ao livro -- o que talvez seja altamente improvável -- o lerá com imenso desprazer, rangendo os dentes e amaldiçoando os autores. Os descontentes serão os que aprenderam a versão deformada da história, aquela que pode ser encontrada em um livro famoso, do mais famoso idiota latino-americano: Eduardo Galeano, Las Venas Abiertas de América Latina (centenas de edições, não preciso dizer).

(Abre parênteses: Nem sempre a história é escrita apenas pelos que venceram; em alguns casos, ela é escrita também pelos que perderam, e sua versão predomina, como parece ser evidente no caso brasileiro em relação a toda a história política dos anos 1960 em diante, quando a versão marxista da história passa a predominar, a despeito do fato de que os militares deram um golpe contra a "ameaça comunista". Claramente, a versão comunista impôs-se como "oficial", pelo menos em TODOS os livros didáticos que são distribuídos nas escolas brasileiras. O mais curioso é que a versão deformada da história predomina mesmo nos livros de história geral, que tem a ver com o capitalismo e o mundo atual: parece que o socialismo, a despeito de todos os fracassos acumulados, ainda é um "bom" sistema, e que o capitalismo só comete perversidades. Muitas dessas deformações, relativas à América Latina, são criticadas no livro de Plinio Apuleyo Mendoza, Carlos Alberto Montaner e Álvaro Vargas Llosa, "Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano", onde Galeano é desmentido como deveria, mas onde também sobra para teorias inconsequente como a "dependência" de Fernando Henrique Cardoso. Fecha parênteses)

Os autores deste novo livro, dois jornalistas, não se dedicaram apenas a desmentir o que desde já pode ser chamado de gigantesca empresa de desinformação sobre a América Latina, mas pesquisaram seriamente para oferecer, não uma outra versão, oposta à primeira, mas uma história simplesmente mais correta, mais compatível com a realidade, mais conforme os documentos e testemunhos fidedignos, não o emaranhado de mentiras e meias verdades que costuma frequentar versões idílicas (ou catastróficas, segundo os casos) da história da região. Eles vão desmantelando mitos, desbancando personagens históricos de seus pedestais, contribuindo para uma correta apreciação de nossa história, e retirando os bodes expiatórios (entre eles, o imperialismo em primeiro lugar), que pretenderiam explicar por que somos tão pobres, tão atrasados, tão desiguais, tão corruptos, tão difíceis em corrigir todos esses males.
Leandro Narloch já tinha assinado um bem-vindo Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil, em que também desmantela mitos e equívocos da nossa história. Duda Teixeira realizou inúmeras viagens pela região e fora dela, trabalhando para a revista Veja, nas quais pode conhecer muito bem o histrionismo, o populismo e as farsas vigentes em vários países.

Não vou descrever agora o livro, pois ainda estou lendo, mas já li os capítulos sobre o Chile de Allende e sobre o Haiti. Ainda tem muito mais a descobrir, com ditadores e personagens famosos, tristemente famosos, eu diria.

Posto aqui o link para os comentários de Rodrigo Constantino sobre o livro:

Leandro Narloch e Duda Teixeira:
Guia Politicamente Incorreto da América Latina

O Brasil no Council on Foreign Relations: em 2001 e em 2011

Percepções do Brasil no mundo
Celso Lafer
O Estado de S.Paulo, 21 de agosto de 2011

"Política é nuvem, vai tomando novas formas." "Tão importante quanto o fato são as versões que assume." Essas frases apontam para o fato de que a palavra política designa ao mesmo tempo a realidade e a consciência que dela tomamos. Por isso, a percepção da realidade faz parte da própria realidade e o jogo da vida pública transita pela interação dos acontecimentos com múltiplos significados que lhes atribuímos ao conhecê-los.

Essa interação caracteriza as sociedades contemporâneas, que, por serem voltadas para o futuro, vivem impregnadas pela noção de risco, com as suas dimensões de probabilidade e incerteza. Por essa razão, hoje em dia as expectativas têm, num mundo interdependente, um papel decisivo, tanto na vida econômica quanto na política.

As agências de rating de crédito dos países impactam, positiva ou negativamente, as economias porque sinalizam expectativas dos riscos futuros da sua sustentabilidade. Também na vida política as percepções sobre a qualidade ou imperícia das lideranças no trato dos problemas, os méritos ou deméritos das instituições, a natureza dos conflitos vão tecendo os cenários de expectativas que cercam a dinâmica de funcionamento de um sistema político. Na elaboração das percepções políticas e econômicas atuam os meios de comunicação, as redes sociais e a instância dos analistas qualificados.

O mesmo ocorre na apreciação dos ativos e passivos de um país no plano internacional, a partir de duas vertentes de estimativa. A primeira diz respeito à configuração da ordem mundial. A segunda resulta das características do seu desenvolvimento interno. Um bom exemplo da dinâmica desse processo de ponderação das expectativas é o contraste entre a avaliação feita em fevereiro de 2001 por um grupo de trabalho do Council on Foreign Relations, coordenado por Kenneth Maxwell, e o recém-publicado relatório elaborado pelo grupo de trabalho conduzido por Julia Zweig. Ambos analisam o papel do Brasil no mundo e as relações entre o nosso país e os Estados Unidos, e provêm de uma reputada instituição norte-americana dedicada ao entendimento do mundo e das opções da política externa dos EUA. Os dois relatórios têm, para nós, o mérito de articular o significado da percepção do Outro, que é tão importante para a condução da política externa num mundo globalizado.

O relatório de 2001 é sucinto, em contraste com o de 2011, que é muito mais abrangente e analítico. O de 2001 foi elaborado numa época de primazia dos EUA no mundo. O de 2011 leva em conta que os EUA precisam adaptar-se às novas realidades de uma ordem multipolar. O relatório de 2001 tem como pano de fundo as crises financeiras da década de 1990, que afetaram o Brasil. Reconhece avanços positivos no plano interno e identifica o Brasil como um ator de inquestionável peso regional com interesses gerais no funcionamento do sistema internacional. O relatório de 2011 tem como horizonte a positiva maneira como o nosso país lidou com a crise financeira de 2008 e reconhece que o Brasil alcançou um novo patamar de presença no mundo multipolar da atualidade, tanto como ator global quanto como motor do crescimento da América do Sul. Daí, para os EUA e os países latino-americanos, a importância de ajustarem suas percepções ao significado da ascensão brasileira no mundo. Nesse contexto, o relatório recomenda ao governo norte-americano endossar o pleito brasileiro de um lugar permanente no Conselho de Segurança da ONU. No trato das relações Brasil-EUA, explora o espaço das convergências e lida, com sensibilidade diplomática, com as diferenças de perspectivas e interesses.

O relatório destaca o cumulativo impacto positivo dos últimos 16 anos, proveniente das Presidências FHC e Lula, realçando o significado da consolidação democrática, dos méritos das políticas econômicas que levaram ao controle da inflação e das políticas sociais de inclusão que propiciaram o declínio das desigualdades de renda e a emergência de uma nova classe média.

O relatório de 2011 aponta para os avanços positivos dos ativos brasileiros relevantes para a presença do nosso país no mundo (agricultura, mineração, energia, meio ambiente, etc.) e também indica a agenda de desafios para o futuro da sua sustentabilidade. Entre eles, o da melhoria da educação, o do necessário aprofundamento do que está sendo feito no campo da pesquisa e da inovação, da superação do significativo déficit de infraestrutura, que compromete a logística e a competitividade do País.

A temática da sustentabilidade do novo patamar da presença do Brasil no mundo comporta, como é natural, outras facetas internas e externas que não foram circunstanciadamente examinadas no relatório. Do ponto de vista político, quero, como cidadão, realçar o significado de um grande item para a democracia brasileira tão presente no debate nacional: o da corrupção.

A democracia baseia-se na confiança recíproca entre os cidadãos e na destes nas instituições. A corrupção (que vem do latim corrumpere e significa destruir) é um agente de decomposição da substância das instituições públicas. Tem um alcance que vai além das condutas transgressivas individuais, pois enseja o que Raymond Aron chama de corrupção do espírito público por conta do intercâmbio clandestino entre o mercado político e o econômico. No caso do nosso país, estamos presenciando o comprometimento do espírito público que norteou a redemocratização e a elaboração da Constituição de 1988 e que, ao propiciar uma cultura política de ampliação da cidadania, foi o grande ponto de partida das positivas transformações do Brasil. O episódio do "mensalão" foi o momento inaugural da negativa inflexão do espírito público.

Cabe lidar com esse desafio, levando em conta o que dizia Machado de Assis: "A corrupção escondida vale tanto como pública, a diferença é que não fede".

PROFESSOR TITULAR DA FACULDADE DE DIREITO DA USP, MEMBRO DA ACADEMIA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS E DA ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, FOI MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES NO GOVERNO FHC

sábado, 20 de agosto de 2011

Agruras financeiras do Barao do Rio Branco em Berlim - Roberto Lopes

Apenas transcrevo:

As agruras do Barão
Oh, que azar de genro!...
Por Roberto Lopes
Revista Leituras da História, n. 42, 2011

Empobrecido pelos gastos com o casamento de sua filha, Amélia, e desassistido pelo Itamaraty, Rio Branco leva vida modesta na cara Berlim, e ainda tem que lidar com as dificuldades financeiras da moça, unida a um aristocrata germânico pouco afeito ao... trabalho!
Naquele 1901, orgulhoso e ingênuo, o Ministro brasileiro em Berlim deu um crédito de confiança à união de Gustav e Amélia. Em outubro ele mandou um telegrama a seu amigo e colega Joaquim Nabuco, convidando-o para ser o padrinho de casamento de sua filha. Desgraçadamente, o matrimônio produziria uma história infeliz, que muitos dissabores iria causar ao diplomata brasileiro.

Amélia não tardou a escrever ao pai, pedindo emprestado algum dinheiro. "Não disponho de nada", respondeu contristado Rio Branco. "O pouco que possuía deixei em garantia a um banco por ocasião do teu casamento, para contrair uma dívida de cinquenta mil francos, da qual pago os juros, e que, até este momento, me foi impossível amortizar, mesmo em parte".

Acudir os da família parece ser a sina do Barão. Em 1887, ele precisara deixar um serviço no exterior para ir ao Rio socorrer a irmã mais nova Maria Luísa, que se casara com um pobretão chamado José Bernardino da Silva, e com ele tivera uma penca de filhos - seis, exatamente. Na juventude Maria Luísa chegara a fugir de casa para ir viver com Bernardino. Mas em 87, no seu pedido desesperado de ajuda ao irmão diplomata, ela confessa que o marido "enlouquecera no espiritismo". Mais tarde o Barão precisará ajudar financeiramente a filha Marie Clotilde, que, em novembro de 1898, se casara com o francês Henri Herbert, um pequeno comerciante amigo de Raul do Rio Branco.

De volta ao Brasil em 1902, para assumir o Ministério das Relações Exteriores, o Barão do Rio Branco assistiu, ainda nesse ano, o nascimento de Maria Margarida, primeira filha do casal Gustav e Amélia. Dois anos mais tarde a menininha ganharia um irmão, José Maria - batizado, obviamente, em homenagem ao avô famoso.

Diplomata e Barão, Rio Branco esteve sempre no imaginário popular de sua época - como um representante do Brasil na cena internacional de reconhecida qualificação e grande reputação. Nem o título de nobreza, nem o fato de pertencer à faixa mais elitizada do serviço público, o distanciaram do carinho das ruas. Na segunda semana de 1912, seu féretro levou milhares de pessoas às ruas. Dois anos mais tarde, Amélia do Rio Branco pediu o divórcio de Gustav von Werther - acerca de quem circulou, bem mais tarde, a notícia de que havia se suicidado.
É 1901. Seus primeiros dias em Berlim, José Maria da Silva Paranhos, o Barão do Rio Branco, novo Enviado Extraordinário e Ministro Plenipotenciário do Brasil no Império Alemão, passou hospedado com a família no Palast-Hotel da Leipziger Platz, um prédio imponente, com frentes também para a Potsdamer Platz e para a Koniggrätzerstrasse.

O edifício abriga 110 quartos, e possui halls e salões luxuosos, além de cafeteria - um endereço que, sem ser o mais sofisticado da capital do Reich, era ainda caro para o bolso do novo Representante Diplomático do Rio. Mas logo o grupo mudou-se para um apartamento térreo da Romaniches Haus, no número 10 da movimentada Kufurstendamm, bem no coração da cidade. Acompanhavam o Barão, de 56 anos, seu filho Raul, de 29, e as filhas Amélia, 23, e Hortênsia, de apenas sete anos. A esposa do chefe de missão - a corista belga Marie Philomène Stevens - morrera em Paris.

Informado de que precisaria esperar quase dois meses para apresentar-se a Wilhelm II, o soberano local, Rio Branco viajou à França para rever os amigos e desfrutar de um de seus prazeres prediletos: a boa mesa. A 18 de maio ele participou de um banquete em homenagem ao jovem escultor Félix-Maurice Charpentier. Eventos desse gênero - organizados com pompa e requinte - eram comuns na Paris do início do Século 20. O de Charpentier reuniu personagens do mundo das artes - Girard, Roybet e Gabriel Ferriere - e personalidades da política francesa: o Presidente da Câmara dos Deputados, Paul Deschamel, o Governador da Indochina, Paul Doumer, e nomes que alcançariam o auge da fama no trágico período da opressão Nazi-fascista sobre a Europa, como os Deputados Gaston Doumerge e Paul Faure. Eram, ao todo, 28 convidados. Rio Branco, o único diplomata estrangeiro - e, ainda por cima, acreditado na Alemanha...

O cardápio previa iguarias como Creme "Joinville", truta defumada ao molho "Genevoise", filé de boi, salada da estação, massas ao estilo italiano, queijos, corbeilles de frutas, biscoitos finos e doces - acompanhados de café e de um digestivo. Para beber, quatro tipos de vinho - "Madère", "Médoc", "Graves" e "St. Julien" - e uma edição especial do champagne "Hotel Moderne".

Com o Imperador
Finalmente, na terça-feira, 28 de maio, Rio Branco avistou-se com Friedrich Wilhelm Viktor Albrecht Hohenzollern. Os arquivos do Ministério das Relações Exteriores guardaram uma descrição desse encontro, no Neues Palais, de Potsdam:

"Vestindo o seu pomposo uniforme dos hussares vermelhos, o Imperador, ao recebê-lo, não se limitou às expressões protocolares na troca de discursos: fez, com largueza, o elogio pessoal do Ministro brasileiro, declarando conhecer os serviços que ele prestara ao seu país e haver acompanhado de perto a sua atuação como advogado em Berna, através dos relatórios do Ministro alemão na Suíça. E, durante vinte minutos de palestra, escolheu Guilherme II certos assuntos que o mostravam muito bem informado a respeito do Brasil: a obra financeira do Governo Campos Sales; a guerra do Paraguai, da qual citou vários episódios que lera em Schneider; a abertura da navegação dos nossos rios interiores, particularmente a do Paraguai, devida aos esforços do Brasil. Referiu-se ainda ao projeto apresentado ao Congresso Latino-Americano de Montevidéu para a ligação, por meio de canais, das duas bacias do Amazonas e do Prata. E, por fim, à colonização alemã no Brasil".
Com 1.888.300 habitantes, a capital alemã oferecia conforto, misturando tradição com modernidade. Há quase 30 anos dispunha de água canalizada. Há quase 20 contava com serviço telefônico. A distribuição de energia elétrica permitira, na década de 90, a inauguração de um serviço de bondes elétricos. E havia ainda a Filarmônica, o Teatro Alemão e a grande novidade do momento: os cinematógrafos de "Atualidades", que desde 1895 informavam e distraíam. Em 1898, Oskar Messter, produtor do noticiário Messter-Woche, acompanhara Wilhelm II em viagens ao estrangeiro.

Outra atração eram as películas dos irmãos Max e Emil Skladanowsky (contemporâneos dos famosos irmãos Lumière), que exibiam cenas de férias populares e outras diversões, narradas por locutor empoleirado em um pódio dentro da sala de projeção.

O único problema dessa fase da vida (e da carreira) de Rio Branco, é que, na Legação, ele não encontrou trabalho suficiente sequer para preencher o horário do expediente. O assunto da imigração alemã para o Brasil era manejado por entidades privadas espalhadas por diferentes cidades. E o acesso aos gabinetes governamentais mostrava-se um tanto dificultoso para os representantes das chamadas "potências de segunda ordem" - como eram conhecidas as nações irrelevantes em termos militares, e de limitada presença econômica internacional (caso preciso do Brasil).

Assessorado pelo filho Raul - um rapaz alto, magro, galanteador e sem o valor intelectual do pai ou do avô - e pelo sobrinho Luís Cavalcanti, o Barão deixarse- ia enredar pela rotina morna e burocrática da Missão que liderava. Pessoa simples e afável, gostava de conversar e de boas anedotas.

A filha Amélia, nascida em Paris, cuida para que a Legação do Brasil na sede do Reich tenha uma aparência de ordem e bom acolhimento - tarefa a que já se entregara quando o grupo vivera em Berna. A pequena Hortênsia, mimada por todos, o Barão entregou aos cuidados da Baronesa de Berg.
Sem peso político
Para o diplomata enfronhado na política européia - alerta, atento aos planos expansionistas da Weltpolitik [política global] "Wilhelmínica" (para ficarmos com uma expressão bem ao gosto dos franceses) -, Berlim era um posto que poderia ser adjetivado de várias maneiras - menos como enfadonho.

A frustração de Rio Branco podia ser mais bem explicada por sua posição marginal no Corpo Diplomático da cidade, como Plenipotenciário do desconhecido Brasil. Mas havia, contudo, outras dificuldades. Em primeiro lugar, é preciso lembrar que o Barão - apesar de pessoa indubitavelmente inteligente e preparada - não era um Representante Diplomático na acepção da palavra. Fizera carreira como agente consular, e até mesmo desse caminho se desviara, enveredando pela pesquisa histórica, que serviria mais tarde para embasar argumentos de caráter jurídico do interesse da República brasileira. Estava mais para Consultor Jurídico especializado em Direito Internacional, do que, propriamente, para chefe de Missão - cargo no qual sua experiência, como já dissemos, era nenhuma.

Em segundo lugar, o Brasil não era um player (como o moderno Itamaraty gosta de caracterizar) da política internacional. O que a República fundada em 1889 pensava ou deixava de pensar acerca das questões europeias, pouco - quase nada - importava às Potências do Velho Continente. As decisões do Rio tinham peso, no máximo, regional, mercê das dimensões continentais do país, de seu potencial humano e das lembranças de uma Esquadra que chegara ao último decênio do século 19, numerosa.

Sem dinheiro
Um terceiro e decisivo ponto para a frustração do Barão na Alemanha era a vida regrada ao extremo, sem sobras de dinheiro, que ele levava. Isso o impedia de mover-se com mais liberdade, inclusive para a coleta de informações junto à aristocracia local e aos colegas do círculo diplomático. Em seu "História da Organização do Ministério das Relações Exteriores", Flávio Mendes de Oliveira Castro - um dos vários sucessores de Rio Branco no Consulado de Liverpool - ressalta que o novo "Regimento para as Legações da República dos Estados Unidos do Brasil", promulgado através do decreto presidencial nº 3.248, de 7 de abril de 1899 - e também conhecido como "Regimento Olyntho Magalhães" -, "não tratou de emolumentos nem de contas ou de despesas. A sua omissão nesse particular é total, com a única exceção do seu artigo 1 quando diz que o Chefe de Legação deveria manter estrita economia na compra de mobiliário, Selos de Armas e arquivos para a instalação da Legação, tendo em vista a decência que cumpria manter e a economia que deveria regular todos os gastos autorizados".

O mais provável é que Magalhães - ele próprio um ex-Plenipotenciário na Europa - tenha se omitido, por saber da necessidade que um chefe de Missão tinha, de, à época, manter-se - e manter sua Legação - em evidência no sofisticado e complicado ambiente europeu. Aparecer bem era meio caminho para inteirar-se das novidades, recolher a boa informação. Retrair era condenar a si próprio - e ao governo representado - ao isolamento e à ignorância.

Contudo, nesse particular, a diplomacia brasileira preferiu aferrar-se ao anacronismo dos tempos do Império, e dos mandamentos do antigo Regimento das Legações Imperiais, que prescrevia: "A regência em Nome do Imperador mui eficazmente Recomenda, e Espera dos Chefes das Legações Imperiais a mais restrita economia nas despesas extraordinárias, que poderão fazer por conta do Tesouro Público Nacional; Declarando-lhes porém que não é de sua Intenção inibi-las de fazer aquelas que forem indispensáveis para que não sofram detrimento nem Dignidade nem o Serviço do Estado, pois Ela unicamente Deseja, que se evitem despesas arbitrárias, que se não acharem previamente autorizadas pela Secretaria de Estado, ou devidamente justificadas pela sua extraordinária urgência".

E Oliveira e Castro ainda lembra: "também não ficaram previstas (no novo Regimento de 1889) as possibilidades dos Chefes de Legação, por iniciativa própria, despacharem expressos (correios diplomáticos) ou de realizarem conferências com outros Ministros brasileiros sobre algum negócio de máximo interesse, que ocorra, e necessite imediata solução".

Sem a ajuda do genro
Ainda em 1901, o Ministro do Brasil no Reich viveu breve momento de emoção, ao casar a bela Amélia com o Barão Gustav Karl Marian von Werther - nobre empobrecido da Prússia, e ainda por cima sem apego ao trabalho, que apesar de dominar perfeitamente os maneirismos sedutores dos jovens europeus da época, almejava apenas alguma posição no serviço público berlinense.

E mesmo ciente dessa realidade, Rio Branco teve a esperança de que o enlace pudesse dar certo. Afinal, o sobrenome Von Werther tinha história na diplomacia europeia. Entre 1824 e 1837, um Von Werther - Wilhelm - chefiara a Embaixada da Prússia em Paris. Cargo que só aceitou abandonar para chefiar, por quatro anos, o próprio serviço diplomático prussiano.

"Celebrando" o declinio do dolar: consequencias economicas de 1971

Um diretor de uma firma de investimentos, oportunista como todos eles, apresenta sua versão de um dos episódios mais momentosos do século XX: a denúncia unilateral pelos EUA do padrão ouro-dólar estabelecido em Bretton-Woods, e as consequências que se seguiram.
Como diria um filósofo mineiro (desculpe Minas Gerais), as consequências sempre vêm depois.
Pois bem, o dólar não cessa de cair, mas não necessariamente devido a 1971, e sim a todas as demais políticas adotadas desde então.
Se me perguntassem quais os mais importantes eventos, fatos ou processos do século XX, eu não hesitaria em alinhar:

1) Primeira Guerra Mundial (e suas consequências econômicas)
2) O desastroso Tratado de Versalhes (que abriu caminho à Segunda)
3) A depressão dos anos 1930 (vejam bem, não é a crise de 1929)
4) A Segunda Guerra Mundial (que na verdade é mera consequência de Versalhes)
5) Bretton Woods, em 1944 (como pilar da nossa ordem econômica, ainda hoje)
6) A tomada do poder pelos comunistas na China, em 1949 (e os desastres que se seguiram)
7) O "fim de Bretton Woods", em 1971-73 (e a bagunça financeira mundial)
8) O fim do comunismo em 1991 (vejam bem, não é a implosão da URSS, que é mera consequência)


Enfim, depois eu desenvolvo a minha "concepção" da história.
Por enquanto fiquem com um investidor metido a historiador.
Paulo Roberto de Almeida

Celebrating 40 Years of Dollar Destruction
Sean Hyman
The Sovereign Investor, August 16, 2011

This week, we’re celebrating the anniversary of the greatest heist in recorded history.
Exactly 40 years ago yesterday, President Nixon severed the dollar’s ties to gold forever.

It was a government game so the politicians could easily pay off their debts with “cheaper dollars” for the foreseeable future.

In reality, this one decision effectively stole all our dollars’ value for decades to come. And you and I are the ones still paying for this mistake.

Strangely this decision also created the $4 trillion Forex market…and eventually sent gold racing above $1,800 an ounce.

But these profitable side effects were not Nixon’s intention…

You see, up until 1971, each dollar was physically backed by gold.

Gold was $35 an ounce and every dollar in circulation could be redeemed for gold. So every dollar was backed by the power and security of gold.

But when Nixon removed us from the gold standard, that responsibility flew out the window – along with the dollar’s long-term value.

It’s the reason the dollar has lost massive purchasing power against other currencies in the last four decades (and gold has risen 51-fold against the buck).

And get this: the worst is still yet to come for the dollar.

I’ll explain how to protect your savings in just a moment. First, let’s take a closer look at how our dollar has lost that much in value.

The Greenback Is Backed By the “Hot Air” of Washington, D.C.

Given that the dollar has lost so much value, backing dollars with gold simply wouldn’t fly today.

As of July 2011 our “reported” gold reserves was 8,133.5 tonnes. Multiple that by the current price of gold ($1,746 as of this writing), and you can see we have a little over $454 billion bucks in gold.

In just the last year, we have had over $1 trillion dollars in circulation. So obviously we don’t have enough gold to cover all that.

But of course, that was the point of taking us off the gold standard. Otherwise, how else would we be able to write blank checks for everything we need?

Back in the Good Old Days, All These Dollars Would Have Had Value
In fact, it’s estimated that if you took all of the gold that has ever been mined in the world, it would only come up to about $5 trillion.Well we print trillions of dollars and run up over $14.6 trillion in debt all by ourselves in the U.S. (and that’s just one country of the world).

All these dollars are only worth something if the U.S. government says so. It’s backed by the U.S. government promise, “we’re good for it.” In other words, our dollars are basically backed by hot air straight from Washington.

But the harsh truth is they couldn’t back all of the dollars in circulation right now even if they wanted to.

Even worse, the more investors realize how shaky our currency is, the more they start looking elsewhere for more fundamentally sound currencies.

That’s one reason why the U.S. just raised our debt ceiling for the 75th time in 50 years. It’s also why the Standard & Poor’s just downgraded our debt.

Toss in the Fed’s nasty habit of creating money out of thin air anytime we need extra resources, bailouts and stimulus packages – and the dollar is in serious trouble.

The Government has Two Choices and Both are Bad… But Here’s What They Will Choose
Our economy is in shambles, and our currency is losing clout every single day. And we are no longer competitive with the rest of the world in terms of exports. We really only have two choices left to stay competitive with the rest of the world.

Either the government can allow “wage devaluation” or “currency devaluation.” In other words, they can let wages fall or let the currency drop in value.

Do you really think Americans will elect politicians that force them to take pay cuts? Heck no! So if the guys in Washington want to keep their jobs, they really only have one choice – devalue our dollars further.

As you can imagine, voters pay closer attention to how many dollars are in their paycheck than how much those dollars buy. (In fact, most Americans don’t even understand the concept of the dollar losing purchasing power anyway.)

That’s why it’s almost too easy for Washington to dilute our currency and accomplish their “cheap dollar” agenda.

A Glimpse Into the Future…
So here’s how all of this is going to play out. The U.S. will continue to stack on more debt and dilute the dollar by creating more money. Call it QEIII or just ridiculously low interest rates until 2013, but either way, this can only end one way.

The dollar is sinking in value, and central bankers around the world know it.

Therefore, they are “ever so quietly” shifting their central bank reserves slowly away from dollars and into currencies that aren’t being diluted, that have superior fundamentals.

Some, like China and India, are even buying up commodities for their reserves (like gold, silver, iron ore, etc.).

This practically guarantees there will be a constant shift away from dollars through the years – especially as our politicians believe the quick solution is “dollar dilution.” But no country in history ever brought themselves to prosperity by continually diluting their currency.

Therefore, you won’t really be able to “protect your dollars” because of the government’s overall agenda.

So what can you do? Well, you can protect your money – your wealth – by taking your money (dollars) and investing them in other currencies that aren’t playing the debt-stacking, currency dilution game.

You can also buy the traditional forms of “hard money” including gold.

Dollars…On Sale…50% Off!
Now remember when I said that our currency will have to be diluted even further?

One well-respected hedge fund manager ran the numbers and said that the dollar would have to be devalued by another 50% to make us competitive with the world again.

That means, if you’re paying $5 for your Starbucks coffee…you’ll be paying $10 in just a few short years. If you’re paying $400 for your car payment now, better get used to $800 payments.

Do you think “wage growth” is going to keep up with that? Hardly!

In fact, Ben Bernanke flat-out admitted last year that it will likely take five years or more to get our unemployment rate back down to 5-6%.

So if there is a glut of unemployed people, there’s no need for employers to raise wages when there’s an everlasting supply of employees willing to work for peanuts.

So the bottom line is: you’ve got to get positioned into currencies that aren’t “singing the same tune” as America.

That includes places like Switzerland, Norway and Singapore. All three have stronger currencies that can shield you from the dollar’s long-term destruction, and even provide some measure of safety as stocks drop.

So before the greenback devalues another 50% over the upcoming years…shift into something that will retain its value and grow through the years. And do it while the buck is still worth something!

Have a Nice Day,
Sean Hyman
Editor, Currency Cross Trader

P.S. As I mentioned, the one bright spot of Nixon taking us off the gold standard was the $4 trillion Forex market itself. The Forex market as we know it today didn’t exist before 1971. But once currencies all over the world started floating freely, traders could buy and sell them for profits. Today, the Forex market includes retail traders from all over the world who trade currencies online just like the pros. Now’s your chance to join them.

A maior crise do seculo (ate agora) - Luiz Felipe Lampreia

A crise de 2011 é a mais grave de todas
Luiz Felipe Lampreia
O Estado de S.Paulo, 20 de agosto de 2011

Após o desmoronamento da URSS, o capitalismo emergiu, vitorioso, de 50 anos de guerra fria e parecia destinado a reinar absoluto dali por diante. Era a mensagem do fim da História, do grande pensador Francis Fukuyama.

Passados 20 anos, a aposta revelou-se parcialmente falsa. O capitalismo prevaleceu e não existe, nem sequer como utopia, uma alternativa que tenha a mínima credibilidade.

Com a crise de 2008, que representou um golpe duro no setor financeiro, principalmente, começou uma fragilização do sistema político/econômico, o que, por sua vez, conduziu à crise atual. Hoje a relativa incapacidade dos líderes políticos ficou patente. Eles são obrigados a manter os olhos postos nas pesquisas e governar por elas. Sua habilidade é meramente tática, os gigantes de visão estratégica, como Franklin Delano Roosevelt, Konrad Adenauer, Charles de Gaulle ou Felipe González, pertencem ao passado.

O sistema de governança global foi confrontado com uma situação que pôs a nu a sua precariedade, seja pelo incrível espetáculo que foi o recente cabo de guerra do orçamento e da dívida no Congresso americano, seja na cabra-cega de Bruxelas para resolver os problemas das dívidas dos Estados-membros. Tudo o que parecia sólido - a ascensão triunfal dos Brics incluída - se tornou questionável.

A única aposta certa entre os países ricos, hoje, é a Alemanha, com seu alto nível de renda, sua produtividade incomparável, sua homogeneidade social e seus talentos inatos, que permitiram que após a derrota violenta e total de 1945 o país apresentasse nos dez anos seguintes o maior exemplo de recuperação e criação de valor da História das nações.

Mas não é indiscutível que a Alemanha continuará a ser a coluna mestra da Europa e o banqueiro de todos os países que não possuem suas virtudes ou sua disciplina. Hoje ela é primus inter pares na Europa e cada vez mais exerce o poder que daí decorre sem as cautelas e os temores do passado. É óbvio que a Alemanha tem enorme interesse no construção europeia, da qual é a maior beneficiária. Mas as opiniões dos eleitores alemães não obedecem a análises apenas racionais e isso poderá obrigar os políticos seguirem os veredictos das urnas ou das sondagens, indicando que a Alemanha não está mais disposta a cobrir todos os excessos e a resgatar os naufrágios de seus sócios irresponsáveis, que se embriagaram de dívidas e de más políticas públicas, como se a União Europeia fosse uma festa interminável para todos.

Os Estados Unidos vivem um de seus piores momentos. Barack Obama mostrou-se muito mais fraco como presidente do que a imensa expectativa que gerou como candidato. O Congresso transformou-se numa arena de enfrentamentos em que inexiste clima para atitudes construtivas e compromissos sobre medidas que interessam a toda a nação. É como se para destruir Obama e os democratas os republicanos radicais do Tea Party fossem até capazes de atear fogo à Casa Branca.

Na recente discussão, o sistema político americano revelou-se disfuncional. John Micklethwaite, editor da grande revista inglesa The Economist, descreveu os partidos americanos como "duas placas tectônicas ideológicas que se movem em direções opostas, aumentam a distância entre si e causam abalos sísmicos". As guerras malsucedidas do Iraque e do Afeganistão representam a terceira ocasião, com o Vietnã, em que todo o imenso poder militar americano não consegue emergir vitorioso, malgrado os enormes custos e todos os meios empregados.

Está hoje patente que os Estados Unidos estão deslizando na ladeira do poder, onde já foram absolutos, embora nada indique que deixarão de ser uma superpotência ou que vão desmoronar como o sistema comunista. Ainda assim, as credenciais americanas persistem. A maior economia mundial, três vezes superior à segunda colocada, Forças Armadas como nunca houve na História, os Estados Unidos são e serão, por longo tempo, uma superpotência. Mas não possuem mais a faculdade de ser, na famosa frase de Madeleine Albright, a "nação indispensável" que dava sempre o tom nas relações internacionais.

Na China, o país hoje mais bem posicionado para desafiar a supremacia de Washington, já existe um questionamento - ainda incipiente, mas claro - quanto à supremacia do Partido Comunista. Em que ponto as atuais contestações - em sua maioria, protestos locais de todo tipo - tomarão volume? Ninguém pode prever, só se sabe que tem havido aumentos de efetivos militares em diversas províncias chinesas, em claro sinal de nervosismo de Pequim. Por outro lado, com a desaceleração econômica, haverá dificuldades para seguir absorvendo rapidamente os grandes contingentes de excluídos que ainda estão no interior do território chinês. Crescer a 10% ao ano não pode ser um moto perpétuo. A médio prazo, é difícil que se mantenha a combinação virtuosa de fatores que permitiu a espetacular emergência da China nos últimos 30 anos.

Não sou daqueles que veem os quatro cavaleiros da Apocalipse nos cantos do céu assim que se instala uma crise. Todos os povos acima mencionados passaram por situações muito mais graves - anos de depressão econômica, guerras, sofrimentos e perdas indizíveis - e terminaram por se recuperar.

A crise de 2011 é a mais grave de todas as que ocorreram nas últimas décadas. Mas o mundo sairá dela. É da essência do capitalismo que essas convulsões ocorram - trata-se do processo de destruição criativa de que falava o grande economista austríaco Joseph Schumpeter. Os fatores produtivos combinados das principais economias do mundo, entre as quais, obviamente, está o Brasil, representam uma força imbatível e acabarão por prevalecer. Até que sobrevenha nova crise mais adiante...

PROFESSOR DA ESPM RIO, FOI MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES NO GOVERNO FERNANDO HENRIQUE CARDOSO