Pois é, eu também estou surpreso, tanto comigo mesmo, que não sou de ficar colocando poesias nestes espaços abertos -- a bem da verdade, nem sou de ficar lendo poesia impunemente -- quanto com a "situação".
Pois é, a "situação", assim mesmo entre aspas, pois não sei como descrever a "situaçao". O fato é que eu recebi duas poesias já bem antigas, de um correspondente, e achei que elas cabiam também na atual... "situação".
Trata-se do consagrado poeta Affonso Romano de Sant'Anna, que a fez num momento particularmente infeliz de nossa história, quando a mentira tinha status oficial, e era mesmo promovida a verdade governamental.
Talvez seja o caso...
A Implosão da Mentira
(ou o episódio do Riocentro-fragmentos)
Affonso Romano de Sant'Anna
Fragmento 1.
Mentiram-me. Mentiram-me ontem
e hoje mentem novamente. Mentem
de corpo e alma, completamente.
E mentem de maneira tão pungente
que acho que mentem sinceramente.
Mentem, sobretudo, impune/mente.
Não mentem tristes. Alegremente
mentem. Mentem tão nacional/mente
que acham que mentindo história afora
vão enganar a morte eterna/mente.
Mentem. Mentem e calam. Mas suas frases
falam. E desfilam de tal modo nuas
que mesmo um cego pode ver
a verdade em trapos pelas ruas.
Sei que a verdade é difícil
e para alguns é cara e escura.
Mas não se chega à verdade
pela mentira, nem à democracia
pela ditadura.
Fragmento 2.
Evidente/mente a crer
nos que me mentem
uma flor nasceu em Hiroshima
e em Auschwitz havia um circo
permanente.
Mentem. Mentem caricatural-
mente.
Mentem como a careca
mente ao pente,
mentem como a dentadura
mente ao dente,
mentem como a carroça
à besta em frente,
mentem como a doença
ao doente,
mentem clara/mente
como o espelho transparente.
Mentem deslavadamente,
como nenhuma lavadeira mente
ao ver a nódoa sobre o linho.Mentem
com a cara limpa e nas mãos
o sangue quente.Mentem
ardente/mente como um doente
em seus instantes de febre.Mentem
fabulosa/mente como o caçador que quer passar
gato por lebre.E nessa trilha de mentiras
a caça é que caça o caçador
com a armadilha.
E assim cada qual
mente industrial? mente,
mente partidária? mente,
mente incivil? mente,
mente tropical?mente,
mente incontinente?mente,
mente hereditária?mente,
mente, mente, mente.
E de tanto mentir tão brava/mente
constroem um país
de mentira
-diária/mente.
* Este poema foi recitado na voz de Tônia Carrero no CD "Affonso Romano de Sant'Anna por Tônia Carrero" da Coleção "Poesia Falada".
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008
terça-feira, 5 de fevereiro de 2008
840) Uma selecao de artigos publicados numa nova revista
Espaço do conhecimento
Tenho colaborado com diversos veículos de caráter acadêmico, entre eles a revista digital Espaço Acadêmico, o newsletter de atualdiade Via Política ou, ocasionalmente, o blog do Instituto Millenium. Eventualmente também preparo resenhas de livros que são normalmente publicadas na revista do IPEA, Desafios do Desenvolvimento, ou no site Parlata.
Em meados de 2007, fui contatado por um professor responsável por uma nova revista acadêmica, a Espaço da Sophia, e solicitado a colaborar, tenho encaminhado alguns materiais que julgo pertinentes ao espírito desse periódico mensal.
Abaixo a lista dos meus artigos publicados desde que comecei a colaborar:
Espaço da Sophia,
Colaborações de Paulo Roberto de Almeida:
9) Políticas Econômicas Nacionais no contexto da globalização: a questão do desenvolvimento (ano I, nr. 11, fevereiro 2008)
8) Uma proposta modesta: a reforma do Brasil (ano I, nr. 10, janeiro 2008)
7) História virtual do Brasil: um exercício intelectual (ano I, nr. 9, dezembro 2007)
6) Expansão Econômica Mundial: 100 anos de uma obra pioneira (ano I, nr. 8, novembro 2007)
5) Dissolução de uma redundância: crônica do petismo ordinário (ano I, n. 7, outubro 2007)
4) Teses para uma revolução partidária: sugestões para um congresso de um grande partido (ano I, nr. 6, setembro 2007)
3) Já não se fazem mais marxistas como antigamente (ano I, nr. 5, agosto 2007)
2) Prometeu Acorrentado: o Brasil amarrado por sua própria vontade (ano I, nr. 4, julho 2007)
1) Estaria a imbecilidade humana aumentando? (uma pergunta que espero não constrangedora...) (ano I, nr. 3, junho 2007)
Tenho colaborado com diversos veículos de caráter acadêmico, entre eles a revista digital Espaço Acadêmico, o newsletter de atualdiade Via Política ou, ocasionalmente, o blog do Instituto Millenium. Eventualmente também preparo resenhas de livros que são normalmente publicadas na revista do IPEA, Desafios do Desenvolvimento, ou no site Parlata.
Em meados de 2007, fui contatado por um professor responsável por uma nova revista acadêmica, a Espaço da Sophia, e solicitado a colaborar, tenho encaminhado alguns materiais que julgo pertinentes ao espírito desse periódico mensal.
Abaixo a lista dos meus artigos publicados desde que comecei a colaborar:
Espaço da Sophia,
Colaborações de Paulo Roberto de Almeida:
9) Políticas Econômicas Nacionais no contexto da globalização: a questão do desenvolvimento (ano I, nr. 11, fevereiro 2008)
8) Uma proposta modesta: a reforma do Brasil (ano I, nr. 10, janeiro 2008)
7) História virtual do Brasil: um exercício intelectual (ano I, nr. 9, dezembro 2007)
6) Expansão Econômica Mundial: 100 anos de uma obra pioneira (ano I, nr. 8, novembro 2007)
5) Dissolução de uma redundância: crônica do petismo ordinário (ano I, n. 7, outubro 2007)
4) Teses para uma revolução partidária: sugestões para um congresso de um grande partido (ano I, nr. 6, setembro 2007)
3) Já não se fazem mais marxistas como antigamente (ano I, nr. 5, agosto 2007)
2) Prometeu Acorrentado: o Brasil amarrado por sua própria vontade (ano I, nr. 4, julho 2007)
1) Estaria a imbecilidade humana aumentando? (uma pergunta que espero não constrangedora...) (ano I, nr. 3, junho 2007)
quarta-feira, 30 de janeiro de 2008
839) Abertura dos portos: revisitando a historia
No contexto dos 200 anos da chegada do príncipe regente, D. João, a Salvador, e do alvará régio que determinou a abertura dos portos brasileiros ao comércio com as nações amigas de Portugal, tenho o prazer de informar o lançamento, neste dia 28 de janeiro de 2008, em São Paulo, na Federação do Comércio (junto com uma exposição alusiva à data histórica) do livro:
A Abertura dos Portos
organizador por Luis Valente de Oliveira e Rubens Ricupero
São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2007, 352 p.; ISBN: 978-85-7359-651-9
no qual figura minha contribuição:
"A formação econômica brasileira a caminho da autonomia política: uma análise estrutural e conjuntural do período pré-Independência" (p. 256-283)
Paulo Roberto de Almeida
A Abertura dos Portos
organizador por Luis Valente de Oliveira e Rubens Ricupero
São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2007, 352 p.; ISBN: 978-85-7359-651-9
no qual figura minha contribuição:
"A formação econômica brasileira a caminho da autonomia política: uma análise estrutural e conjuntural do período pré-Independência" (p. 256-283)
Paulo Roberto de Almeida
domingo, 27 de janeiro de 2008
838) O que fez voce mudar de ideia? e por que?
The Edge Annual Question — 2008
When thinking changes your mind, that's philosophy.
When God changes your mind, that's faith.
When facts change your mind, that's science.
WHAT HAVE YOU CHANGED YOUR MIND ABOUT? WHY?
Science is based on evidence. What happens when the data change? How have scientific findings or arguments changed your mind?"
165 contributors; 112,600 words
Printer version.
Veja todas as questões anuais, a partir de 1998, aqui.
When thinking changes your mind, that's philosophy.
When God changes your mind, that's faith.
When facts change your mind, that's science.
WHAT HAVE YOU CHANGED YOUR MIND ABOUT? WHY?
Science is based on evidence. What happens when the data change? How have scientific findings or arguments changed your mind?"
165 contributors; 112,600 words
Printer version.
Veja todas as questões anuais, a partir de 1998, aqui.
837) Stephen Jay Gould: o triunfo da razao
The Triumph of Stephen Jay Gould
By Richard C. Lewontin
NEW YORK REVIEW OF BOOKS, Volume 55, Number 2 · February 14, 2008
One of the most interesting developments of the last sixty years in the popularization of intellectual concerns and higher culture has been the appearance of "public intellectuals." They are, for the most part, academics who use a variety of means of access to a wide audience to disseminate ideas that are sometimes an integral part of their expertise, and sometimes very far from their professional field. ...
When I was a boy The New York Times had one science reporter, Waldemar Kaempfert, who wrote an occasional column. It now has a staff that produces an entire ten-page Science Times every Tuesday. Of the twenty-two contributors to the 2007 Fall Books edition of The New York Review, nine were academics. The pages of that edition included twenty-six advertisements from university presses announcing 154 books. Nor are university presses the sole publishers of the work of professional thinkers. Really successful public intellectuals employ a literary agent who places his clients' work with major trade publishers or may even serve as the editor of a collection of articles of his clients, [3] which is then published by a major house.
There is a considerable variation in the degree to which academic public intellectuals stray from their own technical work in their public writings. Even those who begin with both feet planted firmly in their discipline find it hard to resist the seduction of generalizing, especially if they see some relevance of their knowledge to human history and social structure. E.O. Wilson, a great expert on the biology of ants and especially on ant behavior, devoted most of his famous book on sociobiology to the social behavior of "lower" animals, but his status as a public intellectual arose from his extension of those ideas and observations to claims about human nature and human social institutions. After all, Homo sapiens is an animal, so why should we not be able to understand human history as just another example of a general theory about animal behavior?
Some depart entirely from their expertise and build a public career with only the slimmest connection to their professional knowledge. It will not be obvious to the readers of Jared Diamond's Guns, Germs, and Steel that he is, in fact, a physiologist and an expert in tropical biogeography. Still others are public figures concerned with political questions quite separate from the content of their intellectual accomplishment. Noam Chomsky's politics have nothing to do with his theory of universal grammar, although he might gain attention for his political arguments because we already know that he is very smart. It is even possible to become a public intellectual in science with no institutional home in a technical discipline. Richard Dawkins, who was trained as a biologist and who obviously knows a great deal about genetics and evolution, is Professor of the Public Understanding of Science at Oxford.
___
[3] See, for example, What We Believe But Cannot Prove: Today's Leading Thinkers on Science in the Age of Certainty, edited by John Brockman (HarperPerennial, 2006).
By Richard C. Lewontin
NEW YORK REVIEW OF BOOKS, Volume 55, Number 2 · February 14, 2008
One of the most interesting developments of the last sixty years in the popularization of intellectual concerns and higher culture has been the appearance of "public intellectuals." They are, for the most part, academics who use a variety of means of access to a wide audience to disseminate ideas that are sometimes an integral part of their expertise, and sometimes very far from their professional field. ...
When I was a boy The New York Times had one science reporter, Waldemar Kaempfert, who wrote an occasional column. It now has a staff that produces an entire ten-page Science Times every Tuesday. Of the twenty-two contributors to the 2007 Fall Books edition of The New York Review, nine were academics. The pages of that edition included twenty-six advertisements from university presses announcing 154 books. Nor are university presses the sole publishers of the work of professional thinkers. Really successful public intellectuals employ a literary agent who places his clients' work with major trade publishers or may even serve as the editor of a collection of articles of his clients, [3] which is then published by a major house.
There is a considerable variation in the degree to which academic public intellectuals stray from their own technical work in their public writings. Even those who begin with both feet planted firmly in their discipline find it hard to resist the seduction of generalizing, especially if they see some relevance of their knowledge to human history and social structure. E.O. Wilson, a great expert on the biology of ants and especially on ant behavior, devoted most of his famous book on sociobiology to the social behavior of "lower" animals, but his status as a public intellectual arose from his extension of those ideas and observations to claims about human nature and human social institutions. After all, Homo sapiens is an animal, so why should we not be able to understand human history as just another example of a general theory about animal behavior?
Some depart entirely from their expertise and build a public career with only the slimmest connection to their professional knowledge. It will not be obvious to the readers of Jared Diamond's Guns, Germs, and Steel that he is, in fact, a physiologist and an expert in tropical biogeography. Still others are public figures concerned with political questions quite separate from the content of their intellectual accomplishment. Noam Chomsky's politics have nothing to do with his theory of universal grammar, although he might gain attention for his political arguments because we already know that he is very smart. It is even possible to become a public intellectual in science with no institutional home in a technical discipline. Richard Dawkins, who was trained as a biologist and who obviously knows a great deal about genetics and evolution, is Professor of the Public Understanding of Science at Oxford.
___
[3] See, for example, What We Believe But Cannot Prove: Today's Leading Thinkers on Science in the Age of Certainty, edited by John Brockman (HarperPerennial, 2006).
836) Realidade do Mercosul: muitas reuniões, pouco resultado
Integração regional: realidade e fantasia
Thiago Marzagão
Instituto Millenium, 21 de Janeiro de 2008
Link
A página oficial do Mercosul – www.mercosur.int – e a da atual presidência do bloco (exercida pela Argentina) – www.mercosur.gov.ar – valem uma visita. Contêm farto e didático material sobre em que consiste, concretamente, isso que chamam de "processo de integração regional" e que, no atual governo, tornou-se o eixo de nossa política externa.
Chama atenção, à primeira vista, a multiplicidade de temas que são objeto de discussão entre os Estados-Partes do bloco. Debatem-se não apenas tarifas de importação e negociações comerciais, mas também questões atinentes a meio-ambiente, segurança, pobreza, saúde, justiça, educação, normas técnicas e infra-estrutura, além de temas relacionados a políticas macro e microeconômica. Para abrigar essas discussões, a estrutura institucional do Mercosul conta com nada menos que 257 fóruns, entre comitês, comissões, grupos de trabalho, foros especializados, órgãos de apoio técnico, etc.
Esses fóruns são, quase todos, compostos por representantes dos quatro Estados-Partes (cinco quando a Venezuela – cuja adesão ainda não foi ratificada pelos parlamentos brasileiro e paraguaio – envia observadores) e se reúnem com bastante freqüência. Apenas para este primeiro semestre de 2008 estão previstas ao todo 96 reuniões, a maior parte das quais a ser realizada em Buenos Aires (as reuniões são, via de regra, no Estado-Parte que esteja exercendo a presidência rotativa do bloco).
Verificando as atas disponíveis na página do Mercosul, descobre-se que para cada reunião o Brasil envia até 20 representantes e raramente menos de três. Tomando por base o salário inicial de um diplomata (R$ 7,7 mil), o tempo de duração de cada reunião (geralmente cerca de três dias, podendo chegar a uma semana) e as despesas com passagens (R$ 700,00 ida-e-volta entre Brasília e Buenos Aires, em classe econômica) e diárias (cada pernoite em Buenos Aires implica uma diária de aproximadamente US$ 250,00 por funcionário em deslocamento), tem-se que as 96 reuniões previstas para este semestre dificilmente custarão menos de R$ 1 milhão.
Um milhão de reais parece pouco, quase nada. Mas é muito em vista do retorno proporcionado por essa despesa. Esse "retorno" é praticamente nulo: a maior parte das discussões intrabloco, como sugerem as atas disponíveis, não produz qualquer resultado concreto além de onerar os cofres públicos. Veja-se, por exemplo, a ata da XVIII Reunião Especializada sobre a Mulher no Mercosul. Dentre as atividades aprovadas no plano de trabalho para 2008 destacam-se as seguintes: “Sensibilização para a prevenção da violência de gênero”; “Fortalecimento da perspectiva de gênero no Mercosul”; e “Promoção dos direitos trabalhistas das mulheres no Mercosul”. O primeiro e o terceiro objetivo, como é fácil perceber, apenas podem ser alcançados por meio de políticas domésticas, sendo portanto inócuo discuti-los no âmbito regional. O segundo objetivo é simplesmente irrelevante, por obscuro – em quê consistiria, afinal, fortalecer a perspectiva de gênero no Mercosul e qual seria o benefício esperado? Nos três casos, os objetivos propostos não se concretizarão.
Outro exemplo é a ata da XXIX Reunião de Ministros da Educação do Mercosul. Nela se descobre que os ministros presentes “[coincidiram] na concepção da educação como direito social e política de estado que garanta o acesso ao conhecimento de todas e todos como cidadãs e cidadãos”; “[reafirmaram] a necessidade de concretizar as metas de universalização do ensino básico e de avançar até a universalização do ensino médio em suas distintas modalidades”; “[reafirmaram] a importância que tem o protagonismo dos docentes no processo educacional, assim como a necessidade de gerar mecanismos de participação da sociedade civil na política educional”; e outras platitudes do gênero. No único ponto dotado de alguma concretude, os ministros presentes “[reafirmaram] no marco das negociações sobre serviços da Organização Mundial do Comércio a posição de que a educação é um bem público e um patrimônio coletivo de nossas nações” e “[sublinharam] a importância de garantir as competências do estado em matéria de regulamentação de suas políticas educacionais, as quais seriam severamente limitadas no caso de nossos governos assumirem compromissos de abertura comercial nesse setor”. Ou seja, quando as discussões no Mercosul fogem ao plano puramente retórico, é pior para nós.
Dá-se o mesmo em praticamente todos os demais duzentos e tantos fóruns do Mercosul: as discussões são imprestáveis e delas resultam apenas declarações vagas e ociosas. Nas reuniões de cúpula do bloco, essas discussões ocupam boa parte da agenda. Como resultado, sobra pouco tempo para a discussão dos temas realmente importantes: liberalização do comércio intrazona (tarefa até hoje incompleta), harmonização da tarifa externa comum (tarefa ainda menos completa que a liberalização do comércio intrazona) e a negociação de acordos comerciais com terceiros países e blocos (os acordos firmados até hoje são pouco abrangentes e/ou têm contrapartes pouco relevantes). Faz-se necessário, portanto, que o Mercosul sofra uma reformulação profunda, que compreenda um enxugamento drástico de sua estrutura institucional e permita a ênfase necessária aos assuntos centrais. Apenas depois de resolvidos esses assuntos e consolidada a união aduaneira é que se deveria pensar em expandir o espectro temático do bloco. Infelizmente, porém, o que se nota atualmente é o movimento inverso, com a estrutura institucional do Mercosul se expandindo de forma descontrolada.
Thiago Marzagão
Instituto Millenium, 21 de Janeiro de 2008
Link
A página oficial do Mercosul – www.mercosur.int – e a da atual presidência do bloco (exercida pela Argentina) – www.mercosur.gov.ar – valem uma visita. Contêm farto e didático material sobre em que consiste, concretamente, isso que chamam de "processo de integração regional" e que, no atual governo, tornou-se o eixo de nossa política externa.
Chama atenção, à primeira vista, a multiplicidade de temas que são objeto de discussão entre os Estados-Partes do bloco. Debatem-se não apenas tarifas de importação e negociações comerciais, mas também questões atinentes a meio-ambiente, segurança, pobreza, saúde, justiça, educação, normas técnicas e infra-estrutura, além de temas relacionados a políticas macro e microeconômica. Para abrigar essas discussões, a estrutura institucional do Mercosul conta com nada menos que 257 fóruns, entre comitês, comissões, grupos de trabalho, foros especializados, órgãos de apoio técnico, etc.
Esses fóruns são, quase todos, compostos por representantes dos quatro Estados-Partes (cinco quando a Venezuela – cuja adesão ainda não foi ratificada pelos parlamentos brasileiro e paraguaio – envia observadores) e se reúnem com bastante freqüência. Apenas para este primeiro semestre de 2008 estão previstas ao todo 96 reuniões, a maior parte das quais a ser realizada em Buenos Aires (as reuniões são, via de regra, no Estado-Parte que esteja exercendo a presidência rotativa do bloco).
Verificando as atas disponíveis na página do Mercosul, descobre-se que para cada reunião o Brasil envia até 20 representantes e raramente menos de três. Tomando por base o salário inicial de um diplomata (R$ 7,7 mil), o tempo de duração de cada reunião (geralmente cerca de três dias, podendo chegar a uma semana) e as despesas com passagens (R$ 700,00 ida-e-volta entre Brasília e Buenos Aires, em classe econômica) e diárias (cada pernoite em Buenos Aires implica uma diária de aproximadamente US$ 250,00 por funcionário em deslocamento), tem-se que as 96 reuniões previstas para este semestre dificilmente custarão menos de R$ 1 milhão.
Um milhão de reais parece pouco, quase nada. Mas é muito em vista do retorno proporcionado por essa despesa. Esse "retorno" é praticamente nulo: a maior parte das discussões intrabloco, como sugerem as atas disponíveis, não produz qualquer resultado concreto além de onerar os cofres públicos. Veja-se, por exemplo, a ata da XVIII Reunião Especializada sobre a Mulher no Mercosul. Dentre as atividades aprovadas no plano de trabalho para 2008 destacam-se as seguintes: “Sensibilização para a prevenção da violência de gênero”; “Fortalecimento da perspectiva de gênero no Mercosul”; e “Promoção dos direitos trabalhistas das mulheres no Mercosul”. O primeiro e o terceiro objetivo, como é fácil perceber, apenas podem ser alcançados por meio de políticas domésticas, sendo portanto inócuo discuti-los no âmbito regional. O segundo objetivo é simplesmente irrelevante, por obscuro – em quê consistiria, afinal, fortalecer a perspectiva de gênero no Mercosul e qual seria o benefício esperado? Nos três casos, os objetivos propostos não se concretizarão.
Outro exemplo é a ata da XXIX Reunião de Ministros da Educação do Mercosul. Nela se descobre que os ministros presentes “[coincidiram] na concepção da educação como direito social e política de estado que garanta o acesso ao conhecimento de todas e todos como cidadãs e cidadãos”; “[reafirmaram] a necessidade de concretizar as metas de universalização do ensino básico e de avançar até a universalização do ensino médio em suas distintas modalidades”; “[reafirmaram] a importância que tem o protagonismo dos docentes no processo educacional, assim como a necessidade de gerar mecanismos de participação da sociedade civil na política educional”; e outras platitudes do gênero. No único ponto dotado de alguma concretude, os ministros presentes “[reafirmaram] no marco das negociações sobre serviços da Organização Mundial do Comércio a posição de que a educação é um bem público e um patrimônio coletivo de nossas nações” e “[sublinharam] a importância de garantir as competências do estado em matéria de regulamentação de suas políticas educacionais, as quais seriam severamente limitadas no caso de nossos governos assumirem compromissos de abertura comercial nesse setor”. Ou seja, quando as discussões no Mercosul fogem ao plano puramente retórico, é pior para nós.
Dá-se o mesmo em praticamente todos os demais duzentos e tantos fóruns do Mercosul: as discussões são imprestáveis e delas resultam apenas declarações vagas e ociosas. Nas reuniões de cúpula do bloco, essas discussões ocupam boa parte da agenda. Como resultado, sobra pouco tempo para a discussão dos temas realmente importantes: liberalização do comércio intrazona (tarefa até hoje incompleta), harmonização da tarifa externa comum (tarefa ainda menos completa que a liberalização do comércio intrazona) e a negociação de acordos comerciais com terceiros países e blocos (os acordos firmados até hoje são pouco abrangentes e/ou têm contrapartes pouco relevantes). Faz-se necessário, portanto, que o Mercosul sofra uma reformulação profunda, que compreenda um enxugamento drástico de sua estrutura institucional e permita a ênfase necessária aos assuntos centrais. Apenas depois de resolvidos esses assuntos e consolidada a união aduaneira é que se deveria pensar em expandir o espectro temático do bloco. Infelizmente, porém, o que se nota atualmente é o movimento inverso, com a estrutura institucional do Mercosul se expandindo de forma descontrolada.
sexta-feira, 25 de janeiro de 2008
835) Conferência da International Law Association, no Rio de Janeiro, em agosto de 2008
73a. Conferência da ILA - international Law Association
17 a 21 de agosto, Rio de Janeiro.
Site: http://www.ilabrasil.org.br/hotsite/pages/programacao.php?lang=pt
Programação
Internacional Law on Natural Resources and Sustainable Development
International Law on Biotechnology
The Biodiversity Convention, Regional and National Instruments, and Access to Bio-Resources
Biodiversity: The Concept of Traditional Knowledge and Unfair Competition
Intellectual Property Rights upon Live Organism Products: Different Approaches
International Law on Sustainable Development
The Shared Management of Natural Resources
Revisiting Sovereignty over Natural Resources: the Latin American intellectual legacy and the taking of new directions
The Kyoto Protocol and the International Capital Markets
Outer Continental Shelf
Access of Non-Party States to the International Commission on the Outer Limits of the Continental Shelf
The Human Person in International Law
International Family Law
Rights of Children: International Cooperation in the Fields of Maintenance, Adoption, Custody and Abduction
New Models of Family Units: Same-Sex Marriages and Unwed Relationships
International Human Rights Law
The Mis(use) of the Human Right Argument and Preemptive Intervention in the Contemporary International Arena
Violence as a Denial of Human Rights
Implementation of International Systems of Human Rights Protection into National Legal Systems
Rights of Indigenous Peoples
Indigenous Rights on Land and Natural Resources
Indigenous Rights in International Law and Domestic law: Conflicting Approaches
Compensation for Victims of War
Justice for Victims of War
International Criminal Law
National, International and Universal Criminal Jurisdiction: Aspects of Antagonism and Complementarity
The Rights of Victims in International Criminal Jurisdiction
International Law on Business and Trade
Consumer Law
The Protection of Consumers in a Globalization Era
Relations between International Law and Consumer Law
Electronic Law
Cyber Criminality: National and International Rules
Contracts over the Internet: the Interplay Between National Laws and International Law
The Role of Civil Society in the International Regulation Process: ICANN as a Case Study
International Law on Foreign Investment
Bilateral Investment Protection Treaties: Recent Development
The ICSID Convention and the Settlement of Disputes in Economic Emergencies
International Securities Regulation
Mergers and Acquisitions in the Global Market and Compliance with National Law and Regulations
Regulation and Regulatory Accountability in an Era of MegaFunds and MegaMarkets
International Trade Law
Coherence Between Human Rights and International Economic Law?
How to Promote a Human Rights Culture in International Economic Institutions?
International Commercial Law
Soft Law Instruments in the Harmonization of International Contract Law: Achievements and Difficulties
The CISG and the Expansion of World Trade
International Private Dispute Resolution
International Commercial Arbitration
International Arbitration: Autonomy v. Territorialism
Public Policy and Mandatory Rules: Influence on the Applicable Law
The Influence of Cultural Factors on the Choice of the Arbitrator
Distortions in Contemporary Arbitration: The Problems of Becoming Popular
International Civil Litigation
Towards World Cooperation Standards: Prospects for the Hague Convention
The Realities of Regional Judicial Cooperation: Existing Experiences
Law on International Security
Nuclear Weapons, Non-Proliferation and Contemporary International Law
The International Regulation of Nuclear Technology and National Development Aspirations: Conflicting Views
Space Law
Outer Space as a Theater of War: Possible Global Effects
Space traffic Management: The Quest for Improvement of International Cooperation and Security
UN Reform
Where can the Security Council Modify States Human Rights Obligations in International Law?
Proposed Changes and the Security Councils New Challenges
Use of Force
Regional Developments on the Fight on Terrorism: Different Approaches
Armed Conflict of Non-International Character
Domingo, 17 de Agosto: 10h - 14h - Visita à cidade do Rio de Janeiro, incluindo o estádio do Maracanã, Sambódromo e visita panorâmica ao centro da cidade
17 a 21 de agosto, Rio de Janeiro.
Site: http://www.ilabrasil.org.br/hotsite/pages/programacao.php?lang=pt
Programação
Internacional Law on Natural Resources and Sustainable Development
International Law on Biotechnology
The Biodiversity Convention, Regional and National Instruments, and Access to Bio-Resources
Biodiversity: The Concept of Traditional Knowledge and Unfair Competition
Intellectual Property Rights upon Live Organism Products: Different Approaches
International Law on Sustainable Development
The Shared Management of Natural Resources
Revisiting Sovereignty over Natural Resources: the Latin American intellectual legacy and the taking of new directions
The Kyoto Protocol and the International Capital Markets
Outer Continental Shelf
Access of Non-Party States to the International Commission on the Outer Limits of the Continental Shelf
The Human Person in International Law
International Family Law
Rights of Children: International Cooperation in the Fields of Maintenance, Adoption, Custody and Abduction
New Models of Family Units: Same-Sex Marriages and Unwed Relationships
International Human Rights Law
The Mis(use) of the Human Right Argument and Preemptive Intervention in the Contemporary International Arena
Violence as a Denial of Human Rights
Implementation of International Systems of Human Rights Protection into National Legal Systems
Rights of Indigenous Peoples
Indigenous Rights on Land and Natural Resources
Indigenous Rights in International Law and Domestic law: Conflicting Approaches
Compensation for Victims of War
Justice for Victims of War
International Criminal Law
National, International and Universal Criminal Jurisdiction: Aspects of Antagonism and Complementarity
The Rights of Victims in International Criminal Jurisdiction
International Law on Business and Trade
Consumer Law
The Protection of Consumers in a Globalization Era
Relations between International Law and Consumer Law
Electronic Law
Cyber Criminality: National and International Rules
Contracts over the Internet: the Interplay Between National Laws and International Law
The Role of Civil Society in the International Regulation Process: ICANN as a Case Study
International Law on Foreign Investment
Bilateral Investment Protection Treaties: Recent Development
The ICSID Convention and the Settlement of Disputes in Economic Emergencies
International Securities Regulation
Mergers and Acquisitions in the Global Market and Compliance with National Law and Regulations
Regulation and Regulatory Accountability in an Era of MegaFunds and MegaMarkets
International Trade Law
Coherence Between Human Rights and International Economic Law?
How to Promote a Human Rights Culture in International Economic Institutions?
International Commercial Law
Soft Law Instruments in the Harmonization of International Contract Law: Achievements and Difficulties
The CISG and the Expansion of World Trade
International Private Dispute Resolution
International Commercial Arbitration
International Arbitration: Autonomy v. Territorialism
Public Policy and Mandatory Rules: Influence on the Applicable Law
The Influence of Cultural Factors on the Choice of the Arbitrator
Distortions in Contemporary Arbitration: The Problems of Becoming Popular
International Civil Litigation
Towards World Cooperation Standards: Prospects for the Hague Convention
The Realities of Regional Judicial Cooperation: Existing Experiences
Law on International Security
Nuclear Weapons, Non-Proliferation and Contemporary International Law
The International Regulation of Nuclear Technology and National Development Aspirations: Conflicting Views
Space Law
Outer Space as a Theater of War: Possible Global Effects
Space traffic Management: The Quest for Improvement of International Cooperation and Security
UN Reform
Where can the Security Council Modify States Human Rights Obligations in International Law?
Proposed Changes and the Security Councils New Challenges
Use of Force
Regional Developments on the Fight on Terrorism: Different Approaches
Armed Conflict of Non-International Character
Domingo, 17 de Agosto: 10h - 14h - Visita à cidade do Rio de Janeiro, incluindo o estádio do Maracanã, Sambódromo e visita panorâmica ao centro da cidade
Assinar:
Comentários (Atom)
Postagem em destaque
Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida
Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...
-
Uma preparação de longo curso e uma vida nômade Paulo Roberto de Almeida A carreira diplomática tem atraído número crescente de jovens, em ...
-
FAQ do Candidato a Diplomata por Renato Domith Godinho TEMAS: Concurso do Instituto Rio Branco, Itamaraty, Carreira Diplomática, MRE, Diplom...
-
Liberando um artigo que passou um ano no limbo: Mercosul e União Europeia: a longa marcha da cooperação à associação Recebo, em 19/12/2025,...
-
Mercado Comum da Guerra? O Mercosul deveria ser, em princípio, uma zona de livre comércio e também uma zona de paz, entre seus próprios memb...
-
Países de Maior Acesso aos textos PRA em Academia.edu (apenas os superiores a 100 acessos) Compilação Paulo Roberto de Almeida (15/12/2025) ...
-
Reproduzo novamente uma postagem minha de 2020, quando foi publicado o livro de Dennys Xavier sobre Thomas Sowell quarta-feira, 4 de março...
-
O destino do Brasil? Uma tartarug a? Paulo Roberto de Almeida Nota sobre os desafios políticos ao desenvolvimento do Brasil Esse “destino” é...
-
Itamaraty 'Memórias', do embaixador Marcos Azambuja, é uma aula de diplomacia Embaixador foi um grande contador de histórias, ...
-
Desde el post de José Antonio Sanahuja Persles (Linkedin) Con Camilo López Burian, de la Universidad de la República, estudiamos el ascens...