terça-feira, 12 de abril de 2011

Um balanco dos 100 dias da presidente, mais para balanca mas nao cai... (editorial O Estado de S.Paulo)

A presidente (com "e") merece um balanço de sua gestão, embora eu ache esse ritual dos 100 dias desnecessário. Balanços devem ser feitos toda vez que uma determinada política produzir efeitos que possam ser aferidos, avaliados, sopesados, comparados com efeitos reais ou potenciais de outras política, enfim, fazer o tipo de análise crítica que todo governo merece (afinal, somos nós que estamos pagando para que ele governe).
Eu, por exemplo, considero que a marca principal deste governo, no que ele fez até agora, foi a improvisação, total e absoluta.
Um ministério enorme, que é, em sua grande maioria, composto de mediocridades desconhecidas, e que foi herdado, por outra parte, do governo anterior, não pode mesmo se distinguir por brilhantes políticas econômicas ou sociais. Pretende ser continuidade, mas não consegue, pois a herança maldita que lhe foi deixada pelo governo irresponsável anterior o está precipitando numa espiral inflacionária que, no seu populismo otimista, o governo atual não sabe debelar.
Pagaremos caro por essa herança, por um governo exacerbado de pretensões e parco de soluções.
Paulo Roberto de Almeida

Os primeiros cem dias
Editorial - O Estado de S.Paulo
12 de abril de 2011 | 0h 00

A presidente Dilma Rousseff completou 100 dias de governo com a economia em crescimento, elevado nível de consumo e ampla oferta de emprego, mas também com inflação acelerada, câmbio em perigosa valorização, gasto federal em rápido crescimento e sinais de alerta nas contas externas. Cem dias podem ser um prazo muito curto para a solução de problemas complexos, mas devem ser suficientes para um governo definir seu estilo. Este deve ser o foco de um primeiro balanço da nova administração: a orientação adotada até agora levará a um crescimento prolongado e seguro ou agravará os desajustes e levará o País a uma nova sucessão de crises? O governo tem dado - na avaliação mais otimista - uma resposta dúbia a essa questão.

As opções do governo foram discutidas com notável clareza pelos economistas Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, e Pedro Cavalcanti Ferreira, professor da Fundação Getúlio Vargas, em artigo no Estado de domingo. A partir de 2008, quando se agravou a crise internacional, a administração petista vem-se mostrando inclinada a ressuscitar o modelo de crescimento em vigor entre os anos 1950 e 1980. O modelo caducou e o País entrou numa fase de quase estagnação, com breves surtos de crescimento interrompidos por longos e penosos períodos de crise.

Esse padrão só foi rompido quando os governantes se dispuseram a promover, a partir de 1994, um ajuste real, sem truques, no sistema de preços, na gestão pública e nas contas externas. Erros foram cometidos durante esse esforço, mas o resultado, altamente positivo, foi uma ampla renovação da política econômica, de seus instrumentos e de seus critérios.

O trinômio metas de inflação, câmbio flutuante e superávit primário passou a sintetizar o novo padrão de política macroeconômica, mas, ao lado disso, consolidou-se uma nova divisão de papéis entre o setor privado e o Estado. Idealmente, esse não deveria ser um Estado omisso, mas empenhado em cumprir com austeridade e eficiência funções indispensáveis ao bom funcionamento da sociedade e ao desenvolvimento econômico e social.

Em vez de dar continuidade à construção desse Estado, a administração petista vem demonstrando, especialmente a partir do segundo governo Lula, uma inquietante nostalgia do velho desenvolvimentismo. "Nostalgia", palavra usada pelos economistas Armínio Fraga e Pedro Cavalcanti Ferreira, é um rótulo quase simpático para uma tendência muito perigosa. Eles apontam o risco: a tentativa de repetir a experiência dos anos 50 a 80 poderá levar o País a espatifar-se em mais uma década perdida. Mas o quadro se torna muito mais assustador quando se acrescentam os detalhes do dia a dia, como a pobreza estrutural, a concentração de renda e de riqueza nas mãos dos grupos escolhidos para protagonizar o crescimento, a persistência da inflação e a recorrência de penosas crises de balanço de pagamentos.

A crise de 2008 impôs a todos os governos importantes ações intervencionistas. Maiores gastos públicos, maior oferta de crédito e operações de socorro a grupos privados constituíram o grosso das políticas anticíclicas. Algumas dessas ações foram adotadas no Brasil. Mas, passada a crise, o governo brasileiro resiste a abandonar inteiramente as ações anticíclicas. A resistência não é só do governo, mas também, é claro, de grupos beneficiados pelo aumento dos gastos, pela expansão de empréstimos subsidiados e por outros benefícios distribuídos pelo poder público.

Ao mesmo tempo, os desajustes se acumulam. O saldo da conta corrente do balanço de pagamentos, hoje deficitário, diminuiu 4 pontos porcentuais do PIB enquanto a relação de preços entre produtos exportados e importados aumentou 40%. Com uma evolução de preços tão favorável, como explicar a sensível deterioração das contas externas, a não ser por um grave desajuste interno?

A escolha correta é simples. Em vez de ressuscitar um modelo falido, deve o governo cuidar de tarefas de importância evidente, como arrumar suas contas, investir em educação e qualificação profissional e criar condições para a expansão do investimento, limitado a insuficientes 18,4% do PIB. Não é preciso criar um setor público empreguista, balofo e intervencionista para cumprir essas tarefas.

Oposicao nao precisa disputar povao, diz FHC - artigo de Reinaldo Azevedo

Continuando na mesma linha do post anterior, transcrevo aqui post retirado do blog do jornalista Reinaldo Azevedo, que concorda com o ex-presidente quando diz que a oposição não precisa disputar "povão".
Discordo, radicalmente.
Ao formular sua mensagem às classes médias, como pretendem os dois citados acima, acredito que a oposição, quando existir, deveria igualmente se dirigir à classe média, mostrando que, bondades e esmolas à parte, o "povão", na verdade, é a principal vítima das políticas distributivistas das novas máfias no poder, na medida em que essas políticas perpetuam sua situação de marginalidade relativa, ao preservar esses mecanismos puramente de "assistência", com manutenção de alta tributação indireta, péssima educação, insegurança geral e outras perversidades indiretas, não detectadas pelo mesmo "povão".
Já considero esse termo "povão" ofensivo, por negar dignidade aos milhares de trabalhadores humildes, sem qualificação, e que também precisam ser educados politicamente a lutar por seus direitos, em lugar de ficar demandando "políticas públicas" enganosas em conteúdo e forma.
Discordo, portanto, embora creio que o debate é importante.
Paulo Roberto de Almeida

FHC diz que oposição não tem de disputar “povão” com o PT. E ele está certo!
Reinaldo Azevedo, 12 de abril de 2011

A Folha de hoje dá a seguinte manchete: “Oposição deve desistir de buscar ‘o povão’, diz FHC”. Muita gente vai ignorar o conteúdo do texto. Os petistas e parte da imprensa (a imprensa petista!) usarão a manchete para satanizar o tucano. E, no entanto, ele está certíssimo. Embora eu me considere um conservador, e FHC seja de centro-esquerda, concordo com ele nesse particular. E, vocês sabem, já escrevi um texto gigantesco defendendo essa tese, que foi publicado na última edição de 2010 da VEJA. Já chego lá. Leiam trechos da reportagem da Folha. Volto em seguida.

*
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso defende em artigo que será publicado nesta semana uma revisão profunda da estratégia adotada pelo PSDB e pelos demais partidos de oposição para voltar ao poder. Numa espécie de manifesto, ele afirma que a oposição deveria desistir de conquistar as camadas mais pobres do eleitorado e se conectar com a nova classe média produzida pelo crescimento econômico dos últimos anos. “Enquanto o PSDB e seus aliados persistirem em disputar com o PT influência sobre os “movimentos sociais” ou o “povão”, falarão sozinhos”, diz o ex-presidente.
(…)
FHC critica os governos que o sucederam e o próprio partido. “Uma oposição que perde três disputas presidenciais não pode se acomodar e insistir em escusas que jogam a responsabilidade no terreno “do outro’”, afirma.
(…)
FHC diz que a oposição não defendeu seu legado. “Segmentos numerosos das oposições de hoje aceitaram a modernização representada pelo governo FHC com dor de consciência”, avalia. O ex-presidente deu a seu artigo o título “O papel da oposição”, o mesmo de um texto célebre que publicou na década de 1970, quando fazia oposição à ditadura militar. Aqui

Voltei [Reinaldo Azevedo:]
No meu longo artigo do ano passado, trato justamente do papel das oposições. A íntegra está aqui. Afirmo explicitamente que é necessário defender as conquistas do PSDB, que é inútil disputar os movimentos sociais com o PT e que é preciso buscar a classe média. E digo ainda que é necessário ter a coragem para falar com o Brasil conservador. Nesse particular, eu e FHC certamente divergimos. No resto, concordamos. Leiam trechos do meu texto.

(…)
A pergunta óbvia é com que discurso articular o dissenso, sem o qual a democracia se transforma na ditadura do consentimento?

Não existem receitas prontas. Mas me parece óbvio que o primeiro passo consiste em libertar a história do cativeiro onde o PT a prendeu. Isso significa mostrar, e não esconder, os feitos e conquistas institucionais que se devem aos atuais oposicionistas e que se tornaram realidade apesar da mobilização contrária bruta e ignorante do PT. Ajuda também falar a um outro Brasil profundo, que não aquele saído dos manuais da esquerda, sempre à espera de reparações e compensações promovidas pelo pai-patrão dadivoso ou a mãe severa e generosa, à espera da “grande virada”, que nunca virá!

Temos já um Brasil de adultos contribuintes, com uma classe média que trabalha e estuda, que dá duro, que pretende subir na vida, que paga impostos escorchantes, diretos e indiretos, a um estado insaciável e ineficiente. Milhões de brasileiros serão mais autônomos, mais senhores de si e menos suscetíveis a respostas simples e erradas para problemas difíceis quando souberem que são eles a pagar a conta da vanglória dos governos. É inútil às oposições disputar a paternidade do maná estatal que ceva mega-currais eleitorais. Os órfãos da política, hoje em dia, não são os que recebem os benefícios - e nem entro no mérito, não agora, se acertados ou não -, mas os que financiam a operação. Entre esses, encontram-se milhões de trabalhadores, todos pagadores de impostos, muitos deles também pobres!

Esse Brasil profundo também tem valores - e valores se transformam em política. O que pensa esse outro país? O debate sobre a descriminação do aborto, que marcou a reta final da disputa de 2010, alarmou a direção do PT e certa imprensa “progressista“. Descobriu-se, o que não deixou menos espantados setores da oposição, que amplas parcelas da sociedade brasileira, a provável maioria, cultivam valores que, mundo afora, são chamados “conservadores”, embora essas convicções, por aqui, não encontrem eco na política institucional - quando muito, oportunistas caricatos os vocalizam, prestando um desserviço ao conservadorismo.

Terão as oposições a coragem de defender seu próprio legado, de apelar ao cidadão que financia a farra do estado e de falar ao Brasil que desafia os manuais da “sociologia progressista”? Terão as oposições a clareza de deixar para seus adversários o discurso do “redistributivismo”, enquanto elas se ocupam das virtudes do “produtivismo”? Terão as oposições a ousadia de não disputar com os seus adversários as glórias do mudancismo, preferindo falar aos que querem conservar conquistas da civilização? Lembro, a título de provocação, que o apoio maciço à ocupação do Complexo do Alemão pelas Forças Armadas demonstrou que quem tem medo de ordem é certo tipo de intelectual; povo gosta de soldado fazendo valer a lei. Ora, não pode haver equilíbrio democrático onde não há polaridade de idéias. Apontem-me uma só democracia moderna que não conte com um partido conservador forte, e eu me desminto.

Antes de saber quem vai liderar um dos pólos, é preciso fazer certas escolhas. O Congresso aprovou há pouco, por exemplo, o sistema de partilha para o pré-sal. Não se ouviu a voz da oposição, a exceção foi a senadora Kátia Abreu (TO). O PT inventou a farsa, amplamente divulgada na campanha eleitoral, de que não passava de “privatização” o sistema de concessão, que conduziu o país à quase auto-suficiência e que fez dobrar a produção de petróleo no governo FHC. Mentiu, mas venceu o embate. Podem vir por aí as reformas. Quais setores da sociedade as oposições pretendem ter como interlocutores? Continuarão órfãos de representação milhões de eleitores que não se reconhecem na ladainha pastosa do “progressismo”? As oposições têm de perder o receio de falar abertamente ao povo que trabalha e estuda. Que estuda e trabalha. Em vez de tentar dividir os louros da caridade, tem de ser porta-voz do progresso.

Construir a oposicao, uma oposicao, qualquer uma - FHC, revista Interesse Nacional

Materia sobre artigo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso sobre a nova atitude que deveria assumir a oposição (partindo do pressuposto de que exista uma, acrescentaria eu...).
Esse artigo de FHC está sendo publicado na mesma revista em que também tenho um artigo: "Miséria da Oposição", o que já revela o que eu penso da "oposição" atualmente, entre aspas, como ela merece.
A revista Interesse Nacional pode ser consultada neste link: http://interessenacional.com
Ou neste aqui: http://interessenacional.uol.com.br/

Meu artigo, está aqui:
A Miséria da “Oposição” no Brasil: Da Falta de um Projeto de Poder à Irrelevância Política?
Por: PAULO ROBERTO DE ALMEIDA
Revista Interesse Nacional, n. 13, abril-junho 2011, p. 28-36.

Quem preferir ler no formato original, ou seja, publicado, em arquivo pdf, pode me pedir em separado. No meu site tem um link para enviar mensagens a este autor (assediado por milhões de junk-mails, spams, virus, ataques de loucura, etc...).
Paulo Roberto de Almeida

Oposição precisa conquistar a classe média, afirma FHC
DANIELA LIMA, DE SÃO PAULO
Folha de São Paulo, terça-feira, 12 de abril de 2011

Em manifesto, ex-presidente defende nova estratégia para PSDB e critica insistência na aproximação com o "povão"
Tucano diz que situação pode se complicar se Dilma Rousseff ganhar apoio de setores que ainda resistem a Lula

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso defende em artigo que será publicado nesta semana uma revisão profunda da estratégia adotada pelo PSDB e pelos demais partidos de oposição para voltar ao poder.
Numa espécie de manifesto, ele afirma que a oposição deveria desistir de conquistar as camadas mais pobres do eleitorado e se conectar com a nova classe média produzida pelo crescimento econômico dos últimos anos.
"Enquanto o PSDB e seus aliados persistirem em disputar com o PT influência sobre os "movimentos sociais" ou o "povão", falarão sozinhos", diz o ex-presidente.
Ele observa que a classe média não participa da vida política do país como no passado, mas está presente em lugares onde os partidos praticamente não existem, como as redes sociais da internet.
"Se houver ousadia, as oposições podem organizar-se, dando vida não a diretórios burocráticos, mas a debates sobre temas de interesses dessas camadas", diz.
O artigo aparecerá no novo número da revista "Interesse Nacional", que será publicado na quinta. E no site interessenacional.uol.com.br.
FHC diz que a presidente Dilma Rousseff (PT) poderá conquistar eleitores que mantiveram "certa distância" do ex-presidente Lula.
"Dilma, com estilo até agora contrastante com o do antecessor, pode envolver parte das classes médias. Estas [...] mantiveram certa reserva diante de Lula", avalia.
FHC critica os governos que o sucederam e o próprio partido. "Uma oposição que perde três disputas presidenciais não pode se acomodar e insistir em escusas que jogam a responsabilidade no terreno "do outro'", afirma.
Em 2010, o ex-governador José Serra brigou por meses com o senador Aécio Neves pela liderança da chapa. Ganhou internamente, mas perdeu para Dilma.
FHC diz que a oposição não defendeu seu legado.
"Segmentos numerosos das oposições de hoje aceitaram a modernização representada pelo governo FHC com dor de consciência", avalia.
O ex-presidente deu a seu artigo o título "O papel da oposição", o mesmo de um texto célebre que publicou na década de 1970, quando fazia oposição à ditadura militar. E comparou a situação da época com a vivida hoje, com o PT ao poder.
"Diante do autoritarismo era mais fácil fincar estacas em um terreno político", diz.
Ontem, em após o lançamento do livro "Ruth Cardoso Fragmentos de Uma Vida", de Ignácio de Loyola Brandão, ele disse que é cedo para avaliar os 100 primeiros dias de Dilma. Avaliou que não basta falar de austeridade fiscal contra a inflação, mas praticá-la.
Colaborou LEANDRO MARTINS, de Ribeirão Preto

Disse-disse presidencial...: sera que resolve?

Desde o início do governo tenho ouvido algumas frases extremamente interessantes quanto à vontade presidencial (desculpem se não me dobro à regra do gênero aplicada ao personagem em questão, que encontro sumamente ridícula):

Antes foram estas as manchetes:
"Presidente diz que não tolerará inflação alta".
"Presidente diz que não aprovará aumento da gasolina"

Hoje, 12/04/2011, a manchete do Estadão online é esta:

"[Presidente] diz que pretende derrubar o juro ao longo do seu governo."

Muito bem: eu me pergunto se um governo funciona à base de retórica, de declarações, de vontades, ainda que presidenciais.
Gostaria de ver, sentir, experimentar, medidas efetivas em função da inflação e dos juros, por exemplo.
Não creio, por outro lado, que seja função de presidentes, de qualquer país, em qualquer tempo e lugar, ficar brigando com preços de mercado, ou determinando a empresas, que devem funcionar com base em preços de mercado, que fixem este ou aquele preço para qualquer produto que seja. Presidentes devem ter coisas mais importantes a fazer do que ficar vigiando preços do setor produtivo.

Talvez, em relação aos índices de inflação e aos juros, coubesse, por exemplo, parar com os níveis elevados de gastos públicos, que visivelmente vem pressionando a inflação e os preços, e que se refletem nos atuais índices de inflação, extremamente elevados tendo em vista as metas de inflação e as expectativas da sociedade.
Se o governo fizesse pelo menos isso, ou seja, parar de gastar muito, em vez de ficar fazendo declarações inócuas, já seria uma grande coisa...

Paulo Roberto de Almeida

Noticias da mafia sindical... sem nenhum exagero...

Nao uma máfia no sentido tradicional do termo, pois a velha máfia dava um duro danado para ganhar dinheiro: extorquia, ameaçava, matava de vez em quando, enfim, trabalhava.
Esta nova máfia ganha dinheiro sem fazer absolutamente nada...
Paulo Roberto de Almeida

O dinheiro fácil das centrais
Editorial - O Estado de S.Paulo - 11/04/11

Sem nenhum esforço, pois o dinheiro lhes é repassado automaticamente pelo governo, as centrais sindicais receberam no ano passado R$ 102,2 milhões, que gastaram do jeito que quiseram, sem se preocupar em prestar contas ao poder público. Com o aumento do número de trabalhadores com registro em carteira e da renda real média dos brasileiros, em razão do crescimento da economia, também as receitas das centrais aumentam. No ano passado, elas foram 20,8% superiores às de 2009, quando haviam crescido 21,6% em relação ao ano anterior.

A legislação que lhes assegura o direito de apropriar-se de uma parte do salário dos brasileiros não as obriga a informar, nem mesmo aos trabalhadores que dizem representar, o que fazem com tanto dinheiro. Fazem o que bem entendem.

Como mostrou o jornal Valor na segunda-feira, algumas compram ou constroem sede para abrigar com mais comodidade e conforto seus dirigentes e sua burocracia, afirmam realizar cursos de formação sindical, organizam convenções ou congressos e, sobretudo, procuram atrair mais sindicatos, pois a distribuição do bolo do imposto sindical é proporcional ao número de entidades e de trabalhadores da base que, teoricamente, elas representam. Gastam também com passagens aéreas, hospedagens, alimentação e outras despesas de viagem.

A transferência também para as centrais de parte do valor retirado anualmente do salário de cada trabalhador com registro em carteira, sindicalizado ou não, para, em tese, sustentar a representação dos trabalhadores é apenas a mais recente de um série de graves distorções e anomalias no campo trabalhista geradas pelo imposto sindical. Criado na década de 1940, durante a ditadura varguista do Estado Novo, o imposto sindical é cobrado em março de todos os trabalhadores, na base de um dia de trabalho. Mudou de nome em 1966, para "contribuição sindical", mas manteve suas características originais e continuou a gerar distorções na estrutura sindical, à custa do trabalhador.

Ao longo dos anos, a distribuição automática da arrecadação desse imposto, que no ano passado superou R$ 1 bilhão, gerou um sindicalismo estruturado primordialmente para receber esse dinheiro, e não, como é legítimo nas sociedades organizadas, para representar os trabalhadores de sua base e defender seus interesses profissionais. A maioria dos sindicatos habilitados a receber parte do imposto sindical não tem representatividade, não atua na defesa daqueles que deveria representar e serve apenas para sustentar uma casta de dirigentes que vive à custa daqueles que deveria defender. E certamente vive em condições muito melhores do que esses.

Durante o segundo mandato de Lula, as centrais sindicais foram incluídas entre as entidades sindicais habilitadas a receber uma fatia do bolo do imposto sindical. Até então, esse bolo era distribuído entre os sindicatos (60%), as federações (15%) e as confederações (5%), cabendo ao governo os restantes 20%. O governo Lula abriu mão de metade de sua fatia, cedendo-a às centrais; as demais entidades sindicais mantiveram sua participação no bolo.

A maior das centrais, a Central Única dos Trabalhadores (CUT), vinculada ao PT, e também a que recebe a maior fatia do bolo sindical (no ano passado, teve direito a R$ 31,9 milhões), diz-se contra o imposto sindical, mas não abre mão do dinheiro que o imposto lhe assegura. Outras centrais defendem essa tributação sobre o salário do trabalhador alegando que, sem ela, não haveria como sustentar um sistema de representação sindical. Ou seja, sem o imposto, a estrutura sindical brasileira ruiria.

Mas seria melhor para o País, e sobretudo para os trabalhadores, se acabasse essa estrutura anômala, formada por sindicatos que na grande maioria só existem para sustentar seus dirigentes, e que se mostrou totalmente incapaz de acompanhar as transformações do mundo do trabalho, que criou novas realidades e novas demandas. Sobre ela se construiria um sindicalismo melhor, mais decente e eficaz, verdadeiramente vinculado às bases profissionais. Ou seja, sem pelegos.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Ainda as diferenças entre as diplomacias de Dilma e de Lula - BBC Brasil

Mudança de tom sobre Irã sinaliza política externa de Dilma
BBC Brasil, 08 de abril de 2011 | 13h 30

Para analistas, postura do novo governo indica maior preocupação com direitos humanos.

A política externa dos primeiros cem dias de mandato da presidente Dilma Rousseff teve como uma de suas principais novidades uma mudança de tom em relação aos direitos humanos no Irã, o que sinaliza uma maior preocupação do novo governo com o tema.

"O Brasil, durante o governo Lula, parecia um tanto flexível quanto aos direitos humanos por conta da prioridade de fazer alianças políticas", disse à BBC Brasil o professor de Relações Internacionais da USP Amâncio Jorge Silva Nunes de Oliveira.

"Com Dilma, os direitos humanos ganharam em prioridade, é uma correção de rota bastante clara", acrescenta. "Endurecer neste sentido é uma reorientação importante."

No dia 24 de março, o Brasil votou, em sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, a favor da nomeação de um relator que investigará a situação dos direitos humanos no Irã.

Ao justificar seu voto, a representante brasileira no Conselho, Maria Nazareth Farani Azevedo, disse que a não-observância da suspensão da prática da pena de morte no Irã, assim como em outros países, era uma "preocupação particular" do Brasil.

Em novembro do ano passado, em um comitê da Assembleia Geral da ONU, o Brasil se absteve de votar em uma proposta que condenava violações de direitos humanos no país persa.

Embora diga que ainda é cedo para fazer afirmações definitivas, o professor da PUC-SP Paulo Edgar Almeida Resende também vê no voto brasileiro sobre o Irã um distanciamento em relação à política do governo Lula para com os direitos humanos.

"Este fato significa algum tipo de revisão da política do (ex-chanceler) Celso Amorim, tanto que o próprio Amorim demonstrou um pensamento diferente do voto brasileiro", diz o professor.

Em entrevista à BBC Brasil, Amorim afirmou que não é possível "bater forte e dialogar ao mesmo tempo" com países como o Irã. "Para você ter esse tipo de influência, você tem que ter um diálogo", disse o ex-chanceler, que afirma considera bom o fato de Dilma tomar rumos próprios na política externa.

EUA e China
Embora analistas afirmem que Dilma deve preservar as relações com países da América Latina, África e Oriente Médio, priorizadas no governo Lula, os primeiros cem dias de governo também foram marcados por um investimento no diálogo com Estados Unidos e China, as duas maiores potências econômicas do planeta.

Em março, o presidente americano, Barack Obama, realizou sua primeira viagem oficial ao Brasil, visitando Brasília e Rio nos dias 19 e 20 de março. Já Dilma fará uma visita à China exatamente no momento em que completa cem dias de governo, entre os dias 8 e 15 de abril.

No pronunciamento que fez ao lado de Obama, Dilma citou "contradições" e "desequilíbrios" que precisam ser superados e pediu o fim de medidas protecionistas dos Estados Unidos.

Ao mesmo tempo em que ressaltou a importância da cooperação entre Brasil e Estados Unidos em diversas áreas, como ciência e tecnologia, ela disse que é necessário romper as barreiras aos produtos brasileiros em território americano.

Nunes Oliveira vê na postura de Dilma uma nova maneira de lidar com os Estados Unidos, buscando um tom mais empreendedor e prático, de olho em resultados concretos. "Resta ver o que vai ocorrer, tudo depende de uma abertura comercial do outro lado."

Quanto à viagem de Dilma à China, a busca de um maior equilíbrio no comércio entre os dois países é considerada por especialistas um dos principais temas de discussão.

"É de se esperar de Dilma algum tipo de cobrança com relação à diversificação na pauta de importação com a China, para que o Brasil não fique como um exportador primário", afirma Paulo Resende.

Conselho de Segurança
Além de acordos bilaterais, a viagem de Obama ao Brasil foi marcada por sua "manifestação de apreço" à intenção do Brasil em se candidatar a uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU.

A declaração, que constou de um comunicado conjunto emitido após seu encontro com Dilma, não incluiu um apoio explícito dos Estados Unidos ao pleito brasileiro. Em outro pronunciamento, Obama se limitou a dizer que trabalha junto do Brasil para tornar o Conselho "mais representativo".

No discurso ao lado de Obama, Dilma defendeu a vaga para o Conselho de Segurança e disse que o Brasil é um país comprometido com a paz e o diálogo, que não pretende realizar uma "ocupação burocrática" de espaços como este.

Em entrevista à BBC Brasil, o ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, também afirmou que espera ver os Estados Unidos engajados em uma reforma do Conselho de Segurança.

"Já não é razoável nem justificável convivermos com um Conselho de Segurança que parece refletir mais um mundo do século 20 do que um do século 21", disse Patriota.

Nunes de Oliveira avalia que a aproximação com países como o Irã complicou as chances do Brasil de obter a vaga. Para o especialista, esta possibilidade diminuiu muito no governo Lula, e agora a situação está, segundo ele, em compasso de espera.

Já a professora de Relações Internacionais da PUC-Rio Letícia Pinheiro vê o "apreço" de Obama como um sinal positivo. "Não é um apoio declarado, mas também não é uma oposição à demanda brasileira, e isso em diplomacia já vale alguma coisa."

Sul-sul
Mesmo com as reorientações que foram observadas nos primeiros cem dias de Dilma no poder, Amâncio vê a política externa brasileira seguindo a mesma "matriz" do governo Lula, buscando aproximação com países emergentes e reivindicando sua maior participação nos fóruns internacionais.

Na opinião de Letícia Pinheiro, a América Latina deverá voltar à pauta da política externa do Brasil no futuro, junto com as demais relações "sul-sul", com países africanos e do Oriente Médio.

Neste contexto, a professora da PUC-Rio avalia que a figura do assessor da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, deve voltar a ganhar importância.

"Concordando ou não com ele, o fato é que Garcia teve uma importância central ao definir uma pauta mais política e menos burocrática na questão diplomática, especialmente na relação com os países da América Latina", diz Pinheiro.

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BRIC ma non troppo: a falta que faz um C...

Do tijolo ao queijo, uma trouvaille que faz todo sentido:

Brics de uma letra só

PEQUIM - O conglomerado Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) soa como tijolo em inglês (brick), sinônimo de solidez. Mas é só tirar o C de China que vira um queijo mole e cremoso no miolo (o brie).
Esse jogo de palavras é usado pelo especialista David Rothkopf, presidente da Garten Rothkopf, assessoria especializada em investimentos em mercados emergentes, em artigo para a "Foreign Policy". É uma maneira, meio sem graça, admito, de deixar claro que o que conta mesmo é o C, porque "tem as maiores reservas e o maior mercado potencial".
O departamento de pesquisas do Deutsche Bank concorda -e põe números no domínio do C: a economia da China é maior do que as três outras somadas, suas exportações e suas reservas em divisas duplicam as de seus parceiros.

Parceiros, aliás, é um termo forte para Brics (porque agora eles incorporam a África do Sul). Não há entre eles uma liga geográfica, histórica, cultural, política. Dele fazem parte a maior democracia do planeta, a Índia, um Brasil que também é grande nesse capítulo, e a maior ditadura do mundo, a China.
A única liga está dada pelo fato de a sigla ter sido inventada por uma firma financeira, a Goldman Sachs, e alegremente incorporada pelos quatro governos, como é próprio da era de hegemonia dos "senhores do universo".
Pois a estreia de Dilma Rousseff no grande mundo do multilateralismo se dará quarta-feira exatamente na cúpula dos Brics.
Mal não faz. É sempre bom bater papo com líderes globais, de países importantes por si, independentemente de haver ou não Brics como conglomerado.
Mas é ilusório esperar muito mais do que isso. Nem quando o voto coincide ele é combinado antes, como aconteceu na abstenção de todos, menos a África do Sul, na recente votação da zona de exclusão aérea sobre a Líbia.

(Clovis Rossi, desde Pequim, na Folha de São Paulo, domingo 10 de abril 2011)

Postagem em destaque

Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...