quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Anemia industrial (made in governo, mesmo) - Celso Ming

Esvaziamento da indústria

Celso Ming
Editorial O Estado de S.Paulo, 28 de fevereiro de 2013
Amanhã saem as Contas Nacionais (evolução do PIB) do quarto trimestre de 2012. Uma das coisas que se verificarão é que a participação da indústria de transformação na renda nacional terá caído de 14,6%, em 2011, para alguma coisa em torno dos 13% em 2012. Segue-se que, se o governo persegue forte crescimento do PIB, cada vez menos poderá contar com a indústria de transformação para isso.

Em outras palavras, no ponto em que estamos, o avanço mais significativo do PIB não se obtém com empurrão ao consumo de bens industriais - seja pelo estímulo ao crédito, seja pela redução de impostos sobre produtos de consumo durável. Será obtido, sim, se o governo puxar pelo avanço dos serviços, o que, evidentemente, não pretende. E, se for verdade que o setor de serviços começa a perder dinamismo, como sugere o ministro da Fazenda, Guido Mantega, ficará inevitável um desempenho também mais limitado do PIB.

Caso se confirme o crescimento da produção (e da renda) da indústria de transformação na ordem de 3% em 2013, como ainda ontem reafirmou o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, a contribuição desse avanço para o do PIB do ano deve ser inferior a 0,4 ponto porcentual.

Isso não quer dizer que a indústria nacional não deve ser estimulada com agressiva redução de custos e com aumento de escala de produção. É necessário que uma economia como a brasileira tenha um setor industrial forte.

O problema é que as políticas do governo nesse sentido são tímidas e contraditórias. Não conseguem caminhar, por exemplo, na desoneração dos encargos trabalhistas. Primeiro, puxa o câmbio para dar mais competitividade à indústria, mas, no meio do caminho, se arrepende e volta atrás. Além disso, até agora, o governo não se empenhou em abrir o mercado externo. As políticas protecionistas e de defesa comercial, quando eficazes, limitam-se apenas a criar mais reserva de mercado interno. As negociações destinadas à obtenção de acordos de livre comércio praticamente pararam. E a política de boa vizinhança e de tolerância com a Argentina derrubaram o mercado do Mercosul para a indústria. Em relação a 2011, as exportações para o Mercosul em 2012 caíram 18% e, para a Argentina, 20%.

As causas do esvaziamento da indústria vêm sendo objeto de intensas discussões. O livro O futuro da indústria no Brasil, com textos organizados por Edmar Bacha e Monica Baumgarten de Bolle, é valiosa contribuição para isso.

De todo modo, fica demonstrado que decisões estratégicas de política econômica tiveram por resultado a intensificação do esvaziamento da indústria. Esse esvaziamento não deve ser entendido como "desindustrialização" - conforme vai sendo repetido por aí. Não é o caso, na medida em que não há transferência física de fábricas e de linhas de produção para outros países, a exemplo do que ocorre nos Estados Unidos e na Europa.

O investimento em infraestrutura que começa a ser atacado com mais determinação pelo governo Dilma ajudará a reduzir os custos da indústria - e, portanto, a fortalecê-la. Mas seu impacto somente será observado a longo prazo.

Juizes, tao pobrezinhos, tao famelicos, coitadinhos...

Eles ganham tão pouco, são tão carentes de nutrientes, que precisam desse auxílio alimentação, no valor modesta de 24 reais, todos os dias, inclusive sábados, domingos e feriados, quando eles certamente gastam mais, comendo fora, essas coisas...
Eles justificam pela "simetria" com nababos federais (e certamente também estaduais e municipais). Eles não percebem que estão sendo assimétricos com a nação, com os outros 190 milhões de brasileiros que não têm auxílio alimentação, pelo menos não tão generoso, ou retroativo...
O Brasil é um país condenada ao atraso mental, mais até do que à falência material, cada vez que comportamentos como esses são sancionados pelos marajás e nababos da administração pública...
Paulo Roberto de Almeida

Eliana Calmon recebeu R$ 84 mil para 'alimentação'

Cortejada pelo PSB para disputar o Senado ou governo da Bahia, ministra do STJ teve contracheque de R$ 113 mil em setembro

28 de fevereiro de 2013 | 2h 06
Fausto Macedo, de O Estado de S.Paulo
 
Cortejada pelo presidente do PSB Eduardo Campos para se candidatar a uma cadeira no Senado ou ao governo da Bahia, a ministra Eliana Calmon, vice-presidente em exercício do Superior Tribunal de Justiça (STJ), recebeu em setembro do ano passado, de uma só vez, R$ 84,8 mil a título de auxílio alimentação. Naquele mês, o contracheque de Eliana bateu em R$ 113.009,50.
Eliana Calmonafirmou que benefício é recebido por todos os juízes - André Dusek/AE - 04.09.2012
André Dusek/AE - 04.09.2012
Eliana Calmonafirmou que benefício é recebido por todos os juízes
Ela ganhou notoriedade em sua gestão na Corregedoria Nacional de Justiça, entre 2010 e 2012, período em que conduziu com rigor inspeções disciplinares nos tribunais, em busca de irregularidades em supercontra-cheques de magistrados.
A ministra denunciou "bandidos de toga" e colecionou desafetos em cortes estaduais com seu estilo combativo. Atribuíam a ela projeto de cunho político eleitoral, o que sempre refutou.
A verba de alimentação, da qual ela se beneficiou, tem respaldo em norma do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que incorpora a vantagem ao subsídio dos magistrados de todo o País. A concessão é prevista na Resolução 133 do CNJ.
Em junho de 2011, o colegiado, sob presidência do ministro Cezar Peluso, aprovou a medida que dispõe sobre a simetria constitucional entre magistratura e Ministério Público e equiparação de vantagens, como o plus de R$ 710 a título de alimentação. O valor cai todo mês na conta da toga. Os juízes não têm de exibir recibos de despesas.
Em setembro, o Tesouro depositou na conta da ex-corregedora o valor acumulado do período retroativo a cinco anos da data da concessão do benefício, ou seja, de 2006 a 2011.
A remuneração regular da ministra, R$ 25.386,97, foi acrescida dos R$ 84,8 mil sob a rubrica "indenizações". Com descontos da previdência e do imposto de renda, ela recebeu R$ 104.760,01.
Benefícios."Efetivamente, recebi em setembro de 2012 acumulado do benefício intitulado auxílio alimentação", disse a ministra do STJ. "O auxílio é automático, sem exigência de recibo de comprovação."
Eliana recebe o auxílio-alimentação - assim como seus colegas da corte -, além de R$ 2.792,56 (sem imposto sobre esse valor) como abono de permanência porque já conta tempo para se aposentar, mas permanece na ativa.
Seu holerite, como o dos outros ministros, é público. Pode ser acessado na página do STJ na internet. Há alguns dias, cópia do contracheque da ministra começou a circular em e-mails de magistrados que ainda não receberam o pagamento acumulado. Alguns intitulam as mensagens com um "Eliana é 100", em alusão aos mais de R$ 100 mil que ela recebeu em um único mês.
Muitos magistrados revelam desconforto com a situação. A resolução do CNJ autorizou o benefício alimentação. Posteriormente, a Associação dos Juízes Federais (Ajufe), que os representa, foi ao Conselho da Justiça Federal (CJF) e pleiteou retroatividade dos cinco anos.
Os magistrados estão recebendo o valor mensal de R$ 710, mas até agora não há previsão para que a verba correspondente àquele período acumulado seja liberada para a toga - nem os juízes federais nem os do Trabalho receberam. Os ministros dos tribunais superiores, exceto os do STF, garantiram sua parte. Os juízes assinalam que estão na expectativa de terem assegurado direito decorrente da simetria reconhecida pelo CNJ.

Surpresas do junkmail: o pecado e a virtude, juntos?

Os acasos do junk mail são realmente surpreendentes: por mais que a gente se esforce para afastar as porcarias que invadem nossa caixa todos os dias, elas sempre aparecem.
Por uma dessas ironias, as duas primeiras entradas desta quinta-feira, último dia de fevereiro deste ano da graça, e no mesmo dia em que se efetiva a abdicação do papa, tão santo e tão intelectual, foram estas, abaixo transcritas, parcialmente.
Uma recomendando e convidando à leitura da homília diária:

Deus se faz presente na história por meio de quem aceita o encargo de falar à humanidade em nome dele. O criador do mundo guiou os patriarcas, chamou Moisés para libertar os escravos do Egito e, depois de ter enviado os profetas, revelou-se como Pai de Jesus Cristo, o emissário por excelência, ressuscitado e presente nas comunidades cristãs. A constante presença divina na história nos questiona sobre a acolhida que o ser humano ofereceu a Deus através dos tempos. Crises financeiras, desastres e catástrofes da natureza não são as piores coisas que podem atingir a humanidade. O maior desastre que pode sobrevir à criação inteira é a falta de acolhida a Deus por parte da única criatura capaz de reconhecê-lo e amá-lo. Porque a criatura não tem a existência em si mesma, mas a recebe do único Eu Sou. Ao ser humano cabe responder em nome da criação inteira: aqui estou.

Mas, antes tinha entrado esta:

Busca Sexo real
Gostamos de pessoas respeitosas, higiênicas, com bom papo, educadas, cheirosas, pouco pelo, e  dispostas a troca ou menage feminino.


Apaguei as duas não sem antes ter refletido como são obscuros os caminhos do Senhor...
Paulo Roberto de Almeida

PR para BC: eu ordeno que voce seja livre e independente!; e nao discuta, ouviu?

Durma-se com um barulho desses; depois de ter manipulado o BC durante os últimos dois anos, agora a PR quer dar a impressão de que o Copom é independente; mas só impressão, não é?...
Paulo Roberto de Almeida

Governo vai reforçar discurso de BC autônomo
VALDO CRUZ
NATUZA NERY
DE BRASÍLIA
FSP, 19/02/2013
A presidente Dilma Rousseff orientou a equipe econômica a deixar claro que o BC tem total autonomia para decidir subir os juros quando considerar necessário.
O objetivo é influenciar nas expectativas de mercado, tentando afastar percepções de interferência sobre a condução da política da entidade.
Segundo assessores, Dilma quer transmitir esse recado porque estava se cristalizando o conceito de que o BC está de "mão atadas" e não subiria a Selic neste ano devido a pressões do Planalto.
Para interlocutores presidenciais, o próprio governo contribuiu para que fosse criada essa imagem de que o BC na era Dilma tem menos autonomia do que no governo Lula, o que dificulta a ação do banco em momentos mais turbulentos na economia.
Para reforçar a imagem de autonomia, assessores dizem que, na próxima reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), o BC pode emitir sinais de uma eventual mudança na taxa de juros, suprimindo suas últimas recomendações de manutenção da política atual por um "tempo suficientemente prolongado".
Essa mudança pode ocorrer caso o BC avalie que há riscos de alteração no cenário atual do banco sobre o comportamento da inflação. A previsão é que a inflação fique acima de 6% no primeiro semestre, recuando no segundo. Caso esse cenário se confirme, tanto o BC como o Palácio do Planalto consideram que o Copom pode ter condições de deixar inalterados os juros, hoje em 7,25%.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Brasil: politica comercial autista (O Globo)

O autismo da política de comércio exterior
Editorial O Globo, 26/02/2013

Consta que a política externa de viés terceiro-mundista seguida pelo governo Lula teria sido uma contrapartida à militância petista pela acertada adoção de uma terapia clássica, monetária e fiscal, para manter a estabilização da economia. No campo comercial, o terceiro-mundismo se materializou na rejeição radical à proposta americana da Alca (Aliança de Livre Comércio das Américas) e aposta cega na Rodada de Doha, de liberalização do comércio mundial.
O Brasil perdeu a aposta - com a contribuição dos "aliados estratégicos" Argentina, China e Índia -, e precisaria compensar o tempo perdido, pelo fato de o mundo ter acelerado a assinatura de acordos comerciais bilaterais.
Mas tampouco fez isso. Ficou paralisado pelo vírus do terceiro-mundismo, refém da crise política e institucional da Argentina, cada vez mais protecionista contra as exportações brasileiras, e deixou-se levar pela onda de chavinização do Mercosul. Tudo conspira a favor da paralisia da diplomacia comercial, engessada pelo viés ideológico anacrônico do "diálogo Sul-Sul", algo que, no início do governo Dilma, parecia ser exorcizado. Ilusão, pois esta política externa se mostra tão forte quanto nos primeiros tempos de Lula.
É emblemático que a presidente Dilma tenha voado para Malabo, capital da Guiné Equatorial, típica ditadura africana, onde transcorreu a 3ª Cúpula de Chefes de Estado e de Governo da América do Sul-África (ASA). Se Lula conviveu sem problemas com o "irmão" Kadafi e Mobuto, literalmente dono do Zaire, Dilma aparece ao lado de Teodoro Obiang, cujo filho, Teodorin, abandonou às pressas o carnaval baiano, depois de ter a prisão decretada pela Justiça francesa, devido à lavagem de dinheiro e desvio de recursos públicos de outros países.
Enquanto isso, Estados Unidos e União Europeia (UE), responsáveis por um terço das trocas comerciais no planeta, decidem acelerar as negociações para a assinatura de um acordo transatlântico. A produção somada das duas partes representa 47% do PIB mundial.
Dilma, na viagem, ressaltou que o comércio entre a América do Sul e a África, em 2011, de US$ 39 bilhões, representou um crescimento de 447% em dez anos. Mas por que não explorar também os maiores mercados do mundo, como o americano? Se o acordo dos EUA com a UE for assinado, será um razoável baque para o Brasil, que tem uma pauta de exportação agropecuária concorrente da americana. Fechado o acordo, o Brasil perderá muito espaço na UE. E nenhum dólar africano compensará o prejuízo.
Ao lado disso, outro bloco recém-formado no continente, a Aliança do Pacífico (Chile, México, Peru, Colômbia) tende a se fortalecer por ter uma postura nada ideológica, flexível. Sendo que o México já faz parte do Nafta, com americanos e canadenses. Impressiona a passividade da diplomacia comercial brasileira. Deve enxergar uma realidade própria, só vista por ela.

Brasil Econômico - Brasil sem bloco: falta empenho nos acordos comerciais / Artigo /Marcos Troyjo

Diretor do BricLab da Columbia University e professor do Ibmec

No momento em que dezenas de chefes de Estado da União Europeia e da CELAC (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos) se reuniam em Santiago em janeiro último, também voltávamos olhos para a capital chilena os estrategistas de Washington. Dali a poucas semanas o Presidente Barack Obama revelaria, em seu discurso ‘State of the Union’, que os EUA e a Europa estão em conversações para constituírem uma área de livre comércio até 2015. Para os EUA, interessa a consolidação da UE como bloco. Washington atribui grande importância à manutenção da configuração comunitária — incluindo o Reino Unido. Um eventual desmantelamento precipitado pela crise de dívidas soberanas nos países na franja mediterrânea como Grécia e Portugal atrapalha seus objetivos geoestratégicos, sobretudo neste instante em que sua economia parece recuperar-se e a área de livre comércio em que estão inseridos, a NAFTA, é dos poucos arranjos regionais que opera sem problemas. Os EUA acompanham de perto a movimentação da América Latina como “Comunidade”, já que seus membros encontram-se em diferentes velocidades — Colômbia, Peru, Chile e México decolam e se reorganizam em nova área de livre comércio entre si, com diálogo aberto com os EUA. Argentina, Brasil e Venezuela se isolam e patinam. O Brasil tem dedicado pouco empenho a acordos comerciais bilaterais, e na geometria bloco-a-bloco, é igualmente difícil ressuscitar o diálogo concreto UE-Mercosul.

De um lado, temos a União Europeia ainda atolada em sua própria areia movediça fiscal e o crescimento estagnado. De outro, hoje o Mercosul está mais mais para um “clube de empatias ideológicas” do que um bloco que se movimenta de acordo com objetivos pragmáticos de comércio e investimento. É claro também que no comércio agrícola, onde os europeus continuam campeões mundiais de protecionismo, mais acesso a mercados seria bem-vindo. No entanto, com a voracidade da demanda chinesa por exportações latino-americanas de commodities agrícolas e minerais, este tema não tem a mesma premência de 10 anos atrás. Hoje, num nível mais amplo há uma “deseuropeização” dos focos prioritários da América Latina. A boa saúde recente dos fundamentos econômicos latino-americanos e o magnetismo exercido pela China têm contribuído a essa fase mais deseuropeizada. Da ótica específica do Brasil, temos a maior economia da região, mas isso não se deve por sermos um paradigma de competitividade. Praticamos elevadas barreiras tarifárias a importações, fortalecimento das megacorporações de economia mista que atuam em commodities agrícolas e minerais, política industrial defensiva. Temos recebido fluxos volumosos de IEDs sobretudo porque o mercado brasileiro, bastante protegido, acena a empresas globais com margens de retorno muito superiores à média dos mercados da OCDE. Se o Brasil flexibilizasse suas exigências de conteúdo local, sobretudo em áreas relacionadas a infraestrutura, transportes e logística, inauguraria uma fase “qualitativamente nova” como destino de investimentos europeus — e esta poderia ser a plataforma para um novo diálogo comercial com Europa e também EUA.

Argentina: um calote que esta' saindo muito caro

Nova crise da dívida ameaça a Argentina
Julgamento nos EUA pode jogar Argentina em nova crise da dívida
Por César Felício | De Buenos Aires
Valor Econômico, 26/02/2013

A corte de apelações de Nova York poderá provocar uma convulsão no mercado financeiro argentino na próxima quarta-feira. O tribunal de segunda instância começará a julgar o processo contra a Argentina movido por 14 fundos que compraram no mercado secundário US$ 1,33 bilhão em títulos da dívida do país que não entraram nas reestruturações de débitos de 2005 e 2010.
Se a corte confirmar a sentença do juiz de primeira instância Thomas Griesa, a Argentina terá que pagar os títulos pelo valor nominal e de maneira imediata. Caso contrário, todo o pagamento sob legislação americana da dívida renegociada, que teve desconto de 66%, ficará suspenso. A Argentina renegociou 91% de uma dívida de US$ 81 bilhões que deixou de ser paga com o colapso financeiro de 2001. Foi a maior reestruturação de dívida da história, até a renegociação da dívida da Grécia em 2012, que envolveu cerca de US$ 200 bilhões.
A conta da causa que começará a ser julgada no dia 27 poderá ficar muito maior para o Estado argentino. Há outros US$ 10 bilhões em títulos que não entraram nas reestruturações, segundo admite o próprio governo de Cristina Kirchner. Existe contestação desses valores na Justiça e agentes do mercado, como o Citibank, divulgaram estimativas de que a Argentina poderia ser obrigada a pagar até US$ 17 bilhões pelos papéis que não entraram nas renegociações.
O abismo financeiro não terminaria ainda: nas duas reestruturações já feitas, a Argentina havia garantido que ofereceria aos credores que aceitaram o desconto as mesmas condições dadas a qualquer outro pagamento que viesse a ser feito. Com as reestruturações, houve um desconto líquido de US$ 27 bilhões. Em tese, o desconto desapareceria caso a sentença fosse desfavorável.
A conta seria impagável para a Argentina, que dispõe de US$ 41,8 bilhões em reservas e programou gastar este ano US$ 4,6 bilhões com o serviço da dívida. Os potenciais efeitos catastróficos do processo beneficiam a defesa argentina. Preocupados com o efeito da sentença em outras reestruturações de dívida soberana, como a grega, o governo dos Estados Unidos e economistas como a ex-diretora do FMI Anne Krueger apresentaram manifestações à Justiça pedindo a revisão da sentença.
O clima de apreensão em relação à Argentina aumentou nos últimos dias. Na segunda-feira, o risco-país argentino, índice elaborado pelo J. P. Morgan, atingiu 1.132 pontos base, alta de 5,2% nos últimos 15 dias. O aumento do indicador encarece todas as captações externas na Argentina, públicas e privadas.
A hipótese mais otimista, com a qual o governo argentino trabalha, é que a Justiça americana obrigaria o país a pagar os credores que estão no processo, mas oferecendo as mesmas condições acertadas com os que entraram nas renegociações anteriores, o que implicaria um pagamento de US$ 400 milhões, caso o entendimento fique restrito à causa atual. Para isso, Cristina teria que pedir ao Congresso a suspensão da lei que impede novas renegociações.
O obstáculo para essa alternativa é que a maior parte dos títulos contestados está em mãos de fundos que os adquiriram com o propósito de judicializar o tema.
Os investidores que se dedicam a essa prática são frequentemente chamados de "abutres" (ou "vulture funds", em inglês) e se caracterizam por ter uma carteira diversificada. No caso do NML, formalmente registrado no Chipre mas de propriedade do financista Paul Singer, os títulos argentinos representam apenas 2% do portfólio e a disposição para negociar por parte dos credores é baixa. O NML é o maior credor na causa.
O cenário mais pessimista foi mencionado na noite da quinta-feira, durante o lançamento de um livro sobre o tema, pelo ex-secretário de Finanças Guillermo Nielsen, negociador da primeira reestruturação, em 2005. "Seria possível, e até mesmo fácil, a corte sentenciar contra a Argentina e evitar que isso se translade a reestruturações de outros países, pelas peculiaridades do nosso caso", afirmou Nielsen.
De acordo com Nielsen, o isolamento internacional que a Argentina vive pode influenciar no processo. Caso a Argentina seja derrotada no processo, cujo desfecho pode não sair na quinta, cabe ainda recurso à Suprema Corte, o que retardaria os efeitos da decisão pelo menos até o final do ano. A última instância nos EUA, contudo, raramente muda as decisões judiciais das instâncias intermediárias.

Valor Econômico - Disputa com fundos envolveu até dinossauro

Por César Felício | De Buenos Aires

Até mesmo o fóssil do "argentinossauro", o maior animal terrestre que já existiu no planeta, foi objeto das disputas judiciais entre o Estado argentino e os fundos que possuem créditos que não entraram nas renegociações das dívidas de 2005 e 2010. Em 2009, credores tentaram embargar cinco contêineres contendo restos de dinossauros, inclusive do mais famoso fóssil argentino, que haviam sido enviados para Rosenheim, na Alemanha, onde se realizava uma mostra sobre o tema.
Os restos dos animais pré-históricos só escaparam do bloqueio porque o governo argentino conseguiu convencer a Justiça alemã de que os fósseis pertenciam aos governos provinciais de Santa Cruz, Chubut e Buenos Aires, e não ao governo nacional, titular da dívida. Em 2010, a mesma ameaça pesou sobre o pavilhão argentino na Feira do Livro de Frankfurt, também na Alemanha.
Segundo levantamento publicado no livro "Os Abutres da Dívida", de Mara Laudonia, uma jornalista com livre trânsito junto à cúpula da equipe econômica argentina, existiam até o fim do ano passado 28 bens do país sob embargo. A lista diminuiu em dezembro, quando o Tribunal Internacional do Mar determinou a liberação da fragata "Libertad", que havia sido arrestada no porto de Tema, em Gana, a pedido do fundo NML.
A ameaça de embargo dos bens argentinos por credores levou a presidente Cristina Kirchner a restringir os voos do avião presidencial "Tango Uno" a determinados países e é uma das razões pela qual a estatização da empresa aérea Aerolineas Argentinas, sob administração do Estado desde 2008, jamais foi concluída. Os fundos de dívida conseguiram sentenças favoráveis em primeira instância, mas não têm sido bem-sucedidos em fazer prevalecer os embargos nos recursos judiciais.
A mais grave derrota que sofreram ocorreu em julho de 2011, quando a Corte de Apelações de Nova York entendeu que as reservas internacionais da Argentina são um bem soberano do país e não possuem uso comercial, não sendo portanto suscetíveis de embargo.
No processo movido pelo NML e outros fundos, os credores obtiveram na semana passada uma decisão judicial do juiz de primeira instância Thomas Griesa que pode indicar uma nova estratégia: Griesa determinou que o Banco de la Nación Argentina, estatal, divulgue a movimentação de todas as contas correntes do Estado argentino e das contas pessoais da presidente e do espólio de seu ex-marido e antecessor, Néstor Kirchner, em todos os países em que o BNA tem operação, inclusive o Brasil.

Nacoes falham (of course) e o Ocidente predomina (por enquanto) - Gideon Rachman

West complacent over why nations fail
Opinion - Gideon Rachman
Financial Times, February 26, 2013

The success of a book can sometimes tell you as much about the times as about the book itself. That may be the case with Why Nations Fail, which was published last year to great acclaim from reviewers and prize juries, and even compared to Adam Smith's Wealth of Nations.

The book, by Professors Daron Acemoglu and James Robinson, is certainly erudite and interesting. But the excited reception for Why Nations Fail may also have something to do with the fact that its message is deeply reassuring to many in the west. I finished the book this weekend, surrounded by newspapers predicting that the US will, this week, slash its budget so deeply that it puts hundreds of thousands of jobs at risk. Meanwhile, the Italian elections threaten to reignite the eurozone crisis.

But do not despair. Hurl the newspapers to one side – and take the long view. Based on a magpie-like assembly of evidence from many centuries, the authors of Why Nations Fail have concluded that, for all its difficulties, western-style democracy is the key to long-term prosperity. The professors argue that countries "such as Great Britain and the United States became rich because their citizens overthrew the elites who controlled power and created a society where political rights were much more broadly distributed". Professor Ian Morris, a reviewer, summarises their argument, thus: "It is freedom that makes the world rich."

In part, the discrepancy between the newspapers and the thesis of Why Nations Fail is simply a question of time. The book deals with the evolution of societies over centuries. This week's Italian elections and the US sequestration are, by comparison, mere stitches in the great tapestry of history.

But that is not quite reassurance enough. The political situations in Italy and the US have similar, and disturbing, long-term implications. They point to the tendency of modern democracies to pile up debt by making unaffordable spending promises to voters, that politicians then cannot wind back.

Investor confidence in Italy has been restored over the past year by a government led by Mario Monti, an unelected technocrat. But in the elections, Mr Monti looks likely to trail in an undistinguished fourth. His reforms won the approval of the markets – but not of the voters. Similarly, in the US, the bipartisan Simpson-Bowles commission offered a more rational way of controlling government spending than the meat axe of the sequestration. But the technocrats' solution has failed to pass the political test in Washington.

The uneasy sense that western democracy is not working very well is heightened by the counter-example of China's rapid economic progress. Chinese success challenges the conventional political wisdom formed after the cold war about the superiority of democracy as an economic system. China's ascent also appears to challenge the insistence of Messrs Acemoglu and Robinson that prosperity can be secured only by "inclusive" economic institutions, rooted in political pluralism.

The professors spend some time grappling with Chinese success in Why Nations Fail and conclude that "Chinese growth ... is just another form of growth under extractive political institutions, [and] unlikely to translate into sustained economic development".

This seems a remarkably dismissive verdict on almost two generations of double-digit growth, which has dragged hundreds of millions of people out of poverty and transformed China into the second-largest economy in the world. Nonetheless, it reflects a strong tendency in American academia to talk down the rise of China – and to stress the enduring strengths of the US system.

All of this might not matter much if the arguments were confined to seminar rooms. But, in fact, versions of the argument made in Why Nations Fail dominate western political debate. No presidential election in the US is complete without all candidates paying obeisance to the idea that "freedom" is not just morally superior – it is also what makes America strong.

This unquestioning assumption of the superiority of the American way may, in fact, be part of what ails the US. I think that Why Nations Fail makes a strong case that, over the long term, there is a clear correlation between political freedom and economic success. But, in the US, a generalised attachment to liberty has somehow turned into an unquestioning veneration of the constitution that has become almost quasi-religious.

As a result, Americans may be unable really to address the fact that their political system is not working well. There is a similar problem in Europe, where the compulsion to pay homage to the European ideal stopped many politicians from asking hard, but necessary, questions about the continent's single currency, the euro.

The Chinese system clearly has its own terrible flaws, including brutality and corrosive corruption. But it has also had the virtue of a radical pragmatism, captured in Deng Xiaoping's maxim that "it doesn't matter if a cat is black or white, so long as it catches mice".

By contrast, political debate in the US is too often captive to procedures and principles that get in the way of pragmatic solutions – whether it is the "right to bear arms", or an insistence on Congress's right to veto a rise in the debt ceiling.

There are many reasons why nations can fail. The complacent worship of a dysfunctional political system could be one of them.

Postagem em destaque

Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...