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terça-feira, 11 de maio de 2010
Going nuke? - Der Spiegel
O Brasil está desenvolvendo a bomba?
De Spiegel, 3 maio 2010
Em outubro de 2009, a renomada revista americana “Foreign Policy” publicou um artigo intitulado “As futuras potências nucleares com as quais você deve se preocupar” (The Future Nuclear Powers You Should Be Worried About). Segundo o autor, Cazaquistão, Bangladesh, Mianmar, Emirados Árabes e Venezuela são os próximos candidatos — depois do Irã — a membros do clube das potências nucleares. Apesar de suas interessantes evidências, o autor deixou de mencionar a potência nuclear virtualmente mais importante: o Brasil.
Hoje em dia, o Brasil é visto com alta estima pelo resto do mundo. Seu presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, se tornou um astro no cenário internacional. “Esse é o cara”, disse certa feita o presidente dos EUA, Barack Obama, em um elogio ao parceiro. Lula, como se sabe, pode até mesmo receber o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, com todas as honras, numa demonstração de apoio a seu programa nuclear, em razão do qual o Irã enfrenta o ostracismo no resto do mundo.
A autoconfiança de Lula é um indicativo da reivindicação do Brasil de assumir o status de grande potência — inclusive em termos militares. A reivindicação militar está refletida na Estratégia Nacional de Defesa, que foi apresentada no fim de 2008. Além do domínio do ciclo completo do combustível nuclear — que já foi conquistado —, o documento trata da construção de submarinos nucleares.
Perto de construir a bomba
Pode soar inofensivo, mas não é, porque o termo “submarino nuclear” poderia ser, de fato, uma fachada para um programa de armas nucleares. O Brasil já teve três programas nucleares secretos entre 1975 e 1990, cada uma das Forças Armadas buscando seu próprio caminho. A atuação da Marinha provou ser a mais bem-sucedida: usa centrífugas importadas de alta performance para produzir urânio altamente enriquecido, a partir de hexafluoreto de urânio, para poder operar pequenos reatores para submarinos. No momento certo, a capacidade nuclear recém-adquirida do país seria revelada ao mundo com uma “explosão nuclear pacífica”, seguindo o exemplo já dado pela Índia. Um poço de 300 metros para o teste já tinha sido perfurado. Segundo declarações do ex-presidente da Comissão Nacional de Energia Nuclear, em 1990, os militares brasileiros estavam prestes a construir uma bomba.
Mas isso nunca aconteceu. Durante a democratização do Brasil, os programas nucleares secretos foram efetivamente abandonados. Segundo a Constituição de 1988, as atividades nucleares ficaram restritas a “usos pacíficos”. O Brasil ratificou em 1994 o Tratado de Proibição de Armas Nucleares na América Latina e Caribe e, em 1998, o Tratado de Não-Proliferação Nuclear e o Tratado Abrangente de Proibição de Testes Nucleares. O flerte do Brasil com a bomba aparentemente havia terminado.
Sob Lula, entretanto, este flerte volta a predominar, e os brasileiros estão se tornando cada vez menos hesitantes em brincar com sua com sua própria opção nuclear. Poucos meses depois da posse de Lula, em 2003, o país retomou oficialmente o desenvolvimento de um submarino nuclear.
Já durante a campanha eleitoral, Lula criticou o Tratado de Não-Proliferação, chamando-o de injusto e obsoleto. Apesar de o Brasil não ter denunciado o tratado, tornou evidentemente mais difíceis as condições de trabalho dos inspetores da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). A situação se tornou tensa em abril de 2004, quando foi negado à AIEA acesso ilimitado a uma instalação de enriquecimento recém-construída em Resende, perto do Rio de Janeiro. O governo brasileiro também deixou claro que não pretendia assinar o protocolo adicional do Tratado de Não-Proliferação, o que permitira a inspeção de instalações sem aviso prévio.
Em meados de janeiro de 2009 — durante uma reunião do Grupo dos Fornecedores Nucleares, seis países que trabalham pela não proliferação por intermédio do controle da exportação de materiais nucleares —, os motivos dessa política restritiva ficaram claros: o representante do Brasil fez de tudo para combater as exigências que tornariam transparente o programa do submarino nuclear.
Aberto à negociação
Por que todo esse sigilo? O que há para esconder no desenvolvimento de pequenos reatores para mover submarinos, sistemas que vários países possuem há décadas? A resposta é tão simples quanto perturbadora. Também o Brasil, provavelmente, está desenvolvendo algo mais do que declarou: armas nucleares. O vice-presidente José Alencar apresentou uma razão quando defendeu abertamente a obtenção de armas nucleares pelo Brasil, em setembro de 2009. Para um país com uma fronteira de 15 mil quilômetros e ricas reservas de petróleo em alto-mar, disse Alencar, essas armas não seriam apenas uma ferramenta importante de “dissuasão”, mas também dariam ao Brasil os meios para aumentar sua importância no cenário internacional. Quando se lembrou que o Brasil tinha assinado o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares, Alencar reagiu calmamente, afirmando que era um assunto aberto à negociação.
Como exatamente o Brasil poderia produzir armas nucleares? A resposta, infelizmente, é que isso seria relativamente fácil. Uma precondição para a fabricação legal de pequenos reatores para os motores de submarino é que o material nuclear regulado pela AIEA seja aprovado. Como o Brasil define suas instalações para a construção do submarino nuclear como áreas militares restritas, os inspetores da AIEA não têm acesso a elas. Em outras palavras: assim que o urânio enriquecido fornecido legalmente passa pelo portão da instalação onde os submarinos estão sendo construídos, ele pode ser utilizado para qualquer propósito, incluindo a produção de armas nucleares. E como quase todos os submarinos nucleares funcionam com urânio altamente enriquecido, o mesmo utilizado nas armas, o Brasil pode facilmente justificar a produção de combustível nuclear altamente enriquecido.
Mesmo sem nenhuma prova definitiva das atividades nucleares do Brasil (ainda), eventos passados sugerem que é altamente provável que o Brasil esteja desenvolvendo armas nucleares. Nem a proibição constitucional nem o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares impedirão que isso aconteça. Bastaria a Lula dizer que o EUA não têm o direito do monopólio das armas nucleares nas Américas para obter uma autorização do Congresso. Se isso acontecesse, a América Latina não mais seria uma zona livre de armas nucleares — e a antevisão de Obama de um mundo livre de armas nucleares estaria acabada.
Um comentário:
A FALTA QUE UM ROBERT SCHUMAN FAZ
A região da Alsácia-Lorena foi, durante muitos anos, o pomo da discórdia da Europa. A sua abundância de carvão – matéria-prima fundamental da indústria, em especial, da indústria bélica – tornou-a cobiçada tanto por alemães, quanto por franceses. Percebendo que esse território poderia afetar a estabilidade da Europa recém saída da Segunda Grande Guerra, o ministro francês dos Negócios Exteriores, Robert Schuman, costurou um acordo que criou a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço,a CECA, que integrou as indústrias de carvão e aço de vários países europeus. A CECA foi o embrião da atual União Europeia. Pergunto: Por que não fazer o mesmo com o urânio? Por que não se constroi uma agência multinacional que se responsabilize pelo enriquecimento desse minério? Quando o Brasil mostrou-se resistente a um das inspeções da AIEA, lembro-me de que argumentaram que a AIEA poderia divulgar os segredos industriais das ultracentrífugas brasileiras. Ora, por que não se cria uma agência internacional que tenha o monopólio do enriquecimento do urânio? Desse modo, não se restringiria o uso pacífico da energia proveniente da radioatividade e, além disso, diminuir-se-ia a sua utilização em ogivas nucleares gradualmente. De bônus, poderia ser o embrião de uma efetiva comunidade internacional...
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