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sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Mercosul: 80 anos em 8? - dificil fazer mais...

Apenas algumas correções ao que vai na matéria abaixo, ou fruto da ignorância do repórter ou engano dos informantes:
1) Quanto ao título: o Mercosul é um projeto de integração econômica, começando pela liberalização comercial: uma avaliação dessas esferas seria interessante, ou deveríamos concluir que Lula deixa o Mercosul depois de enfraquecer a dimensão econômica do bloco?
2) A aproximação com a Bolívia comçou muito antes, e já em 1996, no primeiro governo FHC portanto, ela já tinha o status de Estado associado ao Mercosul. Não houve NENHUMA mudança nesse status desde então e caberia verificar se não houve nenhum recuo nas dimensões econômica e comercial, com a onda de renacionalizações e de restrições protecionistas começadas com o governo Morales, que aliás atuou muito contrariamente aos interesses brasileiros, na complacência do grande vizinho.
3) A Venezuela está em processo de tornar-se membro pleno desde muito tempo, aliás segundo uma figura esdrúxula que justamente não existe em nenhum instrumento jurídico do Mercosul: "membro pleno em processo de adesão" (sic). Isso simplesmente não existe. A Venezuela ainda não cumpriu nenhum dos requisitos essenciais para tornar efetiva essa incorporação, que seria simplesmente a aceitação da Tarifa Externa Comum, que deveria ser a sua única tarifa, bem como a adoção de normas de acesso ao seu mercado interno similares ao mecanismos existentes atualmente, o que tampouco é o caso. Não se vê como, portanto -- e independentemente da dimensão política, que recomenda aos membros do Mercosul serem democracias plenas -- a Venezuela poderia ser aceita no Mercosul sem cumprir regras mínimas do bloco.
4) Por outro lado, esta afirmação de um acadêmico consultado pelo jornal não faz nenhum sentido: "é necessário levar em conta que o Mercosul tem um grande adversário nos Estados Unidos: durante anos os países preferiram negociar um acordo com os Estados Unidos e não com o Mercosul". Os países? Quais países? Os outros da região? Talvez, pelo fato de serem os EUA o maior mercado do hemisfério, o mais aberto, o principal provedor de recursos, maior investidor, etc. As simple as that. O professor vai acusar os outros países de serem idiotas, e de preferirem os EUA em lugar do Mercosul?
5) No mesmo sentido vai esta frase: " "Nesse período, a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) era um projeto forte. Todos os países hesitavam em negociar isso, e negociavam sozinhos, mas o Mercosul se consolidou como opção comercial, econômica e política", considerou o chefe da diplomacia brasileira"
Mas os países não negociavam a Alca sozinhos: Mercosul e CAN, por exemplo, negociavam conjuntamente, da mesma forma que o Caricom. Quem negociava sozinho eram os membros do NAFTA (EUA, Canadá e México) e o Chile, mas todos os outros tinham blocos, com porta-vozes unificados. A consolidação do Mercosul como bloco político foi feita na cúpula das Américas de 1997, em Belo Horizonte, quando o princípio dos "building blocks", ou seja da preservação do Mercosul, foi lograda graças aos esforços do ministro Lampréia e do presidente FHC, com a compreensão de Clinton, que neste caso teve de desmentir sua negociadora comercial, a USTR Charlene Barshevisky. Ou seja, o chanceler atual, que foi quem aceitou a Alca em Miami, em 2004, esqueceu-se de como o processo se desenvolveu de fato.
6) ""Era uma coisa quase esquecida, e agora o fundo [FOCEM] já tem projetos num valor de alguns bilhões de dólares." Melhor seria falar de milhões de dóalers, não de bilhões, que parece um tanto exagerado.
Paulo Roberto de Almeida

Lula deixa Mercosul depois de fortalecer a dimensão política do bloco
Correio Braziliense, 16/12/2010

O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, se despede do Mercosul depois de oito anos de participação em seus fóruns, nos quais contribuiu para fortalecer a dimensão política e humana do bloco, consideraram analistas e diplomatas.

Lula passará a faixa de presidente no dia 1º de janeiro para sua sucessora, a economista Dilma Rousseff, e nesta sexta-feira vai presidir a XL Cúpula presidencial do Mercosul em um de seus últimos atos. A reunião marcará a sua saída de cena de um fórum para o qual contribuiu muito com seu próprio carisma e perspicácia política.

"O Mercosul é um projeto complexo, que tem fundamento na integração econômica, mas Lula deu a ele uma enorme dimensão política, em grande parte consequência de sua própria projeção", disse à AFP o cientista político Guilherme Carvalhido, da Universidade Veiga de Almeida.

Segundo este especialista, "com a saída de Lula de cena, a ausência dessa dimensão política certamente será sentida. Tudo indica que Rousseff mantenrá as políticas brasileiras, mas o carisma de Lula foi útil para o bloco".

Entre as marcas dos oito anos de Lula no Mercosul, Carvalhido mencionou a aproximação da Bolívia e da Venezuela do grupo formado por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai desde 1991. A Bolívia é atualmente membro associado externo e a Venezuela está em processo de se tornar um membro pleno.

"Creio que a concordância entre Lula e Néstor Kirchner (ex-presidente argentino 2003-2007, falecido em outubro) foi muito importante em todo este processo, e ambos venceram muitas resistências", disse, lembrando que o ingresso da Venezuela, por exemplo, leva os limites do Mercosul até o Caribe.

Para Carvalhido, "é necessário levar em conta que o Mercosul tem um grande adversário nos Estados Unidos: durante anos os países preferiram negociar um acordo com os Estados Unidos e não com o Mercosul".

Ainda nesta quinta-feira, o ministro brasileiro das Relações Exteriores Celso Amorim disse em uma entrevista coletiva à imprensa que os oito anos de Lula como chefe de Estado do Brasil coincidiram com uma conjuntura difícil do Mercosur.

"Nesse período, a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) era um projeto forte. Todos os países hesitavam em negociar isso, e negociavam sozinhos, mas o Mercosul se consolidou como opção comercial, econômica e política", considerou o chefe da diplomacia brasileira.

Amorim destacou também o apoio que Lula sempre ofereceu ao Fundo para a Convergência Estrutural do Mercosul (Focem), de apoio a projetos de infraestrutura e sociais nas economias do bloco.

"Era uma coisa quase esquecida, e agora o fundo já tem projetos num valor de alguns bilhões de dólares. O Focem ressalta a necessidade de apoiar as economias mais frágeis", ressaltou Amorim.

A primeira participação de Lula em cúpulas presidenciais do Mercosul ocorreu no dia 18 de junho de 2003 em Assunção, e já em seu primeiro discurso fez um apelo a seus colegas da região para que consolidassem "o Mercosul que nossos povos querem".

Nessa oportunidade, Lula avaliou que faltava "ao Mercosul uma dimensão política, como se bastassem apenas as fórmulas econômicas", e por isso manifestou a sua convicção de que era necessário "fortalecer as agendas política, social e cultural do Mercosul".

Era necessário dar ao bloco "uma dimensão humana", disse Lula em seu primeiro discurso no Mercosul.

Agora que Lula se despede do Mercosul, o bloco discute a adoção de um Estatuto da Cidadania, que em um prazo de uma década se propõe a homogeneizar os direitos dos habitantes do bloco, incluindo padrões comuns para os documentos de identidade.

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