OMC / CANDIDATURA DO EMBAIXADOR ROBERTO
AZEVÊDO
O Estado de S. Paulo - ‘Na OMC,
não serei mais o embaixador do Brasil’ / Entrevista / Roberto Azevedo
Em sabatina, candidato desvia de temas polêmicos
envolvendo o País, entre eles câmbio e protecionismo
Jamil Chade, GENEBRA - Num esforço para ganhar votos e
superar o mal-estar deixado pelo Brasil com alguns de seus sócios por conta das
barreiras adotadas, o brasileiro Roberto Azevedo, candidato ao cargo de direção
da Organização Mundial do Comércio (OMC), se distancia dos temas mais polêmicos
da política comercial brasileira e garante que, se eleito, defenderá o
interesse de todos os países.
Nesta quinta-feira, o embaixador Azevedo foi
sabatinado na entidade, em uma sessão em que foi questionado sobre diversos
assuntos. A escolha só ocorrerá em maio. Mas os nove candidatos ao posto sabem
que um deslize em Genebra significaria a perda de pontos na corrida.
Azevedo foi questionado pela Coreia sobre
protecionismo, mas iniciou sua intervenção esclarecendo que, depois de 17 anos
na OMC representando o Brasil, finalmente falaria em nome próprio. "Esta é
a primeira vez que, nesse prédio, vou compartilhar minha visão pessoal sobre
essa organização, sobre o sistema comercial e sobre onde estamos hoje",
disse aos demais embaixadores.
A estratégia não ocorre por acaso. Nos últimos meses,
o aumento de barreiras comerciais no Brasil deixou dezenas de parceiros
comerciais irritados, a ponto de a Casa Branca enviar uma carta ameaçando
retaliar.
O Brasil também irritou muitos membros com a
insistência de trazer para a agenda da OMC a questão do câmbio, com a criação
de um mecanismo que autorizaria a elevação de tarifas. Para a maioria dos
países, isso não passaria de uma forma de o Brasil justificar barreiras.
Azevedo deixou claro, agora, que não partirá dele a introdução do assunto na
agenda da OMC, se eventualmente for eleito.
Para o embaixador brasileiro, a OMC vive um momento
crítico. "O sistema precisa ser renovado ou será incapaz de lidar com as
demandas de um mundo em mudança", alertou. Em sua visão, se a Rodada Doha
não for concluída, a OMC continuará "fora do radar" do mundo. "Nenhum
marketing vai mudar essa realidade. Vamos precisar de um diretor que trabalhe,
arregasse a manga e enfrente a situação. Será uma tarefa herculana. Mas precisa
ser feita."
Ele também mandou seu recado aos países em
desenvolvimento. "O comércio não é o objetivo da OMC. Mas um instrumento
para desenvolvimento." Ao final da sabatina, Azevedo falou ao Estado. A
seguir, os principais trechos da entrevista.
Depois de 12 anos de uma negociação sem resultado, a
Rodada Doha ainda tem alguma relevância para a economia mundial?
Sim, não tenho nenhuma dúvida disso. Tinha avanços
muito importantes previstos na Rodada, em vários setores. Eles são
significativos até hoje. Se a Rodada for concluída de maneira positiva, teremos
ganhos tanto em acesso a mercados como em disciplinas do comércio. E tudo isso
tem um valor econômico muito importante.
Mas há a impressão de que o mundo já deu um passo
adiante. O que pode ocorrer com a OMC se o projeto fracassar?
A OMC tem a obrigação de tentar concluir a negociação.
O sistema está paralisado. É claro que a OMC é maior que a Rodada. Mas a
realidade é que a Rodada emperra o sistema. Então, eu não vejo alternativa que
não seja pela Rodada. Podemos tentar algum acordo aqui ou ali, mas a OMC
precisa contornar o impasse que vive hoje.
A Coreia o questionou sobre o protecionismo. Qual o
risco que isso representa para a economia internacional?
O protecionismo é uma ameaça sempre presente. Países
vivem ciclos econômicos diferentes, com momentos mais liberalizantes e outros
menos liberalizantes. O que eu disse é que a melhor proteção contra o
protecionismo é o próprio sistema multilateral, que estabelece limites para o
espaço de política pública que os países podem adotar. A melhor maneira de se
evitar um recrudescimento das condições de abertura de mercado é fortalecer o
sistema multilateral, negociando. E, para isso, precisamos sair do impasse.
O Brasil tem sido fortemente criticado nos últimos
meses por alguns dos parceiros comerciais. A posição do Brasil, adotando
medidas protecionistas, pode atrapalhar sua candidatura?
Em primeiro lugar, o governo jamais aceitou e nunca
admitiu que estivesse adotando medidas protecionistas. Você pode ou não
concordar com essa situação. O governo brasileiro entende que está tomando
medidas que são necessárias diante das circunstâncias econômicas que se vive,
inclusive à luz da taxa cambial anormal. Em segundo lugar, se eleito diretor da
OMC, eu não sou mais embaixador do Brasil. Aí quem terá de defender a agenda
brasileira e as medidas brasileiras será o novo embaixador do Brasil. Eu
estarei usando um outro chapéu e estarei defendendo os interesses dos membros
da OMC e os interesses da instituição.
Nos últimos dois anos, um dos temas que o sr. tratou
foi a introdução do câmbio na agenda da OMC. Como diretor, o sr. acredita que o
tema ainda terá espaço, depois de ter tantas críticas?
São os governos que precisam definir isso. O diretor
não tem pode decidir o que os membros devem ou não falar. Não é uma decisão do
diretor. Se alguém quiser introduzir um tema, seja energia, segurança alimentar,
ele tem de convencer os demais que o tema deve ser discutido. O diretor-geral
que quiser ditar a agenda da OMC perde o emprego rapidamente.
Entre os nove candidatos, três são latino-americanos.
Por que Brasil não se comprometeu em apoiar apenas a América Latina, se por
acaso o sr. for eliminado?
A posição do governo foi uma posição sistêmica e
coerente com práticas de organismos internacionais. Há uma alternância entre
desenvolvidos e em desenvolvimento. Outro conceito é a rotatividade geográfica.
Como já houve um asiático na OMC, seria a vez de um latino-americano ou
africano.
Folha de S. Paulo - Candidato
do Brasil à direção da OMC se afasta de posição do país
Política comercial tida como protecionista pode
atrapalhar Azevêdo
DE SÃO PAULO - Tanto na sua apresentação ao
Conselho-Geral da OMC (Organização Mundial do Comércio) quanto na entrevista
coletiva que a seguiu, o candidato do Brasil à direção-geral do organismo,
embaixador Roberto Azevêdo, fez questão de marcar sua distância da posição brasileira
sobre temas de comércio.
Tida como protecionista, a política comercial do
Brasil pode ser uma pedra no sapato do candidato -representante do país na OMC
desde 2008- na disputa à liderança da entidade voltada para a liberalização do
comércio.
"Agora sou candidato. Fiz questão de que eles
soubessem que estou aqui expressando minhas opiniões, e não as do governo
brasileiro. É importante que isso fique bem claro desde o começo", disse,
em entrevista transmitida via internet, de Genebra.
O brasileiro voltou a criticar a paralisia na área de
negociações da OMC e disse que, "a não ser que a OMC volte a apresentar
resultados", continuará "fora do radar".
Para Azevêdo, o grande desafio do próximo
diretor-geral será destravar a rodada Doha (de liberalização do comércio) -e
que, para isso, é preciso "um novo olhar".
"Se você fizer as coisas da mesma maneira, a
chance de avançar é zero. Tem que fazer diferente. Como? Eu não sei",
reconheceu. "Mas muitas vezes, quando ajudei a destravar impasses, também
não sabia."
Azevêdo disputa o posto com outros oito candidatos
-dois deles latino-americanos. O mexicano Herminio Blanco já sugeriu que os
nomes da região se unam para fortalecer a candidatura do "melhor".
O Brasil, porém, parece pouco disposto a unir forças
com os latinos. Ontem, Azevêdo desconversou sobre a ideia: "O Brasil
deixou claro que apoia um novo diretor-geral de um país em
desenvolvimento", disse, incluindo os africanos entre a preferência.
Na última semana, o Brasil enviou um alto diplomata à
cúpula da União Africana, na Etiópia, com cartas a mais de 20 países pedindo
apoio a Azevêdo. A ideia é que o brasileiro seja a segunda opção desses países,
que devem apoiar, primeiro, Gana ou Quênia. (ISABEL FLECK)
Folha de S. Paulo -
Embaixador tem discurso de um profissional do comércio / Análise / Clóvis Rossi
O discurso com que o embaixador Roberto Azevêdo se
apresentou ontem a seus pares da Organização Mundial do Comércio é uma peça
típica de um profissional do comércio e da negociação.
O embaixador sabe perfeitamente que o maior obstáculo
que sua candidatura enfrenta é o rótulo de protecionista que está sendo
aplicado às políticas comerciais brasileiras e, por extensão, ao que as defende
em Genebra.
Por isso mesmo, Azevêdo, como a Folha já havia
antecipado domingo, tratou de deixar claro o que deveria ser óbvio, mas que
disputas eleitorais acabam obscurecendo: Roberto Azevêdo, como embaixador do
Brasil, defende as posições do governo brasileiro; Roberto Azevêdo, como
diretor-geral da OMC, defenderá que "comércio é um elemento indispensável
para o crescimento e desenvolvimento de qualquer economia".
O embaixador tem dito a amigos que nem sequer seria
candidato se não acreditasse nas virtudes do livre-comércio, que, enfim, é a
missão central atribuída à OMC. Mas, atenção, não é o comércio como um fim em
si mesmo, mas "como um meio de melhorar as condições de vida das famílias
no mundo real".
Azevêdo adiantou, no entanto, poucas pistas sobre o
que pretende fazer para tirar do pântano a Rodada Doha, o mais ambicioso projeto
de liberalização comercial que o mundo lançou, já faz 12 anos.
Para o diplomata brasileiro, na verdade são quase
"duas décadas de estagnação no front negociador", contando o tempo
perdido desde a transformação do antigo Gatt (Acordo Geral de Tarifas e Comércio)
em OMC, em 1995, até o lançamento da Rodada Doha (2001).
Azevêdo limitou-se a dizer que "o sistema
[multilateral de comércio] precisa ser atualizado ou logo se tornará incapaz de
lidar com as demandas de um mundo transformado".
Que atualizações, ele já tem na cabeça, mas não era o
momento de dizer porque a etapa de ontem faz parte do que, no jargão da OMC, se
chama de "concurso de Miss Simpatia", uma avaliação mais da
personalidade do candidato do que propriamente do conteúdo de suas propostas.
Brasil Econômico - Candidato
à direção da OMC, Azevêdo promete que retomará rodada Doha
Em discurso de apresentação ao cargo, embaixador
brasileiro aponta paralisia do órgão de comércio mundial
Ruy Barata Neto, de Brasília - A retomada das
negociações da Rodada Doha, paralisada há mais de 11 anos, será o principal desafio
a ser perseguido pelo embaixador brasileiro Roberto Carvalho de Azevêdo caso
assuma a diretoria-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC).
Representante permanente do Brasil no órgão desde 2008, Azevêdo aparece como um
dos favoritos da disputa à sucessão do francês Pascal Lamy, cujo mandato
termina em agosto.
Responsável por encerrar, ontem, a fase de
apresentação dos candidatos, Azevêdo aposta na sua qualificação técnica para
ganhar a disputa e conseguir destravar as negociações da rodada Doha durante o
mandato. "Tenho o expertise necessário para fazer isso porque já pude
atuar tanto no nível técnico quanto no estratégico, além de contar com a
confiança dos membros da OMC, ter um histórico de transparência nas negociações
e diálogo com as mais diferentes tendências da organização", afirma
Azevêdo.
Um dos concorrentes mais fortes do embaixador
brasileiro é o mexicano Herminio Blanco, economista e ex-ministro do comércio e
indústria. A experiência ministerial é apontada como uma vantagem em relação ao
concorrente brasileiro que ainda não assumiu tal cargo. Mas, segundo Azevêdo,
esta lacuna não deverá ser um problema na disputa.
Na avaliação do brasileiro as soluções para o impasse
da Rodada Doha dependerão do conhecimento a cerca do processo do histórico das
negociações da OMC, sobretudo no âmbito técnico. "É preciso expertise para
se achar solução, e isso, francamente, não acontece no nível ministerial",
afirma. "Não estou dizendo que ex-ministros não são capazes de fazê-lo,
mas você tem que observar o caminho antes de se fechar um acordo."
Azevêdo também lembrou que até antes da criação da
OMC, em 1994, nenhum dos diretos gerais do órgão equivalente eram de nível
ministerial. "Todas as rodadas de negociação foram concluídas por estas
pessoas", afirma. "Aliás, desde 1995, quando a diretoria passou a ser
composta por ministros, nenhuma rodada foi concluída."
Ex-ministro das relações exteriores do governo
Fernando Henrique Cardoso, Luiz Felipe Lampreia afirma que a experiência de
Azevêdo na OMC o torna o mais qualificado entre os concorrentes ao cargo. Ele
concorda com Azevêdo a respeito da urgência no avanço das negociações de Doha.
"Se não tiver novos avanços como as rodadas de liberalização do comércio e
de redução de obstáculos comerciais, a OMC esta fadada a ser apenas um
mecanismo de solução de controvérsias", afirma.
Segundo Lampreia, as chances do embaixador brasileiro
são grandes por conta da predisposição dos membros da OMC em elegerem um diretor-geral
representante de um país emergente. "É a bola da vez", afirma. Além
de Blanco, está na disputa Anabel González, ministra de comércio exterior da
Costa Rica, como a terceira representante da América Latina. De países da
África aparecem Alan John Kwadwo Kyerematen, ex-ministro de Comércio e
Indústria de seu país de Ghana, e a embaixadora Amina C. Mohamed, do Kenya.
Ao todo, disputam nove candidatos. Além dos já
citados, estão no páreo representante da Indonésia, Nova Zelândia, Jordânia e
Coreia do Sul. O novo diretor geral deve ser nomeado por consenso antes do fim
de maio e assumirá suas funções no começo de setembro.
Valor Econômico – Brasileiro é destaque
na apresentação de candidatos à OMC
Por Assis Moreira | De Genebra
Encerrada a fase de apresentação dos nove candidatos
para substituir Pascal Lamy na direção-geral da Organização Mundial do Comércio
(OMC), dois ou três candidatos se destacaram, na percepção de vários
negociadores em Genebra. Os candidatos da Nova Zelândia, Tim Groser, e do Brasil,
Roberto Azevedo, são apontados como os que tiveram melhor desempenho diante dos
158 países membros. Alguns delegados incluem a candidata da Costa Rica, Anabel
Gonzalez, que teria ido melhor do que se esperava.
A apresentação dos candidatos na OMC é um processo
necessário, mas não decisivo. Se acertou no desempenho, se mantém no páreo. Se
errou, pode perder algum apoio. Mas a decisão de cada país sobre quem vai
apoiar será tomada nas capitais, no jogo de barganhas e consultas com os
parceiros
A diferença é que Tim Groser, de país desenvolvido e
que já comandou a OMC, pode ter pouca chance de prosperar, a não ser que os
países desenvolvidos queiram comprar uma enorme briga com países em
desenvolvimento, que consideram ser a vez de um de seus candidatos.
Para Azevedo, muito agora dependerá da movimentação de
Brasília, dos contatos diretos da presidente Dilma Rousseff com
outros presidentes em busca de apoio. Curiosamente, muitas delegações mencionam
telefonemas recebidos, mas nenhum fala de chamada do Palácio do Planalto.
Nas apresentações, nenhum dos nove candidatos correu
grande risco. Mas, dependendo de quem se ouvia, os comentários eram de que
alguns candidatos teriam chocado seus próprios apoiadores, sobretudo os de Gana
e Quênia, aparentemente mais interessados em tranquilizar os países
desenvolvidos.
Houve repetição de muita banalidade sobre o papel da
OMC, o que cada um acha que pode fazer etc. A falta de humildade também parece
ter atacado os candidatos. Tudo é usado para carregar a favor ou contra o
favorito.
Pelo que se deduz das percepções, no grupo do meio
aparecem três candidatos.
O mexicano Herminio Blanco deixou poucas lembranças.
Na verdade, a impressão que ele dá é de até poder ser um bom negociador para o
México, o que é diferente de ser um mediador para acordos. O candidato da
Coreia do Sul, o ministro de Comércio, Taeho Barq, não deu má impressão. Mas
dificilmente terá apoios importantes, na opinião de alguns participantes. A
candidata da Indonésia, Mari Pangestu, apareceu adoentada, insistiu que atrás
de seu sorriso pode ser dura e tampouco surpreendeu muito.
No último grupo estão os candidatos de Gana, Jordânia
e Quênia. O ganense Alan John Kwadwo Kyerematen é, porém, o favorito na casa de
aposta eletrônica Paddy Power, em Londres.
Os candidatos terão agora fevereiro e março para fazer
campanha. Enquanto isso, em Genebra os embaixadores decidirão quais as regras
que serão utilizadas para as consultas a serem feitas aos países a respeito dos
candidatos.
Assim, provavelmente só em abril começará a série de
consultas aos países. A expectativa é de que inicialmente haverá a eliminação
de dois ou três candidatos, pelo menos. Se não houver uma guerra, como já
ocorreu no passado, com candidato recusando a sair do páreo, no fim de abril a
OMC terá escolhido seu novo diretor-geral.
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