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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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sexta-feira, 10 de junho de 2022

Pequena observação sobre a miséria da política no Brasil - Paulo Roberto De Almeida

Em abril postei o seguinte: 

"quinta-feira, 7 de abril de 2022

Pequena observação sobre a miséria da política no Brasil

Paulo Roberto de Almeida 

Parte da bizarra 3a via (sem Ciro Gomes) promete marchar unida no 1o turno, mas isso foi feito em um simples conchavo de caciques partidários, num acordo SEM QUALQUER PROGRAMA, SEM IDEIAS OU PROPOSTAS, apenas com base em “pesquisas eleitorais”. 

É uma confissão indireta da FALÊNCIA TOTAL da política e dos partidos na nossa “democracia” de baixíssima qualidade.

Os caciques não se deram sequer ao trabalho — certamente muito difícil para homens que só manipulam os indecorosos fundos Partidário e Eleitoral — de elaborar as bases mínimas de uma plataforma de campanha VOLTADA PARA O BRASIL!

Eles só pensam na conquista da máquina do Estado, o principal instrumento do estamento político para à continuidade do patrimonialismo predatório no qual se converteu o sistema político-partidário do Brasil: programa? Para que programa?

Isso é totalmente dispensável e talvez até inútil, para esses fraudadores da democracia e da própria dignidade pessoal.

O candidato, se houver, dessa vergonhosa “3a via” não será definido ao cabo de laboriosas discussões programáticas, pelas quais se poderá (ou se poderia) chegar a uma plataforma de campanha eleitoral e a um PROGRAMA DE GOVERNO PARA O BRASIL! 

NÃO! Isso não existe para esses caciques pilantras: o Brasil não lhes importa o minimo!

Eles sequer se darão o trabalho de discutir princípios, valores, programas e propostas de governo. Nada disso importa.

O candidato será “escolhido” para eles pelas consultas eleitorais conduzidas por institutos de pesquisas, algumas delas possivelmente manipuladas e distorcidas!

Isso é a FALÊNCIA da democracia no Brasil.

Nunca esperei que chegássemos a esse descalabro completo dos valores da democracia!

Paulo Roberto de Almeida

Porto Alegre, 7/04/2022 "


Em 10 de junho continuo pensando o mesmo.


domingo, 30 de setembro de 2018

A política externa dos candidatos - FSP


Candidatos à Presidência propõem guinada drástica na política externa

Bolsonaro promete aproximação com EUA e Israel; Haddad quer resgate da diplomacia lulista

Se um dos atuais líderes nas pesquisas vencer as eleições presidenciais, a política externa brasileira pode sofrer uma guinada drástica.
Jair Bolsonaro (PSL) promete um rompimento com posições diplomáticas tradicionais do Brasil, enquanto Fernando Haddad (PT) propõe uma desconstrução da política externa dos últimos dois anos e o resgate da diplomacia lulista.
Com Bolsonaro, o elemento incerteza é maior —sem nomes óbvios em política externa, a campanha tem contado com colaboradores informais e é difícil discernir o que é slogan eleitoral do que seria realmente posto em prática.
Fã declarado do presidente americano, Donald Trump, Bolsonaro já afirmou diversas vezes que quer aproximar o Brasil dos EUA e de Israel. "Os americanos tiveram um papel extraordinário na nossa história, impediram que nós virássemos uma Cuba em 1964", disse ele, em vídeo neste ano.
O presidenciável emulou seu ídolo ao anunciar que gostaria de transferir a embaixada do Brasil em Israel para Jerusalém e que pretende fechar a embaixada da Autoridade Palestina em Brasília. Nos dois casos, romperia com tradições diplomáticas do Brasil e geraria hostilidade dos países árabes.
"A Palestina não é país, não deveria ter embaixada aqui. Não dá para negociar com terrorista", afirmou em agosto.
O governo brasileiro reconheceu a Palestina como Estado independente em 2010.
Um de seus filhos, o deputado Eduardo Bolsonaro, é ainda mais assertivo em sua defesa de Israel. "Israel abriga em seu território milhões de árabes, dá água, dá hospital para eles", disse. "Hamas, Hizbullah, esses são os verdadeiros terroristas. Israel não lança bomba para cima da Palestina", afirmou em discurso na Câmara, em junho.
Em sua posição pró-Israel, Bolsonaro é influenciado pelos evangélicos e por alguns apoiadores da comunidade judaica conservadora, como Meyer Nigri, fundador da construtora Tecnisa, e o empresário Fábio Wajngarten.
"Esta viagem a Israel, Estados Unidos, Japão, Coreia e Taiwan mostra de quem seremos ser amigos; queremos nos juntar com gente boa", disse Bolsonaro em evento em Taiwan, em março deste ano.
Sua viagem, aliás, causou uma saia justa diplomática. Ele foi o primeiro presidenciável a visitar Taiwan desde que o Brasil reconheceu Pequim como "o único governo legal da China" em 1974.
Em carta, o governo chinês manifestou sua "profunda preocupação e indignação", dizendo que a visita do deputado violava "o princípio de Uma Só China".
Ao longo da campanha, Bolsonaro demonstrou desconfiança em relação à China.
"Está vindo um monte de chinês aqui comprar nossas terras, eles vão quebrar nossa agricultura e dominar nossa segurança alimentar", disse em vídeo, neste ano. "A China não está comprando no Brasil, está comprando o Brasil."
O guru econômico de Bolsonaro, Paulo Guedes, vem se reunindo com Marcos Troyjo, diretor do BRICLab da Universidade Columbia e colunista da Folha. Uma das principais ideias que Troyjo teria discutido com Guedes é a reemergência dos Estados Unidos como grande potência mundial e a metamorfose da China, país que está agregando valor a sua produção, com o Plano China 2030, e que está cada vez mais assertivo no cenário global, com projetos como One Belt, One Road.
Hussein Kalout, secretário de Assuntos Estratégicos do governo Temer, é próximo do vice de Bolsonaro, general Hamilton Mourão (PRTB), e almoçou recentemente com ele e Guedes. Ele nega estar se aproximando da campanha, mas Marcos Degaut, seu sócio e secretário adjunto na SAE até agosto, afirma estar colaborando informalmente.
Degaut diz não ter sido contatado por ninguém do núcleo duro da campanha, apenas por pessoas próximas.
Ele é muito crítico ao Itamaraty, que acusa de manter tradições anacrônicas e ênfase exagerada em multilateralismo. "A OMC está em estado agonizante, até que ponto vamos continuar concentrando nossos esforços nesse tipo de foro multilateral?"
Alguns diplomatas são apontados como próximos de Bolsonaro ou de sua equipe. O embaixador aposentado Pedro Fernando Brêtas Bastos, colaborador do Centro de Estudos Político-Estratégicos da Marinha, é amigo do general Augusto Heleno. "Ninguém vai falar sobre política externa antes do segundo turno", disse Brêtas à Folha.
Ele afirmou que tem conversado com pessoas do entorno do candidato, de maneira informal. E ressalta a importância da aproximação com países de língua portuguesa.

Jair Bolsonaro (PSL)
  • Aproximação com EUA, Israel e Taiwan; restrição a investimentos chineses no Brasil
  • Abertura comercial, com redução de tarifas, e busca de acordos bilaterais
  • Aprofundar integração na América Latina com países que não sejam ditaduras
  • Mudança da embaixada do Brasil em Israel para Jerusalém
  • Pressionar para troca de regime na Venezuela com imposição de sanções sobre o governo

O programa de governo de Haddad promete uma volta da política externa "ativa e altiva". "No governo Dilma, a política externa não deixou de ser altiva, talvez tenha sido um pouco menos ativa. Mas, depois, mudou completamente, foi um desastre", disse à Folha Celso Amorim, chanceler durante o governo Lula (2003-2011) e um dos autores do programa de governo. "Teríamos um trabalho enorme de reconstrução, muita coisa foi desfeita durante o governo golpista de Michel Temer."
Mas Amorim afirma que o mundo mudou e eles se adaptaram. Ele fala na necessidade de reconstruir a Unasul, mas, segundo ele, poderia ser um outro organismo em novo formato, incluindo o México.
Indagado se a nova orientação ideológica no continente —a maioria dos governos agora é de centro-direita— não atrapalharia na integração, Amorim é "paz e amor". "Precisamos trabalhar com a diversidade, o importante é a capacidade de dialogar; [o ex-presidente da Colômbia Álvaro] Uribe, por exemplo, assinou a criação da Unasul."
O ex-ministro diz preferir o multilateralismo, mas admite que "não dá para por todos os ovos na mesma cesta".
Com os Estados Unidos, com Trump ou sem Trump, é preciso ser pragmático, diz Amorim. "EUA são a maior potência do mundo, precisamos ter uma relação pragmática —é só lembrar como o relacionamento entre o ex-presidente Lula e o ex-presidente George W. Bush foi ótimo."

Fernando Haddad (PT)
  • Resgatar a política externa "ativa e altiva" do governo Lula
  • Ênfase em negociações multilaterais, mas busca de acordos comerciais bilaterais também
  • Revitalizar a Unasul ou outro órgão de integração da América Latina
  • Reaproximação com a África e fortalecimento dos Brics
  • Reforma do Conselho de Segurança da ONU
  • Retomada de diálogo com a Venezuela 

A política externa de Geraldo Alckmin (PSDB) é tocada por Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Washington. O partido mantém algumas de suas bandeiras: foco na Ásia, China e Estados Unidos, segurança nas fronteiras, abertura da economia.
Mas há mudanças. Em vez de criar um ministério dedicado ao comércio exterior, como chegou a defender Barbosa, a Camex deveria centralizar a estratégia para o setor. O programa não mais defende que o Mercosul seja flexibilizado para que os países possam buscar acordos comerciais de forma independente.
Alckmin defende a entrada na Parceria Transpacífico e a continuação do processo de adesão à OCDE (organização que reúne nações ricas).

Geraldo Alckmin (PSDB) 
  • Foco nas relações com Ásia, Europa e, principalmente, China e Estados Unidos
  • Restabelecer comunicação com a Venezuela; rechaça intervenção militar 
  • Fortalecer defesa de fronteiras para lidar com crimes transnacionais
  • Manter política de adesão à OCDE
  • Fortalecimento dos Brics
  • Entrada do Brasil no TPP (Parceria TransPacífico) e aceleração de acordos bilaterais

O programa de política externa de Ciro Gomes (PDT) é formulado por Mangabeira Unger, ex-secretário de Assuntos Estratégicos (governos Dilma e Lula).
Prega a inserção do Brasil nas cadeias produtivas globais com políticas de incentivo para a indústria de alta tecnologia e continuidade na aposta no multilateralismo. Para ele, a relação com os Estados Unidos precisa ser de parceria, e não de protetorado, como é hoje; e é preciso rejeitar uma relação neocolonial com EUA e China.
Ciro também se opõe à compra de terras brasileiras por chineses e criticou investimentos da China em Angola.

Ciro Gomes (PDT)
  • Ênfase no multilateralismo, com fortalecimento do Mercosul, Unasul, Brics, acordo do Clima de Paris
  • Estímulo a cadeias produtivas na América do Sul e oposição à instalação de bases militares externas
  • Reaproximação com a África, mas sem atrelar a política "aos interesses de empreiteiras"
  • Relação de parceria com EUA, e não de protetorado
  • Brasil deve mediar conflito na Venezuela, em vez de isolar o país

Já Marina Silva (Rede) enfatiza o desenvolvimento sustentável como linha mestra da política externa e eventual fonte de "soft power". Crítica da política externa petista, ressalta a necessidade de não submeter a política a "relativizações de cunho ideológico".

Marina Silva (Rede)
  • Foco em quatro regiões: América do Sul, América do Norte, União Europeia e Leste Asiático
  • Desenvolvimento sustentável como carro-chefe da diplomacia
  • Ênfase no multilateralismo com aprofundamento do Mercosul e acordo com a União Europeia
  • Aproximação com a África
  • 'Desideologização' da política externa
  • Aumentar o valor agregado das exportações para China

quinta-feira, 19 de julho de 2018

Ricardo Bergamin continua implacavel, sobretudo contra o Centrao - Josias de Souza

Para ele, o chamado Centrão, que é apenas uma ameba gelatinosa, é simplesmente sinônimo de larápios do Tesouro Nacional, meliantes do dinheiro público...
Mas, Josias de Souza também é cruel com os assaltantes dos cofres do Estado.
Paulo Roberto de Almeida 

A suruba da política no Brasil. 
Por ausência total de direita no Brasil o PT será o grande vencedor nas eleições de 2018 para o Congresso Nacional. Em São Paulo o “jurássico” Eduardo Suplicy lidera a corrida para o Senado.
Ser contra o PT, por si só, não pode ser considerado de direita ou liberal. Necessita de um projeto de pensamento e de fé. 
Viva CAZUZA
A tua piscina tá cheia de ratos
Tuas ideias não correspondem aos fatos
O tempo não pára
Eu vejo o futuro repetir o passado
Eu vejo um museu de grandes novidades
O tempo não para
Não para, não, não pára 
Ricardo Bergamini

Nelson Rodrigues

Josias de Souza
19/07/2018 04:35
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https://conteudo.imguol.com.br/blogs/58/files/2018/07/CiroAlckminMastrangeloReinoFolha.jpg
Os partidos do centrão assumiram o comando das arrumações nos bastidores da sucessão de 2018. A cortina ainda está fechada. Mas já se ouve da plateia o ruído abafado da montagem do palco. Nesta quinta-feira, sujos e mal lavados da política se reúnem na casa funcional do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, para refinar o processo de escolha de um protagonista para sua trama. Disputam o tempo de TV e o amor do centrão Ciro Gomes e Geraldo Alckmin. Ex-presidiário do mensalão, Valdemar Costa Neto, que no espetáculo faz o papel de dono do Partido da República, assumiu as vezes de cupido.
Deve-se a Valdemar a perspectiva de reunificação do centrão. O personagem desgarrara-se do grupo para negociar uma aliança com Jair Bolsonaro. Fracassada a tentativa, comunicou aos velhos parceiros que está de volta. Como já foi alvejado pela língua de Ciro, Valdemar tem uma leve queda por Alckmin. Mas informou aos congêneres que topa qualquer negócio, desde que o empresário Josué Gomes da Silva, filiado ao PR, seja acomodado na posição de candidato a vice-presidente. Conforme já noticiado aqui, Josué já havia se colocado à disposição do grupo.

Participam dos entendimentos, além de Rodrigo Maia e do notório Valdemar, o senador Ciro Nogueira (PP), réu na Lava Jato, Paulinho da Força (SD), alvo de inquérito criminal no Supremo, Marcos Pereira (PRB), também pendurado na Lava Jato e ACM Neto (DEM). Consolidou-se entre eles o desejo de que seus respectivos partidos negociem os dotes eletrônicos de maneira unificada.
Fala-se muito em coalizão partidária e programa de governo. Mas a ausência de ideias denuncia, por assim dizer, o embuste. Ganha trinta segundos no horário eleitoral quem for capaz de explicar o que une o centrão além do propósito de invadir cofres públicos. Se alguém não estiver ligando o nome à pessoa, basta recordar que o grosso do atual centrão fez as vezes de milícia parlamentar de Eduardo Cunha, esticando-lhe o mandato e acompanhando-o até a porta da cadeia.
Com poucas variações, esse mesmo condomínio parlamentar dá as cartas há muito mais tempo do que o Tesouro Nacional poderia suportar. Sob FHC, a convivência com a intelectualidade tucana proporcionou ao centrão um excelente merchandising. Sob Lula, o Planalto de fachada operária resultou em ótimos negócios. Sob Dilma, o centrão desistiu de terceirizar o poder ao petismo. Substituiu a preposta de Lula, sem talento para a administração do balcão, por Michel Temer, especialista na matéria.

Nem as almas mais ingênuas acreditariam que partidos identificados com o suborno, o acorbertamento, o compadrio, o patrimonialismo e o fisiologismo percorrem os bastidores das negociações presidenciais com a disposição de passar os próximos anos dedicando-se a outra atividade que não seja a perpetuação dos vícios. Pode demorar mais alguns dias para acomodar todos em suas marcas e decidir quem, afinal, vai levar o tempo de TV do bloco.
Quando a cortina finalmente for aberta, a primeira cena deve ser divertida. Alguém deve achegar-se à boca do palco para anunciar: “Nós apoiaremos…” Ao fundo, os dois candidatos ajustarão a peruca e escolherão o nariz que utilizarão na campanha.

domingo, 22 de outubro de 2017

Seguindo as disputas presidenciais: uma analise das eleicoes de 2002 em politica externa

O texto abaixo nunca foi publicado. Como nos aproximamos das eleições presidenciais de 2018, e eu vou continuar fazendo o que sempre fiz a cada escrutínio eleitoral – que é seguir as plataformas de campanha de cada candidato nos temas de política externa e de relações econômicas internacionais do Brasil – decidi ressucitar a análise que fiz naquela época, sem que ela pudesse ter sido divulgada.
Vou retomar o mesmo hábito em direção das eleições de 2018.
Paulo Roberto de Almeida


O PROJETO EXTERNO COMO PROJETO NACIONAL

A política externa na campanha presidencial de 2002


31 de março de 2002

O Brasil prepara-se para atravessar, desde a redemocratização de 1985, o seu quarto escrutínio eleitoral geral envolvendo uma campanha presidencial. Na campanha de 2002 os temas de política externa estarão bem mais presentes do que em 1989, em 1994 ou em 1994.
Nas primeiras eleições livres para presidente, desde a de 1960, o debate eleitoral esteve dominado e dividido entre as promessas miríficas de um demagogo, Collor, e a utopia socialista de um candidato operário, Lula. Em 1989 defrontaram-se duas concepções do mundo: a modernização capitalista proposta por uma cidadão de baixa estatura moral e o distributivismo fácil de um despreparado bem intencionado. Ganhou a promessa de reformas capitalistas, mas o presidente revelou-se a maior fraude política já conhecida na história do Brasil.
Em 1994, quem ganhou não foi um candidato, mas uma promessa de estabilidade econômica. Levou fácil, no primeiro turno, contra a mesmice de todos os demais candidatos, inclusive o símbolo da classe operária, que continuava a apostar na redenção salvacionista do Estado distributivista. Em 1998, repetiu-se o mesmo cenário: o povo continuou a votar pela estabilidade econômica, contra todas as outras promessas mais ou menos demagógicas das quais ele aprendeu a desconfiar.
Em 2002, o cenário é um pouco diferente. A população continua a preferir a estabilidade econômica (contra as promessas salvacionistas e distributivistas do eterno candidato operário, que aliás está bem mais “neoliberal” desta vez), mas ela também quer dois produtos supervalorizados na atual campanha: emprego (ou pelo menos a perspectiva de) e segurança pessoal, contra a violência urbana e a deliquência. Os estrategistas de campanha terão portanto de conciliar as exigências da clientela eleitoral em matéria de emprego e de segurança com as parcas possibilidades de um orçamento engessado, comprometido em alto grau com o pagamento de juros por causa da dívida pública. Que tenham sorte nessa tarefa de Sísifo!
Um tema, porém, deve distinguir-se dos demais na campanha de 2002: o da política externa, pouco presente nos escrutínios anteriores. Por causa do desastre argentino, da crise do Mercosul, dos dilemas da Alca e das demais negociações em curso (com a União Européia e no âmbito da OMC), e agora com a falência da “democracia bolivariana” do caudilho Chavez da Venezuela, a política internacional do Brasil assumirá um papel jamais visto nas campanhas presidenciais brasileiras. Qual deveria ser a postura dos candidatos nesse terreno?
O candidato do PT, como em todos os escrutinios anteriores, saiu na frente de todos os demais. Muito embora ela ainda não tenha um programa oficial, já se sabe o que ele pensa em política externa: ele favorece uma política agrícola subvencionista e protecionista (como a PAC da UE), ele se posicionou a favor da aliança privilegiada do Brasil com outros grandes países da “periferia” (China, Índia, Rússia) e ele ja se declarou contrário à Alca e a favor de um acordo do Mercosul com a UE.
Não é preciso comentar as ilusões e equívocos de Lula em termos de política econômica internacional (revelada, entre outros, pela sua aversão infantil ao FMI e à globalização), mas uma coisa precisa ficar clara: se ele for eleito, a diplomacia brasileira se retirará das negociações da Alca, deixando vaga a cadeira da co-presidência do processo negociador que o Brasil assumirá com os Estados Unidos a partir de novembro. Ou seja, o Brasil abandona um importante foro negociador da liberalização comercial apenas porque a militância petista tem aversão à Alca (mas favorece um acordo de livre comércio com a UE, sem que se saiba a diferença exata entre um e outro) e acha que esse projeto hemisférico é mais de “anexação” do que de integração. Santa ingenuidade!
O candidato do PPS, Ciro Gomes, foi ainda mais rápido do que Lula e já liberou uma primeira versão do seu programa de campanha, na qual recomenda que o Brasil entre nas negociações da Alca “sem pressa e sem medo”, esquecendo (ou ignorando) que as negociações já começaram e não se sabe de nenhum temor paralizando a diplomacia brasileira (sabe-se de dúvidas e incertezas, mas não se detectou ainda esse medo apregoado). Ciro acredita ainda que o Brasil deve fortalecer seu poder de barganha nesse processo negociando simultaneamente com a UE, a China e a Índia, sem que se saiba como, exatamente, a multiplicação de foros de liberalização comercial com esse parceiros (admitindo-se que seja possível, além da UE, onde o processo envolve o Mercosul) possa alterar significativamente o curso do processo hemisférico.
“Never mind”, diria seu mentor intelectual de Harvard, Mangabeira Unger, pois o Brasil “rejeita a idéia de inevitabilidade da Alca” e acha que a “formação de um espaço das Américas transcende os interesses apenas comerciais”. Conforme essa idéia brilhante, a diplomacia brasileira “insistirá em condicionar a integração comercial a políticas igualizadoras seguindo nisso o modelo da UE e não o do Nafta”. Ele quer ainda livre direito de imigração como parte do acordo, assumindo aqui a causa de milhões de latino-americanos que lutam para entrar nos EUA e realizar seu “sonho americano”, ignorando que os uruguaios também podem temer afluxo similar de milhares de brasileiros. Santa ingenuidade!
O candidato do PSDB, Serra, não disse ainda a que veio, mas parece endossar a maior parte das posições de política econômica e de política externa do atual governo: globalização sim, desde que compatível com nossos interesses e possibilidades, Mercosul também, porque afinal é o que temos como bloco comercial, Alca talvez, desde que satisfeitas determinadas exigências em termos de abertura do mercado americano a nossos produtos competitivos. Ou seja, more of the same, com algumas tinturas desenvolvimentistas e dirigistas, com convém a um antigo expoente do pensamento cepalino.
Mas, precisaremos esperar pela divulgação do programa do candidato do PSDB, provavel vencedor nas eleições de outubro, para analisar com mais cuidado suas propostas de política externa. Pelo que se conhece, ele fará diplomacia como Monsieur Jourdain fazia prosa: de forma involuntária, no caso mediante políticas comercial, industrial e tributária, o que pode não ser de todo mau. Como os diplomatas dependem mesmo das tarifas, dos incentivos fiscais e das regras tributárias para saber até onde podem avançar nas negociações comerciais, Serra pode acabar definindo com clareza os limites e possibilidades de nossa política externa nos próximos anos.
A campanha presidencial de 2002 promete ser movimentada e inovadora, e nela os temas de política externa, a começar pela Alca, assumirão uma importância jamais vista em eleições anteriores. Bom sinal, uma vez que demonstra que o Brasil já está plenamente inserido nos “ares do tempo”, a despeito do que pensam os anti-globalizadores de todos as vertentes. Tanto Ciro Gomes como Serra, dois dos principais candidatos, parecem deixar em aberto as possibilidades do Brasil no processo da Alca, cujo destino será mais determinado pela atitude do Congresso americano do que pelo que digam ou façam os diplomatas.
Só o candidato do PT, Lula, tem uma posição fechada sobre a Alca: ele é contra e no máximo admite um plebiscito nacional, a ser organizado pela CUT, pelo MST e pela CNBB, com resultados mais do que previsíveis. Com esse tipo de atitude principista não é preciso ter política externa: basta providenciar meia duzia de porta-vozes e proclamar os velhos preconceitos de sempre contra o “imperialismo americano” e tudo estará resolvido. Pena que o mundo não é tão simples como apregoa a filosofia do PT. A inconsistência desse tipo de posicionamento em política externa também estará em julgamento nas eleições de outubro.

31/03/2002

quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Eleicoes 2014: CNA promove debate com candidatos a presidente

Uma entre muitas outras frases prometedoras, mas sem compromisso real, de um dos candidatos, Eduardo Campos, do PSB, acompanhando de sua inefável companheira,  inefável Marina Silva, a deusa da floresta:

Ao discutir política comercial, Campos reforça que é fundamental um olhar sobre as relaçoes exteriores apoioado na Constituição. "Não podemos ter uma política externa partidária, mas sim de Estado."

Assim é, se lhe parece...

Ao abrir seu pronunciamento, o candidato Aécio Neves disse que a prioridade número ZERO de seu governo será o combate ao "Custo Brasil". E prometeu criar um superministério da Agricultura, trazendo de volta o que dele foi extraído indevidamente...
Tomara...

Ao fechar sua participação, o candidato Aécio Neves disse que faria com que o Mercosul fosse redimensionado de uma união aduaneira para uma zona de livre comércio. Vai ter de combinar com os demais membros, como é óbvio.

Paulo Roberto de Almeida 

terça-feira, 15 de julho de 2014

Eleicoes 2014: o comercio exterior na plataforma dos candidatos

Presidenciáveis prometem ampliar o comércio com parceiros internacionais

Tradicionalmente, a política externa não tem a mesma prioridade que os assuntos domésticos em campanhas presidenciais. Sob esse aspecto, poucas são as diferenças entre uma e outra diretriz dos programas de governo de Dilma Rousseff (PT), Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB). O que se destaca é que, desta vez, diante do baixo crescimento da economia brasileira, os três candidatos prometem a ampliação do comércio e dos investimentos do Brasil com os parceiros internacionais e não deixam de mencionar a necessidade de fortalecimento do Mercosul.
Presença em grandes fóruns
Aécio defende uma política externa conduzida com base nos princípios da moderação e da independência. Critica a ideologização das relações do Brasil com os países da América do Sul. Sem citar nomes, ele dá a entender que a aliança com os chamados bolivarianos — Venezuela, Bolívia e Equador — deve ser revista.
O tucano não cita a integração Sul-Sul, iniciada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao contrário de Dilma e Campos. Defende a expansão do comércio com países desenvolvidos e em desenvolvimento, e dá um importante sinal ao mercado: deve flexibilizar a norma do Mercosul que impede que países do bloco negociem, sozinhos, acordos comerciais em separado. O PT não pretende rever a regra, e o PSB admite fazer isso, caso realmente seja necessário.
Os três candidatos afirmam que trabalharão para aumentar a presença do Brasil nos grandes fóruns internacionais. Aquecimento global, direitos humanos, paz, democracia e segurança na internet estão entre os temas mais mencionados. Campos e Aécio prometem valorizar o Ministério das Relações Exteriores.
A crise entre Brasil e EUA, causada pela informação de que órgãos de inteligência americanos espionam cidadãos brasileiros, incluindo a presidente da República, é aproveitada no programa de Dilma. “Queremos construir mecanismos que protejam todas as formas de comunicação — a internet, em particular — assegurando a privacidade da cidadania, das empresas e dos governos”, diz um trecho do capítulo do PT que trata de política externa.
Fonte: O Globo

terça-feira, 8 de julho de 2014

Eleicoes 2014: o patrimonio dos candidatos, do mais rico ao mais pobre (zero patrimonio)

Eymael tem maior patrimônio, e Rui Costa Pimenta declara não ter bens

Dados fazem parte de documentos apresentados no registro de candidatura.
Aécio tem R$ 2,5 milhões; Dilma, R$ 1,7 milhão; e Campos, R$ 546 mil.

Do G1, em Brasília, 8/07/2014
PATRIMÔNIO DOS CANDIDATOS À PRESIDÊNCIA
Candidato
Valor declarado
Eymael (PSDC)
R$ 17.009.306,11
Aécio Neves (PSDB)
R$ 2.503.521,81
Dilma Rousseff (PT)
R$ 1.750.695,64
Levy Fidelix (PRTB)
R$ 649.638,19
Eduardo Campos (PSB)
R$ 546.799,50
Eduardo Jorge (PV)
R$ 412.453,12
Mauro Iasi (PCB)
R$ 204.348,57
Luciana Genro (PSOL)
R$ 185.189,95
Pastor Everaldo (PSC)
R$ 121.391,41
Zé Maria (PSTU)
R$ 20.000,00
Rui Pimenta (PCO)
R$ 0,00
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE)
O político e empresário José Maria Eymael (PSDC) tem o maior patrimônio entre os candidatos à Presidência da República - R$ 17 milhões, segundo declarou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no registro de candidatura. Entre os 11 postulantes ao Planalto, Rui Costa Pimenta é o que tem menor patrimônio: declarou à Justiça não possuir nenhum bem neste ano.
Os dados fazem parte dos documentos entregues pelos candidatos para concorrer à Presidência – o prazo terminou no sábado (5) – veja abaixo a lista completa dos candidatos à Presidência e o valor dos respectivos patrimônios.
No patrimônio de Eymael estão imóveis no estado de São Paulo, quatro carros, ações, aplicações e uma balsa salva-vidas, além de um barco.
Aécio Neves tem o segundo maior patrimônio entre os presidenciáveis. Ele declarou ter dois apartamentos e lotes em Minas Gerais, um Land Rover, joias de família, aplicações e ações. Em nota, o senador informou que o patrimônio cresceu em relação à eleição de 2010 porque recebeu herança do pai, falecido em outubro de 2010.
Dilma Rousseff declarou bens que totalizam R$ 1,75 milhão. Há imóveis, lote, um carro e jóias. Ela declarou ter R$ 172 mil em espécie. Em seguida aparece Levi Fidelix, com patrimônio de R$ 649 mil. Ele afirma ter um carro e valores em contas em vários bancos.
Eduardo Campos, que declarou R$ 546 mil, informou ter dois imóveis, lotes, dois carros e cotas de uma agropecuária, além de dinheiro no banco. O candidato do PV à Presidência, Eduardo Jorge, declarou que os bens somam R$ 412 mil – entre eles, estão uma casa, um terreno, dois carros e dinheiro no banco.

sábado, 2 de fevereiro de 2013

OMC: a via-crucis dos candidatos a DG; candidato brasileiro

Matérias de imprensa, 1/02/2013: 


OMC / CANDIDATURA DO EMBAIXADOR ROBERTO AZEVÊDO
O Estado de S. Paulo - ‘Na OMC, não serei mais o embaixador do Brasil’ / Entrevista / Roberto Azevedo
Em sabatina, candidato desvia de temas polêmicos envolvendo o País, entre eles câmbio e protecionismo
Jamil Chade, GENEBRA - Num esforço para ganhar votos e superar o mal-estar deixado pelo Brasil com alguns de seus sócios por conta das barreiras adotadas, o brasileiro Roberto Azevedo, candidato ao cargo de direção da Organização Mundial do Comércio (OMC), se distancia dos temas mais polêmicos da política comercial brasileira e garante que, se eleito, defenderá o interesse de todos os países.
Nesta quinta-feira, o embaixador Azevedo foi sabatinado na entidade, em uma sessão em que foi questionado sobre diversos assuntos. A escolha só ocorrerá em maio. Mas os nove candidatos ao posto sabem que um deslize em Genebra significaria a perda de pontos na corrida.
Azevedo foi questionado pela Coreia sobre protecionismo, mas iniciou sua intervenção esclarecendo que, depois de 17 anos na OMC representando o Brasil, finalmente falaria em nome próprio. "Esta é a primeira vez que, nesse prédio, vou compartilhar minha visão pessoal sobre essa organização, sobre o sistema comercial e sobre onde estamos hoje", disse aos demais embaixadores.
A estratégia não ocorre por acaso. Nos últimos meses, o aumento de barreiras comerciais no Brasil deixou dezenas de parceiros comerciais irritados, a ponto de a Casa Branca enviar uma carta ameaçando retaliar.
O Brasil também irritou muitos membros com a insistência de trazer para a agenda da OMC a questão do câmbio, com a criação de um mecanismo que autorizaria a elevação de tarifas. Para a maioria dos países, isso não passaria de uma forma de o Brasil justificar barreiras. Azevedo deixou claro, agora, que não partirá dele a introdução do assunto na agenda da OMC, se eventualmente for eleito.
Para o embaixador brasileiro, a OMC vive um momento crítico. "O sistema precisa ser renovado ou será incapaz de lidar com as demandas de um mundo em mudança", alertou. Em sua visão, se a Rodada Doha não for concluída, a OMC continuará "fora do radar" do mundo. "Nenhum marketing vai mudar essa realidade. Vamos precisar de um diretor que trabalhe, arregasse a manga e enfrente a situação. Será uma tarefa herculana. Mas precisa ser feita."
Ele também mandou seu recado aos países em desenvolvimento. "O comércio não é o objetivo da OMC. Mas um instrumento para desenvolvimento." Ao final da sabatina, Azevedo falou ao Estado. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Depois de 12 anos de uma negociação sem resultado, a Rodada Doha ainda tem alguma relevância para a economia mundial?
Sim, não tenho nenhuma dúvida disso. Tinha avanços muito importantes previstos na Rodada, em vários setores. Eles são significativos até hoje. Se a Rodada for concluída de maneira positiva, teremos ganhos tanto em acesso a mercados como em disciplinas do comércio. E tudo isso tem um valor econômico muito importante.
Mas há a impressão de que o mundo já deu um passo adiante. O que pode ocorrer com a OMC se o projeto fracassar?
A OMC tem a obrigação de tentar concluir a negociação. O sistema está paralisado. É claro que a OMC é maior que a Rodada. Mas a realidade é que a Rodada emperra o sistema. Então, eu não vejo alternativa que não seja pela Rodada. Podemos tentar algum acordo aqui ou ali, mas a OMC precisa contornar o impasse que vive hoje.
A Coreia o questionou sobre o protecionismo. Qual o risco que isso representa para a economia internacional?
O protecionismo é uma ameaça sempre presente. Países vivem ciclos econômicos diferentes, com momentos mais liberalizantes e outros menos liberalizantes. O que eu disse é que a melhor proteção contra o protecionismo é o próprio sistema multilateral, que estabelece limites para o espaço de política pública que os países podem adotar. A melhor maneira de se evitar um recrudescimento das condições de abertura de mercado é fortalecer o sistema multilateral, negociando. E, para isso, precisamos sair do impasse.
O Brasil tem sido fortemente criticado nos últimos meses por alguns dos parceiros comerciais. A posição do Brasil, adotando medidas protecionistas, pode atrapalhar sua candidatura?
Em primeiro lugar, o governo jamais aceitou e nunca admitiu que estivesse adotando medidas protecionistas. Você pode ou não concordar com essa situação. O governo brasileiro entende que está tomando medidas que são necessárias diante das circunstâncias econômicas que se vive, inclusive à luz da taxa cambial anormal. Em segundo lugar, se eleito diretor da OMC, eu não sou mais embaixador do Brasil. Aí quem terá de defender a agenda brasileira e as medidas brasileiras será o novo embaixador do Brasil. Eu estarei usando um outro chapéu e estarei defendendo os interesses dos membros da OMC e os interesses da instituição.
Nos últimos dois anos, um dos temas que o sr. tratou foi a introdução do câmbio na agenda da OMC. Como diretor, o sr. acredita que o tema ainda terá espaço, depois de ter tantas críticas?
São os governos que precisam definir isso. O diretor não tem pode decidir o que os membros devem ou não falar. Não é uma decisão do diretor. Se alguém quiser introduzir um tema, seja energia, segurança alimentar, ele tem de convencer os demais que o tema deve ser discutido. O diretor-geral que quiser ditar a agenda da OMC perde o emprego rapidamente.
Entre os nove candidatos, três são latino-americanos. Por que Brasil não se comprometeu em apoiar apenas a América Latina, se por acaso o sr. for eliminado?
A posição do governo foi uma posição sistêmica e coerente com práticas de organismos internacionais. Há uma alternância entre desenvolvidos e em desenvolvimento. Outro conceito é a rotatividade geográfica. Como já houve um asiático na OMC, seria a vez de um latino-americano ou africano.
Folha de S. Paulo - Candidato do Brasil à direção da OMC se afasta de posição do país
Política comercial tida como protecionista pode atrapalhar Azevêdo
DE SÃO PAULO - Tanto na sua apresentação ao Conselho-Geral da OMC (Organização Mundial do Comércio) quanto na entrevista coletiva que a seguiu, o candidato do Brasil à direção-geral do organismo, embaixador Roberto Azevêdo, fez questão de marcar sua distância da posição brasileira sobre temas de comércio.
Tida como protecionista, a política comercial do Brasil pode ser uma pedra no sapato do candidato -representante do país na OMC desde 2008- na disputa à liderança da entidade voltada para a liberalização do comércio.
"Agora sou candidato. Fiz questão de que eles soubessem que estou aqui expressando minhas opiniões, e não as do governo brasileiro. É importante que isso fique bem claro desde o começo", disse, em entrevista transmitida via internet, de Genebra.
O brasileiro voltou a criticar a paralisia na área de negociações da OMC e disse que, "a não ser que a OMC volte a apresentar resultados", continuará "fora do radar".
Para Azevêdo, o grande desafio do próximo diretor-geral será destravar a rodada Doha (de liberalização do comércio) -e que, para isso, é preciso "um novo olhar".
"Se você fizer as coisas da mesma maneira, a chance de avançar é zero. Tem que fazer diferente. Como? Eu não sei", reconheceu. "Mas muitas vezes, quando ajudei a destravar impasses, também não sabia."
Azevêdo disputa o posto com outros oito candidatos -dois deles latino-americanos. O mexicano Herminio Blanco já sugeriu que os nomes da região se unam para fortalecer a candidatura do "melhor".
O Brasil, porém, parece pouco disposto a unir forças com os latinos. Ontem, Azevêdo desconversou sobre a ideia: "O Brasil deixou claro que apoia um novo diretor-geral de um país em desenvolvimento", disse, incluindo os africanos entre a preferência.
Na última semana, o Brasil enviou um alto diplomata à cúpula da União Africana, na Etiópia, com cartas a mais de 20 países pedindo apoio a Azevêdo. A ideia é que o brasileiro seja a segunda opção desses países, que devem apoiar, primeiro, Gana ou Quênia. (ISABEL FLECK)
Folha de S. Paulo - Embaixador tem discurso de um profissional do comércio / Análise / Clóvis Rossi
O discurso com que o embaixador Roberto Azevêdo se apresentou ontem a seus pares da Organização Mundial do Comércio é uma peça típica de um profissional do comércio e da negociação.
O embaixador sabe perfeitamente que o maior obstáculo que sua candidatura enfrenta é o rótulo de protecionista que está sendo aplicado às políticas comerciais brasileiras e, por extensão, ao que as defende em Genebra.
Por isso mesmo, Azevêdo, como a Folha já havia antecipado domingo, tratou de deixar claro o que deveria ser óbvio, mas que disputas eleitorais acabam obscurecendo: Roberto Azevêdo, como embaixador do Brasil, defende as posições do governo brasileiro; Roberto Azevêdo, como diretor-geral da OMC, defenderá que "comércio é um elemento indispensável para o crescimento e desenvolvimento de qualquer economia".
O embaixador tem dito a amigos que nem sequer seria candidato se não acreditasse nas virtudes do livre-comércio, que, enfim, é a missão central atribuída à OMC. Mas, atenção, não é o comércio como um fim em si mesmo, mas "como um meio de melhorar as condições de vida das famílias no mundo real".
Azevêdo adiantou, no entanto, poucas pistas sobre o que pretende fazer para tirar do pântano a Rodada Doha, o mais ambicioso projeto de liberalização comercial que o mundo lançou, já faz 12 anos.
Para o diplomata brasileiro, na verdade são quase "duas décadas de estagnação no front negociador", contando o tempo perdido desde a transformação do antigo Gatt (Acordo Geral de Tarifas e Comércio) em OMC, em 1995, até o lançamento da Rodada Doha (2001).
Azevêdo limitou-se a dizer que "o sistema [multilateral de comércio] precisa ser atualizado ou logo se tornará incapaz de lidar com as demandas de um mundo transformado".
Que atualizações, ele já tem na cabeça, mas não era o momento de dizer porque a etapa de ontem faz parte do que, no jargão da OMC, se chama de "concurso de Miss Simpatia", uma avaliação mais da personalidade do candidato do que propriamente do conteúdo de suas propostas.
Brasil Econômico - Candidato à direção da OMC, Azevêdo promete que retomará rodada Doha
Em discurso de apresentação ao cargo, embaixador brasileiro aponta paralisia do órgão de comércio mundial
Ruy Barata Neto, de Brasília - A retomada das negociações da Rodada Doha, paralisada há mais de 11 anos, será o principal desafio a ser perseguido pelo embaixador brasileiro Roberto Carvalho de Azevêdo caso assuma a diretoria-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC). Representante permanente do Brasil no órgão desde 2008, Azevêdo aparece como um dos favoritos da disputa à sucessão do francês Pascal Lamy, cujo mandato termina em agosto.
Responsável por encerrar, ontem, a fase de apresentação dos candidatos, Azevêdo aposta na sua qualificação técnica para ganhar a disputa e conseguir destravar as negociações da rodada Doha durante o mandato. "Tenho o expertise necessário para fazer isso porque já pude atuar tanto no nível técnico quanto no estratégico, além de contar com a confiança dos membros da OMC, ter um histórico de transparência nas negociações e diálogo com as mais diferentes tendências da organização", afirma Azevêdo.
Um dos concorrentes mais fortes do embaixador brasileiro é o mexicano Herminio Blanco, economista e ex-ministro do comércio e indústria. A experiência ministerial é apontada como uma vantagem em relação ao concorrente brasileiro que ainda não assumiu tal cargo. Mas, segundo Azevêdo, esta lacuna não deverá ser um problema na disputa.
Na avaliação do brasileiro as soluções para o impasse da Rodada Doha dependerão do conhecimento a cerca do processo do histórico das negociações da OMC, sobretudo no âmbito técnico. "É preciso expertise para se achar solução, e isso, francamente, não acontece no nível ministerial", afirma. "Não estou dizendo que ex-ministros não são capazes de fazê-lo, mas você tem que observar o caminho antes de se fechar um acordo."
Azevêdo também lembrou que até antes da criação da OMC, em 1994, nenhum dos diretos gerais do órgão equivalente eram de nível ministerial. "Todas as rodadas de negociação foram concluídas por estas pessoas", afirma. "Aliás, desde 1995, quando a diretoria passou a ser composta por ministros, nenhuma rodada foi concluída."
Ex-ministro das relações exteriores do governo Fernando Henrique Cardoso, Luiz Felipe Lampreia afirma que a experiência de Azevêdo na OMC o torna o mais qualificado entre os concorrentes ao cargo. Ele concorda com Azevêdo a respeito da urgência no avanço das negociações de Doha. "Se não tiver novos avanços como as rodadas de liberalização do comércio e de redução de obstáculos comerciais, a OMC esta fadada a ser apenas um mecanismo de solução de controvérsias", afirma.
Segundo Lampreia, as chances do embaixador brasileiro são grandes por conta da predisposição dos membros da OMC em elegerem um diretor-geral representante de um país emergente. "É a bola da vez", afirma. Além de Blanco, está na disputa Anabel González, ministra de comércio exterior da Costa Rica, como a terceira representante da América Latina. De países da África aparecem Alan John Kwadwo Kyerematen, ex-ministro de Comércio e Indústria de seu país de Ghana, e a embaixadora Amina C. Mohamed, do Kenya.
Ao todo, disputam nove candidatos. Além dos já citados, estão no páreo representante da Indonésia, Nova Zelândia, Jordânia e Coreia do Sul. O novo diretor geral deve ser nomeado por consenso antes do fim de maio e assumirá suas funções no começo de setembro.
Valor Econômico – Brasileiro é destaque na apresentação de candidatos à OMC
Por Assis Moreira | De Genebra
Encerrada a fase de apresentação dos nove candidatos para substituir Pascal Lamy na direção-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), dois ou três candidatos se destacaram, na percepção de vários negociadores em Genebra. Os candidatos da Nova Zelândia, Tim Groser, e do Brasil, Roberto Azevedo, são apontados como os que tiveram melhor desempenho diante dos 158 países membros. Alguns delegados incluem a candidata da Costa Rica, Anabel Gonzalez, que teria ido melhor do que se esperava.
A apresentação dos candidatos na OMC é um processo necessário, mas não decisivo. Se acertou no desempenho, se mantém no páreo. Se errou, pode perder algum apoio. Mas a decisão de cada país sobre quem vai apoiar será tomada nas capitais, no jogo de barganhas e consultas com os parceiros
A diferença é que Tim Groser, de país desenvolvido e que já comandou a OMC, pode ter pouca chance de prosperar, a não ser que os países desenvolvidos queiram comprar uma enorme briga com países em desenvolvimento, que consideram ser a vez de um de seus candidatos.
Para Azevedo, muito agora dependerá da movimentação de Brasília, dos contatos diretos da presidente Dilma Rousseff com outros presidentes em busca de apoio. Curiosamente, muitas delegações mencionam telefonemas recebidos, mas nenhum fala de chamada do Palácio do Planalto.
Nas apresentações, nenhum dos nove candidatos correu grande risco. Mas, dependendo de quem se ouvia, os comentários eram de que alguns candidatos teriam chocado seus próprios apoiadores, sobretudo os de Gana e Quênia, aparentemente mais interessados em tranquilizar os países desenvolvidos.
Houve repetição de muita banalidade sobre o papel da OMC, o que cada um acha que pode fazer etc. A falta de humildade também parece ter atacado os candidatos. Tudo é usado para carregar a favor ou contra o favorito.
Pelo que se deduz das percepções, no grupo do meio aparecem três candidatos.
O mexicano Herminio Blanco deixou poucas lembranças. Na verdade, a impressão que ele dá é de até poder ser um bom negociador para o México, o que é diferente de ser um mediador para acordos. O candidato da Coreia do Sul, o ministro de Comércio, Taeho Barq, não deu má impressão. Mas dificilmente terá apoios importantes, na opinião de alguns participantes. A candidata da Indonésia, Mari Pangestu, apareceu adoentada, insistiu que atrás de seu sorriso pode ser dura e tampouco surpreendeu muito.
No último grupo estão os candidatos de Gana, Jordânia e Quênia. O ganense Alan John Kwadwo Kyerematen é, porém, o favorito na casa de aposta eletrônica Paddy Power, em Londres.
Os candidatos terão agora fevereiro e março para fazer campanha. Enquanto isso, em Genebra os embaixadores decidirão quais as regras que serão utilizadas para as consultas a serem feitas aos países a respeito dos candidatos.
Assim, provavelmente só em abril começará a série de consultas aos países. A expectativa é de que inicialmente haverá a eliminação de dois ou três candidatos, pelo menos. Se não houver uma guerra, como já ocorreu no passado, com candidato recusando a sair do páreo, no fim de abril a OMC terá escolhido seu novo diretor-geral.