1) Em um ano eleitoral, nada como dar um presente às empreiteiras, sabendo que o dinheiro depois vai pingar do outro lado; isto se chama...
2) Em matéria de eletricidade, a gerentona do setor foi quem começou o desmantelamento de qualquer regulação racional, atuando segundo o puro arbítrio e os instintos anti-empresariais; quem paga a conta são todos os brasileiros, para um desastre montado inteiramente no Planalto, desde 2003...
3) Quando se fala de Copa, justamente se fala muito e se faz muito pouco, quase nada: vamos ficar com elefantes brancos e uma conta enorme para pagar, durante anos...
Sem dúvida: ter três editoriais ao mesmo tempo, sobre problemas que têm uma origem similar é um retrato perfeito da qualidade, ou falta de, do governo companheiro.
Mais um pouco eles conseguem três editoriais negativos em três jornais ao mesmo tempo...
Paulo Roberto de Almeida
A mão pesada da presidente
07 de janeiro de 2014 | 2h 06
Editorial O Estado de S.Paulo
Na véspera do Natal, quando o País todo estava olhando para o outro lado, a presidente Dilma Rousseff deu um presentaço a si mesma - e, de quebra, aos grandes grupos que fazem negócios com o setor federal. Eliminou sumariamente da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2014, sancionada naquele dia, as referências de preços que há 14 anos figuravam no seu texto, como parâmetros para a contratação de obras rodoviárias e de construção civil. O assunto é árido, mas poucos hão de ser mais importantes quando estão em jogo as normas de controle dos gastos em infraestrutura do Estado nacional. Eis por que se faz necessário detalhar a história do que outra coisa não é senão uma demonstração da falta de limites da presidente - motivada, em derradeira análise, pelo desastre administrativo que é a marca de seu mandato.
Em regra, quando o Executivo define projetos nas áreas citadas, o seu custo é calculado segundo dois parâmetros. Um é o Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (Sinapi), com base em valores verificados mês a mês em âmbito nacional. Outro é o Sistema de Custos Referenciais de Obras Rodoviárias (Sicro) atualizado a cada dois meses. Essas tabelas são a primeira linha de defesa contra o sobrepreço das empreitadas. No governo Lula e nos anos anteriores do período Dilma, o Planalto tentou removê-las da LDO, mas recuou diante das resistências parlamentares. Mas, em abril passado, ao apresentar a sua proposta orçamentária para este ano, a presidente não apenas deixou de nela incluir os mencionados parâmetros, como, pior ainda, os alojou em um decreto.
Pior ainda porque, se ela realmente quisesse "perenizar", no jargão oficial, as referências - a LDO, afinal, muda de ano para ano -, poderia fazê-lo mediante projeto de lei. Mas, a intenção era outra, obviamente: afrouxar o controle dos gastos com obras, mediante mudanças que os decretos presidenciais proporcionam aos seus signatários. Dito de outro modo, a pretexto de superar a transitoriedade dos Orçamentos, Dilma degradou em decreto o que estava no bojo de uma Lei Complementar, como a LDO - o mais alto instrumento legal do País, abaixo apenas da Constituição e que exige maioria qualificada para passar no Congresso. Pois bem, quando a expurgada LDO de 2014 passou a tramitar, os parlamentares nela repuseram o conteúdo suprimido. E foi isso que a presidente vetou em 24 de dezembro, como se colocasse na árvore de Natal do gabinete um regalo inestimável para as empreiteiras que de há muito pressionam pela flexibilização dos parâmetros de referência do custo de obras.
Essa é uma possibilidade objetiva criada pelos vetos, ainda que a intenção de Dilma tenha sido, com toda a certeza, expandir o seu poder pessoal, no bojo de uma desesperada tentativa de atribuir a terceiros - no caso, o Parlamento - o notório fracasso de sua gestão. Não é a primeira vez que ela tenta remediar o irremediável neste governo aparelhado e, por isso mesmo, destituído de capacidade administrativa. Foi o caso do esperto Regime Diferenciado de Contratações (RDC) que conseguiu aprovar no Congresso em 2011, alegadamente para desburocratizar a execução das obras para a Copa e os Jogos Olímpicos. Não é preciso ser presidente da Fifa ou do Comitê Olímpico Internacional para saber a quantas desanda a infraestrutura para as competições. O sistema - um drible na Lei de Licitações - acabou sendo estendido para as obras do SUS e o PAC. Fez pouca ou nenhuma diferença para o programa. É o que não se cansam de mostrar os levantamentos independentes sobre o seu desempenho.
Os vetos natalinos de Dilma, que deixaram o campo completamente entregue às implicações do decreto de abril, inquietam o Tribunal de Contas da União (TCU). O seu presidente, Augusto Nardes, compara a peça a uma portaria "que eu aprovo e, a qualquer momento posso modificar". Ao contrário do que quer fazer crer o Planalto, o fato de serem complexos os índices que nela foram abrigados não os torna imunes à mão pesada da chefe do governo. Quem pode o mais, pode o menos, ensina o ditado. E o mais ela já fez, com característica soberba - para não falar em descaramento.
Nova manobra criativa
07 de janeiro de 2014 | 2h 06
Editorial O Estado de S.Paulo
Na undécima hora, quando faltavam menos de duas semanas para o fim do ano, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) resolveu adiar para 2015 a aplicação de bandeiras tarifárias nas contas de luz, medida que deveria entrar em vigor em 1.º de janeiro de 2014. Pelo sistema previsto, as contas passariam a exibir uma bandeira impressa em cor verde se os custos das distribuidoras de eletricidade fossem os normais (abaixo de R$ 200 por MWh), sem recurso à energia gerada por termoelétricas. A bandeira passaria a ser amarela toda vez que o custo de operação ficasse entre R$ 200 por MWh e R$ 350 por MWh e seria vermelha se superasse essa última marca. A explicação da agência reguladora é de que os consumidores não foram suficientemente informados e algumas distribuidoras não se prepararam no prazo previsto para implantação do sinal de alerta de aumento da conta de luz. O mercado não se deixou enganar por essa balela e interpretou a decisão como mais uma daquelas manobras que o governo tem utilizado para represar a inflação.
Na realidade, o governo teme que, se o sistema de bandeiras tarifárias fosse implantado já em janeiro, poderia contribuir para um repique inflacionário no início do ano, o que transmitiria uma imagem negativa para ele, com repercussões nos meses seguintes - quando as eleições estarão ainda próximas. Com os reservatórios de hidrelétricas em baixa neste verão em algumas regiões, notadamente no Nordeste, dá-se como certo que haverá um custo adicional para as distribuidoras. Se o sistema entrasse em vigor, levaria à impressão de bandeiras amarela ou vermelha nas contas, uma vez que um número maior de termoelétricas teria de ser ligado para suplementar a geração hidrelétrica, e as contas subiriam.
Há mesmo quem calcule que o governo fará tudo o que puder - e a suspensão das bandeiras é parte desse esforço - para evitar que a taxa de inflação medida pelo IPCA em janeiro de 2014 não supere 0,86%, taxa registrada no mesmo mês de 2013. O adiamento do uso de bandeiras possibilitaria um "alívio" calculado em 0,13%, o que seria de grande utilidade para evitar que a inflação de janeiro atinja 1%, o que seria considerado um desastre.
Como em toda medida relativa a preços administrados, há quem ganhe e quem perca. A Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) considerou a medida positiva. Em nota, afirmou que "o prazo estava muito apertado para as indústrias se adaptarem ao novo mecanismo de cobrança". A entidade lembrou que, em setembro, já havia alertado de que o sistema elevaria o custo de energia a "patamares preocupantes".
De outra parte, perdem as distribuidoras de eletricidade, que só conseguem repassar sua elevação de custos nas datas anuais de reajuste de tarifas. O sistema de bandeiras permitiria que repassassem imediatamente o eventual ônus com o uso maior de termoeletricidade. Com o novo mecanismo preconizado pela Aneel, e agora adiado, poderiam equilibrar mensalmente suas receitas com os custos mais pesados que teriam de arcar, como assinala a Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee).
Isso, naturalmente, geraria uma nova disputa no campo energético, que caberia ao governo arbitrar, em meio a tantas desavenças que têm caracterizado a relação entre o setor elétrico e o Planalto. Não se pode deixar de lembrar, porém, que, sendo 2014 um ano eleitoral, não convêm aos interesses do PT e de partidos aliados que as contas de luz pagas pelos consumidores - não só os industriais e comerciais, mas principalmente os residenciais - subam demais, especialmente em regiões em que o recurso à energia termoelétrica é mais frequente, como o Nordeste - justamente onde o PT é mais forte.
A solução pode ser a concessão de subsídios às distribuidoras, à custa do Tesouro Nacional. Isso significa mais um elemento de pressão sobre a política fiscal. Ou seja, os custos adicionais das distribuidoras nesta época do ano acabarão sendo pagos por todos os contribuintes e não deixarão de influir a médio prazo sobre a inflação, que tem no desequilíbrio fiscal uma de suas causas básicas.
A Copa do atraso e da gastança
07 de janeiro de 2014 | 2h 07
Editorial O Estado de S.Paulo
Atraso nas obras, rapidez na resposta: a presidente Dilma Rousseff reagiu prontamente aos comentários do presidente da Fifa, Joseph Blatter, sobre a demora na preparação da Copa do Mundo de 2014. "Amamos o futebol e por isso recebemos esta Copa com orgulho e faremos a Copa das Copas", proclamou a presidente pelo twitter. "É o país mais atrasado desde que estou na Fifa. E foi o único que teve tanto tempo para se preparar", disse o dirigente em entrevista ao jornal suíço 24 Heures. Publicado o comentário, o Ministério do Esporte logo divulgou em nota oficial a promessa de conclusão dos preparativos "a tempo para a Copa" - garantia desnecessária, se o governo houvesse iniciado muito mais cedo os investimentos necessários. Presidente da federação desde 1998, Blatter entrou na organização em 1975, há quase 40 anos. Ele se referiu a esse período, quando afirmou nunca ter visto uma preparação com tantos atrasos.
O governo brasileiro, chefiado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, assumiu em 2007 o compromisso de organizar a Copa do Mundo programada para sete anos depois. Nada, ou quase nada, foi investido nos quatro anos seguintes. O trabalho ficou para a gestão da presidente Dilma Rousseff.
Só em janeiro de 2010, no começo do último ano de seu mandato, o presidente Lula instalou o comitê responsável pela organização do evento. Ao mesmo tempo, anunciou a destinação de R$ 20 bilhões - do Tesouro Nacional, do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Nessa altura, as estimativas iniciais de custos já estavam estouradas. Em agosto do ano passado, estavam prontos seis dos estádios previstos e continuavam as obras em outros seis. A projeção do investimento havia passado dos R$ 2,8 bilhões anunciados em 2007 para R$ 8 bilhões, com aumento de 285%. O novo valor superava a soma das verbas aplicadas em 12 estádios alemães e em 10 sul-africanos (equivalentes a R$ 6,9 bilhões) para as Copas de 2006 e de 2010.
O planejamento deficiente e a má gestão produziram mais que o enorme atraso no início das obras. Elevaram custos, dificultaram o acompanhamento dos gastos e resultaram em várias irregularidades na elaboração e na execução dos projetos.
Em junho de 2011 o Tribunal de Contas da União (TCU) já reclamava da falta de informações claras e atualizadas sobre as obras de estádios, de mobilidade urbana, de portos e aeroportos e também de programas de segurança e vários outros de natureza organizacional. Em relatórios anteriores, o Tribunal já havia cobrado do Ministério do Esporte informações detalhadas para a montagem do cronograma das auditorias.
Naquela altura, meados de 2011, a Matriz de Responsabilidades da Copa indicava uma previsão de gastos de R$ 23,7 bilhões. A projeção mais recente incluída no Portal da Transparência, do governo federal, indica investimentos de R$ 25,9 bilhões, provavelmente subestimada, segundo analistas. Desse total, projetos no valor de R$ 17,2 bilhões foram contratados e apenas R$ 8,6 bilhões (33,2%) foram executados. Dos R$ 6,7 bilhões previstos para aeroportos, foi contratado R$ 1,8 bilhão e desembolsados R$ 899,6 milhões (13,3%). Dos R$ 7,9 bilhões estimados para mobilidade urbana, foram contratados R$ 6,3 bilhões e pagos (executados) R$ 2,6 bilhões (32,9%).
Para facilitar a contratação de obras, o Executivo foi autorizado pelo Congresso, em 2011, a adotar o Regime Diferenciado de Contratações, menos rigoroso que o sistema normal de licitações. A exceção valeria, inicialmente, para contratos para as Copas das Confederações e do Mundo e para os Jogos Olímpicos. Mas a facilidade foi estendida a projetos do Programa de Aceleração do Crescimento e do Sistema Único de Saúde.
Apesar dessa flexibilidade, a maior parte das obras destinadas à Copa do Mundo continua com grande atraso e os custos finais serão com certeza bem maiores que os estimados inicialmente. Talvez a Lei de Licitações tornasse um pouco mais lentas as contratações. Mas o problema real estava em outra parte - na incompetência gerencial do governo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comentários são sempre bem-vindos, desde que se refiram ao objeto mesmo da postagem, de preferência identificados. Propagandas ou mensagens agressivas serão sumariamente eliminadas. Outras questões podem ser encaminhadas através de meu site (www.pralmeida.org). Formule seus comentários em linguagem concisa, objetiva, em um Português aceitável para os padrões da língua coloquial.
A confirmação manual dos comentários é necessária, tendo em vista o grande número de junks e spams recebidos.