Rubens Barbosa
O Estado de S.Paulo, 14/04/2015
A defesa
nacional e as relações exteriores, dois setores de crucial importância para
resguardar os interesses do Estado, foram relegadas a um perigoso segundo plano
nos últimos anos. A perda de relevância política associada à decisão
governamental de reduzir a participação do Ministério da Defesa e do Itamaraty
no Orçamento Geral da União estão trazendo grandes problemas operacionais que
põem em questão a própria segurança nacional.
Neste
artigo vou limitar-me à área da Defesa, identificando concretamente alguns
problemas que afetam as atividades das três Forças e tornam mais difíceis o
exercício, de forma eficiente, de suas missões constitucionais e o
desenvolvimento dos projetos em execução, alguns dos quais urgentes e de grande
significado para a projeção externa do Brasil.
O
Orçamento Geral da União atribui ao Ministério Defesa apenas 1,3%, abaixo das
necessidades das Forças Armadas. A redução de recursos para o PAC trouxe um
corte de R$ 1,6 bilhão para alguns dos projetos mais importantes da Defesa. O
forte contingenciamento em 2015 trará sérios prejuízos à manutenção das
estruturas físicas, à aquisição de armamentos convencionais, à qualidade dos
serviços prestados, incluindo, o que é mais preocupante, as atividades de
formação, treinamento e aperfeiçoamento de pessoal, que no caso das Forças
Armadas é altamente especializado e relevante para a segurança do País.
No
Exército, a escassez de recursos é sentida não só na modernização dos
equipamentos, como na execução de sete projetos estratégicos e vários projetos
e programas setoriais em andamento. Os projetos Guarani (família de blindados
sobre rodas), Sisfron (Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras),
Defesa Antiaérea, Astros 2020 (sistema de artilharia), Defesa Cibernética e
Recop (Recuperação da Capacidade Operacional da Força Terrestre) têm recebido
verbas abaixo da previsão, atrasando sua implantação.
Também
por causa dos cortes orçamentários impostos às três Forças, o prazo final de
entrega das 50 aeronaves EC-725 (Caracal) que estão sendo montadas na Helibras
para o Exército, a Marinha e a Aeronáutica passou de 2017 para 2019.
Quanto à
Marinha, a esquadra está próxima de um colapso inaceitável. A fragata
brasileira Constituição, navio-capitânia da força multinacional que patrulha o
litoral do Líbano, quebrou na costa libanesa no fim do mês passado. A avaria é
tão grave (a fragata vai completar 37 anos de uso!) que foi preciso despachar
um navio-patrulha (menor em tamanho e em capacidades) para substituí-lo na
missão. Com isso - em outro vexame nacional - o Brasil se arrisca a perder a
liderança da missão, integrada por 15 países.
Por falta
de recursos a Marinha deixou de fazer a manutenção necessária nas suas corvetas
da classe Inhaúma, que se encontram paradas há mais de dois anos. Noticia-se
também a desativação de duas das três fragatas Tipo 22 (classe Greenhalgh), de
procedência britânica. Todos esses navios têm, aproximadamente, 30 anos de uso.
Alguns
esquadrões navais da Marinha - como o da Flotilha da Amazônia e o da Força de
Minagem e Varredura - estão completando 40 anos com os mesmos navios e nenhuma
perspectiva de renovação desses seus meios. Isso implica, naturalmente,
defasagem tecnológica e adestramento das tripulações fora da realidade da
guerra moderna.
Para um
país das dimensões e dos interesses do Brasil, a Marinha, na prática, está
reduzida a 10 navios: 1 submarino, 3 fragatas da classe Niterói, 2 fragatas
Tipo 22), 1 corveta e 3 navios-patrulha. O programa Prosuper, que incorporaria
novas embarcações (5 fragatas e 5 navios-patrulha) está paralisado.
No tocante
à Força Aérea, a modernização dos 43 jatos de ataque A-1 (AMX) da FAB - serviço
liderado pela Embraer com a participação de empresas brasileiras e estrangeiras
- está praticamente parada. Até agora foram entregues apenas dois A-1M. O
cronograma dessa remodelação já está com sete anos de atraso. Agora há rumores
de que a FAB não fará o upgrade em todas as aeronaves - talvez só em 30 delas.
Também
falta dinheiro para que a FAB possa contratar entre 8 e 12 caças Gripen C
(versão anterior à do Gripen NG, vencedor do programa FX-2) a fim de prover a
capital da República de alguma proteção aérea atualizada. As aeronaves também
seriam muito importantes para ir familiarizando os pilotos de combate
brasileiros no manejo do jato sueco. O leasing de cada Gripen C custa US$ 10
milhões por ano.
Por falta
de recursos nossa Força Aérea também adiou sine die o projeto de comprar um
lote de jatos de treinamento para pilotos de combate. Diante dessa dificuldade,
os aviadores precisam passar diretamente da fase de adestramento no avião de
treinamento Tucano - um monomotor turboélice - para o manejo do caça
supersônico F-5.
Empresas
líderes no atendimento aos programas das Forças Armadas, como Embraer, Helibras
e a Itaguaí Construções Navais (construção de submarinos) já sentem os efeitos
dos atrasos nos pagamentos que deveriam receber em 2014. O caso da Embraer é
ainda mais grave. Diante da falta de repasses de dinheiro pelo Comando da
Aeronáutica, a empresa - que fechou 2014 com um cash flow negativo em razão dos
atrasos nos recebíveis do governo - está tendo de bancar com recursos próprios
o desenvolvimento do segundo protótipo do jato cargueiro KC-390.
A falta
de recursos adequados está prejudicando programas de significado estratégico e
político, como o conjunto de atividades relacionadas com o Programa Espacial
Brasileiro: o aproveitamento comercial da Base de Alcântara, o desenvolvimento
do projeto para o veiculo lançador de satélites e a fabricação de satélites
comerciais.
*Rubens
Barbosa é membro do Conselho Superior de Defesa da FIESP
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