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sábado, 21 de abril de 2012

De volta ao problema das "injusticas sociais" em diplomacia: dia do diplomata

O dia do diplomata, no Itamaraty, em 20 de abril de 2012, aos cem anos da morte do Barão do Rio Branco, não foi o dia Barão, que não apenas não foi exatamente homenageado, mas foi especialmente criticado, por ter sido homem, branco, de origem privilegiada, nascido na capital do Império, e todos os outros subentendidos que daí se depreendem. 
Foi pelo menos isso que se pode reter, e assim foi visto por mim e por meu amigo Mario Machado, da cerimônia de formatura da turma que homenageou uma colega diplomata morta em função do cumprimento do dever, homenageada por ser mulher, por ser negra, e por ser do Acre, mais exatamente de Rio Branco, a capital do estado (antigo território) que leva o nome do negociador que incorporou o território então boliviano à jurisdição soberana do Brasil, num processo conduzido por aquele que era, digamos assim, oposto à presença de mulheres e de negros na diplomacia brasileira.
Transcrevo abaixo o post colocado pelo Mario no seu blog Coisas Internacionais, que também traz link para os discursos pronunciados na ocasião.
Se ouso acrescentar um último comentário, seria este: se o Itamaraty só tem um quarto de mulheres em seu corpo diplomático, a culpa é da instituição, dos exames, do processo de seleção. Deveria haver, além da cota para deficientes físicos (constitucional), das bolsas exclusivas para afrodescendentes e da cota para os mesmos, na primeira fase do concurso, uma outra cota para mulheres? Ou uma cota para negros? Para não nascidos na capital? Estranho...
Outros discursos foram pautados pelo tema da justiça social.
Quando ouvimos essa palavra, é inevitável que pensemos em alguém, saint-simoniano, na melhor das hipóteses, fabiano, na média hipótese, ou bolchevique, na pior, que pretende impor um pouco mais de igualdade pelo velho remédio mais rápido: tirar de quem tem muito para dar aos que supostamente não têm nada. No plano internacional, é a velha conversa da transferência de tecnologia e da assistência ao desenvolvimento.
As pessoas não percebem o quanto estão sendo contraditórias: mesmo a oradora da turma falou em aumento da cooperação técnica brasileira para ajudar no desenvolvimento "autônomo" de outros países, menos desenvolvidos. Pois é...
Mas vários equívocos foram cometidos nos pronunciamentos, a começar pela afirmação de que o mundo está cada vez mais desigual, o que é exatamente o contrário da realidade. O Brasil também foi apontado como país diferente, que está retirando pessoas da pobreza, quando diversos outros países estão fazendo isso mais rapidamente e melhor.
Bem, completo aqui o post com esta transcrição.
O Mário, como eu, escreve rápido, na própria janela, daí pequenos erros de redação, digitação, acentuação, por vezes concordância.
Eu ainda cometo erros mais terríveis, ao misturar palavras francesas ou inglesas com o português, aportuguesando alguns conceitos que foram involuntariamente ou inconscientemente pensados em outras línguas, como esse diabo de "frequentação". Assim acontece com quem faz muitas coisas ao mesmo tempo. 
Como não sou candidato à Academia, não me preocupo, mas de vez em quando vem algum purista -- na verdade inimigo -- me condenar por escrever errado. Esses comentaristas devem ser membros de alguma academia, a dos "chatos", como diria Guilherme de Figueiredo.
Basta cosí, como diriam os italianos...
Paulo Roberto de Almeida 

Formatura do Rio Branco ou lá vou eu meter mão em cumbuca

Mario Machado
Coisas Internacionais, 21/04/2012
Alguns dos meus mais íntimos amigos dizem que eu pareço gostar de polêmica ou de ser do contra. Bom, talvez eles estejam certos. Mas, de uma coisa eu tenho certeza há momentos em que não suporto me calar em concordar apenas para ser aceito e querido.
Feita essa introdução um tanto mais pessoal que o que deveria vamos ao assunto. Dia 20 de abril foi realizada a cerimônia de formatura do Instituto Rio Branco, onde estudam e são formados os diplomatas brasileiros. A cerimônia é importante e conta com a cúpula da república os discursos de autoridades feitos nesse evento marcam o tom da atuação diplomática brasileira.
O discurso da secretária Maria Eugênia Zabotto Pulino, oradora da turma, chamou atenção da imprensa (aqui, por exemplo) por ter tocado nos chamados temas sociais e pela defesa que ela faz da escolha do nome da turma, que foi uma merecida homenagem a diplomata Milena Oliveira de Medeiros que faleceu em decorrência da malária contraída em missão na África.
A oradora ao justificar a homenagem a colega caída escolheu enfatizar a origem racial e o gênero da homenageada, enfatizando que era mulher e negra em oposição ao velho Barão que era homem, branco e “nascido na capital do império”. Essa oposição foi a tônica do discurso e arrancou aplausos nas redes sociais e no auditório.
Confesso que estranhei a falta de citações a frases e escritos da homenageada (que com certeza deixou, posto a alta exigência intelectual do CACD e o perfil dos que se interessam pelo campo) é como se a justa homenagem a uma moça que deu – inadvertidamente – a vida pelo seu país, cumprido seu dever fosse somente por que era negra e mulher. Pode não ter sido essa a intenção dos autores do discurso, mas foi isso que se pode depreender do que foi lido.
É esse o problema de transformar pessoas em emblemas de causas, retira-se sua humanidade, o que lhe fazia único e se apega ao genérico. Tendo a achar uma injustiça, ainda que seja uma linda homenagem, sim é paradoxal, mesmo.
Como não poderia ser diferente o discurso é altamente laudatório com o paraninfo da turma o embaixador Samuel Pinheiro, que foi um dos principais articuladores da expansão da carreira diplomática, ou seja, acaba por soar altamente corporativista que os beneficiados pela expansão das vagas homenageiem a visão do homem que é responsável pelo seu benefício. O irônico é que a ênfase sul-sul do paraninfo foi o que acabou levando a diplomata homenageada a África, onde ocorreu a sua fortuita e infeliz contaminação.
A oposição de idéias que me refiro continua ao afirmar que a diplomacia do passado não estaria conectada aos interesses da população e, portanto – não é dito, mas fica implícito, seria a diplomacia das elites ou contrário da atual que seria a diplomacia que verdadeira reflete os valores plurais e democráticos da sociedade brasileira. Essa crítica feita para soar e ressoar aos ouvidos da cúpula do governo é no mínimo controverso quando confrontando com um estudo independente da Política Externa Brasileira.
Sobre o tom racialista do discurso, meu amigo e diplomata de carreira Paulo Roberto de Almeida escreveu (original pode ser lido, aqui):
Curiosas essas constatações que o Itamaraty é majoritariamente branco e masculino. A culpa é da instituição, de alguém em particular? Os exames são sexistas, racistas, discriminatórios?
Essa versão politicamente correta, que busca responsáveis por nossas deficiências e "vias rápidas" para corrigir o que se entende seja uma "deformação do sistema" -- quem sabe até uma das muitas perversidades da sociedade capitalista, elitista, e outros vícios mais -- e que pretende sanar os problemas pela "inclusão dos excluídos", sempre me pareceu uma tremenda demagogia, e um atentado notório ao princípio da igualdade e do mérito. Todas as pessoas, a partir de uma certa idade, têm condições de se preparar para um exame reconhecidamente difícil como o do Itamaraty. 
Ainda que se reconheça que certas pessoas -- pelo background familiar, pela freqüentação das péssimas escolas públicas, por uma série de outros fatores desfavoráveis -- enfrentam dificuldades adicionais nesse tipo de exame extremamente rigoroso, a única recomendação que se poderia fazer seria que as universidades, o próprio Itamaraty, entidades supostamente comprometidas com a "igualdade racial" e a "inclusão social" mantenham cursos preparatórios gratuitos, abertos preferencialmente aos que não dispõem de renda, sob declaração de honra, para pagar os cursos comerciais. 
Bolsas para afrodescendentes são inerentemente discriminatórias e racistas, e não deveriam existir nessa forma, com base na cor.
Mas a voz dos "excluídos" é bem mais forte quando enrolada na bandeira da cor, e da suposta desigualdade da antiga escravidão.
O discurso é exatamente o que se espera de uma diplomata brasileira, ou seja, bem escrito e lido com competência e carisma, como vocês poderão constatar abaixo. Seu conteúdo reflete muito bem o Zeitgeist. Tenho consciência que a essa altura irritei muita gente, mas, meus caros, esse é o preço de ter uma opinião.

domingo, 22 de janeiro de 2012

Brasil: campeao de desigualdade no G20 (BBC)

Algumas coisas merecem muita atenção: do governo, da imprensa, dos comentaristas e colunistas habituais, etc. 
Como por exemplo, a questão da Sexta Potência Econômica Mundial.
Parece que nossas vidas foram inteiramente transformadas por essa informação transcendente...
Eu até me senti mais rico, vejam vocês.
E tudo graças ao governo, claro, que produziu as riquezas que fizeram o Brasil se situar na sexta posição do campeonato mundial de PIBs.
Se não fosse o governo, nós ainda estaríamos lá atrás, amargando pobreza, miséria, desigualdades, etc.
Por exemplo: ninguém fala de nosso último lugar, ou quase, em matéria de educação. Ninguém parece se preocupar com essa vergonha (só eu, claro, e mais meia dúzia de fieis leitores).
E quanto à desigualdade, objeto da matéria abaixo?
Aposto que não vão falar nada, vão ficar quietinhos, esperando a notícia passar...
Mas, se falarem em PIB, preparem as trombetas da glória: nada a ver com câmbio, efeito-China, etc. Não, tudo por obra e graça do governo, sem o qual nossas vidas seriam um inferno de atraso...
Mas, voltando à história da desigualdade, que tal esta matéria abaixo?
Nada que eu lamente muito, pois desigualdade sempre houve, e não é por causa dela que os brasileiros em geral são pobres. Eles são pobres porque nossa produtividade é reduzida, não por causa da desigualdade.
Mas, claro, a desigualdade reflete ou é o resultado, justamente, da baixa qualidade da educação e dos baixíssimos níveis de produtividade humana do trabalho. Padrões baixos, em educação e produtividade representam pobreza e miséria, e desigualdade associada.
Por isso o Brasil não é um país de pessoas ricas, a despeito de ter muita riqueza acumulado pelo grande número de pessoas. A China também. A diferença é que a China cresce rápido, e possui padrões satisfatórios de educação, e está produzindo ciência e tecnologia. Ela vai ficar rica mais rapidamente do que nós, e nos ultrapassar em renda per capita dentro de alguns anos. Sorte dos chineses. Azar nosso.
Mas, a China também tem um dos maiores crescimentos do mundo em termos de desigualdade.
Isso é um grande problema?
Depende. Se todos estiverem ficando mais ricos, isso pode ser atenuado. Mas se a desigualdade se dá em meio à estagnação ou baixo crescimento, aí a coisa pode ficar complicada.
Os chineses precisam crescer. Nós também. Eles vêm conseguindo, rapidamente. Nós muito lentamente.
Paulo Roberto de Almeida 

Brasil é segundo país mais desigual do G20, aponta estudo

BBC – 19/01/2012

De acordo com pesquisa, país está à frente apenas da África do Sul

O Brasil é o segundo país com maior desigualdade do G20, de acordo com um estudo realizado nos países que compõem o grupo.
De acordo com a pesquisa Deixados para trás pelo G20?, realizada pela Oxfam – entidade de combate à pobreza e a injustiça social presente em 92 países -, apenas a África do Sul fica atrás do Brasil em termos de desigualdade.
Como base de comparação, a pesquisa também examina a participação na renda nacional dos 10% mais pobres da população de outro subgrupo de 12 países, de acordo com dados do Banco Mundial. Neste quesito, o Brasil apresenta o pior desempenho de todos, com a África do Sul logo acima.
A pesquisa afirma que os países mais desiguais do G20 são economias emergentes. Além de Brasil e África do Sul, México, Rússia, Argentina, China e Turquia têm os piores resultados.
Já as nações com maior igualdade, segundo a Oxfam, são economias desenvolvidas com uma renda maior, como França (país com melhor resultado geral), Alemanha, Canadá, Itália e Austrália.
Avanços
Mesmo estando nas últimas colocações, o Brasil é mencionado pela pesquisa como um dos países onde o combate à pobreza foi mais eficaz nos últimos anos.
O estudo cita dados que apontam a saída de 12 milhões de brasileiros da pobreza absoluta entre 1999 e 2009, além da queda da desigualdade medida pelo coeficiente de Gini, baixando de 0,52 para 0,47 no mesmo período (o coeficiente vai de zero, que significa o mínimo de desigualdade, a um, que é o máximo).
A pesquisa prevê que, se o Brasil crescer de acordo com as previsões do FMI (3,6% em 2012 e acima de 4% nos anos subsequentes) e mantiver a tendência de redução da desigualdade e de crescimento populacional, o número de pessoas pobres cairá em quase dois terços até 2020, com 5 milhões de pessoas a menos na linha da pobreza.
No entanto, a Oxfam diz que, se houver um aumento da desigualdade nos próximos anos, nem mesmo um forte crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) poderá retirar um número significativo de brasileiros da pobreza.
“Mesmo que o Brasil tenha avanços no combate da pobreza, ele é ainda um dos países mais desiguais do mundo, com uma agenda bem forte pendente nesta área”, disse à BBC Brasil o chefe do escritório da Oxfam no Brasil, Simon Ticehurst.
Para ele, é importante que o governo dê continuidade às políticas de transferência de renda, como o Bolsa Família, e que o Estado intervenha para melhorar o sistema de distribuição.
“Os mercados podem criar empregos, mas não vão fazer uma redistribuição (de renda)”, afirma.
Outras questões
Ticehurst diz que, para reduzir a desigualdade, o Brasil também precisa atacar as questões da sustentabilidade e da resistência a choques externos.
“As pessoas mais pobres são as mais impactadas pela volatilidade do preço dos alimentos, do preço da energia, dos impactos da mudança climática. O modelo de desenvolvimento do Brasil precisa levar isso mais em conta.”
Para o representante da Oxfam, a reforma agrária e o estímulo à agricultura familiar também é importante para reduzir a desigualdade.
“Da parcela mais pobre da população brasileira, cerca de 47% vive no campo. Além disso, 75% dos alimentos que os brasileiros consomem são produzidos por pequenos produtores, que moram na pobreza“, afirma TiceHurst.
“É preciso fechar esse circuito para que os produtores que alimentam o país tenham condições menos vulneráveis e precárias.”
Segundo o estudo da Oxfam, a maioria dos países do G20 apresenta uma tendência “preocupante” no sentido do aumento na desigualdade.
A entidade afirma que algumas dessas nações foram “constrangidas” pelas reduções significativas da desigualdade registradas nos países de baixa renda nos últimos 15 anos.
“A experiência do Brasil, da Coreia do Sul e de vários países de renda baixa e média-baixa mostra que reduzir a desigualdade está ao alcance dos dirigentes do G20″, afirma o texto.
“Não existe escassez de potenciais alavancas para políticas (de redução da desigualdade). Em vez disso, talvez exista uma escassez de vontade política”, diz o estudo.