Congresso deveria apoiar iniciativa em prol da Amazônia
Editorial do jornal O Globo16/05/2022
Numa iniciativa rara, 23 empresas e organizações da agroindústria e agropecuária, representando mais de 300 entidades, remeteram carta ao presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, com o pedido de acesso ao fundo Amazon21, de US$ 9 bilhões, criado pelo Legislativo americano para projetos de preservação de florestas tropicais. Também enviada à presidente da Câmara de Representantes, Nancy Pelosi, a iniciativa é a prova do isolamento do governo Bolsonaro em sua desastrosa política ambiental, que se resume a franquear o acesso de madeireiros e garimpeiros ilegais à Amazônia.
Empresas e entidades empresariais já haviam formalizado um pedido ao governo Bolsonaro para recuperar seu protagonismo na questão ambiental, antes da COP26, em Glasgow, na Escócia. A iniciativa foi em vão. Restou o apelo direto ao governo americano para obter recursos destinados a projetos para conter o desmatamento, com a participação de comunidades indígenas, pressionadas pelo avanço ilegal do garimpo em suas reservas sem nenhuma punição por parte do governo.
A iniciativa de enviar a carta a Biden e Pelosi é a demonstração concreta de que a antipolítica ambiental do governo prejudica os interesses de grandes empresas nacionais e globais exportadoras de alimentos. Dará trabalho ao Itamaraty e aos ministérios da Agricultura e Meio Ambiente desfazer a imagem de inimigo do planeta que Bolsonaro construiu com afinco durante quatro anos. Ainda mais se o segundo semestre na Amazônia for mesmo o que as piores previsões esperam.
O mais novo avanço do projeto bolsonarista de liberar a floresta para madeireiros e garimpeiros ilegais gerou no mês passado um desmatamento de 1.012 quilômetros quadrados, esquadrinhados por satélite do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), equivalente a dois terços da área da cidade de São Paulo. Foi uma destruição recorde para um mês de abril, quando ainda chove na região. O pior pode estar por vir.
Com a chegada do verão amazônico a partir de julho e o fim da temporada de chuvas, madeireiros e garimpeiros poderão ampliar a devastação com menos dificuldade. Como pode ser o último ano do governo Bolsonaro, e as pesquisas não se mostram favoráveis ao projeto continuista do presidente, a conjuntura é um estímulo a quem vive da exploração predatória da Amazônia. Os desmatadores tentarão destruir (e faturar) o máximo que puderem, antes da chegada de um novo governo.
Se sair vitorioso nas eleições de outubro, Bolsonaro encontrará um ambiente internacional ainda mais inóspito para prosseguir com sua política de devastação. Mantido o ritmo do desmatamento, novas marcas serão alcançadas, com novas e inevitáveis reações nos Estados Unidos e na Europa, e o consequente fortalecimento de propostas de boicote a produtos brasileiros oriundos de áreas de desmatamento.
Um novo governo, em contrapartida, terá um enorme e decisivo trabalho para remontar as estruturas de fiscalização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), de modo a reduzir da maneira mais rápida possível os danos da gestão Bolsonaro, e não apenas na Amazônia. Por tudo isso, o apelo a Biden e Pelosi precisa ser apoiado no Congresso brasileiro.
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