Acho dois meses, muito tempo, pois em qualquer democracia respeitável, digna desse nome, o próprio envolvido em falcatruas, fraudes, mentiras, roubos e atos venais, já teria apresentado sua renúncia de imediato, ou sido despedido também de imediato pelo chefe de Estado (que não o fez) ou pelo chefe de governo (que parece que é ele mesmo).
Em qualquer regime parlamentar normal, ele já teria sido convocado (não convidado, convocado), para se explicar no banco dos acusados, e teria sido submetido a uma inquirição em regra.
Em qualquer regime político normal, o parlamento já teria agido para obter esclarecimentos.
Em qualquer país normal, as autoridades financeiras, de corregedoria, policiais e até associações classistas (no caso, a OAB), já teriam pedido um inquérito policial.
No Brasil, obviamente, nada disso acontece, pois venais existem em todas as partes.
Esse é o Brasil...
Só para concluir: o título deste post, ao que parece, não tem nada a ver com a realidade. Só uma aposta pessoal, ou seja, contra mim mesmo. Sendo assim, em 22 de julho de 2011, o ministro em questão estará fora do governo. Vou marcar na minha agenda, e voltarei ao contato naquela data.
Paulo Roberto de Almeida
CASO FRANCENILDO
Palocci levou dossiê pessoalmente, diz ex-diretor da Globo
Opinião e Notícia, 22/05/2011
Em 2009, Palocci foi inocentado de ter quebrado sigilo bancário, e a culpa recaiu sobre seu assessor de imprensa e o presidente da Caixa
O atual ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, levou pessoalmente o dossiê do caso Francenildo à família Marinho, informou o ex-diretor editorial da Globo, Paulo Nogueira.
“Foi o Palocci quem passou para nós o dossiê calunioso. Palocci foi quem fez chegar a nós, na redação da Época, informações que supostamente desqualificariam um caseiro de Brasília que dissera que ele frequentava uma mansão pouco recomendável quando ele era ministro da Fazenda”, explica Nogueira.
Em 2009, Palocci foi inocentado de ter quebrado o sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa. Na ocasião, os dados da conta do caseiro foram publicados na revista Época, e revelavam até que ele recebia depósitos no valor de R$ 24 mil de seu pai biológico, que tentava encerrar uma ação de reconhecimento de paternidade.
Com a absolvição de Palocci, a culpa recaiu sobre dois outros réus: seu assessor de imprensa, Marcelo Netto, e o presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Mattoso.
Paulo Nogueira, no entanto, afirma que Época não se envolveu nessa operação totalmente ciente da fraude. “Imaginávamos, ao publicar a história, que de fato tinham sido feitos depósitos na conta do caseiro. Logo ficou claro que não. Também ficou clara em pouco tempo a desfaçatez de Palocci ao dizer que não fizera o que fez”.
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
domingo, 22 de maio de 2011
sábado, 21 de maio de 2011
Ainda as sauvas: e tem outro assunto mais importante?
Este jornalista pede uma "faxina no Ministério da Educação".
Acho que não bastaria. O MEC não é só o ministério da desigualdade, ou seja, pretende manter os pobres na pobreza. É também o ministério da deseducação, ao manter essas pedagogas freireanas e toda a ralé da máfia sindical da educação formulando e aplicando políticas.
Na verdade, esse pessoal não tem mais jeito: pau torto, apenas isso.
Eu acho que seria preciso começar a reconstruir a educação brasileira em novas bases, com novas pessoas, sem estabilidade, pagas (bem) mas por desempenho.
Não é fácil, mas é o único caminho.
Enquanto tivermos as pedagogas freireanas e as máfias sindicais no comando da educação, o ensino no Brasil vai continuar afundando...
Paulo Roberto de Almeida
Ministério da Desigualdade
Rolf Kuntz
O Estado de S.Paulo, 18 de maio de 2011
O nome oficial é Ministério da Educação, mas podem chamá-lo Ministério da Desigualdade. Ministério da Incompetência também serve: a palavra tanto se aplica à atuação de seus dirigentes quanto se aplicará à condição das vítimas do padrão educacional proposto no livro Por Uma Vida Melhor, comprado e distribuído pelo governo. A presidente Dilma Rousseff prometeu trabalhar pela redução da miséria. Se quiser fazê-lo, terá de cuidar da qualificação de milhões de brasileiros para o trabalho. Mais que isso, terá de promover sua preparação para trabalhar numa economia cada vez mais complexa e exposta à competição internacional. Tratar os pobres como coitadinhos e incapazes conduzirá ao resultado oposto. Se há preconceito, não é de quem considera errada a violação da gramática. Preconceituoso e elitista é quem condena o pobre a uma instrução de baixa qualidade e ainda o aconselha a contentar-se com isso.
Os problemas de formação profissional e o mau desempenho dos alunos brasileiros em testes de avaliação foram apontados com suficiente clareza em artigo de Carlos Alberto Sardenberg, publicado anteontem neste caderno. Concorrentes do Brasil, incluída a China, estão empenhados em oferecer uma educação muito melhor a seus estudantes. Em vez de tratar os pobres como inferiores, autoridades educacionais desses países cuidam de prepará-los para se igualar aos melhores do mundo.
Não é preciso insistir nesse ponto. Mas é indispensável chamar a atenção para a concorrência em outro nível. No Brasil, quem tem bom senso e condição econômica tenta oferecer aos filhos a melhor educação possível. Pais instruídos procuram boas escolas e valorizam aquelas conhecidas pelo alto padrão de exigência. Rejeitam a ideia do diploma conquistado pelo caminho fácil. Além disso, estimulam os filhos a frequentar cursos de línguas e a envolver-se em atividades intelectualmente estimulantes. Nas melhores escolas, crianças pré-adolescentes são treinadas para combinar criatividade e rigor. Assim como as autoridades dos países mais dinâmicos e competitivos, as famílias brasileiras mais atentas aos desafios do mundo real continuarão em busca dos padrões educacionais mais altos.
Famílias saídas há pouco tempo da pobreza também reconhecem a importância de oferecer uma boa formação a seus filhos e por isso procuram escolas particulares. "Meu filho só tem 5 aninhos e já está aprendendo a ler e a escrever. Nessa idade, na escola pública, ninguém sabe nada ainda", disse uma agente de saúde citada em reportagem publicada no Estado de domingo.
Outra personagem da história explicou: "Não é metideza, é necessidade. Eu trabalho como empregada doméstica o dia todo. Meu marido é coletor de lixo e também passa o dia fora. Pagar a escola para a Gecielle foi a melhor opção". Mas ela descobriu também outra vantagem: "Com meus outros dois filhos não pude (pagar). A situação era muito pior. Na escola pública onde eles estudam já teve tiroteio. Na da Gecielle não tem nada disso e ela ainda aprende mais, tem lição de casa e tudo". Pois é: ela aprende, tem lição de casa e a mãe se mostra convencida de ter feito um bom negócio. As duas entrevistadas apostam nos filhos, apertam o cinto para pagar a escola e têm uma clara visão dos problemas: crianças pobres aprendem, como quaisquer outras, quando têm oportunidade.
Tratar os pobres com paternalismo, como pessoas incapazes de aprender a língua oficial e de aguentar os padrões de uma escola séria, é condená-los a ficar para trás, marginalizados e limitados às piores escolhas. Apoiar essa política é agir como se o mundo fosse esperar os mais lentos. Em países com políticas sociais decentes a solução é dar um impulso extra às pessoas em posição inicial desvantajosa.
O paternalismo é muito mais vantajoso para quem concede benefícios do que para quem recebe. Massas protegidas por Pais ou Mães do Povo tendem a ser dominadas com facilidade e nunca exercem plenamente a cidadania. Tratá-las como pessoas irremediavelmente inferiores é condená-las a ser politicamente subdesenvolvidas. Ensiná-las a conformar-se com "nóis vai" e "os menino joga bola" é vedar-lhes o acesso a aprendizados mais complexos e à possibilidade de pensar livremente. As oportunidades serão cada vez mais limitadas para os monoglotas. Muito piores serão as condições dos semiglotas, embora alguns, muito raramente, possam até presidir um país.
A presidente Dilma Rousseff parece haver renunciado ao papel de Mãe do Brasil, planejado por seu antecessor e grande eleitor. Ao anunciar a intenção de oferecer aos pobres a porta de saída dos programas assistenciais, ela mostrou preferir um caminho mais democrático. Mas, para segui-lo, precisará livrar-se do entulho do paternalismo e da demagogia. Uma faxina no Ministério da Educação ajudaria muito.
JORNALISTA
Acho que não bastaria. O MEC não é só o ministério da desigualdade, ou seja, pretende manter os pobres na pobreza. É também o ministério da deseducação, ao manter essas pedagogas freireanas e toda a ralé da máfia sindical da educação formulando e aplicando políticas.
Na verdade, esse pessoal não tem mais jeito: pau torto, apenas isso.
Eu acho que seria preciso começar a reconstruir a educação brasileira em novas bases, com novas pessoas, sem estabilidade, pagas (bem) mas por desempenho.
Não é fácil, mas é o único caminho.
Enquanto tivermos as pedagogas freireanas e as máfias sindicais no comando da educação, o ensino no Brasil vai continuar afundando...
Paulo Roberto de Almeida
Ministério da Desigualdade
Rolf Kuntz
O Estado de S.Paulo, 18 de maio de 2011
O nome oficial é Ministério da Educação, mas podem chamá-lo Ministério da Desigualdade. Ministério da Incompetência também serve: a palavra tanto se aplica à atuação de seus dirigentes quanto se aplicará à condição das vítimas do padrão educacional proposto no livro Por Uma Vida Melhor, comprado e distribuído pelo governo. A presidente Dilma Rousseff prometeu trabalhar pela redução da miséria. Se quiser fazê-lo, terá de cuidar da qualificação de milhões de brasileiros para o trabalho. Mais que isso, terá de promover sua preparação para trabalhar numa economia cada vez mais complexa e exposta à competição internacional. Tratar os pobres como coitadinhos e incapazes conduzirá ao resultado oposto. Se há preconceito, não é de quem considera errada a violação da gramática. Preconceituoso e elitista é quem condena o pobre a uma instrução de baixa qualidade e ainda o aconselha a contentar-se com isso.
Os problemas de formação profissional e o mau desempenho dos alunos brasileiros em testes de avaliação foram apontados com suficiente clareza em artigo de Carlos Alberto Sardenberg, publicado anteontem neste caderno. Concorrentes do Brasil, incluída a China, estão empenhados em oferecer uma educação muito melhor a seus estudantes. Em vez de tratar os pobres como inferiores, autoridades educacionais desses países cuidam de prepará-los para se igualar aos melhores do mundo.
Não é preciso insistir nesse ponto. Mas é indispensável chamar a atenção para a concorrência em outro nível. No Brasil, quem tem bom senso e condição econômica tenta oferecer aos filhos a melhor educação possível. Pais instruídos procuram boas escolas e valorizam aquelas conhecidas pelo alto padrão de exigência. Rejeitam a ideia do diploma conquistado pelo caminho fácil. Além disso, estimulam os filhos a frequentar cursos de línguas e a envolver-se em atividades intelectualmente estimulantes. Nas melhores escolas, crianças pré-adolescentes são treinadas para combinar criatividade e rigor. Assim como as autoridades dos países mais dinâmicos e competitivos, as famílias brasileiras mais atentas aos desafios do mundo real continuarão em busca dos padrões educacionais mais altos.
Famílias saídas há pouco tempo da pobreza também reconhecem a importância de oferecer uma boa formação a seus filhos e por isso procuram escolas particulares. "Meu filho só tem 5 aninhos e já está aprendendo a ler e a escrever. Nessa idade, na escola pública, ninguém sabe nada ainda", disse uma agente de saúde citada em reportagem publicada no Estado de domingo.
Outra personagem da história explicou: "Não é metideza, é necessidade. Eu trabalho como empregada doméstica o dia todo. Meu marido é coletor de lixo e também passa o dia fora. Pagar a escola para a Gecielle foi a melhor opção". Mas ela descobriu também outra vantagem: "Com meus outros dois filhos não pude (pagar). A situação era muito pior. Na escola pública onde eles estudam já teve tiroteio. Na da Gecielle não tem nada disso e ela ainda aprende mais, tem lição de casa e tudo". Pois é: ela aprende, tem lição de casa e a mãe se mostra convencida de ter feito um bom negócio. As duas entrevistadas apostam nos filhos, apertam o cinto para pagar a escola e têm uma clara visão dos problemas: crianças pobres aprendem, como quaisquer outras, quando têm oportunidade.
Tratar os pobres com paternalismo, como pessoas incapazes de aprender a língua oficial e de aguentar os padrões de uma escola séria, é condená-los a ficar para trás, marginalizados e limitados às piores escolhas. Apoiar essa política é agir como se o mundo fosse esperar os mais lentos. Em países com políticas sociais decentes a solução é dar um impulso extra às pessoas em posição inicial desvantajosa.
O paternalismo é muito mais vantajoso para quem concede benefícios do que para quem recebe. Massas protegidas por Pais ou Mães do Povo tendem a ser dominadas com facilidade e nunca exercem plenamente a cidadania. Tratá-las como pessoas irremediavelmente inferiores é condená-las a ser politicamente subdesenvolvidas. Ensiná-las a conformar-se com "nóis vai" e "os menino joga bola" é vedar-lhes o acesso a aprendizados mais complexos e à possibilidade de pensar livremente. As oportunidades serão cada vez mais limitadas para os monoglotas. Muito piores serão as condições dos semiglotas, embora alguns, muito raramente, possam até presidir um país.
A presidente Dilma Rousseff parece haver renunciado ao papel de Mãe do Brasil, planejado por seu antecessor e grande eleitor. Ao anunciar a intenção de oferecer aos pobres a porta de saída dos programas assistenciais, ela mostrou preferir um caminho mais democrático. Mas, para segui-lo, precisará livrar-se do entulho do paternalismo e da demagogia. Uma faxina no Ministério da Educação ajudaria muito.
JORNALISTA
As novas sauvas do Brasil: as pedagogas freireanas...
Não confundir freireanas com associações indevidas com mestre Gilberto Freyre, um grande sociólogo. Eu me refiro a Paulo Freire, um homem de boa vontade, mas tremendamente equivocado, sobretudo a partir de seu panfleto "Pedagogia do Oprimido", que parece ter se convertido no manual de besteirol das pedagogas atuais do Brasil.
A julgar pela sua influência na política educacional do Brasil, vamos continuar indo para o brejo em matéria de ensino e educação.
Monteiro Lobato lutava contra as saúvas, que segundo ele eram o atraso do Brasil. Ele queria dar-lhes morte à base de inseticida e outros defensivos agrícolas. Isso no campo das medidas profiláticas para tornar a agricultura viável e fazer o Brasil ficar mais rico.
Hoje nós estamos sendo atrasados pelas novas saúvas, as pedagogas freireanas.
Não pretendo matá-las com inseticida.
Meu decreto de pena de morte é puramente no campo das ideias.
Enquanto não matarmos essas novas saúvas -- apenas as ideias, insisto -- não vamos avançar em matéria de educação.
Se eu posso ilustrar o problema narrado abaixo com um caso real, absolutamente e INACREDITAVELMENTE real, aqui vai ele:
Uma pessoa, estudante universitária de jornalismo (que não preciso dizer quem é, mas vocês podem confiar em que o caso é tal qual ela me relatou), foi rebaixada em sua nota de trabalho de redação de uma típica matéria de jornal porque, segundo a ENERGÚMENA da professora, ela "tinha escrito de forma difícil, muito rebuscada, com linguagem acima da média da compreensão dos leitores. Teria de escrever de maneira mais popular, mais compreensível". E pronto, pau: nota 4.
A estudante em questão não é o que poderíamos chamar de intelectual, nem se distingue pela erudição, apenas ocorre de escrever corretamente, como se lê nos livros e nos bons jornais de nossa vida. Ou seja, está sendo punida por escrever corretamente, em Português da norma, não culta, mas normal. A professora, obviamente, é uma idiota completa, mas totalmente em linha com as novas pedagogas freireanas do MEC: ela pretendia uma escrita popular, e por isso rebaixou a nota, numa inacreditável demonstração de que a linguagem luliana ganhou definitivamente espaço neste país. O livro de Português distribuído pelo MEC apenas reflete essa triste realidade.
Estamos afundando lentamente...
Paulo Roberto de Almeida
Visão perversa
MERVAL PEREIRA
O Globo, 17/05/11
Há um aspecto perverso nessa crise do livro didático de português, que o MEC insiste em manter em circulação, que ultrapassa qualquer medida do bom-senso de um governo, qualquer governo.
A pretexto de defender a fala popular como alternativa válida à norma culta do português, o Ministério da Educação está estimulando os alunos brasileiros a cultivarem seus erros, que terão efeito direto na sua vida na sociedade e nos resultados de exames, nacionais e internacionais, que avaliam a situação de aprendizado dos alunos, debilitando mais ainda a competitividade do país.
O ministro Fernando Haddad, que já protagonizou diversas confusões administrativas, agora se cala diante dessa "pedagogia da ignorância" que apresenta aos alunos da rede pública a defesa de erros de português, como se fossem corretas ou aceitáveis expressões populares como "nós pega o peixe" ou "dois real".
(Aliás, cada vez que escrevo essas frases, o corretor de texto teima em sublinhá-las em verde, como se estivessem erradas. Esse computador ainda não passou pelo crivo do MEC).
Mas é o próprio MEC que veicula anúncios exaltando supostos avanços dos alunos brasileiros no Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos).
O país registrou crescimento em todas as notas, embora continue muito abaixo da média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), e mesmo de alguns da América Latina.
Ora, se o próprio governo baliza sua atuação pela régua do Pisa, como justificar que a defesa de uma alternativa da fala correta seja uma política oficial do Estado brasileiro?
A professora Heloísa Ramos, autora do livro "Por uma vida melhor", da Coleção Viver, Aprender (Editora Global) acredita ser "importante que o falante de português domine as duas variantes e escolha a que julgar adequada à sua situação de fala".
Seria preciso então que as escolas e faculdades ensinassem o português popular para os que foram alfabetizados pela norma culta, numa radicalização esdrúxula que esse raciocínio estimula.
O caráter ideológico de certos livros didáticos utilizados pelo MEC, especialmente de história contemporânea, ganha assim uma nova vertente, mais danosa que a primeira, ou melhor, mais prejudicial para a vida do cidadão-aluno.
Enquanto distorções políticas que afetem posições pessoais do aluno podem ser revertidas no decorrer de sua vida, por outros conhecimentos e vivências, distorções didáticas afetam a perspectiva desse aluno, que permanecerá analfabeto, sem condições de melhorar de vida.
Fosse o livro uma obra de linguística da professora Heloísa Ramos, nada a opor quanto à sua existência, embora seus métodos e conclusões rasteiras do que seja preconceito contra a fala popular possam, sim, ser refutados como uma mera mistificação política.
Se fosse um romance, não haveria problema algum em reproduzir a maneira de falar de uma região, ou os erros de português de um personagem.
Mas o livro didático não pode aceitar como certo o erro de português. Didática, pelo dicionário (?) é "a arte de transmitir conhecimento, técnica de ensinar" ou "que proporciona instrução e informação".
O fato de falarem de certa maneira em algumas regiões não quer dizer que este ou aquele linguajar represente o português correto.
A visão deturpada do que seja ensinar aparece na declaração de um assessor anônimo do MEC no GLOBO de ontem, alegando que não cabe ao ministério dizer "o que é certo e o que errado", e nem mesmo fazer a análise do conteúdo dos livros didáticos.
Se não exerce esses deveres básicos, o que faz o MEC em relação ao ensino do país?
Seria um equívoco lamentável e perigoso se o MEC, com essa postura, estivesse pretendendo fazer uma política a favor dos analfabetos, dos ignorantes, como se ela fosse a defesa dos que não tiveram condições de estudar.
Na verdade, está é agravando as condições precárias do cidadão-aluno que busca na escola melhorar de vida, limitando, se não impossibilitando, que atinjam esse objetivo.
Se, porém, a base da teoria for uma tentativa de querer justificar a maneira como o presidente Lula fala, aí então teremos um agravante ao ato criminoso de manter os estudantes na ignorância.
Querer transformar um defeito, uma falha da educação formal do presidente-operário, em uma coisa meritória é um desserviço à população.
Os erros de português de Lula não têm mérito nenhum, ele os explora para fazer política, é um clássico do populismo, cuja consequência é deseducar a população.
Mas ele nunca teve a coragem de defender a fala errada, embora goste de ironizar palavras ou expressões que considera rebuscadas.
Ele desvaloriza o estudo, com frases como "não sei por que estudou tanto, e eu fiz mais do que ele", ou quando se mostra como exemplo de que é possível subir na vida sem estudar.
Mas em outras ocasiões, estimula que a universidade seja acessível a todos, numa atitude que parece paradoxal, mas que ganha coerência quando se analisam os objetivos políticos de cada uma das atitudes.
Se, no entanto, o desdém pela norma culta do português transformou-se em política de Estado, aí teremos a certeza de termos chegado ao fundo do poço.
A julgar pela sua influência na política educacional do Brasil, vamos continuar indo para o brejo em matéria de ensino e educação.
Monteiro Lobato lutava contra as saúvas, que segundo ele eram o atraso do Brasil. Ele queria dar-lhes morte à base de inseticida e outros defensivos agrícolas. Isso no campo das medidas profiláticas para tornar a agricultura viável e fazer o Brasil ficar mais rico.
Hoje nós estamos sendo atrasados pelas novas saúvas, as pedagogas freireanas.
Não pretendo matá-las com inseticida.
Meu decreto de pena de morte é puramente no campo das ideias.
Enquanto não matarmos essas novas saúvas -- apenas as ideias, insisto -- não vamos avançar em matéria de educação.
Se eu posso ilustrar o problema narrado abaixo com um caso real, absolutamente e INACREDITAVELMENTE real, aqui vai ele:
Uma pessoa, estudante universitária de jornalismo (que não preciso dizer quem é, mas vocês podem confiar em que o caso é tal qual ela me relatou), foi rebaixada em sua nota de trabalho de redação de uma típica matéria de jornal porque, segundo a ENERGÚMENA da professora, ela "tinha escrito de forma difícil, muito rebuscada, com linguagem acima da média da compreensão dos leitores. Teria de escrever de maneira mais popular, mais compreensível". E pronto, pau: nota 4.
A estudante em questão não é o que poderíamos chamar de intelectual, nem se distingue pela erudição, apenas ocorre de escrever corretamente, como se lê nos livros e nos bons jornais de nossa vida. Ou seja, está sendo punida por escrever corretamente, em Português da norma, não culta, mas normal. A professora, obviamente, é uma idiota completa, mas totalmente em linha com as novas pedagogas freireanas do MEC: ela pretendia uma escrita popular, e por isso rebaixou a nota, numa inacreditável demonstração de que a linguagem luliana ganhou definitivamente espaço neste país. O livro de Português distribuído pelo MEC apenas reflete essa triste realidade.
Estamos afundando lentamente...
Paulo Roberto de Almeida
Visão perversa
MERVAL PEREIRA
O Globo, 17/05/11
Há um aspecto perverso nessa crise do livro didático de português, que o MEC insiste em manter em circulação, que ultrapassa qualquer medida do bom-senso de um governo, qualquer governo.
A pretexto de defender a fala popular como alternativa válida à norma culta do português, o Ministério da Educação está estimulando os alunos brasileiros a cultivarem seus erros, que terão efeito direto na sua vida na sociedade e nos resultados de exames, nacionais e internacionais, que avaliam a situação de aprendizado dos alunos, debilitando mais ainda a competitividade do país.
O ministro Fernando Haddad, que já protagonizou diversas confusões administrativas, agora se cala diante dessa "pedagogia da ignorância" que apresenta aos alunos da rede pública a defesa de erros de português, como se fossem corretas ou aceitáveis expressões populares como "nós pega o peixe" ou "dois real".
(Aliás, cada vez que escrevo essas frases, o corretor de texto teima em sublinhá-las em verde, como se estivessem erradas. Esse computador ainda não passou pelo crivo do MEC).
Mas é o próprio MEC que veicula anúncios exaltando supostos avanços dos alunos brasileiros no Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos).
O país registrou crescimento em todas as notas, embora continue muito abaixo da média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), e mesmo de alguns da América Latina.
Ora, se o próprio governo baliza sua atuação pela régua do Pisa, como justificar que a defesa de uma alternativa da fala correta seja uma política oficial do Estado brasileiro?
A professora Heloísa Ramos, autora do livro "Por uma vida melhor", da Coleção Viver, Aprender (Editora Global) acredita ser "importante que o falante de português domine as duas variantes e escolha a que julgar adequada à sua situação de fala".
Seria preciso então que as escolas e faculdades ensinassem o português popular para os que foram alfabetizados pela norma culta, numa radicalização esdrúxula que esse raciocínio estimula.
O caráter ideológico de certos livros didáticos utilizados pelo MEC, especialmente de história contemporânea, ganha assim uma nova vertente, mais danosa que a primeira, ou melhor, mais prejudicial para a vida do cidadão-aluno.
Enquanto distorções políticas que afetem posições pessoais do aluno podem ser revertidas no decorrer de sua vida, por outros conhecimentos e vivências, distorções didáticas afetam a perspectiva desse aluno, que permanecerá analfabeto, sem condições de melhorar de vida.
Fosse o livro uma obra de linguística da professora Heloísa Ramos, nada a opor quanto à sua existência, embora seus métodos e conclusões rasteiras do que seja preconceito contra a fala popular possam, sim, ser refutados como uma mera mistificação política.
Se fosse um romance, não haveria problema algum em reproduzir a maneira de falar de uma região, ou os erros de português de um personagem.
Mas o livro didático não pode aceitar como certo o erro de português. Didática, pelo dicionário (?) é "a arte de transmitir conhecimento, técnica de ensinar" ou "que proporciona instrução e informação".
O fato de falarem de certa maneira em algumas regiões não quer dizer que este ou aquele linguajar represente o português correto.
A visão deturpada do que seja ensinar aparece na declaração de um assessor anônimo do MEC no GLOBO de ontem, alegando que não cabe ao ministério dizer "o que é certo e o que errado", e nem mesmo fazer a análise do conteúdo dos livros didáticos.
Se não exerce esses deveres básicos, o que faz o MEC em relação ao ensino do país?
Seria um equívoco lamentável e perigoso se o MEC, com essa postura, estivesse pretendendo fazer uma política a favor dos analfabetos, dos ignorantes, como se ela fosse a defesa dos que não tiveram condições de estudar.
Na verdade, está é agravando as condições precárias do cidadão-aluno que busca na escola melhorar de vida, limitando, se não impossibilitando, que atinjam esse objetivo.
Se, porém, a base da teoria for uma tentativa de querer justificar a maneira como o presidente Lula fala, aí então teremos um agravante ao ato criminoso de manter os estudantes na ignorância.
Querer transformar um defeito, uma falha da educação formal do presidente-operário, em uma coisa meritória é um desserviço à população.
Os erros de português de Lula não têm mérito nenhum, ele os explora para fazer política, é um clássico do populismo, cuja consequência é deseducar a população.
Mas ele nunca teve a coragem de defender a fala errada, embora goste de ironizar palavras ou expressões que considera rebuscadas.
Ele desvaloriza o estudo, com frases como "não sei por que estudou tanto, e eu fiz mais do que ele", ou quando se mostra como exemplo de que é possível subir na vida sem estudar.
Mas em outras ocasiões, estimula que a universidade seja acessível a todos, numa atitude que parece paradoxal, mas que ganha coerência quando se analisam os objetivos políticos de cada uma das atitudes.
Se, no entanto, o desdém pela norma culta do português transformou-se em política de Estado, aí teremos a certeza de termos chegado ao fundo do poço.
Desmantelando a psicanalise: Catherine Meyer (ja vem tarde...)
Os franceses demoraram para chegar no século XX, e agora continuam demorando para chegar no século XXI. Esse processo de desmantelamento da psicanálise já começou há muito tempo atrás, nos EUA, obviamente, com aportes iniciais de Karl Popper, que já tinha denunciado o "método" (ugh!) totalmente inverossímil de Freud como uma fraude completa.
Acho que já está na hora dessas pessoas grandinhas pararem de torrar o seu dinheiro com fraudadores impunes...
Paulo Roberto de Almeida
O legado freudiano no banco dos réus
Andrei Netto
O Estado de S.Paulo, 21 de maio de 2011
A editora francesa Catherine Meyer, que organizou O Livro Negro da Psicanálise, lançado em versão abreviada no Brasil, diz que a teoria de Freud 'repousa sobre a areia' e acusa a renomada psicanalista Elisabeth Roudinesco de agir de má-fé
Em alguns países, como os Estados Unidos ou a Alemanha, Sigmund Freud (1856-1939) costuma ser situado na categoria dos gênios, mas nem por isso sua obra representa unanimidade. Em outros, como França e Argentina - poderíamos incluir o Brasil? -, o pai da psicanálise não é menos do que um ícone. Nesse sentido, duvidar de suas teorias pode ser interpretado como uma blasfêmia. Foi com o propósito de blasfemar e, por isso, suscitar controvérsia, que a editora franco-argelina Catherine Meyer lançou-se ao desafio de coordenar um "front de oposição" a Freud, lançando em 2005, pela Les Arènes, O Livro Negro da Psicanálise.
O impacto da obra foi imediato - e rapidamente se internacionalizou. Composto em sua versão original de mais de 40 artigos assinados por filósofos, historiadores, psiquiatras e também pacientes, o livro explorava as dúvidas e os fracassos que pesariam sobre a "ciência" fundada por Freud, tomando por base cinco temas: mitos e lendas da psicanálise, seu sucesso, seus impasses, suas vítimas e uma proposta de prática pós-freudiana.
Para tanto, Meyer, 52 anos, encomendou ensaios a especialistas como Mikkel Borch-Jacobsen, autor de Anna O. - Uma Mistificação Centenária; Didier Pleux, diretor do Instituto Francês de Terapia Cognitiva; e Jacques Van Rillaer, professor de psicologia da Universidade de Louvain-la-Neuve e praticante das terapias comportamentais e cognitivas (TCC). Tratava-se, então, de um desafio a dogmas e mitos. O efeito, no entanto, não foi o alcançado, segundo admite Catherine Meyer. Em vez de abrir um debate sobre o lugar das terapias da mente, O Livro Negro da Psicanálise deu origem a uma espécie de acerto de contas entre praticantes da psicanálise e das TCC e a uma troca de farpas no mundo intelectual parisiense e internacional.
A bem da verdade, não se pode inocentar Meyer, que se dispôs ao desafio tendo o marketing como uma de suas preocupações centrais, verificada desde a escolha do nome da obra até seu grande mote: "Freud mentia". Essa polêmica ganha destaque no Brasil com a publicação de uma versão abreviada da edição francesa do Livro Negro da Psicanálise, reunindo textos de 23 ensaístas selecionados por Simone Perelson. Resta torcer que não seja igualmente vazia. Catherine Meyer - formada em Letras Modernas pela Escola Normal Superior, com mestrado sobre ópera romântica - diz esperar que não. Está no seu papel. A seguir, a síntese da entrevista exclusiva ao Estado concedida pela editora no seu escritório, em Paris.
Na sua opinião, Freud era um mentiroso?
Sim, porque ele fraudou seus resultados. Não foi o único; há outros a trapacear no meio científico. Mas você sabe como as coisas funcionam na ciência: define-se uma hipótese, mesmo que inacreditável - como Édipo e o amor de um filho pela mãe e a pedra angular de nossa vida psíquica. Eis uma hipótese! Um filho tem desejo e quer ter relações sexuais com sua mãe. É o Complexo de Édipo. Quando se faz uma hipótese científica, a seguir passa-se à fase de verificação. Procede-se um percurso de pesquisa para constatar a hipótese pela sua eficiência. Quando se imagina um medicamento para a tuberculose, ele é testado em várias pessoas. A seguir, usamos a lixeira para jogar fora todas as hipóteses refutadas. O que os teóricos explicam muito bem no Livro Negro da Psicanálise é que Freud lançou hipóteses e elas nunca deixaram de ser apenas isso: hipóteses. Ele traficou a realidade para confirmar suas hipóteses.
É essa a sua visão sobre a hipótese central de Freud?
A hipótese central de Freud é sensacional! É ela que explica ao mesmo tempo a força e o poder da Psicanálise. Karl Popper explicou que a psicanálise não era uma ciência porque era irrefutável. O Complexo de Édipo é irrefutável. Se você argumenta: "Não, no meu caso não é verdade: eu detesto a minha mãe e adoro o meu pai" e se eu sou um psicanalista, eu lhe respondo: "Isso não refuta o Complexo de Édipo; o que você está fazendo é negar o Complexo de Édipo". É o gênero de teoria "coroa, eu ganho; cara, você perde". É sempre verdade. Karl Popper explicou essa incoerência muito bem. A partir do momento em que atribuímos tudo ao inconsciente, qualquer coisa pode ser verdade. Logo, digo eu, não é jamais verdade. Ou, ao menos, é inverificável. Outra armadilha da psicanálise é que todos os grandes teóricos se contradizem. O que Freud diz no início não é o mesmo que diz no fim, o que Freud diz é diferente do que diz Otto Rank, que é diferente do que diz Carl Gustav Jung. Uns dizem: "Veja, o Complexo de Édipo é simbólico, não real". Outros dirão "Não, é concreto". Dirão que uma criança - de 4 ou de 7 anos, de acordo com cada especialista - quer realmente manter relações sexuais com sua mãe. É uma teoria elástica. Elástica demais.
Sua análise, de uma "teoria elástica", me faz lembrar as críticas de filósofos da pós-modernidade que consideram a psicanálise e as teorias freudianas discursos metanarrativos que se dispõem a explicar o mundo, como o marxismo, por exemplo. É essa sua linha? Absolutamente. Freud é um filósofo, muito mais do que um cientista. Ele se pretendia um cientista. Era um médico que desejava o Prêmio Nobel de Medicina, que desejava fundar uma ciência. Para ele, a sexualidade estava para o psiquismo como o bacilo de Koch está para a tuberculose. Ele desejava encontrar a etiologia de todos os problemas psíquicos. Depois veio Lacan, dizendo que não. Mas, para voltar ao tema "mentira", Freud trabalhou com pacientes e era protegido pelo segredo médico. Quando ele fazia uma descoberta sobre o que revelava um lapso ou um sonho, ao escrever um estudo de caso sobre o tema ele não podia revelar o nome de seus pacientes. Eles eram identificados como O Homem dos Lobos (Sergius Pankejeff), O Homem dos Ratos (Ernst Lanzer), Anna O., caso que foi analisado por seu mentor, Joseph Breuer. Tudo se baseia na palavra de Freud, e nós somos obrigados a acreditar em sua palavra. Como saberemos se o que foi dito é verdade? Berger, um dos primeiros historiadores da psicanálise, fez pesquisas e descobriu que Anna O. se chamava Bertha Pappenheim, e descobriu ainda que ela nunca foi curada. Há outros exemplos. Além do trabalho de historiadores, pode-se dispor da própria obra de Freud, que era muito vasta, afinal, ele era um gênio.
Era um gênio? Mas como Freud pode ser um mentiroso e um gênio?
Há muitos políticos que são geniais e mentirosos, por exemplo.
Uma das críticas comuns à obra que a senhora coordena é o próprio título. Seus detratores o consideram um oportunismo, já que antes o Livro Negro do Comunismo havia feito muito sucesso. A escolha do nome foi marketing?
É verdade que o Livro Negro do Comunismo fez muito barulho. Mas, na época em que pesquisei para o nosso, levantei quantos livros negros havia: não lembro se eram 30 ou 60. "Livro negro" é um conceito genérico para designar um balanço crítico. Porque usamos a expressão "livro negro" não quer dizer que vamos falar de genocídios. Alguns autores que integram a obra eram contra esse título. Mas queríamos fazer um livro para o grande público, ao contrário dos outros, muito acadêmicos. Nosso objetivo era reunir o front dos que refutam: filósofos, psicólogos, psiquiatras, pacientes, historiadores... Algo mais geral, mais voltado ao grande público. Sim, eu assumo que pensamos no marketing também. Mas era para mostrar que não seria apenas um livro acadêmico, mesmo que tenhamos nele muitos acadêmicos de alto nível.
Eu gostaria de ouvi-la sobre críticas contundentes que o seu livro suscitou na França na época de sua publicação. Jean Birnbaum, por exemplo, afirmou que seu livro parece fazer uma aproximação perigosa, uma equação psicanálise = terror.
O que aconteceu é que muitos psicanalistas e jornalistas, no caso de Birnbaum, em lugar de responder às questões abertas pelo livro, dizendo que não estão de acordo com tais e tais argumentos, tentaram lançar uma cortina de fumaça, fazendo acusações. Não houve um verdadeiro debate na França. Então me dei conta de que Freud é um ícone quase religioso. Atacar a Igreja teria sido menos chocante. Freud é um mito. Ao dirigir um livro, tomei todo o cuidado possível para que os ensaios fossem extremamente rigorosos e que não fossem escritos em tom agressivo, mas em tom analítico. O que lamentei foi que, em lugar de abrir uma verdadeira polêmica, uma discussão, houve ataques, apenas ataques.
Elisabeth Roudinesco constatou em artigo que determinadas citações de sua obra empregadas por autores que assinam o seu livro não são fiéis ao seu pensamento. O que a senhora responde?
Gostaria que ela nos indicasse essas citações.
Ela o fez. Escreveu um artigo, À Propos du Livre Noir de la Psychanalyse, citando trechos do livro e comparando-os à sua própria obra.
Nós não traficamos citações. Ela, sim, trafica citações. A senhora Roudinesco diz ser historiadora da psicanálise, mas não fala alemão. Todos os outros historiadores da psicanálise falam alemão. Eles leram Freud em versões originais e não nas traduções francesas, que não são boas. A senhora Roudinesco foi e é de uma grande má-fé,
Alguns críticos interpretaram o seu Livro Negro como um ataque frontal de adeptos das terapias comportamentais e cognitivas (TCC), que contestam abertamente a legitimidade da psicanálise. Como essa disputa entre a psicanálise e as TCC se reflete no seu livro?
É uma das questões em jogo, mas não a única. Algumas pessoas resumiram o livro a essa questão. Mas não é verdade. Para um jornalista, é fácil reduzir o livro a uma guerra entre duas escolas. É verdade em parte. Mas toda a pesquisa histórica que está no livro não tem nada a ver com briga de escolas. Os historiadores que constam do livro buscam o viés de historiadores, apresentando Freud como um médico que fez descobertas. Eles não têm nada a ver com TCC.
Mas esse afrontamento existe no livro.
Uma das razões pelas quais eu quis fazer esse livro é porque, na França, um psi é forçosamente um psicanalista, enquanto nos Estados Unidos, na Europa do norte, nos países nórdicos, há várias alternativas terapêuticas, entre as quais a psicanálise. A psicanálise não é o único deus no universo psi.
Mas Roudinesco, que é reconhecida como uma das psicanalistas mais importantes do mundo, afirma que a psicanálise é muito eficiente contra neuroses, mas não psicoses. Isso não é um mea-culpa?
Freud dizia isso também. Mas esse é outro problema. Na França, você pode se tornar psicanalista depois de fazer estudos de sociologia e passar por análise didática. Assim você se torna psicanalista. Não há nenhuma formação clínica. Nenhuma. Se o sujeito não tem formação clínica, como pode saber se tem diante de si um neurótico ou alguém que está em depressão muito grave?
A senhora disse que a verificabilidade é um dos problemas da psicanálise e uma das questões em jogo no livro. Mas não podemos verificar com precisão resultados em diversas outras Ciências Humanas. Por que a psicanálise não é uma ciência e a sociologia é uma ciência, a seu ver?
A sociologia não é uma ciência. A medicina ou a psiquiatria são ciências. E olhe lá, porque elas também não conseguem explicar por que alguns pacientes se curam e outros não. Deixe eu citar um exemplo: o autismo. Nesse assunto, estamos realmente no lado negro da psicanálise, porque ela fez muito estrago. A psicanálise, por meio de Bruno Bettelheim, que acusou as mães de serem responsáveis pelo autismo de seus filhos (mais tarde surgiriam denúncias de que ele maltratava os pequenos pacientes). Inconscientemente, dizia o autor, a mãe desejava a morte de seu filho. Além de ser extremamente irresponsável, já que sabemos que o autismo é um problema genético em grande parte, ainda é cruel, porque acusa uma mulher de ser a responsável por uma doença. Não bastasse, sabemos que não se pode curar o autismo.
Voltando ao assunto, sua definição de ciência se limita ao que se costumava chamar de "ciências duras", excluindo as Ciências Humanas.
É isso. A psicanálise é uma teoria que repousa sobre a areia, sobre o segredo, sobre o que não se pode verificar, o que é irrefutável, o que não pode ter sua eficácia comprovada. É claro que há coisas positivas. Não sou contra a constatação do inconsciente. Muitos teóricos estão de acordo. Mas isso não quer dizer que estamos de acordo com o inconsciente freudiano. A ideia de que temos um inconsciente que pode determinar certos comportamentos não é negada por ninguém, mas isso pode não ter nada a ver com a sexualidade, com o Complexo de Édipo, a angústia da castração. É isso que eu refuto.
Não podemos usar o mesmo argumento da cura e de sua verificabilidade para a TCC?
Mas eu não vejo quem pode se dizer hoje em dia capaz de curar tudo, como fazemos com doenças tratáveis por antibióticos. Estamos no início. O conhecimento do psiquismo e a cura do psiquismo têm apenas 150 anos. Estamos na situação dos médicos da Idade Média, que ousavam tratar retirando e injetando sangue.
A senhora já fez análise?
Não, não fiz análise. O que fiz foi uma curta psicoterapia analítica que me fez muito bem. Por um ou dois anos fui a um terapeuta. Eu não era doente. Tinha apenas alguns problemas existenciais, e a terapia me fez muito bem. Não tenho nenhum acerto de contas com a psicanálise. O conselho que daria é, se você é doente, não faça psicanálise. Eu descobri algo que funciona muito bem para casos de problemas existenciais, por exemplo, que é a meditação.
A senhora faz meditação? E como avalia sua eficácia?
É algo extremamente bem avaliado em termos de eficácia. Para avaliar, é preciso ter códigos. Um americano, por exemplo, introduziu a meditação na medicina há 30 anos, o que nos dá uma boa base. Ele fez um programa de oito semanas que se chama Mindfullness Based Stress Reduction (MBSR). Ele submeteu durante oito semanas pessoas que sofriam de um certo tipo de inflamação a encontros semanais, divididos em dois grupos: um grupo fazia meditação, com auxílio de videocassetes, etc; outro jogava cartas, xadrez, etc. Ao fim de oito semanas, o grupo que havia meditado tinha inflamações bem menores. Os que jogaram cartas, tinham inflamações maiores.
Surpreende que alguém com uma crítica tão enfática à psicanálise acredite nos efeitos benéficos da meditação, mesmo da MBSR, que interage com a psicologia e a psiquiatria.
Mas não é antinômico. Não mesmo.
Acho que já está na hora dessas pessoas grandinhas pararem de torrar o seu dinheiro com fraudadores impunes...
Paulo Roberto de Almeida
O legado freudiano no banco dos réus
Andrei Netto
O Estado de S.Paulo, 21 de maio de 2011
A editora francesa Catherine Meyer, que organizou O Livro Negro da Psicanálise, lançado em versão abreviada no Brasil, diz que a teoria de Freud 'repousa sobre a areia' e acusa a renomada psicanalista Elisabeth Roudinesco de agir de má-fé
Em alguns países, como os Estados Unidos ou a Alemanha, Sigmund Freud (1856-1939) costuma ser situado na categoria dos gênios, mas nem por isso sua obra representa unanimidade. Em outros, como França e Argentina - poderíamos incluir o Brasil? -, o pai da psicanálise não é menos do que um ícone. Nesse sentido, duvidar de suas teorias pode ser interpretado como uma blasfêmia. Foi com o propósito de blasfemar e, por isso, suscitar controvérsia, que a editora franco-argelina Catherine Meyer lançou-se ao desafio de coordenar um "front de oposição" a Freud, lançando em 2005, pela Les Arènes, O Livro Negro da Psicanálise.
O impacto da obra foi imediato - e rapidamente se internacionalizou. Composto em sua versão original de mais de 40 artigos assinados por filósofos, historiadores, psiquiatras e também pacientes, o livro explorava as dúvidas e os fracassos que pesariam sobre a "ciência" fundada por Freud, tomando por base cinco temas: mitos e lendas da psicanálise, seu sucesso, seus impasses, suas vítimas e uma proposta de prática pós-freudiana.
Para tanto, Meyer, 52 anos, encomendou ensaios a especialistas como Mikkel Borch-Jacobsen, autor de Anna O. - Uma Mistificação Centenária; Didier Pleux, diretor do Instituto Francês de Terapia Cognitiva; e Jacques Van Rillaer, professor de psicologia da Universidade de Louvain-la-Neuve e praticante das terapias comportamentais e cognitivas (TCC). Tratava-se, então, de um desafio a dogmas e mitos. O efeito, no entanto, não foi o alcançado, segundo admite Catherine Meyer. Em vez de abrir um debate sobre o lugar das terapias da mente, O Livro Negro da Psicanálise deu origem a uma espécie de acerto de contas entre praticantes da psicanálise e das TCC e a uma troca de farpas no mundo intelectual parisiense e internacional.
A bem da verdade, não se pode inocentar Meyer, que se dispôs ao desafio tendo o marketing como uma de suas preocupações centrais, verificada desde a escolha do nome da obra até seu grande mote: "Freud mentia". Essa polêmica ganha destaque no Brasil com a publicação de uma versão abreviada da edição francesa do Livro Negro da Psicanálise, reunindo textos de 23 ensaístas selecionados por Simone Perelson. Resta torcer que não seja igualmente vazia. Catherine Meyer - formada em Letras Modernas pela Escola Normal Superior, com mestrado sobre ópera romântica - diz esperar que não. Está no seu papel. A seguir, a síntese da entrevista exclusiva ao Estado concedida pela editora no seu escritório, em Paris.
Na sua opinião, Freud era um mentiroso?
Sim, porque ele fraudou seus resultados. Não foi o único; há outros a trapacear no meio científico. Mas você sabe como as coisas funcionam na ciência: define-se uma hipótese, mesmo que inacreditável - como Édipo e o amor de um filho pela mãe e a pedra angular de nossa vida psíquica. Eis uma hipótese! Um filho tem desejo e quer ter relações sexuais com sua mãe. É o Complexo de Édipo. Quando se faz uma hipótese científica, a seguir passa-se à fase de verificação. Procede-se um percurso de pesquisa para constatar a hipótese pela sua eficiência. Quando se imagina um medicamento para a tuberculose, ele é testado em várias pessoas. A seguir, usamos a lixeira para jogar fora todas as hipóteses refutadas. O que os teóricos explicam muito bem no Livro Negro da Psicanálise é que Freud lançou hipóteses e elas nunca deixaram de ser apenas isso: hipóteses. Ele traficou a realidade para confirmar suas hipóteses.
É essa a sua visão sobre a hipótese central de Freud?
A hipótese central de Freud é sensacional! É ela que explica ao mesmo tempo a força e o poder da Psicanálise. Karl Popper explicou que a psicanálise não era uma ciência porque era irrefutável. O Complexo de Édipo é irrefutável. Se você argumenta: "Não, no meu caso não é verdade: eu detesto a minha mãe e adoro o meu pai" e se eu sou um psicanalista, eu lhe respondo: "Isso não refuta o Complexo de Édipo; o que você está fazendo é negar o Complexo de Édipo". É o gênero de teoria "coroa, eu ganho; cara, você perde". É sempre verdade. Karl Popper explicou essa incoerência muito bem. A partir do momento em que atribuímos tudo ao inconsciente, qualquer coisa pode ser verdade. Logo, digo eu, não é jamais verdade. Ou, ao menos, é inverificável. Outra armadilha da psicanálise é que todos os grandes teóricos se contradizem. O que Freud diz no início não é o mesmo que diz no fim, o que Freud diz é diferente do que diz Otto Rank, que é diferente do que diz Carl Gustav Jung. Uns dizem: "Veja, o Complexo de Édipo é simbólico, não real". Outros dirão "Não, é concreto". Dirão que uma criança - de 4 ou de 7 anos, de acordo com cada especialista - quer realmente manter relações sexuais com sua mãe. É uma teoria elástica. Elástica demais.
Sua análise, de uma "teoria elástica", me faz lembrar as críticas de filósofos da pós-modernidade que consideram a psicanálise e as teorias freudianas discursos metanarrativos que se dispõem a explicar o mundo, como o marxismo, por exemplo. É essa sua linha? Absolutamente. Freud é um filósofo, muito mais do que um cientista. Ele se pretendia um cientista. Era um médico que desejava o Prêmio Nobel de Medicina, que desejava fundar uma ciência. Para ele, a sexualidade estava para o psiquismo como o bacilo de Koch está para a tuberculose. Ele desejava encontrar a etiologia de todos os problemas psíquicos. Depois veio Lacan, dizendo que não. Mas, para voltar ao tema "mentira", Freud trabalhou com pacientes e era protegido pelo segredo médico. Quando ele fazia uma descoberta sobre o que revelava um lapso ou um sonho, ao escrever um estudo de caso sobre o tema ele não podia revelar o nome de seus pacientes. Eles eram identificados como O Homem dos Lobos (Sergius Pankejeff), O Homem dos Ratos (Ernst Lanzer), Anna O., caso que foi analisado por seu mentor, Joseph Breuer. Tudo se baseia na palavra de Freud, e nós somos obrigados a acreditar em sua palavra. Como saberemos se o que foi dito é verdade? Berger, um dos primeiros historiadores da psicanálise, fez pesquisas e descobriu que Anna O. se chamava Bertha Pappenheim, e descobriu ainda que ela nunca foi curada. Há outros exemplos. Além do trabalho de historiadores, pode-se dispor da própria obra de Freud, que era muito vasta, afinal, ele era um gênio.
Era um gênio? Mas como Freud pode ser um mentiroso e um gênio?
Há muitos políticos que são geniais e mentirosos, por exemplo.
Uma das críticas comuns à obra que a senhora coordena é o próprio título. Seus detratores o consideram um oportunismo, já que antes o Livro Negro do Comunismo havia feito muito sucesso. A escolha do nome foi marketing?
É verdade que o Livro Negro do Comunismo fez muito barulho. Mas, na época em que pesquisei para o nosso, levantei quantos livros negros havia: não lembro se eram 30 ou 60. "Livro negro" é um conceito genérico para designar um balanço crítico. Porque usamos a expressão "livro negro" não quer dizer que vamos falar de genocídios. Alguns autores que integram a obra eram contra esse título. Mas queríamos fazer um livro para o grande público, ao contrário dos outros, muito acadêmicos. Nosso objetivo era reunir o front dos que refutam: filósofos, psicólogos, psiquiatras, pacientes, historiadores... Algo mais geral, mais voltado ao grande público. Sim, eu assumo que pensamos no marketing também. Mas era para mostrar que não seria apenas um livro acadêmico, mesmo que tenhamos nele muitos acadêmicos de alto nível.
Eu gostaria de ouvi-la sobre críticas contundentes que o seu livro suscitou na França na época de sua publicação. Jean Birnbaum, por exemplo, afirmou que seu livro parece fazer uma aproximação perigosa, uma equação psicanálise = terror.
O que aconteceu é que muitos psicanalistas e jornalistas, no caso de Birnbaum, em lugar de responder às questões abertas pelo livro, dizendo que não estão de acordo com tais e tais argumentos, tentaram lançar uma cortina de fumaça, fazendo acusações. Não houve um verdadeiro debate na França. Então me dei conta de que Freud é um ícone quase religioso. Atacar a Igreja teria sido menos chocante. Freud é um mito. Ao dirigir um livro, tomei todo o cuidado possível para que os ensaios fossem extremamente rigorosos e que não fossem escritos em tom agressivo, mas em tom analítico. O que lamentei foi que, em lugar de abrir uma verdadeira polêmica, uma discussão, houve ataques, apenas ataques.
Elisabeth Roudinesco constatou em artigo que determinadas citações de sua obra empregadas por autores que assinam o seu livro não são fiéis ao seu pensamento. O que a senhora responde?
Gostaria que ela nos indicasse essas citações.
Ela o fez. Escreveu um artigo, À Propos du Livre Noir de la Psychanalyse, citando trechos do livro e comparando-os à sua própria obra.
Nós não traficamos citações. Ela, sim, trafica citações. A senhora Roudinesco diz ser historiadora da psicanálise, mas não fala alemão. Todos os outros historiadores da psicanálise falam alemão. Eles leram Freud em versões originais e não nas traduções francesas, que não são boas. A senhora Roudinesco foi e é de uma grande má-fé,
Alguns críticos interpretaram o seu Livro Negro como um ataque frontal de adeptos das terapias comportamentais e cognitivas (TCC), que contestam abertamente a legitimidade da psicanálise. Como essa disputa entre a psicanálise e as TCC se reflete no seu livro?
É uma das questões em jogo, mas não a única. Algumas pessoas resumiram o livro a essa questão. Mas não é verdade. Para um jornalista, é fácil reduzir o livro a uma guerra entre duas escolas. É verdade em parte. Mas toda a pesquisa histórica que está no livro não tem nada a ver com briga de escolas. Os historiadores que constam do livro buscam o viés de historiadores, apresentando Freud como um médico que fez descobertas. Eles não têm nada a ver com TCC.
Mas esse afrontamento existe no livro.
Uma das razões pelas quais eu quis fazer esse livro é porque, na França, um psi é forçosamente um psicanalista, enquanto nos Estados Unidos, na Europa do norte, nos países nórdicos, há várias alternativas terapêuticas, entre as quais a psicanálise. A psicanálise não é o único deus no universo psi.
Mas Roudinesco, que é reconhecida como uma das psicanalistas mais importantes do mundo, afirma que a psicanálise é muito eficiente contra neuroses, mas não psicoses. Isso não é um mea-culpa?
Freud dizia isso também. Mas esse é outro problema. Na França, você pode se tornar psicanalista depois de fazer estudos de sociologia e passar por análise didática. Assim você se torna psicanalista. Não há nenhuma formação clínica. Nenhuma. Se o sujeito não tem formação clínica, como pode saber se tem diante de si um neurótico ou alguém que está em depressão muito grave?
A senhora disse que a verificabilidade é um dos problemas da psicanálise e uma das questões em jogo no livro. Mas não podemos verificar com precisão resultados em diversas outras Ciências Humanas. Por que a psicanálise não é uma ciência e a sociologia é uma ciência, a seu ver?
A sociologia não é uma ciência. A medicina ou a psiquiatria são ciências. E olhe lá, porque elas também não conseguem explicar por que alguns pacientes se curam e outros não. Deixe eu citar um exemplo: o autismo. Nesse assunto, estamos realmente no lado negro da psicanálise, porque ela fez muito estrago. A psicanálise, por meio de Bruno Bettelheim, que acusou as mães de serem responsáveis pelo autismo de seus filhos (mais tarde surgiriam denúncias de que ele maltratava os pequenos pacientes). Inconscientemente, dizia o autor, a mãe desejava a morte de seu filho. Além de ser extremamente irresponsável, já que sabemos que o autismo é um problema genético em grande parte, ainda é cruel, porque acusa uma mulher de ser a responsável por uma doença. Não bastasse, sabemos que não se pode curar o autismo.
Voltando ao assunto, sua definição de ciência se limita ao que se costumava chamar de "ciências duras", excluindo as Ciências Humanas.
É isso. A psicanálise é uma teoria que repousa sobre a areia, sobre o segredo, sobre o que não se pode verificar, o que é irrefutável, o que não pode ter sua eficácia comprovada. É claro que há coisas positivas. Não sou contra a constatação do inconsciente. Muitos teóricos estão de acordo. Mas isso não quer dizer que estamos de acordo com o inconsciente freudiano. A ideia de que temos um inconsciente que pode determinar certos comportamentos não é negada por ninguém, mas isso pode não ter nada a ver com a sexualidade, com o Complexo de Édipo, a angústia da castração. É isso que eu refuto.
Não podemos usar o mesmo argumento da cura e de sua verificabilidade para a TCC?
Mas eu não vejo quem pode se dizer hoje em dia capaz de curar tudo, como fazemos com doenças tratáveis por antibióticos. Estamos no início. O conhecimento do psiquismo e a cura do psiquismo têm apenas 150 anos. Estamos na situação dos médicos da Idade Média, que ousavam tratar retirando e injetando sangue.
A senhora já fez análise?
Não, não fiz análise. O que fiz foi uma curta psicoterapia analítica que me fez muito bem. Por um ou dois anos fui a um terapeuta. Eu não era doente. Tinha apenas alguns problemas existenciais, e a terapia me fez muito bem. Não tenho nenhum acerto de contas com a psicanálise. O conselho que daria é, se você é doente, não faça psicanálise. Eu descobri algo que funciona muito bem para casos de problemas existenciais, por exemplo, que é a meditação.
A senhora faz meditação? E como avalia sua eficácia?
É algo extremamente bem avaliado em termos de eficácia. Para avaliar, é preciso ter códigos. Um americano, por exemplo, introduziu a meditação na medicina há 30 anos, o que nos dá uma boa base. Ele fez um programa de oito semanas que se chama Mindfullness Based Stress Reduction (MBSR). Ele submeteu durante oito semanas pessoas que sofriam de um certo tipo de inflamação a encontros semanais, divididos em dois grupos: um grupo fazia meditação, com auxílio de videocassetes, etc; outro jogava cartas, xadrez, etc. Ao fim de oito semanas, o grupo que havia meditado tinha inflamações bem menores. Os que jogaram cartas, tinham inflamações maiores.
Surpreende que alguém com uma crítica tão enfática à psicanálise acredite nos efeitos benéficos da meditação, mesmo da MBSR, que interage com a psicologia e a psiquiatria.
Mas não é antinômico. Não mesmo.
Dois paises, duas policias, duas justicas, uma unica conclusao...
Primeiro a materia de um conhecido jornalista:
Direto ao Ponto
O caseiro do Piauí e a camareira da Guiné
AUGUSTO NUNES
Blog Veja, 20/05/2011
Nascido no Piauí, Francenildo Costa era caseiro em Brasília. Em 2006, depois de confirmar que Antonio Palocci frequentava regularmente a mansão que fingia nem conhecer, teve o sigilo bancário estuprado a mando do ministro da Fazenda.
Nascida na Guiné, Nafissatou Diallo mudou-se para Nova York em 1998 e é camareira do Sofitel há três anos. Domingo passado, enquanto arrumava o apartamento em que se hospedava Dominique Strauss-Kahn, foi estuprada pelo diretor do FMI e candidato à presidência da França.
Consumado o crime em Brasília, a direção da Caixa Econômica Federal absolveu liminarmente o culpado e acusou a vítima de ter-se beneficiado de um estranho depósito no valor de R$ 30 mil. Francenildo explicou que o dinheiro fora enviado pelo pai. Por duvidar da palavra do caseiro, a Polícia Federal resolveu interrogá-lo até admitir, horas mais tarde, que o que disse desde sempre era verdade.
Consumado o crime em Nova York, a direção do hotel chamou a polícia, que ouviu o relato de Nafissatou. Confiantes na palavra da camareira, os agentes da lei descobriram o paradeiro do hóspede suspeito e conseguiram prendê-lo dois minutos antes da decolagem do avião que o levaria para Paris ─ e para a impunidade perpétua.
Até depor na CPI dos Bingos, Francenildo, hoje com 28 anos, não sabia quem era o homem que vira várias vezes chegando de carro à “República de Ribeirão Preto”. Informado de que se tratava do ministro da Fazenda, esperou sem medo a hora de confirmar na Justiça o que dissera no Congresso. Nunca foi chamado para detalhar o que testemunhou. Na sessão do Supremo Tribunal Federal que julgou o caso, ele se ofereceu para falar. Os juízes se dispensaram de ouvi-lo. Decidiram que Palocci não mentiu e engavetaram a história.
Depois da captura de Strauss, a camareira foi levada à polícia para fazer o reconhecimento formal do agressor. Só então descobriu que o estuprador é uma celebridade internacional. A irmã que a acompanhava assustou-se. Nafissatou, muçulmana de 32 anos, disse que acreditava na Justiça americana. Embora jurasse que tudo não passara de sexo consensual, o acusado foi recolhido a uma cela.
Nesta quinta-feira, Francenildo completou cinco anos sem emprego fixo. Palocci completou cinco dias de silêncio: perdeu a voz no domingo, quando o país soube do milagre da multiplicação do patrimônio. Pela terceira vez em oito anos, está de volta ao noticiário político-policial.
Enquanto se recupera do trauma, a camareira foi confortada por um comunicado da direção do hotel: “Estamos completamente satisfeitos com seu trabalho e seu comportamento”, diz um trecho. Nesta sexta-feira, depois de cinco noites num catre, Strauss pagou a fiança de 1 milhão de dólares para responder ao processo em prisão domiciliar. Até o julgamento, terá de usar uma tornozeleira eletrônica.
Livre de complicações judiciais, Palocci elegeu-se deputado, caiu nas graças de Dilma Rousseff e há quatro meses, na chefia da Casa Civil, faz e desfaz como primeiro-ministro. Atropelado pela descoberta de que andou ganhando pilhas de dinheiro como traficante de influência, tenta manter o emprego. Talvez consiga: desde 2003, não existe pecado do lado de baixo do equador. O Brasil dos delinquentes cinco estrelas é um convite à reincidência.
Enlaçado pelo braço da Justiça, Strauss renunciou à direção do FMI, sepultou o projeto presidencial e é forte candidato a uma longa temporada na gaiola. Descobriu tardiamente que, nos Estados Unidos, todos são iguais perante a lei. Não há diferenças entre o hóspede do apartamento de 3 mil dólares por dia e a imigrante africana incumbida de arrumá-lo.
Altos Companheiros do PT, esse viveiro de gigolôs da miséria, recitam de meia em meia hora que o Grande Satã ianque é o retrato do triunfo dos poderosos sobre os oprimidos. Lugar de pobre que sonha com o paraíso é o Brasil que Lula inventou. Colocados lado a lado, o caseiro do Piauí e a camareira da Guiné gritam o contrário.
Se tentasse fazer lá o que faz aqui, Palocci teria estacionado no primeiro item do prontuário. Se escolhesse o País do Carnaval para fazer o que fez nos Estados Unidos, Strauss só se arriscaria a ser convidado para comandar o Banco Central. O azar de Francenildo foi não ter tentado a vida em Nova York. A sorte de Nassifatou foi ter escapado de um Brasil que absolve o criminoso reincidente e castiga quem comete o pecado da honestidade.
===========
Agora a conclusão, que é só minha:
Vamos ter de avançar muito, ainda, para escapar da pré-história da Justiça e penetrar numa era em que a Justiça (e a polícia, por antecipação) funcione igual para todos.
Vai demorar um pouco mais, talvez uma ou duas gerações, para que a população deixe de eleger trogloditas e mentecaptos e que estes deixem de escolher juízes medíocres e venais para os cargos pertinentes.
Vai demorar mais um pouco. Um dia chega. Infelizmente não vamos ver esse dia any time soon.
Direto ao Ponto
O caseiro do Piauí e a camareira da Guiné
AUGUSTO NUNES
Blog Veja, 20/05/2011
Nascido no Piauí, Francenildo Costa era caseiro em Brasília. Em 2006, depois de confirmar que Antonio Palocci frequentava regularmente a mansão que fingia nem conhecer, teve o sigilo bancário estuprado a mando do ministro da Fazenda.
Nascida na Guiné, Nafissatou Diallo mudou-se para Nova York em 1998 e é camareira do Sofitel há três anos. Domingo passado, enquanto arrumava o apartamento em que se hospedava Dominique Strauss-Kahn, foi estuprada pelo diretor do FMI e candidato à presidência da França.
Consumado o crime em Brasília, a direção da Caixa Econômica Federal absolveu liminarmente o culpado e acusou a vítima de ter-se beneficiado de um estranho depósito no valor de R$ 30 mil. Francenildo explicou que o dinheiro fora enviado pelo pai. Por duvidar da palavra do caseiro, a Polícia Federal resolveu interrogá-lo até admitir, horas mais tarde, que o que disse desde sempre era verdade.
Consumado o crime em Nova York, a direção do hotel chamou a polícia, que ouviu o relato de Nafissatou. Confiantes na palavra da camareira, os agentes da lei descobriram o paradeiro do hóspede suspeito e conseguiram prendê-lo dois minutos antes da decolagem do avião que o levaria para Paris ─ e para a impunidade perpétua.
Até depor na CPI dos Bingos, Francenildo, hoje com 28 anos, não sabia quem era o homem que vira várias vezes chegando de carro à “República de Ribeirão Preto”. Informado de que se tratava do ministro da Fazenda, esperou sem medo a hora de confirmar na Justiça o que dissera no Congresso. Nunca foi chamado para detalhar o que testemunhou. Na sessão do Supremo Tribunal Federal que julgou o caso, ele se ofereceu para falar. Os juízes se dispensaram de ouvi-lo. Decidiram que Palocci não mentiu e engavetaram a história.
Depois da captura de Strauss, a camareira foi levada à polícia para fazer o reconhecimento formal do agressor. Só então descobriu que o estuprador é uma celebridade internacional. A irmã que a acompanhava assustou-se. Nafissatou, muçulmana de 32 anos, disse que acreditava na Justiça americana. Embora jurasse que tudo não passara de sexo consensual, o acusado foi recolhido a uma cela.
Nesta quinta-feira, Francenildo completou cinco anos sem emprego fixo. Palocci completou cinco dias de silêncio: perdeu a voz no domingo, quando o país soube do milagre da multiplicação do patrimônio. Pela terceira vez em oito anos, está de volta ao noticiário político-policial.
Enquanto se recupera do trauma, a camareira foi confortada por um comunicado da direção do hotel: “Estamos completamente satisfeitos com seu trabalho e seu comportamento”, diz um trecho. Nesta sexta-feira, depois de cinco noites num catre, Strauss pagou a fiança de 1 milhão de dólares para responder ao processo em prisão domiciliar. Até o julgamento, terá de usar uma tornozeleira eletrônica.
Livre de complicações judiciais, Palocci elegeu-se deputado, caiu nas graças de Dilma Rousseff e há quatro meses, na chefia da Casa Civil, faz e desfaz como primeiro-ministro. Atropelado pela descoberta de que andou ganhando pilhas de dinheiro como traficante de influência, tenta manter o emprego. Talvez consiga: desde 2003, não existe pecado do lado de baixo do equador. O Brasil dos delinquentes cinco estrelas é um convite à reincidência.
Enlaçado pelo braço da Justiça, Strauss renunciou à direção do FMI, sepultou o projeto presidencial e é forte candidato a uma longa temporada na gaiola. Descobriu tardiamente que, nos Estados Unidos, todos são iguais perante a lei. Não há diferenças entre o hóspede do apartamento de 3 mil dólares por dia e a imigrante africana incumbida de arrumá-lo.
Altos Companheiros do PT, esse viveiro de gigolôs da miséria, recitam de meia em meia hora que o Grande Satã ianque é o retrato do triunfo dos poderosos sobre os oprimidos. Lugar de pobre que sonha com o paraíso é o Brasil que Lula inventou. Colocados lado a lado, o caseiro do Piauí e a camareira da Guiné gritam o contrário.
Se tentasse fazer lá o que faz aqui, Palocci teria estacionado no primeiro item do prontuário. Se escolhesse o País do Carnaval para fazer o que fez nos Estados Unidos, Strauss só se arriscaria a ser convidado para comandar o Banco Central. O azar de Francenildo foi não ter tentado a vida em Nova York. A sorte de Nassifatou foi ter escapado de um Brasil que absolve o criminoso reincidente e castiga quem comete o pecado da honestidade.
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Agora a conclusão, que é só minha:
Vamos ter de avançar muito, ainda, para escapar da pré-história da Justiça e penetrar numa era em que a Justiça (e a polícia, por antecipação) funcione igual para todos.
Vai demorar um pouco mais, talvez uma ou duas gerações, para que a população deixe de eleger trogloditas e mentecaptos e que estes deixem de escolher juízes medíocres e venais para os cargos pertinentes.
Vai demorar mais um pouco. Um dia chega. Infelizmente não vamos ver esse dia any time soon.
"A saude no Brasil atinge a perfeicao", ou uma variacao disso...
Nao tenho certeza da frase acima, citada de memoria, talvez tenha sido algo como: "A saúde no Brasil é quase perfeita".
Whatever! Nosso equivocado frasista não tinha o menor compromisso com a verdade, e desejava apenas engrandecer seu desgoverno e as fraudes continuamente praticadas contra os brasileiros pela inepcia dos companheiros encastelados no poder.
Abaixo, um resumo de uma matéria maior da revista The Lancet sobre a saúde no Brasil:
http://www.thelancet.com/series/health-in-brazil?elsca1=BRAZILSERIES-ANNOUNCEMENT&elsca2=email&elsca3=segment
Health in Brazil
Launched in Brasília May 9, 2011
Brazil has made significant improvements in maternal and child health, emergency care, and in reducing the burden of infectious diseases. But the news is not all good. The country continues to have a burden of injury mortality that is different from other countries due to the large number of murders, especially using firearms. Obesity levels are increasing and caesarean section rates are the highest in the world.
Brazil now has the opportunity to move closer towards its ultimate goal of universal, equitable, and sustainable health care as enshrined in the 1988 Constitution. To highlight this opportunity, The Lancet is publishing a Series of six papers that critically examine what the country’s policies have achieved and where future challenges lie. As Cesar Victora and colleagues conclude in the final paper of the Series: "the challenge is ultimately political, requiring continuous engagement by Brazilian society as a whole to secure the right to health for all Brazilian people."
Whatever! Nosso equivocado frasista não tinha o menor compromisso com a verdade, e desejava apenas engrandecer seu desgoverno e as fraudes continuamente praticadas contra os brasileiros pela inepcia dos companheiros encastelados no poder.
Abaixo, um resumo de uma matéria maior da revista The Lancet sobre a saúde no Brasil:
http://www.thelancet.com/series/health-in-brazil?elsca1=BRAZILSERIES-ANNOUNCEMENT&elsca2=email&elsca3=segment
Health in Brazil
Launched in Brasília May 9, 2011
Brazil has made significant improvements in maternal and child health, emergency care, and in reducing the burden of infectious diseases. But the news is not all good. The country continues to have a burden of injury mortality that is different from other countries due to the large number of murders, especially using firearms. Obesity levels are increasing and caesarean section rates are the highest in the world.
Brazil now has the opportunity to move closer towards its ultimate goal of universal, equitable, and sustainable health care as enshrined in the 1988 Constitution. To highlight this opportunity, The Lancet is publishing a Series of six papers that critically examine what the country’s policies have achieved and where future challenges lie. As Cesar Victora and colleagues conclude in the final paper of the Series: "the challenge is ultimately political, requiring continuous engagement by Brazilian society as a whole to secure the right to health for all Brazilian people."
O gigante anestesiado? provavelmente...
Os fatos sao os relatados abaixo. Se, depois de tudo isso, não acontecer nada, é porque o gigante não só foi anestesiado, mas drogado, amarrado, amordaçado, humilhado, pronto para servir de repasto às máfias que disputam o poder...
Primeiro a notícia, depois o editorial...
Paulo Roberto de Almeida
Entre a eleição e a posse de Dilma, Palocci faturou R$ 10 milhões
Catia Seabra
Folha de S.Paulo, 21/05/2011
O faturamento da consultoria do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, no ano passado superou R$ 10 milhões em novembro e dezembro, os dois meses que separaram a eleição da presidente Dilma Rousseff e sua posse. Palocci foi o principal coordenador da campanha de Dilma e chefiou a equipe que organizou a transição para o novo governo nesse período. Dilma anunciou sua escolha como ministro da Casa Civil no dia 3 de dezembro.
O valor obtido nos últimos dois meses do ano pela empresa de Palocci, a Projeto, representa mais da metade de sua receita no ano passado. A consultoria faturou R$ 20 milhões em 2010, segundo duas pessoas que examinaram seus números e foram ouvidas pela Folha.
Sem confirmar os valores, a assessoria da empresa atribuiu a intensa movimentação do fim do ano ao cancelamento de vários contratos após a decisão de Palocci de mudar a Projeto de ramo e encerrar suas atividades como consultor, antes de assumir o comando da Casa Civil. Palocci abriu a Projeto em julho de 2006 e manteve sua atividade empresarial nos quatro anos em que exerceu o mandato de deputado federal e durante a campanha eleitoral do ano passado.
Como a Folha revelou ontem, o desempenho da Projeto no ano passado representou salto significativo em comparação com os R$ 160 mil faturados em 2006, quando a empresa abriu as portas. faturamento da Projeto em 2010 põe a consultoria de Palocci em pé de igualdade com as maiores empresas do ramo no país. A LCA Consultores, que hoje lidera o setor, faturou pouco mais de R$ 20 milhões no ano passado. Entre as empresas que contrataram Palocci nos últimos anos estão a construtora WTorre e a operadora de planos de saúde Amil, como a Folha informou ontem.
==========
O que o ministro oferecia? Tráfico de influência!
Edtorial - O Estado de S.Paulo
Sábado, 21/05/2011
O então deputado federal e ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci faturou muito mais do que os cerca de R$ 7,5 milhões gastos com os dois imóveis comprados em nome da Projeto, a empresa de consultoria que abriu em 2006 e transformou em administradora de bens no final de 2010, dias antes de assumir a Casa Civil da presidente Dilma Rousseff, de quem tinha sido coordenador de campanha. Nesse período, portanto, ele multiplicou o seu patrimônio declarado por muito mais do que 20 vezes.
Palocci se recusa a falar em números, a identificar clientes e a descrever a natureza dos serviços que lhes prestou. Mas o texto produzido por sua assessoria para orientar os líderes da base parlamentar do governo na sua defesa - e que, por inadvertência, foi amplamente difundido - argumenta que, “no mercado de capitais e em outros setores, a passagem por Ministério da Fazenda, BNDES ou Banco Central proporciona uma experiência única que dá enorme valor a esses profissionais no mercado”, citando ex-autoridades da área que prosperaram na iniciativa privada.
Qual será o valor de mercado de quem tem a oferecer, além da “experiência única”, a credencial de ter permanecido como protagonista de primeira grandeza na esfera das decisões do governo? Palocci sabia não apenas como funciona o poder, mas que rumos o poder tencionava tomar em matérias de interesse direto do empresariado e do sistema financeiro. O escândalo da quebra do sigilo bancário do caseiro que testemunhou as visitas do então titular da Fazenda a uma mal-afamada casa de Brasília custou-lhe o posto, mas não o prestígio.
Enquanto dava lá as suas disputadas consultorias - a carteira de clientes da Projeto incluía pelo menos 20 formidáveis corporações -, ele continuava a ser interlocutor privilegiado do presidente Lula e da elite lulista, no Executivo, na administração indireta e no Congresso. Quando chegou a hora, tornou-se fiador da candidata Dilma Rousseff junto ao grande capital. Dizer, como o aide-mémoire que vazou para todos os lados, que 237 parlamentares exercem atividade econômica é querer jogar areia nos fatos. O deputado Palocci esteve longe de ser mais um.
Relator do projeto social do pré-sal e da proposta de prorrogação da CPMF, presidente da comissão da reforma tributária e membro da comissão do Orçamento, lembra a colunista Maria Cristina Fernandes, do jornal Valor, além de diretamente envolvido na regulamentação da previdência complementar, ele estava em posição de antecipar tendências aos seus consulentes, um certo número dos quais há de ter contribuído para a sua campanha, e de levar em conta os seus interesses. Não está claro em que medida isso estava no cerne de suas consultorias - se é que estava. Mas os ganhos da Projeto são compatíveis com oportunidades dessa magnitude.
Significativamente, talvez, a firma não tinha nome na praça, ao contrário de congêneres como a LCA e a Tendências (de que é sócio o ex-ministro Mailson da Nóbrega, citado como exemplo de sucesso na nota da Casa Civil). Segundo a Folha de S.Paulo, profissionais do setor “nunca ouviram falar da atuação da empresa de Palocci”. O jornal equipara o faturamento da Projeto ao daquelas com uma centena ou mais de clientes - um número bem maior que os do ministro - e dezenas ou uma centena de funcionários. O quadro de pessoal da Projeto é desconhecido.
Em documento enviado à Procuradoria-Geral da República para se antecipar a um eventual pedido de esclarecimento sobre os seus negócios, conforme revelou o Estado, Palocci cita apenas o seu sócio (com 1% do capital da consultora) Lucas Martins Novaes. Por ser ele economista, o ministro - médico de formação - podia ter uma empresa de “prestação de serviços, palestras, análise de mercado”. A explicação é supérflua. Obviamente, nenhuma empresa capaz de pagar o que a Projeto cobrava iria preteri-la em razão das origens profissionais do seu sócio titular.
Nem ele deve tê-la criado para lavar “recursos não contabilizados”, como diriam os seus companheiros petistas ao tempo do mensalão. A lógica dos fatos indica que o ilícito que se poderia atribuir a Palocci, levando às alturas o seu patrimônio, chama-se tráfico de influência.
==========
Ministro pede a Kassab que preserve sigilo fiscal da Projeto
Por Leandro Colon
O Estado de S. Paulo, 20/05/2011
Para evitar qualquer tipo de quebra ilegal do sigilo fiscal de sua empresa, o ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, acionou o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab. O petista quer evitar que integrantes de escalões inferiores da administração municipal vazem informações sobre a Projeto Administração de Imóveis, que até o ano passado funcionou como empresa de consultoria.
Um interlocutor do ministro telefonou para Kassab na quarta-feira, 18, para alertar sobre rumores de que adversários do ministro estavam trabalhando para conseguir os valores de tributos municipais recolhidos por sua empresa entre 2006 e 2010, período em que Palocci disse ter prestado consultoria a clientes através da Projeto. A revelação, por exemplo, de quanto o ministro recolheu do Imposto Sobre Serviço (ISS), cuja alíquota é de 5% em São Paulo, poderia indicar o faturamento da Projeto, informação que Palocci tem guardado a sete chaves.
Ao recorrer a Kassab, o Palácio do Planalto mostra que conta com seu apoio na crise vivida pelo ministro da Casa Civil após a revelação de que aumentou seu patrimônio em 20 vezes nos últimos quatro anos. Ao deixar o DEM para fundar o PSD, o prefeito de São Paulo tem sinalizado uma aproximação com o governo da presidente Dilma Rousseff. Na conversa com os interlocutores de Palocci, Kassab mandou o recado de que, se depender dele, não haverá vazamento de dados sigilosos de sua empresa que estão ao alcance da Prefeitura. Kassab escalou assessores para acompanhar o caso.
A aliados, Palocci tem debitado a origem da crise a possíveis divergências políticas dentro do seu próprio partido, o PT. Teme que petistas usem a influência conquistada em escalões inferiores na gestão de Marta Suplicy para conseguir informações sigilosas de sua empresa. Palocci também avalia que políticos do PSDB, de olho em desgastá-lo, atuem para obter dados fiscais da Projeto.
Primeiro a notícia, depois o editorial...
Paulo Roberto de Almeida
Entre a eleição e a posse de Dilma, Palocci faturou R$ 10 milhões
Catia Seabra
Folha de S.Paulo, 21/05/2011
O faturamento da consultoria do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, no ano passado superou R$ 10 milhões em novembro e dezembro, os dois meses que separaram a eleição da presidente Dilma Rousseff e sua posse. Palocci foi o principal coordenador da campanha de Dilma e chefiou a equipe que organizou a transição para o novo governo nesse período. Dilma anunciou sua escolha como ministro da Casa Civil no dia 3 de dezembro.
O valor obtido nos últimos dois meses do ano pela empresa de Palocci, a Projeto, representa mais da metade de sua receita no ano passado. A consultoria faturou R$ 20 milhões em 2010, segundo duas pessoas que examinaram seus números e foram ouvidas pela Folha.
Sem confirmar os valores, a assessoria da empresa atribuiu a intensa movimentação do fim do ano ao cancelamento de vários contratos após a decisão de Palocci de mudar a Projeto de ramo e encerrar suas atividades como consultor, antes de assumir o comando da Casa Civil. Palocci abriu a Projeto em julho de 2006 e manteve sua atividade empresarial nos quatro anos em que exerceu o mandato de deputado federal e durante a campanha eleitoral do ano passado.
Como a Folha revelou ontem, o desempenho da Projeto no ano passado representou salto significativo em comparação com os R$ 160 mil faturados em 2006, quando a empresa abriu as portas. faturamento da Projeto em 2010 põe a consultoria de Palocci em pé de igualdade com as maiores empresas do ramo no país. A LCA Consultores, que hoje lidera o setor, faturou pouco mais de R$ 20 milhões no ano passado. Entre as empresas que contrataram Palocci nos últimos anos estão a construtora WTorre e a operadora de planos de saúde Amil, como a Folha informou ontem.
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O que o ministro oferecia? Tráfico de influência!
Edtorial - O Estado de S.Paulo
Sábado, 21/05/2011
O então deputado federal e ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci faturou muito mais do que os cerca de R$ 7,5 milhões gastos com os dois imóveis comprados em nome da Projeto, a empresa de consultoria que abriu em 2006 e transformou em administradora de bens no final de 2010, dias antes de assumir a Casa Civil da presidente Dilma Rousseff, de quem tinha sido coordenador de campanha. Nesse período, portanto, ele multiplicou o seu patrimônio declarado por muito mais do que 20 vezes.
Palocci se recusa a falar em números, a identificar clientes e a descrever a natureza dos serviços que lhes prestou. Mas o texto produzido por sua assessoria para orientar os líderes da base parlamentar do governo na sua defesa - e que, por inadvertência, foi amplamente difundido - argumenta que, “no mercado de capitais e em outros setores, a passagem por Ministério da Fazenda, BNDES ou Banco Central proporciona uma experiência única que dá enorme valor a esses profissionais no mercado”, citando ex-autoridades da área que prosperaram na iniciativa privada.
Qual será o valor de mercado de quem tem a oferecer, além da “experiência única”, a credencial de ter permanecido como protagonista de primeira grandeza na esfera das decisões do governo? Palocci sabia não apenas como funciona o poder, mas que rumos o poder tencionava tomar em matérias de interesse direto do empresariado e do sistema financeiro. O escândalo da quebra do sigilo bancário do caseiro que testemunhou as visitas do então titular da Fazenda a uma mal-afamada casa de Brasília custou-lhe o posto, mas não o prestígio.
Enquanto dava lá as suas disputadas consultorias - a carteira de clientes da Projeto incluía pelo menos 20 formidáveis corporações -, ele continuava a ser interlocutor privilegiado do presidente Lula e da elite lulista, no Executivo, na administração indireta e no Congresso. Quando chegou a hora, tornou-se fiador da candidata Dilma Rousseff junto ao grande capital. Dizer, como o aide-mémoire que vazou para todos os lados, que 237 parlamentares exercem atividade econômica é querer jogar areia nos fatos. O deputado Palocci esteve longe de ser mais um.
Relator do projeto social do pré-sal e da proposta de prorrogação da CPMF, presidente da comissão da reforma tributária e membro da comissão do Orçamento, lembra a colunista Maria Cristina Fernandes, do jornal Valor, além de diretamente envolvido na regulamentação da previdência complementar, ele estava em posição de antecipar tendências aos seus consulentes, um certo número dos quais há de ter contribuído para a sua campanha, e de levar em conta os seus interesses. Não está claro em que medida isso estava no cerne de suas consultorias - se é que estava. Mas os ganhos da Projeto são compatíveis com oportunidades dessa magnitude.
Significativamente, talvez, a firma não tinha nome na praça, ao contrário de congêneres como a LCA e a Tendências (de que é sócio o ex-ministro Mailson da Nóbrega, citado como exemplo de sucesso na nota da Casa Civil). Segundo a Folha de S.Paulo, profissionais do setor “nunca ouviram falar da atuação da empresa de Palocci”. O jornal equipara o faturamento da Projeto ao daquelas com uma centena ou mais de clientes - um número bem maior que os do ministro - e dezenas ou uma centena de funcionários. O quadro de pessoal da Projeto é desconhecido.
Em documento enviado à Procuradoria-Geral da República para se antecipar a um eventual pedido de esclarecimento sobre os seus negócios, conforme revelou o Estado, Palocci cita apenas o seu sócio (com 1% do capital da consultora) Lucas Martins Novaes. Por ser ele economista, o ministro - médico de formação - podia ter uma empresa de “prestação de serviços, palestras, análise de mercado”. A explicação é supérflua. Obviamente, nenhuma empresa capaz de pagar o que a Projeto cobrava iria preteri-la em razão das origens profissionais do seu sócio titular.
Nem ele deve tê-la criado para lavar “recursos não contabilizados”, como diriam os seus companheiros petistas ao tempo do mensalão. A lógica dos fatos indica que o ilícito que se poderia atribuir a Palocci, levando às alturas o seu patrimônio, chama-se tráfico de influência.
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Ministro pede a Kassab que preserve sigilo fiscal da Projeto
Por Leandro Colon
O Estado de S. Paulo, 20/05/2011
Para evitar qualquer tipo de quebra ilegal do sigilo fiscal de sua empresa, o ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, acionou o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab. O petista quer evitar que integrantes de escalões inferiores da administração municipal vazem informações sobre a Projeto Administração de Imóveis, que até o ano passado funcionou como empresa de consultoria.
Um interlocutor do ministro telefonou para Kassab na quarta-feira, 18, para alertar sobre rumores de que adversários do ministro estavam trabalhando para conseguir os valores de tributos municipais recolhidos por sua empresa entre 2006 e 2010, período em que Palocci disse ter prestado consultoria a clientes através da Projeto. A revelação, por exemplo, de quanto o ministro recolheu do Imposto Sobre Serviço (ISS), cuja alíquota é de 5% em São Paulo, poderia indicar o faturamento da Projeto, informação que Palocci tem guardado a sete chaves.
Ao recorrer a Kassab, o Palácio do Planalto mostra que conta com seu apoio na crise vivida pelo ministro da Casa Civil após a revelação de que aumentou seu patrimônio em 20 vezes nos últimos quatro anos. Ao deixar o DEM para fundar o PSD, o prefeito de São Paulo tem sinalizado uma aproximação com o governo da presidente Dilma Rousseff. Na conversa com os interlocutores de Palocci, Kassab mandou o recado de que, se depender dele, não haverá vazamento de dados sigilosos de sua empresa que estão ao alcance da Prefeitura. Kassab escalou assessores para acompanhar o caso.
A aliados, Palocci tem debitado a origem da crise a possíveis divergências políticas dentro do seu próprio partido, o PT. Teme que petistas usem a influência conquistada em escalões inferiores na gestão de Marta Suplicy para conseguir informações sigilosas de sua empresa. Palocci também avalia que políticos do PSDB, de olho em desgastá-lo, atuem para obter dados fiscais da Projeto.
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