Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
quarta-feira, 14 de agosto de 2019
Diplomacia da canelada? (O Globo); ou da ignorância inconstitucional? (PRA)
Bolsonaro insiste na diplomacia da canelada

Diplomacia da canelada
Jair Bolsonaro entrou na fase de rasgar dinheiro. No domingo, ele disse não se importar com o corte nas doações alemãs para a proteção da Amazônia. “Pode fazer bom uso dessa grana. O Brasil não precisa disso”, desdenhou.
Jair Bolsonaro entrou na fase de rasgar dinheiro. No domingo, ele disse não se importar com o corte nas doações alemãs para a proteção da Amazônia. “Pode fazer bom uso dessa grana. O Brasil não precisa disso”, desdenhou.
Em tempos de vacas magras, o presidente esnobou R$ 155 milhões oferecidos por um país amigo. O repasse seria destinado a ações de combate ao desmatamento. Para recebê-lo, o Brasil só precisava demonstrar empenho na proteção da floresta.
Bolsonaro já deixou claro que se lixa para a tarefa. Na semana passada, chegou a brincar com o apelido de “Capitão Motosserra”. A ministra alemã Svenja Schulze não achou graça. “Não posso simplesmente ficar dando dinheiro enquanto continuam desmatando”, disse. O 7 a 1 continua, mas agora a goleada é na arena diplomática.
Ontem o presidente deu outra canelada que pode custar caro ao país. Em visita a Pelotas, ele reclamou da derrota de Mauricio Macri nas prévias argentinas. Chegou a fazer terrorismo com a provável vitória da oposição peronista. “Se essa esquerdalha voltar aqui na Argentina, nós poderemos ter sim, no Rio Grande do Sul, um novo estado de Roraima. E não queremos isso: irmãos argentinos fugindo pra cá”, afirmou.
A Constituição estabelece que as relações internacionais do Brasil devem seguir os princípios da não intervenção e da autodeterminação dos povos. Ao atacar a escolha dos argentinos, Bolsonaro descumpre a lei brasileira e desrespeita o eleitorado do país vizinho.
O discurso do presidente também afronta a inteligência alheia. Cristina Kirchner não é Nicolás Maduro, e Buenos Aires não é Caracas. Se o peronismo vencer, o Brasil poderá enfrentar represálias do seu maior parceiro comercial na região. E os argentinos continuarão fugindo para cá, mas só na temporada de férias.
Macri está em baixa porque a economia argentina vai mal. Seu choque liberal não deu certo: a pobreza cresceu, a inflação disparou e o país voltou a pedir socorro ao FMI. O apoio de Bolsonaro também parece não ajudá-lo. Os argentinos não têm saudade da ditadura militar, que o presidente brasileiro insiste em defender.
terça-feira, 13 de agosto de 2019
O que pensam os senadores do Paraná sobre o “embaixador” Eduardo Bolsonaro - João Frey (Gazeta do Povo)
O que pensam os senadores do Paraná sobre o “embaixador” Eduardo Bolsonaro
Gazeta do Povo, 13/08/2019

Para que possa assumir o posto de embaixador do Brasil nos Estados Unidos, Eduardo Bolsonaro (PSL), filho do presidente Jair Bolsonaro (PSL), precisa da aprovação do Senado Federal. Sem garantia de que tem votos suficientes, o governo tem intensificado a articulação no Senado, especialmente com o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP). As conversas, entretanto, não têm sido suficientes para debelar as más impressões causadas pela indicação do filho do presidente para um cargo estratégico para os interesses nacionais.
Na bancada paranaense, Alvaro Dias (Podemos), Flavio Arns (Rede) e Oriovisto Guimarães (Podemos), demonstram haver algum desconforto com a escolha do governo.
Alvaro, líder do Podemos na Casa, é o paranaense que critica com mais veemência a indicação. Após o nome de Eduardo Bolsonaro passar a ser cotado para o cargo, ele chegou a apresentar uma Proposta de Emenda à Constituição que exige que os embaixadores sejam diplomatas de carreira. Para Alvaro, o filho do presidente não apresenta requisitos mínimos para representar o país nos Estados Unidos.
"Esta indicação é um equívoco histórico, uma trombada nas tradições da diplomacia brasileira. Para a embaixada americana, sempre são escolhidos os mais capacitados, pois trata-se de uma função complexa nas relações entre as nações. A história mostra isso”, diz.
O senador indica que fará forte oposição ao nome de Eduardo Bolsonaro.
“A indicação de alguém sem a qualificação necessária é um desestímulo ao preparo, ao talento, ao estudo, à busca pelo conhecimento e à experiência. Não se trata de escolher o mais próximo, e sim o mais qualificado. A aprovação desta indicação diminuiria o Senado”, sustenta.
Também do Podemos, Oriovisto disse que está estudando o assunto e prefere não se posicionar até que a indicação formal chegue ao Senado. O parlamentar, entretanto, subscreveu a PEC de Alvaro Dias que reserva o cargo de embaixadores a diplomatas de carreira.
Flavio Arns, que também assinou a PEC, acredita que os membros do Itamaraty são mais preparados para chefiar missões diplomáticas.
“Apoio que as embaixadas sejam ocupadas por diplomatas de carreira do Itamaraty que são tecnicamente qualificados e preparados para exercer a diplomacia brasileira no exterior. O Instituto Rio Branco é uma escola de excelência respeitada internacionalmente como academia diplomática e deve ser prestigiado quanto à escolha dos nossos embaixadores”, avalia.
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A nova Guerra Fria Economica: EUA (ou Trump) contra a China - Eswar Prasad (Brookings Institution)
Which country is better equipped to win a US-China trade war?
Eswar Prasad
Brookings Institution, Monday, August 12, 2019

The United States and China are clearly on a collision course. Chinese companies abscond with intellectual property, and President Trump introduces tariffs on Chinese goods; President Xi Jinping responds with his own levies, so Trump adds more. China allows the value of its currency to fall, and the United States brands it a currency manipulator. We are now on the verge of all-out economic warfare.
These are the world’s two largest economies, and the collapse of trade between them would hardly bring either one to a grinding halt. But the combatants are not evenly matched. China might seem in a better position to cope with a trade war, since it is a heavily managed economy and the government squashes political resistance. Yet its every maneuver carries enormous risks. Meanwhile, Trump, who manages a durable and flexible economy, is not exactly seeking victory for the American way of doing business. His approach, in some ways right out of Beijing’s playbook, would make our economy quite a bit more like China’s.
The breakdown in trade between the two countries is already causing pain in both economies, as soybean farmers in the Midwest and Chinese textile exporters in Guangzhou can attest. The battle will intensify if rising tensions close off investment flows and dampen the movement of tourists and students between two countries. But the U.S. economy is about 50 percent larger than China’s, and is less dependent on trade, so its prospects look better. And China exports more to the United States than it imports from the United States (a fact that clearly riles up Trump and was a key instigator for the trade war). So the near-term pain will be greater for China.
But Beijing does have some advantages. One is the structure of its (mostly) command economy, which is dominated by state enterprises. The majority of banks in China are also state-owned, making it easy for the government to generate a surge of cheap credit—and the subsequent investment that boosts growth. The second advantage is the structure of China’s political system, in which dissent is easier to shut down and bad news about the trade war can be filtered out.
Still, even a state-dominated economy with many economic weapons has to be cautious about which ones it uses; some of them could backfire badly.
One of China’s greatest weapons in a trade war is its ability to disrupt the work of American companies that want to sell into China’s enormous and fast-growing markets or that use China as part of their global supply chains. But other foreign companies and investors could also begin to see China as an unpredictable and volatile business environment, unconstrained by the rule of law. This would hurt China’s plans for modernizing its economy with the help of foreign investments and foreign technological and managerial expertise.
China could also further cheapen the value of its currency, the renminbi, to offset U.S. tariffs. Here, too, the government faces constraints. Fear of a major devaluation could cause foreign investors to pull their money out of China, and domestic investors might follow. This happened in 2014-15, when a modest government-orchestrated devaluation set off panic-driven capital outflows in anticipation of further depreciation.
Moreover, even an autocratic government cannot count on getting carte blanche from its people. Xi is not immune to domestic political pressures and must carefully manage the tricky balance between using nationalist sentiments as a rallying cry and actually delivering good economic performance.
Theoretically, China can stimulate a flagging economy by ordering a burst of investment that boosts gross domestic product growth in the short term. But this would probably generate more bad loans in an already fragile banking system. A protracted trade war would also halt even modest momentum toward market-oriented reforms, a putative objective of the Chinese government. This would hurt the economy’s long-term growth prospects. And China’s plan to shift the focus of its economy from staid and inefficient state enterprises to high-productivity and high-value industries will fall short if it loses access to technology from the United States and other Western nations.
In some ways, Trump seems more constrained than Xi because of America’s democratic political system, its more laissez-faire economy and the limits on his executive power. But he, too, has some elements in his favor as he does battle with China. Trump has the advantage of managing an economy that is enormously flexible and resilient. And getting tough on China resonates not just with his political base but even with Democrats, many of whom have long called for aggressive U.S. action against Chinese trade and currency practices, even if they disagree with Trump on tactics.
Yet in exercising his power, he could end up making America’s economy a bit more like the state-dominated one operated by Beijing—and, in so doing, permanently damage the U.S. free market. To rescue the agricultural sector from the consequences of the trade war, Trump has already dispatched $28 billion in government subsidies. He has also jawboned American companies to move their production bases back to U.S. shores, rather than letting them make their own commercial decisions. Trump has even pressured the Federal Reserve, whose independence is seen as sacrosanct, to lower interest rates and suggested that the Fed should help drive down the value of the dollar. With such moves, he risks undermining the true strengths of the United States: the institutions that make the U.S. dollar and the American financial system so dominant.
What’s worse, Trump suggests that the rule of law is up for negotiation. After imposing sanctions on Chinese technology companies such as ZTE and Huawei for running afoul of U.S. rules, he hinted that those sanctions could be negotiated away as part of a trade deal. He is fighting a Pentagon process that could award a defense contract to Amazon, whose CEO (who owns The Washington Post) has criticized him.
China has made its lack of independent institutions a source of strength in dealing with external economic aggression. In that model, Trump sees something Washington should copy—and seems ready to abandon what makes the United States special. This truly is a trade war with no winners.
Ciência: fuga de cérebros é uma realidade no Brasil - presidente da ABC
Fuga de cérebros é realidade, diz chefe da Academia Brasileira de Ciências
Valor Econômico, 13/08/2019
Presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), o físico Luiz Davidovich tem assinado cada vez mais cartas de recomendação para pesquisadores que deixam o Brasil. Aves raras na academia, esses doutores não querem salários altos. Procuram, na verdade, insumos e equipamentos para os quais o governo brasileiro tem empenhado cada vez menos recursos nos últimos anos. O êxodo de cientistas, para Davidovich, é a ferida mais exposta do sistema de ciência e tecnologia (C&T) do país, que se agravou no governo Jair Bolsonaro e seus contingenciamentos, ausência de projeto tecnológico e negação da ciência. "A fuga de cérebros é muito concreta e dolorosa para mim", diz Davidovich. Recentemente ele viu quatro colegas concursados abandonarem seus cargos para tocar trabalhos em Austrália, Holanda, Portugal e Chile. "Três vão para universidades estrangeiras, outro vai para uma empresa australiana de computação quântica, mas aprendeu tudo aqui", diz apontando para o chão da Escola de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde leciona há 25 anos. Ele comanda os estudos da casa em computação e ótica quânticas, sendo colaborador do francês Serge Haroche, laureado com o Nobel de Física em 2012.
"Não nego as recomendações. Essas pessoas têm o direito de se preocupar com suas pesquisas, mas escrevo nas cartas que lamento o fato de estarem nos deixando", diz. A debandada, afirma, está diretamente ligada à queda nos repasses a universidades federais. Segundo Davidovich, as verbas têm caído todos os anos desde 2010. A exceção foi 2013, quando houve um pico que ele atribui ao programa Ciência sem Fronteiras. Em 2019, o golpe mais duro da década: contingenciamento de 30% no Ministério da Educação e 42% na pasta de Ciência e Tecnologia (MCTIC). O principal afetado é o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que provê a maior parte dos recurso à pesquisa científica. "Com o corte, as bolsas de pesquisa só chegariam a junho, mas uma suplementação de R$ 300 milhões permitiu pagar até setembro. Ainda falta para o resto do ano", afirma Davidovich. De acordo com a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), ainda faltam R$ 340 milhões para o CNPq honrar as bolsas de 84 mil pesquisadores neste ano.
Os cortes surpreenderam o chefe da Academia de Ciências. Ainda em campanha, Jair Bolsonaro respondera a um questionamento da entidade com a promessa de elevar o investimento em ciência a 3% do PIB até o fim do mandato, enquanto a entidade recomendava a reserva de 2% da riqueza nacional para a área. Segundo Davidovich, hoje em queda, o investimento total em ciência e tecnologia está um pouco acima de 1% do PIB, sendo igualmente dividido entre União e setor privado. Inicialmente encarado como auspicioso pelo cientista e seus pares, o compromisso de campanha do presidente se mostra cada vez mais distante. "O apagão de investimentos pode quebrar o sistema de C&T. Tudo que temos hoje começou a ser institucionalizado na década de 1950, mas vem de antes. A construção é um processo longo, mas a destruição pode ser muito rápida, menos de uma década". Questionado se o "Future-se", programa do governo para estimular a entrada de recursos privados nas universidades, pode solucionar o problema, Davidovich é claro: "Só funcionará se os repasses públicos forem restabelecidos".
Em sua leitura, as universidades só vão interagir mais com empresas na medida em que se modernizarem primeiro via recurso público. "A maior parte do orçamento universitário sempre virá do governo, como acontece no mundo todo. O ministro [Abraham Weintraub, do MEC] precisa de um choque de realidade", diz. O pesquisador, no entanto, vê com bons olhos aspectos da proposta como desvinculação de verbas privadas do orçamento e previsão de incentivos fiscais para quem investir. Caso o governo ainda queira honrar a promessa de investir duas vezes mais em ciência, Davidovich afirma que, além de rever os cortes, será preciso incentivar investimento direto do setor privado. Ele cita as experiências dos Estados Unidos e da Coreia do Sul. Doutor pela Universidade de Rochester (EUA) e membro estrangeiro da Academia de Ciências dos Estados Unidos (NAC), lembra que na Coreia do Sul três quartos do investimento em P&D vêm de empresas, e um quarto, das universidades. "Não precisamos reinventar a roda. Basta olhar para o lado. Os EUA sempre usaram encomendas de Estado para grandes projetos nacionais", diz, citando como exemplos o programa espacial e a criação de bancos de dados para órgãos de governo. "Isso é muito melhor que subvenção, pois permite orientar os resultados."
Como um caminho natural, Davidovich aponta a biotecnologia baseada na pouco explorada biodiversidade nacional. "Conhecemos apenas 5% do potencial de nossos biomas", diz. Animado, ele fala de uma substância chamada bergenina, originalmente encontrada no caule de uma planta amazônica. Sua molécula anti-inflamatória foi sintetizada por um laboratório privado que hoje comercializa o miligrama por mais de R$ 1.000. "Existem várias outras substâncias que poderiam ser produzidas no Brasil." Soluções de saúde, afirma, são mais que recomendadas para um país com um comprador natural do tamanho do Sistema Único de Saúde (SUS). "Prioridades óbvias como a biotecnologia têm sido prejudicadas por uma política de desmatamento que nega evidências científicas", diz. Davidovich se mostra especialmente irritado com os ataques do governo ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em cuja defesa saiu mais de uma vez por meio de carta aberta da ABC. "Há uma ironia no fato de não perceberem que isso pode prejudicar a própria agroindústria, por causa dos rios voadores que garantem chuvas no Centro-Oeste e Sudeste. Isso para não citar o acordo comercial com os europeus, que terão um Parlamento com cada vez mais [deputados] verdes." Em seu entender, as ações do governo até aqui refletem uma "total ausência de agenda para o desenvolvimento científico" que abre espaço para voluntarismos, expressos por exemplo na retórica sobre nióbio ou dessalinização, que têm o seu valor, mas estariam longe da escala necessária para alavancar a ciência no país.
Valor Econômico, 13/08/2019
Presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), o físico Luiz Davidovich tem assinado cada vez mais cartas de recomendação para pesquisadores que deixam o Brasil. Aves raras na academia, esses doutores não querem salários altos. Procuram, na verdade, insumos e equipamentos para os quais o governo brasileiro tem empenhado cada vez menos recursos nos últimos anos. O êxodo de cientistas, para Davidovich, é a ferida mais exposta do sistema de ciência e tecnologia (C&T) do país, que se agravou no governo Jair Bolsonaro e seus contingenciamentos, ausência de projeto tecnológico e negação da ciência. "A fuga de cérebros é muito concreta e dolorosa para mim", diz Davidovich. Recentemente ele viu quatro colegas concursados abandonarem seus cargos para tocar trabalhos em Austrália, Holanda, Portugal e Chile. "Três vão para universidades estrangeiras, outro vai para uma empresa australiana de computação quântica, mas aprendeu tudo aqui", diz apontando para o chão da Escola de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde leciona há 25 anos. Ele comanda os estudos da casa em computação e ótica quânticas, sendo colaborador do francês Serge Haroche, laureado com o Nobel de Física em 2012.
"Não nego as recomendações. Essas pessoas têm o direito de se preocupar com suas pesquisas, mas escrevo nas cartas que lamento o fato de estarem nos deixando", diz. A debandada, afirma, está diretamente ligada à queda nos repasses a universidades federais. Segundo Davidovich, as verbas têm caído todos os anos desde 2010. A exceção foi 2013, quando houve um pico que ele atribui ao programa Ciência sem Fronteiras. Em 2019, o golpe mais duro da década: contingenciamento de 30% no Ministério da Educação e 42% na pasta de Ciência e Tecnologia (MCTIC). O principal afetado é o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que provê a maior parte dos recurso à pesquisa científica. "Com o corte, as bolsas de pesquisa só chegariam a junho, mas uma suplementação de R$ 300 milhões permitiu pagar até setembro. Ainda falta para o resto do ano", afirma Davidovich. De acordo com a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), ainda faltam R$ 340 milhões para o CNPq honrar as bolsas de 84 mil pesquisadores neste ano.
Os cortes surpreenderam o chefe da Academia de Ciências. Ainda em campanha, Jair Bolsonaro respondera a um questionamento da entidade com a promessa de elevar o investimento em ciência a 3% do PIB até o fim do mandato, enquanto a entidade recomendava a reserva de 2% da riqueza nacional para a área. Segundo Davidovich, hoje em queda, o investimento total em ciência e tecnologia está um pouco acima de 1% do PIB, sendo igualmente dividido entre União e setor privado. Inicialmente encarado como auspicioso pelo cientista e seus pares, o compromisso de campanha do presidente se mostra cada vez mais distante. "O apagão de investimentos pode quebrar o sistema de C&T. Tudo que temos hoje começou a ser institucionalizado na década de 1950, mas vem de antes. A construção é um processo longo, mas a destruição pode ser muito rápida, menos de uma década". Questionado se o "Future-se", programa do governo para estimular a entrada de recursos privados nas universidades, pode solucionar o problema, Davidovich é claro: "Só funcionará se os repasses públicos forem restabelecidos".
Em sua leitura, as universidades só vão interagir mais com empresas na medida em que se modernizarem primeiro via recurso público. "A maior parte do orçamento universitário sempre virá do governo, como acontece no mundo todo. O ministro [Abraham Weintraub, do MEC] precisa de um choque de realidade", diz. O pesquisador, no entanto, vê com bons olhos aspectos da proposta como desvinculação de verbas privadas do orçamento e previsão de incentivos fiscais para quem investir. Caso o governo ainda queira honrar a promessa de investir duas vezes mais em ciência, Davidovich afirma que, além de rever os cortes, será preciso incentivar investimento direto do setor privado. Ele cita as experiências dos Estados Unidos e da Coreia do Sul. Doutor pela Universidade de Rochester (EUA) e membro estrangeiro da Academia de Ciências dos Estados Unidos (NAC), lembra que na Coreia do Sul três quartos do investimento em P&D vêm de empresas, e um quarto, das universidades. "Não precisamos reinventar a roda. Basta olhar para o lado. Os EUA sempre usaram encomendas de Estado para grandes projetos nacionais", diz, citando como exemplos o programa espacial e a criação de bancos de dados para órgãos de governo. "Isso é muito melhor que subvenção, pois permite orientar os resultados."
Como um caminho natural, Davidovich aponta a biotecnologia baseada na pouco explorada biodiversidade nacional. "Conhecemos apenas 5% do potencial de nossos biomas", diz. Animado, ele fala de uma substância chamada bergenina, originalmente encontrada no caule de uma planta amazônica. Sua molécula anti-inflamatória foi sintetizada por um laboratório privado que hoje comercializa o miligrama por mais de R$ 1.000. "Existem várias outras substâncias que poderiam ser produzidas no Brasil." Soluções de saúde, afirma, são mais que recomendadas para um país com um comprador natural do tamanho do Sistema Único de Saúde (SUS). "Prioridades óbvias como a biotecnologia têm sido prejudicadas por uma política de desmatamento que nega evidências científicas", diz. Davidovich se mostra especialmente irritado com os ataques do governo ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em cuja defesa saiu mais de uma vez por meio de carta aberta da ABC. "Há uma ironia no fato de não perceberem que isso pode prejudicar a própria agroindústria, por causa dos rios voadores que garantem chuvas no Centro-Oeste e Sudeste. Isso para não citar o acordo comercial com os europeus, que terão um Parlamento com cada vez mais [deputados] verdes." Em seu entender, as ações do governo até aqui refletem uma "total ausência de agenda para o desenvolvimento científico" que abre espaço para voluntarismos, expressos por exemplo na retórica sobre nióbio ou dessalinização, que têm o seu valor, mas estariam longe da escala necessária para alavancar a ciência no país.
Filho de PR pode furar a fila de embaixadores? - O Antagonista
Eduardo Bolsonaro vai furar fila
O Estadão registra que são mais de 10 as indicações de embaixadores paradas na Mesa Diretora do Senado.
Davi Alcolumbre, porém, ao que tudo indica, passará na frente a de Eduardo Bolsonaro.
No mês passado, O Antagonista publicou o currículo de quatro desses candidatos que terão de esperar um pouco mais em razão do filho do presidente da República.
Vale a pena rever:
O currículo dos 4 futuros embaixadores que serão sabatinados em agosto
A Comissão de Relações Exteriores do Senado tem 4 sabatinas de candidatos a embaixadores do Brasil marcadas para agosto.
Os senadores vão ouvir Maria Laura da Rocha, que já serviu nas embaixadas em Roma, Moscou e Paris e agora deverá representar o país na Romênia.
A bacharel em Letras Eugenia Barthelmess, ministra de primeira classe da carreira de diplomata do Ministério das Relações Exteriores, foi indicada para a embaixada em Cingapura.
Para exercer o cargo de embaixador na Hungria, o candidato é José Luiz Machado e Costa, diplomata de carreira do Itamaraty, que já foi embaixador no Haiti e junto à Organização dos Estados Americanos (OEA).
Ary Norton de Murat Quintella, outro ministro do Itamaraty, é graduado em psicologia no Reino Unido e deverá ocupar o cargo de embaixador do Brasil junto à Malásia e ao Brunei.
segunda-feira, 12 de agosto de 2019
Argentina: Bolsonaro criou um problema para si mesmo e para a diplomacia brasileira
Como sempre, o presidente perdeu mais uma oportunidade de ficar calado. Todos os dias, compulsivamente, ele vive falando sobretudo e sobre todos, em especial sobre assuntos que ele não conhece.
Em lugar de demonstrar sua ignorância enciclopédia, o presidente faria bem em ficar calado, não por um dia ou dois, mas por semanas, talvez sobre meses, melhor ainda até o final do mandato.
Quem é boquirroto, acaba dando bom dia a cavalo, como já se disse.
Paulo Roberto de Almeida
Em lugar de demonstrar sua ignorância enciclopédia, o presidente faria bem em ficar calado, não por um dia ou dois, mas por semanas, talvez sobre meses, melhor ainda até o final do mandato.
Quem é boquirroto, acaba dando bom dia a cavalo, como já se disse.
Paulo Roberto de Almeida
Bolsonaro deveria reavaliar discurso sobre Argentina, avaliam militares e diplomatas
Chapa de Cristina Kirchner venceu as primárias, o que representa revés para líder brasileiro
A vitória da chapa de oposição nas primárias presidenciais argentinas representou um revés para o presidente Jair Bolsonaro, na avaliação de integrantes da cúpula militar e da diplomacia brasileira.
O diagnóstico feito por eles à Folha, em caráter reservado, é de que o presidente brasileiro se equivocou ao ter se envolvido de maneira ativa na disputa do país vizinho e que seria adequado, neste momento, reavaliar o discurso, moderando o tom.
A chapa liderada por Alberto Fernández, que tem a ex-mandatária Cristina Kirchner como vice, venceu com larga vantagem as primárias presidenciais argentinas realizadas neste domingo (11), apontam os resultados preliminares.
Desde maio, Bolsonaro tem feito reiterados ataques a Cristina, inclusive em entrevista à imprensa estrangeira, e pedido à população argentina que não votasse nela. Para ele, o retorno da hoje senadora ao Poder Executivo pode fazer com que a Argentina se torne uma Venezuela.
Nas palavras de um assessor palaciano, as críticas foram "desnecessárias" e acabaram apenas por criar um ônus ao presidente brasileiro sobre um assunto no qual ele não tem relação direta.
A avaliação de auxiliares presidenciais é de que a manutenção do discurso belicoso, diante da chance de vitória da oposição, pode dificultar uma composição entre Brasil e Argentina no futuro, sobretudo no momento em que se negocia o acordo entre Mercosul e União Europeia.
Para evitar um contratempo, eles defendem que Bolsonaro interrompa os ataques à chapa vencedora e faça gestos de diálogo, mesmo que ele siga se opondo à esquerda. Um assessor diplomático, no entanto, ressalta que não é do temperamento do presidente recuar em questões ideológicas.
Fernández já disse que pretende rever o pacto comercial com a União Europeia, porque, na opinião dele, foi feito de maneira precipitada devido à disputa eleitoral e pode prejudicar a indústria argentina.
À tarde, no Twitter, o candidato kirchnerista agradeceu mensagem do ex-presidente brasileiro Lula, também publicada na rede social, em que parabenizava a vitória nas primárias.
“Muito obrigado, querido amigo Lula. Como você bem diz, devemos dar esperança ao nosso povo e cuidar de quem mais precisa. Te mando um forte abraço que espero poder te dar em breve.”
“Muito obrigado, querido amigo Lula. Como você bem diz, devemos dar esperança ao nosso povo e cuidar de quem mais precisa. Te mando um forte abraço que espero poder te dar em breve.”
Caso os números das primárias se repitam na eleição, marcada para o fim de outubro, Fernández seria eleito em primeiro turno. Para isso, ele precisa ter mais de 45% dos votos ou mais de 40% e no mínimo 10 pontos percentuais de vantagem para o segundo colocado.
De acordo com os dados oficiais, o comparecimento às urnas foi alto, com a participação de 75% dos eleitores. As chamadas Paso (Primárias Abertas, Simultâneas e Obrigatórias) foram criadas em 2009, com a intenção de diminuir o número de candidaturas que concorriam na eleição.
As primárias argentinas servem mais como uma espécie de pesquisa eleitoral confiável, pois o voto é obrigatório, do que para definir as chapas, que já foram escolhidas por cada coalizão.
Na última eleição, em 2015, o kirchnerismo ganhou nas primárias e no primeiro turno, com Daniel Scioli. No entanto, Macri venceu no segundo turno e se tornou presidente.
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