quarta-feira, 14 de junho de 2023

Kissinger-Metternich in 2014: accomodating Putin’s interests in Ukraine

 An opinion by the already old (91 years old) machiavellian strategist, always contemplating great powers ambitions over geopolitical matters. For the record, Finland would not be a suitable case forUkraine in 2014 (the year of this Opinion), as it has now joined NATO by its own decision

PRA

How the Ukraine Crisis Ends

O BRICS e os Brics em face da desordem internacional trazida pela guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia

 Os chanceleres do BRICS, representando os atuais cinco Brics individuais, reuniram-se recentemente na Cidade do Cabo, África do Sul, para preparar a próxima cúpula do grupo, que deverá reunir-se em Johannesburg, capital daquele país, em agosto.

Como quando da reunião de chanceleres do ano passado, e da própria declaração final dos chefes de Estado e de governo, ocorrida já em meio à guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia, iniciada em 24 de fevereiro de 2022, os diplomatas fizeram cara de paisagem, em face da cruel realidade da guerra, inclusive já revelados os massacres, crimes de guerra inomináveis, perpetrados pelas forças russas em Bucha, arredores da capital Kiev, que elas não conseguiram tomar (levado ao local, para uma exposição na igreja local sobre os cadáveres deixados espalhados nas ruas pelos assassinos do Exército russo, o atual assessor internacional do presidente Lula para assuntos internacionais, e ex-chanceler nos governos Lula 1 e 2, disse que "não dava para saber, pois são apenas fotos). 

Transcrevo abaixo, para renovar a lembrança da vergonha já cometida em 2022 e renovado neste ano, trechos da declaração dos chanceleres, que se vangloriam reciprocamente do compromisso de seus países com o multilateralismo e a "defesa do direito internacional"... "em um sistema internacional no qual Estados soberanos cooperam para manter a paz e a segurança, promover o desenvolvimento sustentável, garantir a promoção e proteção da democracia, dos  direitos humanos e das liberdades fundamentais para todos e promover a cooperação baseada no espírito de respeito mútuo, justiça e igualdade."

Não consigo imaginar hipocrisia maior, sabendo-se de todos os crimes já perpetrados (e ainda a perpetrar) pelos invasores em território soberano da Ucrânia, sobretudo a recente explosão deliberada da barragem de Nova Krakhovka, causando um desastre humanitário e uma catástrofe ecológica e ambiental. 

Imagino que os chanceleres continuarão impérvios à realidade da guerra, deslanchada sem provocação, por um dos membros contra um vizinho, na violação da Carta da ONU e de normas elementares do direito internacional, ou da própria moralidade dos seus atos de guerra, que cabe a cada Estado respeitar, segundo os protocolos em vigor sobre as leis da guerra, que a Rússia viola seguidamente.

Entendo que a hipocrisia continuará na reunião de cúpula de 2023, talvez até com a presença do criminoso de guerra cuja prisão já foi solicitada pelo Tribunal Penal Internacional, mas que não será eventualmente cumprida pela República da África do Sul, a que seria obrigada pelo Estatuto de Roma ao qual subscreveu e ratificou. Ah, sim, a hipocrisia se estendeu inclusive a um curto parágrafo sobre a "situação na Ucrânia", na qual ignoram completamente a situação de guerra causada por uma das partes.

Nada mais tenho a expressar, a não ser uma vergonha alheia, pela diplomacia de meu país, nesta conjuntura diplomática que aparentemente não mudou absolutamente nada, desde o governo demolidor de nossa política externa até o final de 2022.

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 14 de junho de 2023


Ministério das Relações Exteriores

Assessoria Especial de Imprensa 

Nota nº 76, 19 de maio de 2022

Declaração Conjunta do BRICS sobre o tema: “Fortalecer a Solidariedade e a Cooperação do BRICS; Responder às novas Características e Desafios da Situação Internacional”

(...)

3. Os Ministros reiteraram seu compromisso com o multilateralismo por meio da defesa do direito internacional, inclusive os propósitos e princípios consagrados na Carta das Nações Unidas como sua pedra angular indispensável, e com o papel central das Nações Unidas em um sistema internacional no qual Estados soberanos cooperam para manter a paz e a segurança, promover o desenvolvimento sustentável, garantir a promoção e proteção da democracia, dos  direitos humanos e das liberdades fundamentais para todos e promover a cooperação baseada no espírito de respeito mútuo, justiça e igualdade.

4. Os Ministros reiteraram seu compromisso de realçar e aprimorar a governança global, promovendo um sistema mais ágil, eficaz, eficiente, representativo e responsável, realizando consultas e colaboração inclusivas para o benefício de todos com base no respeito à soberania, à independência, à integridade territorial, à igualdade, aos interesses e preocupações legítimos dos diferentes países. 

 (...)

11. Os Ministros recordaram suas posições nacionais sobre a situação na Ucrânia, conforme expressas nos fóruns apropriados, nomeadamente o CSNU e a AGNU. Apoiaram as negociações entre a Rússia e a Ucrânia. Discutiram também suas preocupações sobre a situação humanitária dentro e ao redor da Ucrânia e expressaram seu apoio aos esforços do Secretário-Geral da ONU, das Agências da ONU e do CICV para fornecer ajuda humanitária de acordo com a resolução 46/182 da Assembleia Geral da ONU.


terça-feira, 13 de junho de 2023

Política externa - Os primeiros seis meses - Rubens Barbosa (OESP)

Minha avaliação dos primeiros seis meses da diplomacia de Lula 3 é bem mais severa do que a do embaixador Rubens Barbosa, que faz um julgamento ponderado sobre seus sucessos e insuficiências. Eu provavelmente sou levado a fazer um questionamento moral, sobretudo em relação às más alianças no caso da guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia. (PRA)


Política externa - Os primeiros seis meses

Por Rubens Barbosa
13/06/2023 | 03h00, O Estado de S. Paulo

As prioridades na política externa definidas pelo governo Lula a partir de janeiro foram acertadas. A volta do Brasil ao cenário internacional, o destaque ao meio ambiente e a mudança de clima e a importância da América do Sul são políticas que estão de acordo com o interesse nacional, num momento de grandes transformações globais. Na condução da política externa, nos primeiros seis meses a questão que ficou aparente é a falta de uma visão estratégica de médio e de longo prazos do governo no planejamento e na implementação dessas políticas.

Na retomada de um papel atuante do Brasil, a ênfase no multilateralismo, na multipolaridade, na restauração da credibilidade e na melhora da percepção externa estiveram no centro das preocupações de Lula. A reforma dos organismos multilaterais, em especial do Conselho de Segurança da ONU e o fortalecimento da Organização Mundial do Comércio (OMC), bem como a atualização da agenda brasileira nessas instituições, desgastada nos últimos anos, fez parte da ação do Itamaraty. A posição de independência em relação às tensões entre os EUA e a China foi mantida, mas poderá ser testada caso a crise em relação a Taiwan se agrave. A prioridade para a formação do grupo da paz para a guerra na Ucrânia, quando ninguém está interessado nela no momento, foi um equívoco e mostra um protagonismo que é percebido como desequilibrado e ingênuo. O governo ficou devendo iniciativas para definir uma política para o Brics, a OCDE, no G-20 e para reduzir as vulnerabilidades externas, expostas depois da pandemia e da guerra na Ucrânia. 
As declarações de Lula sobre o conflito expuseram a dependência externa brasileira dos equipamentos bélicos da Otan e as contradições entre o Ministério da Defesa e o Itamaraty.

Nas negociações comerciais, o governo ameaça reabrir o acordo Mercosul-União Europeia no tocante às compras governamentais, o que poderá inviabilizar sua assinatura. Nada foi feito para revitalizar o Mercosul.

Na questão do clima, em que o Brasil é uma potência global, não se conhece uma política estratégica que inclua propostas para cumprir os compromissos de redução de emissões de gases de efeito estufa ou para regulamentar o mercado voluntário e compulsório de carbono, sem falar nos retrocessos internos na política ambiental. A realização da COP-30 em 2025 no Pará e a convocação do Tratado de Cooperação Amazônica foram resultados positivos.

No tocante à América do Sul, além do controvertido apoio à Argentina e à Venezuela, Lula decidiu retomar a iniciativa de 2000 e 2002 do presidente FHC e promoveu reunião presidencial para coordenar políticas visando a maior integração regional.

O ativismo diplomático, evidenciado na proposta de paz na Ucrânia e na reunião presidencial regional, trouxe mais desgastes para o governo e para a imagem presidencial do que resultados concretos. No tocante à guerra na Ucrânia, no encontro do G-7 as ambiguidades do discurso de Lula e a controvérsia quanto ao encontro frustrado com Zelensky tornaram-se mais evidentes. As declarações públicas do governo puseram em dúvida a equidistância do Brasil e a percepção de que Lula teria assumido um dos lados. Quanto ao resultado do encontro presidencial regional, ele pode ser considerado como limitado e longe do que o presidente Lula pretendia. Moeda Unida, Unasul, a criação de mais uma instituição, defendidas pelo Brasil, não foram acolhidas. Nem o prazo de 120 dias para os chanceleres apresentarem sugestões de ação aos presidentes foi aceito.

A América do Sul está desintegrada e sem perspectiva de avançar no processo de integração no curto prazo. Sem uma visão estratégica e sem a apresentação de propostas que respondam aos desafios atuais das transformações globais, prevaleceu a discussão ideológica divisiva. O discurso público de Lula, desatualizado e ideológico, valorizou a Venezuela, gerou divisão política e pôs em risco a liderança que o Brasil deveria exercer na região. O fato de Lula ter oferecido a Maduro uma recepção especial (“visita histórica”), antes do encontro com os demais presidentes, ofuscou a reunião e colocou em segundo plano a importância da união e integração regional. A afirmação de que Maduro teria de mudar a narrativa construída contra a Venezuela por alguns países, em especial pelos EUA, sem fazer qualquer reparo ao notório autoritarismo reinante, suscitou duras críticas dos presidentes do Chile e do Uruguai, além da oposição venezuelana, o que, na prática, significa críticas da direita e da esquerda. A exemplo do que aconteceu na visita à Argentina e na reunião do G-7, o marketing do encontro foi negativo. Também na área externa, Lula pode perder prestígio e credibilidade.

A dualidade de funções entre a assessoria presidencial e o ministro do Exterior indicou o continuado esvaziamento do Ministério das Relações Exteriores. Até aqui, no entanto, não se pode dizer que a política externa foi contaminada pela ideologia e pela partidarização. Os sinais, porém, são preocupantes, sobretudo em razão do tratamento dado à Venezuela.

Com tantos problemas políticos, econômicos e sociais internos, a pesada agenda externa de Lula no segundo semestre, se cumprida, pode ampliar os ruídos no Congresso e na opinião pública contra o protagonismo internacional do presidente.

*

EX-EMBAIXADOR EM WASHINGTON E LONDRES, É PRESIDENTE DO INSTITUTO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS E COMÉRCIO EXTERIOR (IRICE)

Diplomacia partidária da China acena ao PT - Marcelo Ninio (O Globo)

 Diplomacia partidária da China acena ao PT

A diplomacia partidária da China é uma forma de promover o modelo de governança do país para ampliar sua influência

Por Marcelo Ninio — Pequim
O Globo, 13/06/2023

Uma delegação do Partido dos Trabalhadores (PT) com 20 integrantes desembarcou nesta segunda-feira em Pequim para uma visita de 12 dias, a convite do governo chinês. É a reabertura de mais um canal na aproximação com o Brasil, após o aquecimento das relações obtido com a visita do presidente Lula à China em abril. A viagem se encaixa na diplomacia partidária praticada pelo Partido Comunista da China desde a década de 1950, para reforçar os laços com grupos políticos afinados ideologicamente.

É uma das maiores delegações partidárias do Brasil que já participaram desse tipo de viagem, em novo sinal da importância que Pequim tem dado ao país desde a volta ao poder do “velho amigo” da China, como a mídia estatal chama Lula. Chefiado pelo secretário-geral nacional do PT, Henrique Fontana, o grupo inclui vários dirigentes do partido e o senador Humberto Costa (PE), além de três deputados federais e um estadual.

Em Pequim, o grupo irá conhecer “a formação política dos quadros e da base e o processo de organização” do PC chinês, informou em suas redes sociais Camila Moreno, da Direção Executiva Nacional do PT, que integra o grupo. O roteiro inclui ainda cidades que são vitrines do milagre econômico chinês, como Cantão e o polo tecnológico de Shenzhen.

A política partidária chinesa ganhou novo impulso com a chegada de Xi Jinping à liderança, em 2012, como forma de promover o modelo de governança do país e ampliar sua influência global. O projeto é uma das principais atribuições do Departamento de Ligação Internacional (DLI), criado em 1951 para articular as relações com partidos comunistas ao redor do mundo. O leque se ampliou e, hoje, o PCC mantém “contato regular” com mais de 600 partidos de 160 países, segundo a mídia estatal.

Enquanto no Ocidente a política externa de Xi Jinping é cada vez mais vista como um instrumento agressivo da ascensão chinesa, com os países em desenvolvimento há meios mais sutis de interação, além da oferta de investimentos em infraestrutura. Um deles é a diplomacia partidária. Sem precisar representar o governo em atritos com outros países, o DLI pode se concentrar no lado positivo do modelo chinês, cativando os países emergentes com o que eles mais necessitam: eficiência e desenvolvimento.

Um exemplo são os treinamentos oferecidos a políticos de outros países. Milhares de estrangeiros já passaram pelas escolas do PC chinês, em cursos com previsível teor doutrinário, mas empacotados em linguagem pragmática, que enfatiza a importância do planejamento central para atingir as metas desenvolvimentistas. No ano passado, o conceito cruzou as fronteiras da China e se instalou na Tanzânia, onde foi inaugurada uma escola de liderança construída com aporte de US$ 40 milhões oferecido pela China.

O PC chinês insiste que não almeja exportar seu modelo de governança. Mas ao compartilhar histórias de sucesso, como no combate à pobreza, o objetivo implícito é oferecer uma alternativa descolada do Ocidente. Apesar da admiração que Lula tem demonstrado pelas conquistas do sistema chinês, o país é motivo de divergências históricas no PT, devido ao descaso com os valores democráticos.

Em 1989, o partido aprovou a moção “Não ao massacre do povo chinês”, após a brutal repressão ao movimento pró-democracia da Praça da Paz Celestial. Desde então a China virou referência em desenvolvimento, mas continua longe de ser modelo em direitos humanos.


Plano de paz de Lula está paralisado e é visto com ceticismo pela Ucrânia - Patrícia Campos Mello (FSP)

Existem várias ambiguidades nesta matéria sobre o plano de paz de Lula para a Ucrânia, não necessariamente por parte da jornalista, mas em função das posições dos principais interlocutores.

A verdade é que NÃO EXISTE um plano de paz de Lula para a paz na Ucrânia, apenas uma vaga aspiração para que países que "desejem a paz" se congreguem por iniciativa do líder brasileiro para "FALAR DE PAZ", sendo que nenhum deles pode estar fornecendo "armas para a guerra", o que significa que a Ucrânia DEVE PERDER para conseguir a paz.

Paulo Roberto de Almeida


Plano de paz de Lula está paralisado e é visto com ceticismo pela Ucrânia

Kiev tem duas objeções à proposta brasileira e demonstra ceticismo em relação à influência do petista sobre Putin

Patrícia Campos Mello
12.jun.2023 às 23h15

O plano do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para negociar o fim da Guerra da Ucrânia está paralisado e enfrenta o ceticismo de Kiev. Após o desencontro na cúpula do G7, no Japão, em maio, não houve mais contato entre o alto escalão do governo brasileiro e a equipe do presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, e tampouco há telefonemas ou reuniões planejados para o curto prazo.

Mesmo antes do fracasso da reunião, a Ucrânia se queixava de pouco interesse do Brasil para ouvir o seu lado. Em Hiroshima, o Itamaraty disse ter oferecido três horários para Zelenski, que, ao fim, não foi ao encontro. À Folha, o líder ucraniano se eximiu da culpa pelo fiasco, mas tampouco explicou o que ocorreu.

Em reserva, autoridades ucranianas disseram ser necessário criar uma relação de confiança para que o Brasil tenha um papel relevante num eventual plano de paz para acabar com o conflito. O chefe de gabinete de Zelenski, Andrii Iermak, disse em entrevista à CNN Brasil que vai convidar Brasília para uma cúpula de paz na Ucrânia, ainda sem data para ocorrer.

Lula e Zelenski conversaram por vídeo em 2 de março. Na conversa, o ucraniano pediu que o brasileiro ajudasse a organizar uma reunião com líderes da América Latina, mas o petista teria ponderado que vários países da região, como Nicarágua e Venezuela, tinham posições firmes a favor da Rússia, e outros não gostariam de dar a impressão de que estão se aproximando de um dos lados.

Por isso, segundo Lula, seria difícil promover uma cúpula dessa natureza e ficou acordado que voltaria a falar com Zelenski após retornar da viagem à China, em 12 de abril. Na versão dos ucranianos, o petista disse que tentaria organizar o encontro com líderes latino-americanos, mas nunca mais falou com Kiev.

Depois da visita à China, no entanto, o governo brasileiro recebeu em Brasília o chanceler da Rússia, Serguei Lavrov, uma passagem que causou mal-estar e críticas. Na tentativa de aparar arestas, Lula enviou Celso Amorim, seu assessor especial para política externa, à Ucrânia. O ex-chanceler, arquiteto da ideia de o Brasil mediar o conflito, reuniu-se com Zelenski em 10 de maio no palácio presidencial em Kiev.

Lá, ouviu do presidente ucraniano que existem diversos planos de paz, mas que a Ucrânia só está disposta a debater aqueles que passem pelos 10 pontos propostos pelo governo em Kiev no final do ano passado.

Desde o desencontro no G7, em 21 de maio, não foi discutido se haverá outra reunião. O governo brasileiro diz que poderia haver uma chance no final de junho, no encontro sobre financiamento ao desenvolvimento promovida pelo francês Emmanuel Macron ou na Assembleia-Geral da ONU, em setembro, em Nova York.

Antes disso, Lula pode se reunir virtual ou presencialmente com Vladimir Putin, mas um encontro bilateral com o presidente russo, após o petista não ter se encontrado com Zelenski, seria visto como mais um gesto brasileiro em favor de Moscou, comprometendo a reivindicação de ser mediador do conflito.

Putin participará da cúpula do Brics na África do Sul, em agosto. Como o Tribunal Penal Internacional emitiu um mandado de prisão contra ele, sob a acusação de crimes de guerra pelo suposto sequestro de crianças ucranianas, não se sabe se o líder russo comparecerá de forma remota ou presencial. A África do Sul ratificou o estatuto de Roma, que criou o tribunal, e, em tese, teria de cumprir o mandado e prender Putin ao desembarcar, algo que não ocorrerá, porque o país concedeu imunidade aos líderes na reunião.

A Ucrânia tem duas objeções à proposta de Lula. Não aceita decretar cessar-fogo nem iniciar o diálogo sem que os russos devolvam os territórios que anexaram ilegalmente. A Rússia ocupa parcialmente quatro regiões na Ucrânia: Donetsk e Lugansk, no leste, e Zaporíjia e Kherson, no sul, além da Crimeia, península tomada em 2014. As áreas são equivalentes a cerca de 18% do território do vizinho invadido.

"Congelar o conflito dá aos russos tempo para treinar e equipar as tropas. Enquanto isso, o mundo vai dizer que a guerra acabou, o conflito terá muito menos atenção, receberemos menos armas, haverá uma normalização", diz Andrii Zagorodniuk, ex-ministro da Defesa e atual assessor do governo da Ucrânia.

Já o deputado ucraniano Artur Gerasimov faz uma analogia: "Imagine que você tem um apartamento de três quartos. O vizinho invade a casa, ocupa a cozinha e começa uma guerra. Aí ele diz: 'Quero paz, mas a cozinha fica com a gente'. É o que a Rússia quer, cessar-fogo, e eles ficam com a Crimeia e o Donbass."

As autoridades ucranianas também demonstram ceticismo em relação à influência de Lula sobre Putin. Sentem mais firmeza na China, que mandou um enviado especial à Ucrânia em maio. Pequim quer que a contraofensiva de Kiev seja suspensa, e as sanções contra Moscou, retiradas, o que o Ocidente descarta.

Ainda assim, eles mantêm aberto o canal de comunicação com os chineses, que, por seu peso político e econômico, têm maior poder de barganha. Kiev acha possível, por exemplo, que a China convença Putin a fazer um gesto de boa vontade, desmilitarizando a região da usina nuclear de Zaporíjia, a maior da Europa.

Outro que estaria mais bem posicionado para mediar o conflito seria o líder da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, que dialoga com o Ocidente e com a Rússia, o que permite tanto vender drones a Kiev como se manter em bons termos com Putin a ponto de negociar o pacto para a exportação de grãos ucranianos.

Mas o Brasil tem pontos a seu favor para atrair Kiev e, assim, atuar como mediador. Do Brics, é o país menos pró-Rússia. Xi Jinping e Putin estiveram juntos em Pequim antes da guerra e celebraram uma "amizade sem limites". Em março, o chinês foi a Moscou e reafirmou a aliança. A África do Sul é acusada pelos EUA de fornecer armas à Rússia. E a Índia ajuda a viabilizar a economia russa por meio da compra de petróleo, em volumes bem maiores do que os da venda de fertilizantes ao agronegócio brasileiro.

Além disso, o Brasil é visto como instrumental para influenciar a América Latina. A Ucrânia precisa do apoio do chamado Sul Global —por enquanto, só potências ocidentais têm enviado armas, imposto sanções à Rússia e declarado apoio explícito a Kiev. Na América Latina, apenas Chile, Uruguai, Costa Rica e Guatemala se posicionaram abertamente a favor do país ora invadido, e Zelenski precisa de votos na ONU para criar um tribunal internacional especial que julgue Putin, outro dos pontos de seu plano de paz.

Mas depõem contra o Brasil as seguidas falas de Lula, que, entre outras declarações, chegou a dizer que o líder ucraniano "não pode ter tudo o que pensa que vai querer", algo que foi interpretado como uma sugestão para Kiev abrir mão de territórios como a Crimeia, além da afirmação, na volta da visita à China, de que os EUA incentivam a guerra, referência ao envio de armas para a Ucrânia se defender da invasão.

Na visão do governo brasileiro, Zelenski pode negociar agora ou esperar mais seis meses –a situação militar provavelmente será a mesma, mas outras 100 mil pessoas, estima-se, terão morrido–, enquanto Putin estaria atrás de um fim com algo para mostrar ao público interno. Uma das concessões poderia ser a garantia de que a Ucrânia não integrará a Otan, a aliança militar do Ocidente, o que Kiev descarta.

"Hoje, os ucranianos preferem avançar na contraofensiva a negociar, porque a negociação agora implica perda de territórios", afirma Oliver Stuenkel, professor de relações internacionais da FGV-SP. "Eles têm pressa, e o Brasil quer conversar. A proposta brasileira ajuda a Rússia a ganhar tempo."


A estranha viagem de Celso Amorim para falar de paz na Ucrânia em fórum da Noruega, que acabou sendo desmarcada - Ricardo Della Coletta (FSP)

A alegação de que Amorim "ficou em Brasília para participar da recepção de Ursula von der Leyen" não se sustenta minimamente. Lula deve ter vetado a viagem depois que Amorim havia confirmado presença, mas depois que sua performance em Hiroshima ficou abaixo do esperado, e até do desejável, sendo não só ofuscado pela presença de Zelensky, como também se recusou a encontrar o presidente ucraniano. 

Lula é do tipo vingativo, e não pretende mais falar com Zelensky, e por isso Celso Amorim teve de cancelar sua viagem, já que o chefe prefere privilegiar Putin e seus amigos autocratas, a lutar verdadeiramente pela paz na Ucrânia. 

Lamento mais essa diminuição da credibilidade diplomática do Brasil, e antecipo que este novo gesto deve retirar do Brasil a credencial para continuar propugnando por um "Clube da Paz". Resta ver o que Lula vai conversar com Macron, e outros líderes mundiais, e como ele vai seguir em suas tergiversações sobre como se obter "menos intervenção armada na Ucrânia", conforma ele recitou para a comissária europeia.

Custa a crer que a diplomacia brasileira possa ser humilhada pelo seu próprio chefe.

Paulo Roberto de Almeida

 Celso Amorim confirma e depois cancela ida a fórum sobre paz na Noruega

Principal assessor de Lula para política externa apresentaria visão brasileira sobre conflito na Ucrânia
Folha de S. Paulo, 13 junho 2023 às 14h13
Ricardo Della Coletta

O assessor especial do presidente Lula (PT), Celso Amorim, cancelou a participação que faria em uma das principais conferências internacionais sobre negociações de paz, o Oslo Forum.

O convite foi feito pelo governo da Noruega, que sedia o encontro. De acordo com a assessoria especial do Planalto, Amorim abriria um dos dias de debate para falar sobre a visão do Brasil em relação ao conflito entre Ucrânia e Rússia —tema que figura entre as prioridades do presidente brasileiro na arena externa.

Também havia a possibilidade de uma reunião de Amorim com o premiê da Noruega, Jonas Gahr Støre —ambos se conhecem porque coincidiram na chefia das respectivas chancelarias entre 2005 e 2010.

A viagem do principal assessor de Lula para temas internacionais chegou a ser publicada no Diário Oficial. Em 6 de junho, o petista autorizou o afastamento de Amorim entre 11 e 15 deste mês para ir a Oslo.

Apesar da centralidade que o conflito na Ucrânia tem na política externa de Lula, Amorim alegou questões de agenda para cancelar a visita. De acordo com sua assessoria, ele ficou em Brasília para participar da recepção de Ursula von der Leyen e de outros compromissos nesta semana. A data da passagem da presidente da Comissão Europeia pela capital é conhecida desde meados de abril. Amorim também deve acompanhar Lula em reuniões na Itália e na França na próxima semana, ainda segundo sua assessoria.

O Oslo Forum é organizado pela chancelaria da Noruega, país com ampla tradição na mediação de conflitos, e por uma organização humanitária suíça. Segundo o site do evento, neste ano a reunião abordará os principais acontecimentos diplomáticos e geopolíticos da atualidade, com discussões sobre os conflitos na Ucrânia, no Sudão e no Iêmen, entre outros. "A agenda inclui sessões sobre como garantir que a voz de todas as partes sejam ouvidas e formas de alcançar uma paz sustentável, muitas vezes baseada em acordos duramente conquistados e originados da exaustão militar e do pragmatismo."

Nesta segunda (12), o Oslo Forum anunciou que entre os participantes desta edição estão os chanceleres da Indonésia, Retno Marsudi, e da Colômbia, Álvaro Leyva Durán, além do promotor do Tribunal Penal Internacional Karim Khan. Trata-se do responsável por ter solicitado a expedição do mandado de prisão contra o presidente da Rússia, Vladimir Putin, por acusações de crimes de guerra cometidos na Ucrânia.

Segundo pessoas que conhecem o funcionamento do fórum, a lista completa de participantes é mantida em sigilo. A rede pública de comunicação norueguesa NRK informou recentemente que alguns integrantes do grupo extremista Talibã, que governa o Afeganistão, participariam da conferência. A organização do evento diz que mais de cem mediadores e atores envolvidos em processos de paz devem comparecer.

Amorim é apontado como o arquiteto da abordagem de Lula para a Guerra da Ucrânia. O presidente tentou se colocar desde o início de seu terceiro mandato como possível mediador do conflito, mas declarações vistas pelo Ocidente como favoráveis à Rússia geraram forte desconforto dos EUA e da Europa.

A fala de Lula que gerou mais reações ocorreu em Pequim, durante visita à China, em abril. Na ocasião, cobrou que os EUA "parem de incentivar a guerra e comecem a falar em paz" para encaminhar um acordo no Leste Europeu, uma referência ao envio de armas para que Kiev se defenda das ofensivas russas.

Poucos dias depois, enquanto o chanceler russo, Serguei Lavrov, era recebido em Brasília, um porta-voz do governo americano descreveu a postura de Lula sobre a Ucrânia como "repetição automática da propaganda russa e chinesa" e "profundamente problemática".


O Holodomor de Putin - Paulo Roberto de Almeida

O Holodomor de Putin

Paulo Roberto de Almeida


O tirano de Moscou já constatou que ele não poderá mais anexar a Ucrânia pela força.

Ele agora só está empenhado em destruir o país e matar o maior número possível de pessoas, inclusive velhos e crianças. 

A diplomacia brasileira já perdeu qualquer resquício de moralidade?

Se revela incapaz de expressar pelos ucranianos os mesmos cuidados que o governo diz manter em relação aos “povos originários”? 

A guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia é apenas um detalhe nos planos de Lula para uma “nova ordem mundial”?

O Brics continuará, como no ano passado, absolutamente indiferente ao morticínio deliberado que ocorre na Ucrânia?

E sua Declaração de cúpula ainda terá a petulância (e a ignomínia) de afirmar, como foi o caso em 2022, que todos os países respeitam a Carta da ONU e os DH?

Confesso meu asco em pensar que meus colegas diplomatas possam negociar os termos de um documento final recheado de mentiras escabrosas.

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 13/06/2023

Postagem em destaque

Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...