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domingo, 28 de novembro de 2010

Diplomacia brasileira: no meio do caminho tinha uma China...

Destaque cético: Antônio Azeredo da Silveira, chanceler de Ernesto Geisel, dizia que "o Brasil pode renunciar a tudo, menos à sua grandeza."
Que grandeza?

Celso Amorim: 'Precisamos repensar nossa relação com a China'
Patrícia Campos Mello, enviada especial a Brasília
O Estado de S.Paulo, 27 de novembro de 2010

Em balanço de sua gestão, chanceler rebate críticas por omissão do País em temas polêmicos

BRASÍLIA - O chanceler Celso Amorim se prepara para deixar o circuito das grandes questões mundiais e se recolher à ponte aérea entre Brasília, onde vive sua mulher, e a Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde pretende dar aulas quando acabar o governo Lula. Dizendo se sentir "realizado" com sua atuação à frente da política externa do governo Lula durante oito anos, o chanceler admite não ter "planos muito claros" sobre o que vai fazer daqui para frente. Amorim tem apenas uma autocrítica em relação a seu mandato no Itamaraty - falta de uma estratégia mais clara para lidar com a China, concorrente e, ao mesmo tempo, aliada do Brasil no Brics. "Esse será um grande desafio", diz.

Quanto ao envolvimento do Brasil em questões polêmicas como a omissão do governo brasileiro em relação a violações contra direitos humanos em Cuba e no Irã, ele não recua nem um milímetro. "Nós não somos ‘soft’ em direitos humanos, só não condenamos porque a grande maioria dos países que condenam é de ex-potências coloniais que estão purgando os seus complexos de culpa", disse. "Não dá certo fazer as duas coisas (conversar privadamente enquanto condenam publicamente)."

Amorim acha que a maior visibilidade do Brasil no cenário internacional veio para ficar. "Como o Brasil quer ser membro do Conselho de Segurança, não podemos nos omitir dessas (grandes) questões", afirma o chanceler. "Não vamos fazer uma nova política de isolacionismo, só cuidar do nosso. Como dizia o Silveira (Antônio Azeredo da Silveira, chanceler de Ernesto Geisel), o Brasil pode renunciar a tudo, menos à sua grandeza."

O Itamaraty argumenta que é melhor não fazer condenações públicas de violações a direitos humanos para manter o canal de comunicação aberto e influenciar os países dessa maneira. Não dá para fazer as duas coisas ao mesmo tempo, evitando desgastar a imagem da democracia brasileira?
Não dá certo fazer as duas coisas. Se você ficar condenando, você se descredencia como interlocutor. Precisamos ter uma atitude que propicie o diálogo e nossa estratégia deu certo.
No caso da francesa Clotilde Reiss (civil francesa que estava presa no Irã, acusada de espionagem, e foi libertada), não há dúvida. As críticas são totalmente injustas. Ontem mesmo o responsável por direitos humanos no Irã disse que o país está revendo a sentença de morte por apedrejamento de Sakineh. Até que ponto isso se deve à pressão internacional e até que ponto aos apelos do presidente Lula e de outras pessoas que tenham diálogo direto com ele, eu não sei, essas coisas são difíceis de medir.

O Brasil se alinhar com países que têm histórico antidemocrático não compromete nosso "soft power", poder de influenciar sem recorrer à força bruta?
Eu não acho que o nosso "soft power" tenha sido comprometido ao longo desses anos, nem essa é a opinião de nenhum comentarista internacional. Não somos "soft" em direitos humanos, só não condenamos porque a grande maioria dos países que condenam é de ex-potências coloniais que estão purgando os seus complexos de culpa. E não quer dizer que nós privadamente muitas vezes não falemos. E se eu quisesse posar de amiguinho do Irã ia votar contra, ia dizer que a resolução (da ONU) não tem cabimento. Nós nos abstivemos.

Olhando para esses últimos oito anos, o que o senhor teria feito de diferente?

Pode parecer presunçoso, a minha tendência é ver acertos, os historiadores terão visão mais equilibrada. Eu não me arrependo da Alca (negociação que não avançou).

O sr. acha que a atribuição de comércio exterior tem de ficar no Itamaraty ou deve ser criado um escritório comercial subordinado à Presidência, como nos EUA?
Pergunte à Fiesp o que eles acham - à Fiesp mesmo, não a ex-diplomatas que estão na Fiesp. Nós temos uma visão de País mais completa, levamos em conta outros fatores que não são aqueles de ganho imediato.

Um problema que está ganhando cada vez mais importância é a competição da China. Não deveria haver maior assertividade em relação à China, além de defesa comercial?
Nós estamos com superávit de quase US$ 7 bilhões com a China.

Mas o que exportamos são commodities.
Quando chega a hora de defender o interesse do etanol, do açúcar, é muito importante, mas quando está dando certo, aí tudo vira commodities. Dito isso, eu não quero dizer que não tenhamos de ser mais assertivos em relação à China. Esse é um desafio.

O Brasil é muito mais enfático ao criticar a política monetária americana, dentro da guerra cambial, do que a desvalorização do yuan. Isso não é ideológico?
A China adotou uma política que nos prejudica, mas a raiz do problema está na política monetária dos EUA, não tenho dúvida sobre isso. Como estou em final de governo, estou de saída, dou minha opinião: se um país quer ser tratado como economia de mercado, não pode ter política cambial que não seja de mercado. Essa política de constante desvalorização nos atinge. Eu acho que o relacionamento com a China será um dos maiores desafios do Brasil daqui para a frente.

A China está entrando em áreas de influência nossa, como América do Sul e África. Mas a China segue um modelo de negociação sem impor condições com Zimbábue, por exemplo, país notório por violações.
Vamos competir com nossos méritos, o Brasil transfere conhecimento da maneira que eles não transferem, em agricultura tropical, por exemplo. Não queremos seguir o modelo chinês, em absoluto, não perco uma oportunidade de conversar com meus interlocutores do Zimbábue sobre o que eu acho que eles deveriam fazer, que envolve tratamento adequado da oposição. Mas não somos a favor de isolamento comercial, algo que não dá resultado.

Quais são os grandes desafios em política externa do próximo governo?
Precisamos dar uma forma importante ao relacionamento com a China. Não desenvolvemos um conceito pleno de como vai ser nossa relação com a China. Essa é uma autocrítica. Não deu tempo. Precisamos pensar mais profundamente nisso.

E com os EUA, em que pé estamos?
Estamos bem. Nossa cooperação no Haiti foi muito boa, há vários países onde cooperamos no etanol.

Seria positivo a presidente eleita Dilma Rousseff se encontrar com o presidente americano Barack Obama em Washington antes de sua posse?
Ah, esse conselho eu só dou a ela se ela me pedir. E ela não me pediu. Mas, na minha opinião, indispensável não é. Ela terá tempo de ir depois, receber o Obama aqui depois. É mais importante ela ir à Argentina, porque simboliza as realizações com a América do Sul.

Os EUA têm a visão certa do papel do Brasil no mundo?
Há uma visão mais aproximada, apesar de tropeços. Em uma matéria recente, a própria (secretária de Estado) Hillary Clinton falou da necessidade de intensificar as relações com China, Índia e Brasil.

Mas, por enquanto, intensificou com a Índia.
A Índia tem para eles um valor estratégico em função da região onde está, ao lado da China e Rússia.

Seria esperado, quando o presidente Obama vier pra cá, que ele manifeste apoio à pretensão do Brasil a um assento permanente no Conselho de Segurança (CS) da ONU, como fez com a Índia?
Ah, eu esperaria, se o presidente Obama vier pra cá, depois de ter ido à Índia, seria normal ele dizer a mesma coisa do Brasil.

Apesar dos nossos percalços com os EUA nos últimos tempos.
Sim, seria normal. Se o preço para entrar no CS é dizer sim a tudo, pode até não valer a pena.

Em Trinidad Tobago em 2009, na Cúpula das Américas, Obama fez um discurso prometendo uma nova política para a América Latina. Ele correspondeu às expectativas de mudança da política americana para a região?
O governo republicano (do presidente George Bush) cometeu muitos erros em relação à América Latina - pôs Cuba no eixo do mal, apoiou o golpe na Venezuela. Mas em outros casos o governo Bush agiu de maneira mais sensata, ouviu o Brasil em muitas coisas. Nós tínhamos uma enorme expectativa com o presidente Obama, mas ele teve de se concentrar em outros problemas, internos e do Oriente Médio. Algumas vezes isso não é mau. A melhor política que os americanos podem ter para a América Latina é a "negligência benigna".

O que o sr. pretende fazer quando acabar o governo Lula?
Não tenho nenhum plano muito claro, tenho vários convites vagos, para fazer seminários, cursos, o mais específico é para dar aula na UFRJ. Pretendo fazer isso, vou morar entre Brasília e o Rio, minha mulher mora aqui.

O sr. teria gostado de permanecer no governo Dilma?
Dizer não soaria arrogante, dizer sim parece que estou pleiteando alguma coisa. Eu me sinto realizado. Os nomes que ouço falar todos são de pessoas boas.

O sr. acha que haverá continuidade na política externa?
Eu não creio que haja mudanças de curso muito importantes, mas desafios novos sempre aparecerão, a China é uma relação que terá de ser pensada.

O sr. vê o mesmo tipo de atuação intensa em questões controversas, como Oriente Médio e Irã?
O Brasil é percebido como um interlocutor válido no Oriente Médio, eu recebi pedidos para receber autoridades da Síria, da Autoridade Palestina, de Israel. Independentemente de quem seja o presidente, o Brasil é um país que tem um peso. Essas situações vão se repetir caso a gente queira ou não queira, e a gente não pode fugir delas. Como o Brasil quer ser membro do CS, mesmo não permanente, não podemos nos omitir dessas questões. Não vamos fazer uma nova política de isolacionismo, só cuidando do nosso. Como dizia o Silveira (Antônio Azeredo da Silveira, chanceler de Ernesto Geisel), o Brasil pode renunciar a tudo, menos à sua grandeza.

sábado, 27 de novembro de 2010

Pausa para...grandes arquitetos e suas obras maravilhosas...

ARTS - INTERACTIVE FEATURE
Architects Take On Museums in Doha and Abu Dhabi
I.M. Pei, Frank Gehry, Norman Foster and Jean Nouvel discuss their work in the Persian Gulf.

The New York Times, November 27, 2010

Two Cities, Four Architects

Two cities on the Persian Gulf, Doha and Abu Dhabi are the settings for vast construction projects, including major new museums designed by some of the world's most celebrated architects.

I.M. Pei

spoke about the simple geometric forms that make up his Museum of Islamic Art in Doha, and he described the clarity of the desert sunlight as a central influence.

Frank Gehry

is building a branch of the Guggenheim that is 12 times the size of its New York headquarters. He spoke of an intuitive design approach. GUGGENHEIM MUSEUM, ABU DHABI

Norman Foster

is designing the National Museum in Abu Dhabi. His project is built on Saadiyat Island, and he talked about history as a guide to sustainable structures in a hot environment.

Jean Nouvel

has projects in both cities. His branch of the Louvre in Abu Dhabi is covered by a huge dome. His other project, in Doha, is the National Museum of Qatar. It was inspired by the shape of local sand roses.


Photographs by: Gehry Partners; DigitalGlobe via Google Earth,; Agence France-Presse; Reuters; Chris Ramirez for The New York Times

Norman
Foster

is designing the National Museum in Abu Dhabi. His project is built on Saadiyat Island, and he talked about history as a guide to sustainable structures in a hot environment.
SITE OF NATIONAL MUSEUM, ABU DHABI
Photographs by: DigitalGlobe via Google Earth, Foster & Partners, Horst Neumann/Image Bank via Getty, Sajid Shafique/Getty Images

Jean
Nouvel

has projects in both cities. His branch of the Louvre in Abu Dhabi is covered by a huge dome. His other project, in Doha, is the National Museum of Qatar. It was inspired by the shape of local sand roses.
LOUVRE, ABU DHABI; NATIONAL MUSEUM, DOHA
Photographs by: DigitalGlobe via Google Earth, Ateliers Jean Nouvel; Ed Alcock for The New York Times; Stephanie Kuykendal for The New York Times; Sean Gallup/Getty Images; Ernest H. Schoedsack; Owen Oxley
Credits: Erin Aigner, Xaquín G.V., Mika Gröndahl, David Nolen, Sergio Peçanha and Zach Wise; videography by Brent McDonald and David Clair, Stefania Rousselle, Marcus Yam for The New York Times

Protecionismo argentino: continuidade assegurada...

Desde a segunda metade dos anos 1980 -- não considerando as travas anteriormente existentes no que se refere a açúcar e automóveis, que continuam existindo até hoje -- a Argentina impõe restrições ilegais aos produtos brasileiros, e contra ele erige barreiras para-tarifárias (salvaguardas, antidumping, todos ilegais e abusivos), numa total contravenção às regras da zona de livre-coméricio e de união aduaneira que deveriam, supostamente, reger o Mercosul.
Antes do "nunca antes", o governo brasileiro reagia, por meio do mecanismo próprio de solução de controvérsias ou até recorrendo às instâncias do GATT-OMC, o que é inacreditável, sabendo que se trata de dois membros de uma mesma união aduaneira. Com a entrada do "nunca antes", nunca mais o Brasil reagiu à altura, sendo tolerante com os desmandos argentinos e até colaborando com o protecionismo deslavado, pedindo "compreensão" aos empresários exportadores brasileiros, a pretexto de colaborar com o esforço argentino de recuperação econômica e de reindustrialização.
O Brasil do "nunca antes" aceitou passivamente os argumentos completamente equivocados em torno de supostas "assimetrias" entre os dois países, o que é também um indício que as cabeças supostamente pensantes na política econômica externa do Brasil na verdade não pensam, pois aceitam argumentos totalmente falsos quanto à natureza da relação bilateral e dos fatores de competitividade nacional.
Continua sendo assim, como evidencia este editorial do Estadão, que destaca que a integração, na verdade, vem dando passos atrás, com a conivência ativa do governo brasileiro, que proclama promovê-la e defendê-la.
Pode-se considerar que seja apenas inconsciência, embora alguns observadores admitem que se trata de burrice, mesmo, parte de um projeto ilusório de liderança na região.
Paulo Roberto de Almeida

Maus modos, velhas práticas

Editorial O Estado de S.Paulo, 26 de novembro de 2010
 
O que há de novo nas recentes ameaças do governo argentino de criar barreiras à entrada de produtos brasileiros são os maus modos com que elas foram transmitidas pelo secretário de Comércio Interior do governo Kirchner, Guillermo Moreno, ao embaixador do Brasil em Buenos Aires, Ênio Cordeiro.
Utilizando um tom agressivo, como informou o jornal Valor, e ignorando o fato de que "um embaixador, por definição, é representante de algo que excede sua pessoa" e de que, no caso de Cordeiro, "por trás dele há um país quatro vezes maior e mais poderoso do que a Argentina, que dificilmente deixará que o episódio se dilua sem nenhum custo", como registrou o jornal Clarín, de Buenos Aires, Moreno se excedeu nas grosserias. Isso transformou o assunto num incidente diplomático, que certamente exigirá a interferência do presidente Lula, que ainda se avistará duas vezes com a presidente argentina Cristina Kirchner.
Novidade para muitos brasileiros, o estilo truculento de Moreno é, porém, conhecido do setor empresarial argentino. O secretário de Comércio Interior tem sob seu comando o órgão oficial encarregado de medir a inflação argentina, o Instituto Nacional de Estatísticas e Censo (Indec), acusado de manipular dados. Como responsável pelo comércio interno, Moreno tem ameaçado empresários de vários setores, que convoca a seu gabinete para forçá-los a baixar os preços. Segundo participantes desses encontros, às vezes os recebe com uma pistola sobre sua mesa.
Foi dele, em maio, a iniciativa de avisar os dirigentes de supermercados argentinos de que, a partir daquele momento, proibiria a entrada no país de produtos alimentícios não frescos procedentes do Brasil que concorressem com o similar nacional e puniria as empresas que desrespeitassem suas ordens. Era uma barreira apenas verbal, mas que, pelos métodos e pelo poder de Moreno - é considerado fiel cumpridor das determinações de Kirchner -, foi levada a sério.
Na época, houve notícias de filas de caminhões brasileiros na fronteira, pois sua entrada na Argentina estava sendo impedida. Após encontro com Lula, a presidente Cristina Kirchner negou publicamente que seu governo tivesse imposto restrições à entrada de produtos brasileiros.
No dia 5 de novembro, Guillermo Moreno se reuniu com o embaixador Ênio Cordeiro, na presença do ministro da Economia, Amado Boudou, ao qual está subordinado - mas, na prática, responde diretamente à presidente Kirchner. O pretexto da reunião, segundo o jornal Valor, foi a importação de tubos de metal fabricados no Brasil que caracterizaria a prática de dumping (esse produto passou a ser sobretaxado na Argentina). Além disso, Moreno afirmou que o governo argentino prepara "contramedidas" eficientes e não ortodoxas para conter a importação de produtos brasileiros.
Se, para as autoridades brasileiras, a falta de educação do funcionário argentino pode ser novidade, suas ameaças são velhas conhecidas. Sempre que o comércio entre os dois países registra um aumento expressivo do saldo em favor do Brasil, a Argentina ignora os acordos e tratados que regem o Mercosul e impõe barreiras de diferentes tipos à entrada no país de produtos brasileiros.
É o que ocorre no momento. Apesar das desvantagens dos produtos brasileiros no exterior por causa da valorização do real em relação ao dólar, o Brasil conseguiu acumular, nos primeiros dez meses deste ano, um saldo de US$ 2,9 bilhões no comércio com a Argentina. E esse superávit foi alcançado a despeito do aumento de cerca de 30% das exportações da Argentina para o Brasil, o que, argumentam os brasileiros, contribui para assegurar mais da metade dos 80 mil empregos da indústria automobilística argentina.
Quando o governo argentino investe contra os produtos brasileiros, o governo Lula, ao contrário do que diz a imprensa argentina - segundo a qual dificilmente o Brasil deixa de reagir -, tem aceitado as medidas com tolerância que beira a passividade. O que talvez o tenha incomodado no caso é o estilo de Guillermo Moreno. As agressões argentinas praticadas com luvas de pelica foram sempre toleradas.

Politica externa: continuidade assegurada...

Dizem que um dos lemas do Itamaraty é saber renovar-se na continuidade. Bem, em termos de continuidade, ele não precisa mais se preocupar...
Aliás, na Defesa também, como registra a matéria na sequencia.
Paulo Roberto de Almeida

Dilma mantém Marco Aurélio Garcia, assessor de Lula
Tânia Monteiro
O Estado de S.Paulo, 26.11.2010

A presidente eleita Dilma Rousseff decidiu manter o assessor especial internacional do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Marco Aurélio Garcia, no mesmo cargo que ocupa hoje.
A manutenção da Garcia na cozinha do Planalto é um forte sinal da continuidade de política de boa vizinhança do Brasil com os países vizinhos, como a Venezuela, que rendeu muitas críticas à política
externa do presidente Lula. A própria Dilma, embora não tenha explicitado como pretende conduzir a política externa brasileira, já manifestou apoio ao Mercosul e foi celebrada pelo venezuelano Hugo
Chávez. Será uma reedição da dobradinha Garcia-Itamaraty, que o governo considera que deu certo na administração da política externa sob Lula.
Mas, a ajuda de Marco Aurélio à Dilma não se restringe à política externa. Garcia, que foi um dos coordenadores da campanha da petista, ajudará a presidente eleita também na relação com o PT.
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Convencida por Lula, Dilma irá se reunir com Jobim
Gerson Camarotti e Geralda Doca
 O Estado de S.Paulo, 27.11.2010

Dilma já considera possível mantê-lo no Ministério da Defesa

Depois das recomendações do presidente Lula, a presidente eleita, Dilma Rousseff, já diminuiu as resistências para manter no cargo o ministro da Defesa, Nelson Jobim.
Terá uma conversa definitiva com ele depois do dia 4 de dezembro, quando ele estará de volta ao Brasil de uma viagem a Itália, Sérvia, Polônia e Espanha. Oficialmente, a conversa será para tratar da compra dos caças para a Força Aérea Brasileira.
Lula tem dito a Dilma que Jobim é fundamental para evitar crise numa área delicada.
Na sua avaliação, o presidente vai além: hoje haveria poucos quadros preparados como Nelson Jobim para ter autoridade e conhecimento para comandar as Forças Armadas.
Todos os antecessores de Jobim enfrentaram crise e foram desestabilizados. Dilma analisou outros nomes para a Defesa. Até o do deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP), que irá para a Justiça, chegou a ser avaliado.
Mas cresce o consenso de que qualquer nome enfrentaria dificuldades. Para diminuir as resistências de Dilma, uma saída seria manter Jobim por um período determinado, até acabar a reestruturação do Ministério da Defesa. Mas Lula tem dito que o melhor seria mantê-lo por todo o mandato.
Confirmada a permanência de Jobim, devem continuar nos cargos os comandantes das Forças Armadas: brigadeiro Juniti Saito, da Aeronáutica; almirante Moura Neto, da Marinha, e general Enzo Perri, do Exército.
Ontem, a atuação de Jobim no enfrentamento ao crime organizado no Rio foi elogiada no Planalto, o que contou pontos para sua permanência.
Ao saber das resistências ao seu nome, Jobim mandou sinais de que não tinha interesse em permanecer no posto. Isso preocupou Lula, que decidiu priorizar o assunto.
"Até Jobim, a Defesa foi um dos maiores problemas do meu governo", disse Lula para Dilma.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Unasur e a clausula democratica: e quando o "golpista" é o proprio dirigente?

A Unasur aprovou uma "clásula democrática", como informa a matéria abaixo. Muito bom, muito bem.
Mas ela se aplica apenas em tentativas ou iniciativas de derrubadas de regimes regularmente eleitos por meios violentos, ou seja, golpes de Estado "clássicos" (se o termo se aplica).
E quando são os próprios dirigentes a minar a democracia em seu país? Nada a fazer?
Pois é isso o que vem fazendo alguns dos líderes políticos presentes na reunião da Unasur: eles vem minando, na verdade destruindo, a democracia por dentro. Sem golpes, apenas na base de decretos, de mudanças constitucionais e legais, algumas delas conseguidas por via plebiscitária, quando o líder cesarista, ou candidato a autocrata, exerce todos os seus poderes efetivos para convencer uma maioria de votantes (que podem não ser suficientemente esclarecidos) de que aquelas mudanças vão melhorar a vida desses votantes.
Contra esses "golpes legais" a cláusula da Unasur não serve para nada. Melhor ficar com a resolução democrática da OEA, a declaração de Lima (2001), muito mais exigente em termos de requerimentos democráticos.
Paulo Roberto de Almeida

Unasul aprova cláusula democrática

Protocolo estabelece sanções diplomáticas e comerciais a tentativa ou golpe de Estado na região

estadão.com.br, 26 de novembro de 2010 | 19h 20


GEORGETOWN  - Os países da União de Nações Sul-Americanas (Unasul) aprovaram nesta sexta-feira, 26, um protocolo para responder de forma conjunta, ou inclusive prevenir, tentativas de golpes de Estado na região. 

"Já assinamos", disse o presidente da Venezuela, Hugo Chávez em Georgetown, na Guiana, onde a reunião ocorre.
O protocolo estabelece sanções diplomáticas, políticas e comerciais a qualquer tentativa ou golpe de Estado nos países membros. "Quem tentar um golpe de Estado, ou chegar ao poder por meio de um governo de facto, saberá que terá de enfrentar o ostracismo total da região", disse o presidente do Equador, Rafael Correa.

Inflacao na China, e no Brasil

Revoltas contra os aumentos de preços costumam ser violentos na China, como relata esta pequena matéria da Economist. Mas não adianta culpar os americanos pelo aumento de preços na China, pois como também indica a matéria o aumento do meio circulante na China foi muito mais importante do que nos EUA, para uma economia duas ou três vezes menor.
Seria interessante conhecer de quanto aumento o M2 brasileiro, uma vez que o governo vem aumentando o crédito e os gastos de maneira quase irresponsável. Não se deveria reclamar, em seguida, se o BC aumentar os juros, em virtude de a inflação estar superando não apenas o centro da meta, mas ameaçando ultrapassar a banda fixada (que vai até 6,5%, cabe lembrar).

The canteen vigilantes
The Economist, November 26th, 2010, 10:05
by S.C. | HONG KONG
FORGET the bond-market vigilantes. In China, rising inflation has invited swift and terrible retribution from over a thousand rampaging schoolkids, who trashed their canteen in Guizhou province after the school raised the price of school dinners and bottled water. The South China Morning Post has the story (subscription required) and the pictures.
The disagreement among China-watchers about the roots of the country’s inflation is almost as violent. Like the company running the school canteen, many economists blame the rising price of vegetables and fruit. But this is “a lot of guff”, argues Arthur Kroeber of Dragonomics, an economics consultancy. “Food prices,” he says, are “an expression of inflation, not its cause.”
I wouldn’t go that far. But I share his scepticism about the other excuse Chinese officials like to offer: the Fed. They trash its monetary policy as enthusiastically as the schoolkids trashed their canteen. Its easy money, they argue, has raised global commodity prices and spurred hot-money inflows.
But despite its best efforts, the Fed has only succeeded in raising America’s broad money supply (as measured by seasonally-adjusted M2) to about $8.8 trillion. China’s central bankers, on the other hand, have increased China’s M2 to almost 70 trillion yuan, or $10.5 trillion. As Mr Kroeber points out, China has a greater quantity of money circulating in an economy a third of the size. Who is calling whom easy?

Tentando entender a politica externa brasileira (e nao conseguindo)...

Li, e peço que leiam, a nota seguinte:

Ministério das Relações Exteriores
Assessoria de Imprensa do Gabinete
Nota à Imprensa nº 682
23 de novembro de 2010

Tensão na Península Coreana
O Governo brasileiro tomou conhecimento, com preocupação, dos incidentes ocorridos na ilha de Yeonpyeong, entre a República da Coréia e a República Popular Democrática da Coréia, dos quais resultaram vítimas fatais sul-coreanas.
Ao solidarizar-se com as famílias das vítimas, o Governo brasileiro conclama ambas as Partes a absterem-se de medidas que possam agravar ainda mais a tensão na Península Coreana e a buscarem uma solução negociada, com participação das Nações Unidas.


Ao que tudo indica, quem bombardeou a ilha sul-coreana foi a artilharia norte-coreana. A nota passa por cima desse fato, como se os obuses tivessem vindo de "alienígenas" ou terceiras partes. A nota ainda pretende que os sul-coreanos abstenham-se de tomar qualquer medida de defesa nacional?
Ainda estou tentando entender...

OI Movel: passe longe dessa companhia vagabunda

A OI tem um excelente serviço "policial", ou de investigações "criminosas", mas é uma péssima companhia telefônica, ou uma companhia de crédito desqualificada.

Estou no Brasil há três dias, depois de oito meses no exterior. Pois acabo de receber um telefonema em meu celular de Brasília, que pertence a outra companhia telefônica, cobrando-me um débito de mais de 800 reais, relativo a uma compra feita no Rio Grande do Norte em dezembro de 2006.
Alguns dados correspondem: meu nome, data de nascimento e CPF, o que não é difícil de descobrir, pois o CPF vem impresso em cada talão de cheque.
Mas o endereço é de Natal, no RN, cidade e estado onde jamais estive, assim como jamais mantive qualquer tipo de relação contratual com essa companhia vagabunda, a OI, que ousa me telefonar a Brasília para cobrar um débito de origem fraudulenta.
O mais inacreditável é que essa companhia concedeu um cartão de crédito a esse suposto alter ego meu, nordestino, sem jamais exigir uma carteira de identidade, com foto, nem verificou antecedentes, endereço real, nomes de pai e mãe, etc... Asi no más, vão dando crédito a qualquer bandido que aparece (esse com o meu nome, mas não é a primeira vez, devo dizer).

Efetuei uma reclamação no SAC -- que tem um nome algo incômodo para o atendimento a não clientes -- mas se a companhia vagabunda voltar a me incomodar novamente pretendo processá-los por assédio indevido e danos morais.

Em todo caso, fica aqui o alerta: companhias vagabundas não merecem o crédito de clientes...

Paulo Roberto de Almeida

Populismo cambial e farra dos importados: Brasil tem o Guiness...

O Brasil conseguiu se distinguir num concurso econômico internacional: é o país onde as importações cresceram mais rapidamente, de todos os membros da OMC. Os exportadores -- outros países da OMC -- agradecem e pedem para continuar essa "abertura irresponsável e unilateral".
Nossos parceiros na OMC adoram todas as nossas "práticas econômicas nefandas", todo esse "populismo cambial", que "destrói a indústria nacional", "remete empregos para o exterior", cria um "desequilíbrio insustentável na balança comercial" e "compromete gravemente o saldo de transações correntes" do Balanço do Pagamentos.
Todo esse quadro é "inaceitável", só explicável num "governo antinacional", "submisso aos interesses estrangeiros", e que arrisca "comprometer nossa soberania nacional". Tudo isso é consequência do "neoliberalismo da política econômica", de uma visão "mercadista exagerada", que acredita na "ilusão de que os mercados são capazes de auto-correção", que afasta a "necessária ação do Estado na manutenção de um bom ambiente econômico interno", se necessário por algumas "medidas de proteção justificadas", em face da "deslealdade comercial" de vários parceiros externos.
"Tudo isso é inaceitável", e "não pode continuar assim".

Calma, calma, não penso nada disso. Tudo o que está entre aspas são frases, reais, pronunciadas por vários dos que nos comandam ou que nos representam atualmente, quando essas personagens estavam na oposição ao governo anterior, social-democrata, e quando eles acusavam o governo de ser antinacional e vendido aos interesses estrangeiros.
Pois bem: os atuais dirigentes estão fazendo exatamente o que foi feito anteriormente: uma abertura "irresponsável", um "populismo cambial" e outros atos perversos contra a economia nacional.
Não vejo os protestos que deveriam existir nessas circunstâncias.
Será que estou vivendo em outro país?
Paulo Roberto de Almeida

CÂMBIO DÓLAR-REAL É INSUSTENTÁVEL! IMPORTAÇÕES SOBEM 46%
O Estado de S.Paulo, 25/11/2010

1. Brasil é o país onde as importações mais cresceram desde o início do ano. Volume cresceu 46% entre dezembro de 2009 e setembro deste ano; variação é a maior entre 70 países avaliados pela OMC. A invasão de importados no Brasil bate todos os recordes. Segundo dados oficiais de 70 governos, o País está sofrendo a maior expansão de importações em 2010 entre todos os membros do G-20 e entre todas as economias do mundo que tiveram seus dados compilados pela Organização Mundial do Comércio (OMC).

2. Setembro bateu recorde em volume de importações no País. Em comparação com a média dos meses de 2006, o valor é três vezes maior. Em relação a setembro de 2009, o Brasil também tem a maior taxa de expansão, de 43%. Na China, a alta havia sido de 24%, ante 34% na Rússia.  Nenhuma das 70 economias avaliadas teve variação tão grande como a do Brasil entre dezembro de 2009 e o fim do terceiro trimestre de 2010.

3. O Brasil já aparece nas estatísticas americanas como o parceiro comercial com o qual os Estados Unidos têm o maior superávit. Com a Europa, a situação se repete. O superávit que o Brasil tinha com os europeus desde 1999 foi zerado no terceiro trimestre. O resultado contrasta com os números de 2007, quando o País havia obtido saldo positivo de 11,5 bilhões, amplamente favorável às contas nacionais.

4. Em 2010, o Brasil foi ainda a economia que teve a maior expansão de importação de produtos europeus em todo o mundo. O crescimento das vendas europeias ao Brasil foi de 54% de janeiro a agosto. Segundo os dados da OMC, China e Rússia também tiveram alta em suas importações em 2010. Mas em nenhum deles a expansão ocorreu no mesmo ritmo que a do Brasil.

Contra a politizacao dos direitos humanos...

Essa mania dos americanos de manipularem resoluções nos órgãos de direitos humanos é de fato insuportável e precisa de uma resposta ousada. Justamente como certas pessoas pensam que é o correto como postura internacional. Não se pode deixar os países politizarem questões à vontade, praticamente sozinhos. Que coisa...

Abstenção pró-Irã
Editorial Folha de S.Paulo, 25/11/2010

Ao abster-se na votação de uma resolução das Nações Unidas contra as violações dos direitos humanos no Irã, aprovada na última sexta-feira, a diplomacia do governo Lula manteve-se coerente com sua política de confrontação com os Estados Unidos.

Se os norte-americanos manobram contra moções que firam seus aliados, então os brasileiros recusam-se a votar reprimendas a adversários da grande potência, mesmo que sentenciem mulheres a morrer apedrejadas ou se envolvam em campanhas genocidas.

O Brasil deve assumir atitude altiva em suas relações com os EUA, mas já são suficientes os contenciosos com aquela nação para que se amplie desnecessariamente as frentes de conflito.

Ao justificar a abstenção na resolução sobre o Irã, o representante brasileiro queixou-se de que os direitos humanos são tratados na ONU de forma "seletiva e politizada". São termos, aliás, que definem bem a atual política do Itamaraty, em contraste com a melhor tradição brasileira.

O governo Lula condenou, por exemplo, "de forma veemente" o golpe hondurenho. Interveio nos assuntos internos, cedendo a embaixada para a volta do presidente banido e, num extremo de intransigência, ainda recusa-se a aceitar o resultado da eleição que, goste ou não, superou o impasse.

Ao mesmo tempo, evitou manifestar-se sobre os conflitos no Irã, onde divergências políticas foram - e continuam sendo - tratadas com prisões, mortes e expurgos.

No ano passado, o ditador do Sudão, Omar al Bashir, já havia dito que tinha o "apoio do presidente Lula". O Brasil se eximira de condenar o governo sudanês por sua responsabilidade na campanha de "limpeza étnica" que chegou ao auge em 2004 e custou a vida de milhares de pessoas.

Incongruências dessa espécie só servem para minar a credibilidade de nossa diplomacia.

A política externa deve ser um instrumento de defesa dos interesses econômicos do país, colocando-se a favor da resolução negociada e pacífica de conflitos e de princípios como direitos humanos e autodeterminação.

No caso do Irã, não havia laços comerciais relevantes a atenuar a abstenção - que, dado o histórico recente, ganhou sabor de um renovado apoio ao governo de Mahmoud Ahmadinejad.
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Addendum (para destacar um comentário e minha resposta):
felipe disse...
Olá PRA, Afinal, o que você acha que tem mais efeito prático ? As sanções impostas pela ONU, ou o meio do diálogo, que o Brasil tem colocado em pauta atualmente ? Gostaria de ouvir um pouco "a voz da experiência". Obrigado, Felipe França

Meu comentário em retorno (PRA):
Felipe,
Em primeiro lugar, uma coisa (as sanções coletivas, decididas num órgão multilateral) não se opõe à outra (o diálogo bilateral).
Em segundo lugar, o diálogo bilateral raramente traz soluções ou constitui um meio eficaz de pressão, a menos que seja numa situação de assimetria tão grande que o grande consiga fazer pressões (neste caso ilegítimas) contra o suposto pequeno, para trazer resultados tangíveis para o que se pretende.
No caso da Coréia do Norte, por exemplo, sanções multilaterais não surtem nenhum efeito. Mas a China, se desejar, pode estrangular o país em pouco mais de uma semana. O mesmo não se aplicaria ao Irã, que depende muito pouco de um grande vizinho e menos ainda dos órgãos multilaterais. Mas as sanções multilaterais são indispensáveis se se desejar resolver a questão pelo lado prático, independente de qualquer diálogo bilateral.
Portanto, nesse caso, a "experiência" recomendaria, sanções, primeiro, e bem fortes, depois "diálogo", seja lá o que isso significar.
Trogloditas do cenário internacional (e ainda existem vários) são dificilmente enquadráveis pela voz da razão: apenas sanções fortes (e que infelizmente prejudicam o povo do país) ou um grande porrete unilateral podem trazer resultados.
Mas, os países precisam ter coerência: não se pode deixar de sancionar o Irã e pretender sancionar Honduras, por exemplo.
As simples as that...
Paulo Roberto de Almeida

Capitalismo de compadres (onde mais poderia ser?)

Política Industrial II : JBS/Friboi, etc. e as condições privilegiadas de acesso ao  BNDES  das tais "empresas campeãs"
Mansueto de Almeida, do IPEA
25 de novembro de 2010

Hoje, o presidente do grupo JBS deu entrevista ao Estado de São Paulo e reclama do tratamento que a empresa vem recebendo do mercado e da imprensa que, entre outras coisas, faz matérias negativas sobre o grupo. O título da matéria (será que joguei pedra na cruz?) mostra a indignação do executivo com as matérias da imprensa e com o comportamento dos investidores privados que penalizam o valor de mercado do  JBS (valor de mercado despencou em mais de 30% este ano e está abaixo do valor patrimonial), que seria uma das companhias brasileiras mais bem sucedida aqui e lá fora.

Já falei sobre esse assunto várias vezes, mas como já está em gestação no BNDES a mais nova versão da política industrial, a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) na sua segunda versão, que agora vai focar em sub-setores ou “elos das cadeias produtivas”, acho que vale a pena voltar ao assunto e, claro, o JBS sempre entra na discussão porque essa empresa em 2008, 2009 e 2010 esteva na lista dos maiores empréstimos diretos do BNDES ao setor industrial.

Em 2008, o JBS pegou R$1,1 bilhão de empréstimos com o BNDES, em 2009, mais R$ 3,5 bilhões, e mais R$ 200 milhões em 2010. Como JBS comprou o grupo Bertin, que tinha recebido R$ 2,5 bilhões de empréstimos diretos do BNDES, em 2008, e mais R$ 200 milhões em 2009, todos esses empréstimos totalizam R$ 7,5 bilhões em um prazo de três anos.

Além desses empréstimos diretos, O BNDESpar comprou participação no JBS e no grupo Bertin que hoje são a mesma empresa. De acordo com o balanço patrimonial do BNDES de junho de 2010, o BNDES possuía 17,32% do JBS; algo como R$ 3,9 bilhões (participação societária do custo de dezembro de 2009). Essa participação  coloca o JBS entre aquelas empresas nas quais o BNDESpar aposta muito dinheiro, grupo formado pela Eletrobrás (R$ 4,3 bilhões), Vale S/A (R$ 3,7 bilhões), Valepar (R$ 2,6 bilhões) e FIBRIA (R$ 2,3 bilhões) entre outras.

Assim, a relação BNDES-JBS é mais do que um simples empréstimo para o BNDES. É uma aposta de política industrial que o banco fez no grupo para que este pudesse se consolidar como um grande player no mercado de carnes global. O BNDES fez a mesma aposta com a Fibria (30,4% do capital) para o setor de celulose e com o frigorífico Marfrig, no qual o banco detém 13,9% (R$ 987 milhões) do capital.

Dito isso, seguem alguns esclarecimentos.

(1) Ganho Privado versus Ganho Social: o grupo JBS adotou a estratégia correta de crescimento do ponto de vista privado. Eu como empresário teria buscado o BNDES como parceiro e fonte de recursos. O que se questiona não é o JBS, mas sim o BNDES que nunca explicou claramente os critérios para apostar tanto em um setor no qual o Brasil já tinha uma clara vantagem comparativa. Qual o ganho social dessa aposta?  O crescimento da empresa decorreu mais do acesso ao BNDES ou do mérito dos seus administradores?

O JBS fez o jogo correto, quem teria que se explicar deveria ser o BNDES que se restringiu a falar que precisamos criar empresas globais. OK, mas por que o setor público tem que estar por trás dessa estratégia em companhias que já são competitivas? por sinal, há algumas semanas o economista Josér Roberto Mendonça Barros publicou na sua coluna no Estado de São Paulo (clique aqui)uma avaliação dos impactos do crescimento do JBS na economia brasileira.

(2) Banco de Fomento versus Operações de Socorro: Na entrevista de hoje ao jornal estado de São Paulo, o presidente do JBS deixa escapar que:

“….Sabe o que ninguém lembra? É que o Bertin tinha R$ 4 bilhões de dívida com Itaú, Bradesco, Santander, Banco do Brasil. Por que ninguém pergunta: o Bradesco te pediu para comprar? O BNDES tinha R$ 2 bilhões. O fato é que naquele momento ninguém tinha balanço para comprar o Bertin. Eu acho que ajudei o Bradesco, ajudei o Santander. Quando eu converso com o Fábio (Barbosa, do Santander), eu digo: olha, você lembra, né? Eu poderia até levar vantagem em cima disso. Mas eu nunca faria isso.”

O curioso é que este não foi o único caso. Como já cometei neste blog sobre matéria de outubro na revista Piauí no caso da venda da Sadia para Perdigão:

“Nildemar Secches, antigo presidente da Perdigão e atual presidente do conselho da Brasil Foods, acha que, sem a intervenção do BNDES, teria comprado a Sadia por um preço muito mais baixo. “A Sadia não ia quebrar, quem ia quebrar eram os acionistas”, disse ele a um amigo. “Nós ficaríamos com a empresa por um preço muito menor.”

E exatamente as mesmas observações valem para o caso da venda da Aracruz celulose, que tinha como acionistas os mesmos controladores do Banco Safra,  para a Votorantim Celulose para formar a Fibria. Os empréstimos do BNDES, além de facilitar as vendas, “salvou” os empréstimos dos bancos privados (ou de seus acionistas).

Essas operações nunca foram devidamente explicadas. De qualquer forma, aqui e acolá acaba-se descobrindo que os bancos privados também foram favorecidos pela posição mais ativa que o BNDES adotou desde a crise do final de 2008.

As dúvidas do mercado não são se este ou aquele empresário “atirou pedra na cruz”, mas sim do que estar por trás do crescimento de várias empresas brasileiras, se uma maior facilidade de acesso a recursos públicos ou a competência excepcional dos seus administradores. Como ninguém se dá o trabalho de explicar a “real política industrial”, fica-se com a impressão que nossas grandes empresas crescem rápido devido a condições excepcionais de acesso a recursos do BNDES

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

IBRI-RBPI: Seminario sobre a insercao internacional do Brasil na UnB (6/12/2010)

O Instituto Brasileiro de Relações Internacionais – IBRI e o Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da Universidade de Brasília convidam para o Seminário “A inserção global do Brasil: um Balanço da Política Externa na era Lula”, por ocasião do lançamento da edição especial da Revista Brasileira de Política Internacional – RBPI, Emerging Brazil under Lula: an assessment on International Relations (2003-2010). No seminário se fará uma avaliação geral da ação internacional do Brasil ao longo dos últimos anos – as suas linhas de força, as suas grandes ambições, as metas realizadas e os projetos frustrados.
O evento terá lugar no Auditório Joaquim Nabuco do prédio da FACE, no Campus Universitário Darcy Ribeiro, Universidade de Brasília, Asa Norte, no dia 6 de dezembro de 2010, a partir das 9h30min. Informações adicionais podem ser obtidas pelo telefone (61) 31070756. Inscrições, gratuitas, podem ser realizadas aqui e será emitido certificado de participação.

Programa

09h30min – 10h – Mesa de Abertura
  • Eiiti Sato, diretor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB;
  • José Flávio Sombra Saraiva, professor titular de Relações Internacionais da Universidade de Brasília e coordenador do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da UnB;
  • Amado Luiz Cervo, professor emérito da Universidade de Brasília –  UnB;
  • Antônio Carlos Lessa, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB e editor da Revista Brasileira de Política Internacional – RBPI.
10h – 10h40 min – Mesa 1 – O Brasil e o mundo – uma visão geral
  • Moderador: Tânia Maria Pechir Manzur, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB.
  • A ascensão do Brasil no cenário internacional: o Brasil e o mundo – Amado Luiz Cervo, professor emérito da Universidade de Brasília –  UnB e co-organizador da edição especial Emerging Brazil under Lula: an assessment on International Relations (2003-2010).
10h45 min – 12h10min – Mesa 2 – Um perfil internacional em transformação: meio-ambiente e segurança internacional
  • Moderador: Pio Penna Filho, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB
  • Quando países emergentes reformam a governança global das mudanças climáticas: o Brasil sob Lula – Ana Flávia Granja e Barros Platiau, professora do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB
  • Questões de segurança no governo Lula: da perspectiva reativa para a afirmativa – Rafael Duarte Villa, professor do Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo – USP
14h – 16h – Mesa 3 – O sistema de relações bilaterais: inflexões, continuidades e renovações
  • Moderador: Danielly Silva Ramos, professora do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB
  • Um novo diálogo estratégico: As relações Brasil-Estados Unidos na Presidência Lula (2003-2010) – Cristina Soreanu Pecequilo, professora do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de São Paulo – Unifesp
  • Política externa brasileira para a América do Sul durante o governo Lula: entre América do Sul e Mercosul – Míriam Gomes Saraiva, professora do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ
  • A Nova África e o Brasil na era Lula: o renascimento da política atlântica brasileira – José Flávio Sombra Saraiva, professor titular de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB
16h – Debate
16h30min – Encerramento – Lançamento da edição especial da Revista Brasileira de Política Internacional – RBPI, Emerging Brazil under Lula: an assessment on International Relations (2003-2010), pelos seus organizadores
  • Amado Luiz Cervo, professor emérito da Universidade de Brasília –  UnB;
  • Antônio Carlos Lessa, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB e editor da Revista Brasileira de Política Internacional – RBPI.

Comercio Exterior: o Brasil as vesperas de adotar as solucoes erradas

Leiam a matéria abaixo da Agência Brasil, que traduz a preocupação dos setores industriais, majoritariamente concentrados na FIESP, mas igualmente representados na CNI, com a chamada "desindustrialização" da economia brasileira e a alegada "commoditização" da pauta de exportações.
As importações crescem continuamente -- obviamente, pois os produtos externos são baratos e produzir no Brasil é um ato heróico, ou de loucura microeconômica -- e o desequilíbrio vai se refletir, em algum momento, nas preocupações dos chamados investidores internacionais -- que alguns chamam de especuladores -- com a sustentabilidade das transações correntes e a manutenção das atuais regras do jogo. Em função disso, pode começar uma saída de capitais que precipitará uma crise.
Para evitar esse quadro, o governo que entrar em janeiro de 2011, vai tentar ser mais "ativista", mas ele o fará, provavelmente, no pior sentido da expressão: adotando os remédios errados, que vão paliar temporariamente a situação, mas que vão se refletir mais adiante, numa situação insustentável no plano cambial e fiscal, e que se traduzirá em menor bem estar para a população, pois que refletida em maior desemprego setorial e menor crescimento da renda.
Em lugar de atacar os problemas reais -- que são o custo Brasil, refletido na tributação excessivamente excessiva, se me permitem a redundância, e o desequilíbrio das contas públicas, que se refletem nos juros altos -- o governo vai fazer aquilo que querem os empresários (que são aqueles que o financiam): vai atuar sobre o câmbio, para desvalorizá-lo, e sobre os juros, para baixá-los, ambos politicamente.
Isso sem falar que vem aí nova rodada de protecionismo explícito: novas tarifas, novas salvaguardas, novos antidumpings, que só refletem o desespero de industriais e burocratas governamentais (supostamente legitimados pela concorrência desleal do exterior).
A única concorrência desleal que existe no Brasil é da carga tributária extorsiva, que simplesmente torna poucos competitivos os produtos manufaturados brasileiros nos mercados internacionais. O paliativo de subsídios e incentivos fiscais é a outra falsa solução, de caráter setorial, que o governo vai oferecer, introduzindo novas distorções num cenário produtivo já suficientemente confuso e caótico.
Ou seja, o Brasil vai adotar as soluções erradas para os problemas percebidos.
Posso apostar que, com exceção da politização dos juros -- pois o Banco Central vai resistir a isso -- todos os demais pecados serão cometidos pelo governo brasileiro que tomar posse em 1. de janeiro.
Poderia até apostar se tivesse dinheiro, mas vou preferir investir o que tenho em bons livros...
Paulo Roberto de Almeida

Importações continuam crescendo acima das exportações, aponta Fiesp
Alex Rodrigues
Agência Brasil, 18/11/2010

São Paulo - O consumo interno de produtos importados continua crescendo em um ritmo acima das exportações brasileiras. Segundo cálculos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), entre julho e setembro deste ano, os importados atenderam a 22,7% do consumo interno, ante os 20,7% calculados no segundo trimestre. Esse é o maior valor registrado desde 2003, quando a entidade começou a calcular o coeficiente de importação trimestral, mas analistas da federação acreditam que desde a década de 1990 os importados não obtêm uma participação tão expressiva.
As exportações brasileiras no período também aumentaram, atingindo um resultado (19,2%) próximo aos registrados nos dois últimos trimestres de 2008 (antes da última crise econômica mundial, no fim de 2008), em torno de 20%. Apesar disso, a diferença entre a participação dos produtos importados e as exportações se ampliou.
Desde o terceiro trimestre de 2009, quando o coeficiente de importações e o de exportações calculado pela Fiesp era praticamente o mesmo (respectivamente 18,1% e 18,2%), o consumo de produtos estrangeiros aumentou 4,6 pontos percentuais. Já as exportações, após diminuírem nos últimos três meses de 2009 e praticamente estagnarem durante o primeiro semestre de 2010, fecharam o último período com uma alta de apenas 1 ponto percentual. Ou seja, entre julho de 2009 e o fim de setembro deste ano, a participação dos importados cresceu mais de quatro vezes acima das exportações brasileiras.
Segundo o diretor titular do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Fiesp, Roberto Giannetti da Fonseca, a tendência é que o volume de importados continue aumentando enquanto a atual taxa de câmbio for mantida e o real permanecer valorizado ante o dólar. Essa situação cambial, segundo o economista, também faz com que os empresários brasileiros prefiram importar bens e produtos do que fabricá-los aqui, causando um desequilíbrio nas contas internas e levando ao fechamento de postos de trabalho devido à falta de investimento na produção.
"Não podemos aceitar que o país assista passivamente ao declínio das nossas exportações de produtos manufaturados", disse Giannetti, para quem o dólar a R$ 2 seria um bom valor de equilíbrio. Ele também destacou que, hoje, a lista de produtos exportados pelo Brasil se constitui basicamente de commodities, bens primários como minérios e grãos de baixo valor agregado.
No terceiro trimestre de 2010, os setores exportadores com melhor desempenho foram os de alimentos e bebidas e de automóveis, caminhões e ônibus. Já o aumento das importações, muito mais generalizado, foi motivado principalmente pelo setor de máquinas e equipamentos industriais e comerciais, mas também no de produtos químicos, refino de petróleo e automóveis, caminhões e ônibus.
Para demonstrar o fenômeno que classifica como a "primarização da pauta exportadora", o economista aponta para o fato de que, dos dez produtos brasileiros mais vendidos no exterior entre janeiro e setembro deste ano, apenas um (automóveis de passageiros) é manufaturado, ao passo que, no mesmo período de 2006, a mesma lista continha quatro manufaturados contra seis produtos primários. Além do mais, Giannetti também critica a concentração das exportações em poucos produtos primários, já que, atualmente, apenas quatro itens (minério de ferro; óleo bruto de petróleo; soja e açúcar de cana) respondem por um terço das vendas internacionais. Em 2006 era preciso somar todos os dez itens mais vendidos para chegar a um terço das exportações brasileiras.
Para Giannetti, os resultados divulgados hoje (18), em São Paulo (SP), atestam o que a Fiesp vem alertando há tempos: está em curso um processo de desindustrialização e o governo, segundo ele, vem adotando medidas inócuas, com base no argumento de que a balança comercial é avitária, o que, de acordo com o economista, só tem sido possível graças à exportação das commodities, sobretudo para a China. Além disso, Giannetti também afirma que, com a queda das exportações, a produção industrial brasileira tem crescido graças ao aumento da renda nacional e do crédito, fatores que, segundo ele, não irá se sustentar.
"Podemos estar batendo às portas de uma recessão já em 2012", diz o economista. "Temos que tomar uma vacina tríplice, mexendo no câmbio, devolvendo todos os créditos tributários nas mãos de exportadores e desonerando os investimentos em logística, além de melhorar a gestão da política de comércio exterior", afirmou.

Qual a politica "menos pior" para o Brasil? - minha modesta opiniao...

Estes dois artigos publicados no mesmo site Ordem Livre precedem o que foi postado imediatamente abaixo, ou seja, antes deste, mas a ordem dos fatores não altera muito o conteúdo do que tenho a dizer, embora haja uma sequência em minha argumentação:

Confesso que sou suspeito para me pronunciar a respeito, simplesmente por ser diplomata, mas já escrevi um texto – na verdade um prefácio a um dos meus livros – dizendo “como e por que sou e não sou diplomata”, assim que peço a indulgência dos leitores para a exposição subjetiva que se segue. Estou também cingido pela lei do Serviço Exterior (ops, esqueci o número), que limita a capacidade de um servidor da ativa pronunciar-se publicamente sobre a diplomacia atual e corrente, sem autorização superior.
 
A resposta a uma pergunta desse tipo depende, obviamente, da concepção geral de sociedade da qual está impregnado o respondedor. Keynes dizia que sempre somos prisioneiros de algum economista morto, o que não parece ser o meu caso, já que não exerço a disciplina profissionalmente e posso, assim, ostentar uma aparente independência em relação a escolas e tendências econômicas. Não me classifico como liberal em economia, apenas como racionalista, seja lá o que isso queira dizer.
 

Aprendendo com o fracasso: meu artigo mais recente publicado

Já saiu alguns dias atrás, mas só vim a saber hoje. No mesmo site do Ordem Livre, existem outros artigos meus dessa série "volta ao mundo em 25 ensaios" (falta fazer o último, justamente...).

Normalmente, pessoas e países procuram se guiar pelos bons exemplos, pelas experiências de sucesso, pelos modelos que produziram mais crescimento, maior bem-estar e trouxeram um incremento de "felicidade" às pessoas (seja lá como medir essa felicidade). Não existem, ou pelo menos não se proclamam, modelos de fracasso. A história econômica registra apenas os casos de sucesso: os milagres japonês e alemão do pós-guerra, o milagre brasileiro do início dos anos 1970, a fantástica ascensão (ainda em curso) da China, precedida por vários exemplos de crescimento rápido entre os "tigres asiáticos". Ninguém fala, et pour cause, de modelo africano ou latino-americano de desenvolvimento: poderia parecer gozação...
Pois bem, vou inverter o exercício e falar, justamente, dos casos de fracasso, dos exemplos de insucesso total e completo, dos modelos patéticos, que servem, uma vez não é costume, para demonstrar exatamente o que não se deve fazer em matéria de políticas econômicas, para não acabar como essas experiências mal sucedidas ao longo da história. Isto por uma razão muito simples: como se diz em linguagem popular, o sucesso tem muitos pais, o fracasso não tem nenhuma mãe. Assim sendo, creio, sinceramente, ser muito melhor aprender com o fracasso do que com o sucesso, pois este pode ter múltiplas causas, por vezes difíceis de serem detectadas, ao passo que aquele tem a virtude de nos indicar, precisamente, aquilo que não se deve fazer, sob risco de entrar em decadência ou suportar fracassos, como certos países por aí...
Os economistas Robert Barro e Xavier Sala-i-Martin, na introdução ao livro Economic Growth (2a edição; Cambridge, Mass.: The MIT Press, 2004), sublinham a importância do crescimento para o desempenho de longo prazo das economias e, portanto, para a prosperidade e o bem-estar das pessoas. O PIB per capita real nos EUA cresceu dez vezes, em dólares atualizados, entre 1870 e 2000, passando de US$ 3.340 a US$ 33.300, o que corresponde a um crescimento médio anual de apenas 1,8%; nada de excepcional, como se vê. Para avaliar como as coisas poderiam ter sido diferentes, eles calculam, retrospectivamente, como teria sido esse desempenho se os EUA tivessem crescido apenas 1% a mais, ou seja, 2,8% ao ano, cumulativamente: pois bem, o cidadão americano teria chegado ao ano 2000 com a fantástica renda (média, recorde-se, pois o valor já pode ser encontrado em Manhattan) de US$ 127.000, 38 vezes o valor de 1870 e 3,8 vezes maior do que o valor real do ano 2000.
Mas suponhamos o exercício inverso, ou seja, que os EUA tivessem crescido apenas 0,8% ao ano, algo tampouco excepcional, pois correspondeu ao crescimento do PIB per capita da Índia de 1900 a 1987 (0,64% ao ano), do Paquistão no mesmo período (0,88% ao ano) e das Filipinas (0,86%). Nesse caso, o cidadão americano teria chegado ao ano 2000 com uma renda disponível de apenas US$ 9.450, apenas 2,8 vezes maior do que o valor de 1870 e 28% da renda efetivamente realizada em 2000, o que aproximaria o americano do seu vizinho mexicano. Nada de muito glorioso, não é mesmo? E qual a diferença disso? Bem, digamos que os americanos não seriam muito numerosos a passar suas férias em Acapulco, com o que os mexicanos seriam provavelmente ainda mais pobres, comparativamente, do que eles são efetivamente, posto que uma parte da renda do México deriva de suas relações com a economia do poderoso vizinho ao norte.
Esse simples exercício de simulação nos demonstra como o crescimento é importante para fins de bem-estar e disponibilidade de bens e serviços, que por vezes podem fazer a diferença entre a vida e a morte, simplesmente (pensemos em serviços hospitalares e maternidades eficientes, provavelmente o fator explicativo para as diferentes taxas de mortalidade nos EUA e no México). Mas eu vou tratar de outro caso, ainda mais dramático, e muito perto de nós: a Argentina. Sorry, caros vizinhos, mas não pretendo chorar por vocês, apenas usar o seu caso como exemplo do que não se deve fazer para não conhecer uma decadência similar, ou pior.
Cem anos atrás, os EUA já eram o país mais rico do mundo, exibindo uma renda per capita de US$ 5.017, segundo dados atualizados (dólares de 1990) pelo economista Angus Maddison (ver, em seu site, Statistics on World Population, GDP and Per Capita GDP, 1-2006 AD). A Argentina dispunha, então, de uma renda per capita de US$ 3.699, ou seja, 73,7% do valor americano, ao passo que o Brasil era um pobretão, com apenas US$ 776 de renda, ou seja, 15% do PIB per capita americano e pouco mais de 20% do argentino.
Pois bem, retomando os mesmos dados para o ano de 2006, como registrados por Maddison, constatamos que a Argentina, com US$ 9.679, já não fazia mais do que 31,7% do PIB per capital americano (estimado em US$ 31.049). O Brasil continuou relativamente pobre, mas sua renda individual já tinha saltado para US$ 5.835, correspondendo a 18,8% da renda americana (um progresso modesto, reconheçamos), mas já tinha avançado para 60,3% da renda argentina. Neste caso, não fomos nós que progredimos fantasticamente em relação aos EUA; foi a Argentina que recuou espetacularmente na escala da riqueza global, de fato uma das mais gloriosas decadências de que se tem notícia em toda a história econômica mundial.
Estamos, agora, no ponto onde eu queria chegar: o exemplo do fracasso, o modelo do insucesso, o itinerário mais espetacularmente desastroso de que se ouviu falar nas comparações de desempenho relativo para países capitalistas. A Argentina tem direito a um Guiness, a um Prêmio Nobel (talvez Ignóbil) da decadência econômica, ainda mais "brilhante", se ouso dizer, do que a trajetória da Grã-Bretanha, que também foi o outro exemplo de insucesso completo nos primeiros oitenta anos do século XX. Como é que se consegue chegar a esse estado falimentar?
As receitas são simples, e devem ser aprendidas por todo estadista que desejar evitar a decadência e, ao contrário, promover o crescimento e a prosperidade. Comece por destruir a legalidade de um estado, o que pode ser facilmente obtido por meio de golpes, revoluções, quarteladas, ditaduras personalistas, enfim, por todos esses casos de caudilhismo pretoriano a que nos acostumamos tão bem na América Latina; pois foi o que a Argentina conheceu a partir de 1930, e com muito maior intensidade a partir da Segunda Guerra Mundial. Continue pela aplicação de uma série de medidas econômicas que, no conjunto, contribuem para retirar as fontes de crescimento e, inversamente, produzem desinvestimento, desincentivo ao espírito empresarial, fuga de capitais, inflação, desemprego e perda completa de confiança na moeda nacional. Também é relativamente fácil: implante controles de preços, taxe pesadamente a produção, redistribua os “lucros” – e se possível o controle das empresas – aos trabalhadores, passe a gestão de órgãos públicos a sindicalistas mafiosos, penalize as exportações pelo controle cambial, os investimentos por juros elevados (derivados da dívida pública, sublinhe-se), emita moeda para cobrir as despesas do governo, enfim, promova a nacionalização e a estatização de "setores estratégicos" e depois proteja-os da concorrência estrangeira por tarifas altas e outras medidas protecionistas. A Argentina também praticou tudo isso com grande desenvoltura; aliás, ainda o faz...
Pronto: a receita está dada. Mas parece que os argentinos não aprenderam nada dos erros do passado, pois, a cada ano, continuam fazendo tudo sempre igual. Querem outro exemplo, atual e corrente? Basta olhar a Venezuela. Gracias pelas aulas de economia, professor Chávez: sabemos, agora, exatamente o que não se deve fazer, para não afundar o país...
As digressões acima respondem exatamente à pergunta deste ensaio: o que podemos aprender com a experiência de outros países, ainda que pelo lado negativo, o que pode ser relativamente frustrante. Ou seja: sabemos o que temos de evitar – e Chávez está ai mesmo para nos demonstrar, praticamente todos os dias – e o que existe de receitas para o fracasso. Elas nada nos dizem, contudo, sobre o que devemos fazer para seguir as experiências de sucesso, aquelas que produziram crescimento e bem estar em certo número de países, o que também existe.
Sinto decepcionar os leitores, mas não existem – pelo menos não acredito que existam – “modelos de sucesso”: todo e qualquer “modelo” nada mais é do que uma consolidação a posteriori de percepções sobre as supostas razões do sucesso de um empreendimento, expressa a um nível de generalidade que pretende abarcar toda uma experiência complexa em poucas fórmulas aparentemente inovadoras. Cada país deve criar sua própria fórmula, com base em suas vantagens comparativas – sim, elas existem, por mais que alguns identifiquem nelas uma predestinação permanente e um congelamento das possibilidades produtivas, o que é absolutamente falso – e certa engenhosidade de que são capazes todos os seres livres e sujeitos à competição, em condições “normais” de mercado (as aspas significam que quando os estados passam a interferir, os mercados deixar de atuar “normalmente”).
Sem pretender ser repetitivo, volto aqui às minhas simples regras de boa governança econômica que podem significar a diferença entre o sucesso e o fracasso num processo de crescimento econômico sustentado, base indispensável a qualquer evolução gradual para patamares mais avançados de desenvolvimento social:
1) macroeconomia estável, acompanhando a dinâmica dos mercados;
2) microeconomia competitiva, com total liberdade de entrada nos mercados;
3) instituições públicas capazes de reduzir os custos de transação;
4) alta qualidade de recursos humanos, para maiores ganhos de produtividade;
5) abertura ao comércio internacional e aos investimentos estrangeiros.
Não chega a ser, exatamente, um modelo, sendo mais bem um simples manual sobre o que fazer, num plano altamente genérico e não totalmente operacional. Mas não deixa de ser, também, um conjunto de lembretes sobre o que não fazer para não incorrer em fracassos continuados.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Nossa diplomacia em acao: defendendo a soberania dos povos e das nacoes...

Asi no más: nada é mais importante do que a soberania de um país.
Com o que concordariam gregos e goianos, ou melhor, coreanos do norte e do sul?
Não é original?
Paulo Roberto de Almeida

Lula condena ataques da Coreia do Norte à Coreia do Sul

Eu não sei quem atacou primeiro, mas, de qualquer forma, eu condeno, diz presidente

estadão.com.br, 23 de novembro de 2010 | 16h 57
 
Lula defende princípio da soberania
SÃO PAULO -O presidente Luiz Inácio Lula da Silva condenou nesta terça-feira o ataque da Coreia do Norte contra a ilha sul-coreana de Yeonpyeong e lembrou que, a princípio, o Brasil se opõe a qualquer tipo de agressão entre países.

"Por enquanto condenamos qualquer tentativa de ataque da Coreia do Norte à Coreia do Sul", disse Lula. "Eu não sei quem atacou primeiro, mas, de qualquer forma, qualquer ataque eu condeno. Tem de respeitar a soberania do País".
O presidente afirmou ainda que precisava se inteirar do assunto com o Itamaraty sobre o contexto do ataque. " A Coreia do Norte está dizendo que foi atacada primeiro, que foi provocada primeiro. Vou me informar melhor", prometeu o presidente.
Lula reiterou também a posição brasileira de defesa da integridade territorial de cada país. "Nós temos de respeitar a soberania de cada país e não permitiremos, em hipótese alguma, qualquer tentativa de transgredir a soberania de outro país".
Leia ainda:linkEUA e UE condenam ataque norte-coreano
linkJapão fica em alerta devido a conflito entre Coreias
linkPyongyang acusa Seul de disparar primeiro
Com Agência Estado e Efe
Veja também: Radar Global: O armistício de Pan-Mun-Jonespecial Infográfico: As origens do impasse na península coreanalista Entenda a crise entre os dois países 

Pausa para uma piada...avant la lettre...

Bem, para os que não sabem Francês, apenas informo que a piada antecipa algo que ainda vai acontecer.
Vejam esta nota que retirei da coluna diária do jornalista Carlos Brickmann (23.11.2010):


É aqui! É aqui!

O Brasil será a sede da 15ª Conferência Internacional Contra a Corrupção, que deve ocorrer em 2012. Costumam comparecer às reuniões cerca de 1.500 pessoas, entre elas chefes de Estado e de Governo, representando 130 países. A escolha do Brasil (pela primeira vez na História desse pais) é a melhor possível: onde mais colher exemplos abundantes e próximos do que deve ser combatido?


Não é uma gracinha?
O país no qual nenhum corrupto vai para a cadeia, onde alguns são até celebrados como companheiros eventualmente aloprados, ou equivocados, onde o "malandro federal" da canção já virou malandro oficial, com direito a carro e mordominas, um país desses abriga uma conferência contra o flagelo que ela pretende combater?
Só pode ser piada, involuntária, claro...
Paulo Roberto de Almeida

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Brasil: consequencias politicas da reducao da desigualdade - Oxford University

Um importante encontro para debate entre especialistas, numa área em que crenças políticas, simpatias partidárias e honestidade científica se juntam para complicar justamente a dimensão política desse fenômeno real no Brasil.
Suas consequências políticas são mais difíceis de serem avaliadas, pois elas penetram no subconsciente nacional, ou melhor, na psicologia das massas, como se diria antigamente.

Workshop:  “Political Consequences of Declining Inequality in Brazil”
University of Oxford, 3 December
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co-sponsored by the Brazilian Studies Programme (www.brazil.ox.ac.uk) and the Oxford Centre for the Study of Inequality and Democracy (ocsid.politics.ox.ac.uk)

Friday, 3 December 2010
Tawney Room, Rewley House, 1 Wellington Square with the generous support of Santander Universities (www.santander.com)

Although Brazil remains a world leader in inequality, the Gini coefficient of income inequality has been falling perceptibly since the early 1990s. The past 5-7 years have seen a notable reduction in poverty rates, with some analysts heralding the emergence of a “new middle class.” Factors contributing to this trend include renewed economic growth, improved education, sustained increases in the minimum wage, and innovative social policies introduced by the past two governments. In particular, the conditional cash transfer programme known as Bolsa Família has generated intense interest both in Brazil and abroad. While economists, sociologists, and demographers have been swift to document the decline in poverty and inequality in Brazil, few have explored the political implications of these trends.
Given that the institutions and practices of Brazilian politics have long been causally linked to the presence of deep inequalities in the country, this day-long workshop aims to analyse both the macropolitical and micropolitical consequences of recent social changes. The key questions are whether (1) government social policy and (2) the declining economic vulnerability of the poor make any difference for the politics of democracy in Brazil.
The workshop will feature nine papers from social scientists who will appraise the implications of social change for democratic development. Topics include electoral realignments, the possible
erosion of oligarchy, new approaches to clientelism and “exchange politics,” political implications of rising labor formality and improved educational/literacy outputs, the impact on governance of rising living standards in peripheral communities, the effects of improving social indicators on longstanding ideological divisions between left and right, the possible accrual of a long-term political legacy for Lula’s PT, and the extent to which subnational politicians (governors and mayors) engage in credit-
claiming. The majority of papers focus centrally on Bolsa Família, allowing us to advance the emerging theoretical debates on the implications of conditional cash transfers for democracy
and development. We will conclude the day with a keynote presentation by Dr Marcelo Neri of the Centre for Social Policies, Getúlio Vargas Foundation, who will lay out the empirical panorama of the recent reduction in Brazilian inequality.

9:05-10:45    Panel 1: Patterns of Voting and Public Opinion
Chair: Andrew Hurrell (University of Oxford)
“Realignment in Brazil”
André Singer (University of São Paulo)
“Poorest Voters vs. Poorest Places: Persistent Patterns and Recent Changes in Brazilian Electoral Patterns”
Cesar Zucco Jr. (Princeton University)
“Electoral Gains and Losses from Conditional Cash Transfer Programs: How Bolsa Família Led to the Polarization of the Brazilian Electorate”
Diego Sanches Correa (University of Illinois)
Discussant: Anthony W. Pereira (King’s College, London)

11:00-12:30   Panel 2: New Perspectives on Clientelism and Exchange Politics
Chair: Nancy Bermeo (University of Oxford)
“Creating Citizens or Clients: The Impact of Bolsa Família in Brazil”
Wendy Hunter (University of Texas at Austin)
“Their Separate Ways: Leftist Mobilization and Clientelist Continuity in Brazilian Subnational Politics”
Alfred P. Montero (Carleton College)
“Agents of Citizenship or Agents of Clientelism? The Cultural Dilemma of Bolsa Família’s State Monitors.”
Presented by Luciana Veiga (Universidade Federal do Paraná) on behalf of co-authors Simone Bohn (York University), Salete da Dalt (Universidade Federal Fluminense), André Augusto Pereira Brandão (Universidade Federal Fluminense), César Augusto da Silva (Federal University of Vale do São Francisco), and Victor Hugo de Carvalho Gouvêa (Universidade Federal Fluminense)
Discussant: David Doyle (Dublin City University)

14:00-15:30   Panel 3: Framing the Public Debate on Redistribution
Chair: Alessandra Aldé (Universidade do Estado do Rio de Janeiro)
“Inequality and Support for Redistribution”
Fabiana Machado (Inter-American Development Bank)
“The Debate on the Reduction of Inequality in Brazil: An Analysis of the 2010 Presidential Campaign”
Marcia Ribeiro Dias (Pontifícia Universidade Católica, Rio Grande do Sul)
“Coalitions for Equity-Enhancing Reform in Brazil”
Diego Sánchez-Ancochea and Timothy J. Power (University of Oxford)
Discussant: Camille Goirand (University of Lille)

15:45-17:30   Panel 4: Keynote Address
Chair: Antonio David Cattani (Universidade Federal do Rio Grande do Sul)
“The Decade of Inequality Reduction in Brazil: Causes, Consequences and Perspectives”
Marcelo Neri (Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro)
Discussant: Edmund Amann (University of Manchester)

17:30-18:00   Closing Remarks and Adjournment

FOR MORE INFO and to register, please contact: david.robinson@lac.ox.ac.uk prior to 30 November 2010

Um amigo virtual, exageradamente elogioso

Não sou muito de elogios: de dar ou receber...
Em todo caso, tenho de agradecer um jovem amigo virtual, colega de blogosfera, que me enaltece ao ponto do exagero, até provocando certo constrangimento na divulgação, mas não poderia deixar de fazê-lo, como prova de reconhecimento e de agradecimento:
Paulo Roberto de Almeida 

Olá prof. Paulo Roberto,
Gostaria de desejar minhas mais sinceras felicitações nesta sua data natalícia. Muita paz em sua vida e na vida das pessoas ao seu redor.
Fiz uma pequena homenagem para o senhor no blog em que faço parte, confira:
http://futilizzando.blogspot.com/2010/11/felicitacoes-paulo-roberto-de-almeida-o.html
 Abraços,
 Jonathan Yuri


Ao Jonathan, meu abraço.

Ser um pais pobre: gastança, irresponsabilidade e inconsciencia...

O mistério das promessas

Rolf Kuntz
O Estado de S.Paulo, 17 de novembro de 2010
 
A presidente eleita Dilma Rousseff continua devendo seu programa para o primeiro ano de governo e, de modo especial, sua estratégia para enfrentar as questões mais prementes, como a deterioração das contas externas e das finanças públicas. As poucas informações disponíveis até agora – e provenientes, na maior parte, de pessoal ligado à transição – simplesmente não combinam. Há promessas de aumento de gastos e, ao mesmo tempo, de redução de tributos. Neste momento, o desafio mais visível e mais discutido pelo setor privado é o das contas externas. O déficit em transações correntes deverá chegar a US$ 68 bilhões no próximo ano, segundo a nova estimativa de consultores privados e analistas do setor financeiro, divulgada ontem pelo Banco Central. A previsão de um déficit de US$ 50 bilhões neste ano mantém-se há um mês.
Há quatro semanas a projeção para 2011 indicava um buraco de US$ 62 bilhões nas transações correntes. Nesse intervalo, o valor estimado para o superávit comercial no próximo ano diminuiu de US$ 9 bilhões para US$ 8 bilhões, metade do esperado para 2010.
A previsão do investimento direto estrangeiro em 2011 passou de US$ 38 bilhões para US$ 37 bilhões. Se as bolas de cristal estiverem bem ajustadas, será preciso arranjar US$ 31 bilhões de fontes menos seguras, como empréstimos e aplicações nos mercados de papéis. Não deverá faltar dinheiro de fora para financiar as contas e, além disso, o País dispõe de reservas elevadas (US$ 286 bilhões em 11 de novembro). Mas a qualidade do financiamento será inferior. A presidente eleita já comentou as condições adversas no mercado internacional, mas não disse como pretende cuidar do problema nem se o assunto estará entre suas prioridades.
Em Seul, onde assistiu à reunião de cúpula do Grupo dos 20 (G-20), levada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ela falou sobre sua preocupação com o desajuste cambial, prometeu estudar as medidas possíveis e limitou-se a isso. Como já anunciou a intenção de manter o câmbio flutuante, está excluída, por enquanto, a hipótese de uma intervenção direta na cotação do real.
No governo, assim como no setor privado, há opiniões diferentes sobre como cuidar do problema externo. Há quem dê prioridade a medidas defensivas – mais barreiras contra o ingresso de produtos estrangeiros. Há quem recomende mudanças mais amplas e mais ambiciosas, para aumentar o poder de competição do produtor nacional em todos os mercados. Uma estratégia meramente defensiva só poderá fracassar, porque não impedirá os concorrentes – em primeiro lugar os chineses – de continuar tomando espaço dos brasileiros até na América do Sul.
O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, mencionou um possível corte de encargos trabalhistas, mais altos no Brasil do que na maioria dos países concorrentes. Seria um dos passos para reduzir o excesso de custos – tributários, financeiros, burocráticos e logísticos – e eliminar parte importante das desvantagens competitivas. Mas já se anuncia também a elevação real de várias despesas. Exemplos: aumento da Bolsa-Família além da inflação e mais uma correção generosa do salário mínimo, com repercussão em todos os níveis de aposentadorias. Pode-se falar a favor desses benefícios, por seus efeitos sociais, mas, nesse caso, é preciso saber de onde sairá o dinheiro e, mais que isso, onde haverá redução de gastos.
As contas estão sobrecarregadas com as transferências para o BNDES e a capitalização da Petrobrás, os gastos aumentam e a piora do quadro fiscal é evidente, apesar da maquiagem. Mas o Tesouro, segundo se informa, continuará bancando o financiamento a empresas e endividando-se para isso. Além do mais, será preciso cuidar do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), com projetos caros, alguns muito importantes.
Ainda não se sabe quanto a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos vão custar para o contribuinte, mas a conta, pode-se apostar, será pesada. Como as obras estão atrasadas, cresce o risco de soluções de emergência, na última hora, com custos maiores para o governo. Quanto ao trem-bala, o Tesouro está autorizado, por medida provisória, a gastar algumas dezenas de bilhões de reais para garantir os financiamentos concedidos pelo BNDES e compensar erros de projeções. A presidente eleita já se declarou favorável a esse projeto. Falta explicar como conciliará as promessas de aumento de gastos, de redução da carga de impostos e até de eliminação do déficit nominal. Enquanto não vier a explicação, todas as desconfianças e temores serão justificados.

Ser um pais rico: trabalho, recursos e um pouco de sorte...

Os EUA são um país reconhecidamente rico, unicamente com base numa combinação original de fatores que é difícil encontrar em outras partes. Mas não precisa ser assim, pois outros países poderiam, também, combinar outros fatores de riqueza e um pouco de sorte.
Atenção: não coloco achar petróleo entre os fatores de riqueza. Em certo sentido, pode ser um caminho para a pobreza, ou pelo menos para o rentismo corruptor e construtor de desigualdades...
Paulo Roberto de Almeida 

Economics

Free exchange

Growth

Why is America so rich?
The Economist, Nov 9th 2010, 13:50 
by R.A. | LONDON
ECONOMIC gloom and doom aside, America remains the world's richest large country. It's generally estimated to have a per capita GDP level around $45,000, while the richest European nations manage only a $40,000 or so per capita GDP (setting aside low population, oil-rich states like Norway). Wealth underlies America's sense of itself as a special country, and it's also cited as evidence that America is better than other economies on a range of variables, from economic freedom to optimism to business savvy to work ethic.
But why exactly is America so rich? Karl Smith ventures an explanation:
I am going to go pretty conventional on this one and say a combination of three big factors
  1. The Common Law
  2. Massive Immigration
  3. The Great Scientific Exodus during WWII
You’ll notice that four of the top five countries in the Human Development Index have the Common Law and the top, Norway, is a awash in oil. Without the petro-kronors they probably wouldn’t be so hot.
You’ll also notice that 3 of the top 4, again with Norway the odd man out, are immigrant nations. The founder effect here should be clear.
The bonus from the great exodus is definitely waning. Most of our hey-day German and Jewish scientists are dying off, but its still given us a boost that lingers to this day. There is no fundamental reason why the US should be the center of the scientific world but for a time it was the only place in the world safe for many scientists.
It's a difficult question to tackle because there's so very much to it. America jumped to a huge productivity lead early last century by developing a resource- and capital-intense, high-throughput style of manufacturing producing mass market goods. The fractious, class-riven European continent struggled to copy this technology, and while adoption of these methods eventually led to a period of rapid catch-up growth, the process of catch-up was never quite completed. And so that's one gap to explore.
There's also the question of what exactly one is comparing. What if we take similar European and American metropolitan areas and adjust for human capital and hours worked? On that basis, the difference between America and northern Europe looks relatively small. One might then focus on the ways in which America's more integrated domestic market leads to a lower level of within-continent inequality, even though national inequality levels in Europe compare favourably with America's.
The size of the market may be more important than we imagine. As Mr Smith notes, four of the top five HDI countries share the Common Law. They also speak English. In a world in which national and cultural barriers still bite, America's wealth could be chalked up to the fact that it's a uniquely large and uniform nation. Common rules, culture, language, and so on facilitate high levels of trade and mobility. National and cultural barriers within Europe, by contrast, work to limit the extent to which the economic potential of the continent can be reached.
Mr Smith also gets at something important in discussing immigration and talent. The economic geography of the world is lumpy, and talent likes to clump together into centres of innovation. Through fortune and foresight, America managed to develop world-leading centres of talent in places like Silicon Valley, Boston, and New York. Relatively open immigration rules and the promise of a safe harbour for war refugees, including persecuted Jews, helped build these knowledge centres. When one combines that innovative capacity with a system that makes it relatively easy to develop ideas and relatively lucrative to exploit them economically, the potential is there for rapid and sustained growth.
America does seem to be special in important ways, but it's not always clear what those ways are. A liberal economic order and geographically mobile population are important, but so is the level of education, the promise of social mobility, and the openness of America's borders. It's worth keeping all of that in mind as the country's leaders think about the ways economic policy should change in the wake of the Great Recession.

domingo, 21 de novembro de 2010

O Brasil a caminho do populismo (talvez ja esteja...)

O artigo abaixo é de um escritor consumado, que também é médico e diplomata, o que demonstra que a carreira continua a atrair as melhores vocacões e formações do Brasil, numa diversidade muito saudável para a instituição. Assim, constituímos uma burocracia menos cinzenta e mais diversificada e colorida.
Paulo Roberto de Almeida 

TENDÊNCIAS/DEBATES
Sem olhos em casa
CLÁUDIO GUIMARÃES DOS SANTOS
Folha de S.Paulo, 5.11.2010

Governantes populistas, além de lançarem mão de um farto assistencialismo, se esmeram em dificultar o acesso dos cidadãos à informação variada

Segundo Karl Mannheim, uma sociedade moderna dificilmente consegue escolher bem o seu futuro sem a presença de intelectuais independentes. Somente eles, com seu saudável poder corrosivo, são capazes de garantir a existência de uma opinião pública crítica.
Para fazê-lo, contudo, os intelectuais precisam defender o seu direito de pensar como melhor lhes pareça e recusar a adesão canina a esta ou àquela ideologia, a este ou àquele partido.
A sua falta de identidade coletiva - de "espírito de manada" - é o que lhes proporciona a autonomia imprescindível à realização de sua missão: examinar, sem descanso, as soluções conflitantes de um problema antes de rejeitá-las ou de assimilá-las.
Todavia, por rever constantemente as suas opiniões, a intelectualidade "não engajada" é vista com reservas pelos adeptos do ideal gramsciano de "intelectual orgânico", paladino de "sua classe". Estes não suportam o inquietante inconformismo das mentes livres, as quais se encontram, por isso mesmo, em grande perigo nos regimes populistas.
Tal fato, infelizmente, nem sempre é percebido com clareza, já que, ao contrário dos ditadores declarados - que eliminam os intelectuais indesejáveis sem nenhum pudor -, os governantes populistas preferem atuar de modo mais discreto.
Buscam, inicialmente, cooptar a intelectualidade "rebelde", minando-lhe a independência por meio de favores. Se não o conseguem, procuram desacreditá-la perante a população, o que se dá não tanto pelo confronto direto, mas pelo ataque aos meios de comunicação pelos quais se expressa, que são acusados de serem "contra o governo", ou, ainda pior, de serem "contra o povo". A artimanha, porém, só funciona quando o aparato crítico dos indivíduos aos quais se dirige apresenta um nível rudimentar, resultado das graves deficiências educacionais de que padece a maioria da população nesses regimes: pessoas esclarecidas não se deixam engabelar por pregações descabidas.
É por isso que os governantes populistas, além de lançarem mão de farto assistencialismo e de retórica demagógica pela qual se apresentam como "pais do povo" e "salvadores da pátria", tanto se esmeram em dificultar o acesso dos cidadãos à informação diversificada. E o fazem seja pela restrição "bem-intencionada" à liberdade de imprensa, seja pela utilização de instrumentos próprios, como as redes de TV "públicas", que funcionam, quase sempre, como veículos da propaganda oficial.
O populismo deforma os cidadãos como nenhum regime autoritário é capaz de fazê-lo. Ele os perverte desde dentro, destruindo a sua resistência crítica. Ele os faz crer que são suas as razões que o regime neles implanta sutilmente. Ele os convence de que a loucura que os acomete constitui uma maneira mais lúcida de ver as coisas.
As vítimas do populismo, ofuscadas por essa luz malsã não só não lamentam como até comem or am a destruição do pensamento independente. Ao fazê-lo, porém, colocam-se, ingenuamente, ainda mais à mercê dos hábeis governantes, dóceis e desarmadas, sem olhos em casa. 

CLÁUDIO L. N. GUIMARÃES DOS SANTOS, 50, escritor, médico e diplomata, é mestre em artes pela ECA-USP e doutor em linguística pela Universidade de Toulouse-Le Mirail (França). Blog: http://perplexidadesereflexoes.blogspot.com/

O Brasil a caminho da decadencia argentina...

Analogias históricas são sempre equivocadas, e muitas vezes anacrônicas, pois é óbvio que situações derivadas de uma história única e original não são suscetíveis de se desenvolverem em outros países e sociedades no mesmo estilo ou sob os mesmos moldes.
Mas o que se pretende destacar aqui são processos similares, funcionalmente falando, não semelhantes ou devendo se desenvolver da mesma forma. Pode-se, assim, comparar o crescimento dos aparatos sindicais na Argentina de Perón e no Brasil de Lula. Não se trata de um sindicalismo de base, mas de cúpula.
O fato é que a decadência de uma nação tem muitos componentes, mas uma constante, ou um processo muito frequente, é a apropriação dos canais "redistributivos" do Estado por corporações não produtivas e rentistas que de fato tomam para si a riqueza coletada da sociedade. São sanguessugas, que falam em nome da sociedade, como os peronistas argentinos, mas atuam em seu benefício exclusivo.
Eis aí um caminho rápido para a decadência. Ela ainda não veio, pelo menos não completamente, mas já se observam traços disso nos que nos representam e até nos "lideram". Por enquanto só pagamos a festa. Depois vamos ter de administrar os prejuízos também.
Paulo Roberto de Almeida

República sindical


Ruy Fabiano
Blog do Noblat, 20/11/2010

Na reta final da atual legislatura, e sem que o tema tenha sido debatido ou sequer levado ao conhecimento da sociedade brasileira, a Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados aprovou proposta que concede às centrais sindicais dez minutos semanais de transmissão gratuita no rádio e TV.
O texto original, de autoria da deputada Manuela D’ávila (PCdoB-RS), era bem mais radical: previa nada menos que dez minutos diários de programação sindical em rádio e TV, sete vezes mais que o texto final aprovado.
Havia ainda proposta similar, do deputado Vicentinho (PT-SP), que estabelecia que a transmissão seria entre as 20 horas e 22 horas – horário nobre - das terças-feiras. Assegurava também programa anual de dois minutos em cadeia nacional para cada central sindical.
Prevaleceu o substitutivo do deputado Roberto Santiago (PV-SP), que estabelece que as transmissões serão às terças-feiras, entre as 6 horas e as 22 horas, em bloco ou em inserções de 30 segundos a um minuto, no intervalo da programação normal das emissoras.
Se aprovada, a regra será incluída no Código Brasileiro de Telecomunicacões, que fixa as obrigações das radiodifusoras - e, em troca, concede-lhes compensação fiscal pela cessão do horário. Ou seja, a gratuidade dada aos sindicatos, sabe-se lá para quê, será paga pelo contribuinte, que não foi consultado a respeito.
O agravante é que a proposta tramita em caráter conclusivo no âmbito das comissões da Câmara. Ou seja, não vai a plenário. Será ainda analisada por duas outras comissões permanentes: a de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática e a de Constituição, Justiça e Cidadania. Considerando-se o poder do lobby sindical no Congresso, é improvável que seja rejeitada nessas instâncias.
Trata-se de passo decisivo para a consolidação do que se convencionou chamar de república sindical. Na gestão Lula, os sindicatos ganharam visibilidade e influência sem precedentes. Lideranças egressas do sindicalismo controlam os bilionários fundos de pensão. As centrais sindicais passaram a ter acesso ao imposto sindical, pago mesmo pelos que não se sindicalizaram. Não lhes é exigida também prestação de contas.
No âmbito do Estado, e em cargos estratégicos – inclusive no primeiro escalão -, figuram nomes forjados no sindicalismo. O resultado notório é a cooptação desse setor pelo Estado, situação que atende pelo nome de peleguismo e distorce os fundamentos da própria instituição sindical, suprimindo-lhe a autonomia e independência. A luta contra o peleguismo, introduzido no Brasil ao tempo da ditadura do Estado Novo de Getúlio Vargas, foi uma das bandeiras inaugurais do PT, que propugnava por um sindicalismo moderno, sem vínculos com o Estado.
No poder, Lula, porta-voz desse novo sindicalismo, tratou de torná-lo velho. E tem colhido bons resultados.
Basta ver o papel que as centrais sindicais desempenharam na recém-concluída campanha eleitoral, quando, violando a legislação – que proíbe que se associem a partidos e candidatos -, organizaram comícios e fizeram circular panfletos, jornais e revistas em prol da candidatura de Dilma Roussef. Tudo pago com o imposto sindical.
A conquista de horário gratuito na TV aberta, se confirmado, soma-se à recente aquisição da TV do Trabalhador, pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, filiado à CUT, que, por sua vez, é ligada ao PT.
O ministro da Comunicação Social, Franklin Martins, saudou o novo canal como “uma revolução”, fator decisivo para que a mídia convencional “perca o controle sobre as notícias levadas à opinião pública”. Ou inversamente para que as notícias levadas à opinião pública estejam sob controle, como postulam a Conferência de Comunicação do PT e o Programa Nacional de Direitos Humanos.
De uma forma ou de outra, a república sindical avança a passos largos. Ganha mais visibilidade e tribuna própria, ainda que esses atributos nada tenham a ver com a natureza de seu papel institucional. Passam a integrar na linha de frente o jogo do poder.

Ruy Fabiano é jornalista