A Petrobras é uma empresa de sucesso! Bem, quase todas as empresas de petróleo o são, pois se trata de um bem dito estratégico, pelo qual os governos se movimentam (por vezes arrogantemente) e os cidadãos acabam pagando qualquer preço (quase como no caso dos remédios).
Sendo uma empresa de sucesso, monopolista de fato, e sentada, por isso mesmo, num imenso lençol de petróleo que lhe é atribuído quase ilegalmente pelo governo, ela poderia se capitalizar diretamente no mercado acionário ou se financiar no mercado de capitais privado, pois seu rating é, supostamente, melhor do que o do Brasil.
Paradoxalmente, o governo está despejando um volume absurdo de recursos na companhia, via BNDES, que por sua vez se abastece diretamente (e vergonhosamente) no Tesouro, e que por isso mesmo viu aumentar a dívida interna total do Brasil em mais (pelo menos) 180 bilhões de reais (atenção: eu, você, todos nós, vamos pagar essa bolada, sob a forma de mais juros, e portanto mais impostos, ou então com mais inflação ou desvalorização da moeda no futuro).
Se isso já não bastasse, o governo vem agindo de forma criminosa, ao continuar a sustentar obras da companhia mesmo quando manchadas por suspeitas de irregularidades ou corrupção, num desprezo claro pela legalidade e normas de probidade administrativa.
A Petrobras, nesse sentido, parece um Império, dentro do Estado do Brasil, fazendo o que bem entende, sem prestar contas a ninguém. O seu grau de manipulação da informação é enorme, e ela é também capaz de "comprar" (o termo se aplica, lato et stricto sensi) apoios em diversos setores, inclusive no Congresso, que deveria ser o vigilante dos orçamentos públicos e da moralidade nacional (acho que é o contrário).
Pois bem, um dos posts mais acessados neste blog foi um que tratava dos honorários aparentemente exagerados dos "conselheiros" (as aspas são de rigor) da Petrobras, bombardeado com comentários extraordinariamente agressivos (provavelmente dos interessado em manter a falta de transparência da companhia).
Assim, decidi postar mais um artigo, de um economista conhecido, que trata do nosso maior, talvez único, dinossauro estatal.
Paulo Roberto de Almeida (17.02.2010)
PS. Provavelmente haverá menos comentários desta vez, pois poucos poderão constestar argumentos econômicos...
O custo político da Petrobrás
Rodrigo Constantino
Valor Econômico, 17.02.2010
Normalmente, uma empresa estatal apresenta um risco maior que outra privada para seus acionistas minoritários. Isso se deve ao risco de uso político da empresa, além da falta de escrutínio adequado dos principais sócios no uso dos recursos escassos. A Petrobrás é um caso sintomático deste perigo. Várias vezes no passado a empresa foi utilizada para objetivos políticos dos governantes, levando pouco em conta os interesses dos acionistas. O melhor retorno possível sobre o capital sempre foi colocado em segundo plano, atrás das metas políticas do momento. Com a descoberta do pré-sal, esse fantasma está de volta.
Para que a enorme quantidade de recursos naturais no solo se transforme em riqueza efetiva, a empresa terá que realizar um programa gigantesco de investimentos: para os próximos cinco anos, são previstos 175 bilhões de dólares. A geração própria de fluxo de caixa da empresa não será suficiente para suprir todo este montante. O grau de alavancagem da Petrobrás já não está em patamares tão confortáveis. Resta, portanto, a opção de emitir novas ações para levantar capital. Mas o governo não pode ser diluído e perder o controle da empresa. Surge, então, um problema: como capitalizar a Petrobrás sem que o governo perca o controle ou precise desviar dezenas de bilhões para a estatal?
A resposta veio por meio de uma engenhosa arquitetura financeira. O próprio ativo sob o solo, que pertence à União, será usado como capital pelo governo. Desta maneira, ele não precisa desviar dinheiro de outros setores. Entretanto, uma grande incerteza paira no ar: qual será o valor atribuído a este ativo? O fluxo de caixa gerado pelas reservas pré-sal será altamente dependente do preço futuro do petróleo, sem falar dos enormes riscos operacionais da atividade. Além disso, o valor presente deste fluxo dependerá da velocidade no uso do pré-sal, que custa mais caro para ser extraído do que o óleo em menor profundidade e em campos já mais maduros. Dependendo das premissas usadas, o valor presente do pré-sal poderá ser elevado, sacrificando-se, porém, as margens da Petrobrás, que faria uso melhor de seu capital focando em outras reservas mais baratas.
O risco de o governo supervalorizar esses ativos de alguma forma, para aumentar o capital da Petrobrás sem diluir sua participação, não é nada irrelevante. Há um claro conflito de interesses entre o acionista controlador – o governo, e os acionistas minoritários. E o mercado de ações acusa o golpe. Desde meados de 2009, as ações da Petrobrás já perderam cerca de 30% de valor em relação ao Ibovespa. Isso não pode ser explicado pela mudança no cenário de commodities, pois o petróleo continuou no mesmo patamar nesse período, sem falar do bom desempenho da OGX. Além disso, as ações da Petrobrás perderam bastante valor em relação às ações da mineradora Vale também, o que mostra claramente que o problema é específico da Petrobrás.
As incertezas quanto ao modelo de capitalização estão no cerne do problema, agravado pelo “overhang” de ações (bilhões de dólares serão vendidos em forma de novas ações aos minoritários, inundando o mercado com mais oferta de papel). O valor de mercado da Petrobrás tem oscilado entre 300 e 350 bilhões de reais. Esses 30% de perda no valor relativo ao índice de ações brasileiras representa quase 100 bilhões de reais. Pode-se afirmar que este foi o custo, até agora, de se colocar a política acima dos interesses dos acionistas no que diz respeito somente ao pré-sal.
Se todos os demais custos, pelo fato de a Petrobrás ser ainda uma estatal, fossem computados, o resultado seria assustador. Quantos bilhões a mais a empresa poderia valer se tivesse uma gestão privada, focada no melhor retorno sobre o capital, sem a influência dos interesses políticos? Infelizmente, nas eleições que se aproximam, não há um único partido com a bandeira de retomar as privatizações no país. Os acionistas minoritários da maior das estatais continuarão arcando com um pesado custo enquanto tiverem que pagar pelo jogo político dentro da empresa.
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