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quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

1701) A Politica Externa do PT (talvez de um governo Dilma)

A autoria do artigo é do Embaixador Rubens Antonio Barbosa, mas o copyright de fato não lhe pertence, e sim à patota do PT que assinou um quase inacreditável documento programático que foi, aparentemente (posto que as portas se fecharam aos jornalistas), discutido no recente congresso do partido em Brasilia.
Vale transcrever, e tentar encontrar o resto do documento, certamente exemplar nos anais da diplomacia. Como várias outras coisas, nunca antes na história deste país, coisas tão bizarras vem acontecendo com a diplomacia brasileira...

A POLITICA EXTERNA DO GOVERNO LULA
Rubens Barbosa
O Estado de S.Paulo, 23 de fevereiro de 2010, p. A=2

O documento “A Política Internacional do PT”, examinado no Congresso do Partido dos Trabalhadores na semana passada é uma versão mais branda e polida do trabalho “A Política Externa do Governo Lula”, de autoria do Secretário Internacional do PT, Valter Pomar.
A análise de Pomar mostra a influência do PT na política externa do governo Lula, tornando evidentes as motivações ideológicas e partidárias da ação do Itamaraty nos últimos sete anos. Pareceu-me adequado em lugar de uma ana’lise critica, reproduzir literalmente algumas das principais afirmativas incluídas no trabalho, deixando ao leitor a tarefa de tirar suas próprias conclusões.
A grande novidade nas decisões sobre relações internacionais do Congresso do PT foi a sugestão de criar um Conselho Nacional de Política Externa, com participação social (sindicatos, ONGS, movimentos sociais (MST).
“Na política externa, as diferenças entre o governo Lula e FHC sempre foram muito visíveis. A política externa antecipou o movimento progressista do governo Lula, estando desde o início sob a hegemonia de concepções fortemente críticas ao neoliberalismo e a hegemonia dos EUA. Contribuiu também a militância internacionalista do PT e do Presidente Lula, expressa na criação de uma assessoria especial dirigida por Marco Aurélio Garcia.
“Objetivamente, a política externa do Presidente Lula faz o Brasil competir com os EUA (sic). Comparada com outras potencias, trata-se de uma competição de baixa intensidade, até porque a doutriana oficial do Brasil é de convivência pacifica e respeitosa (cooperação franca e divergência serena com os EUA).
“Inclusive por se dar no entorno imediato da potência, a competição com o Brasil possui imensa importância geopolítica e tem potencial para, no médio prazo, constituir-se em uma ameaça aos EUA (sic). Isso é confirmado (....) pela manutenção pela Administração Obama da política de acordos bilaterais e de exibição de força bruta (IV frota, bases na Colômbia, golpe em Honduras e reafimação do bloqueio contra Cuba). É nesse marco que vem se travando o debate sobre a renovação do equipamento das FFAA brasileiras (sic), o submarino de propulsão nuclear e a compra de jatos de combate junto a industria francesa.
“O Governo Lula é não apenas parte integrante, mas também forte protagonista da onda de vitórias eleitorais progressistas e de esquerda ocorrida na América Latina entre 1998 e 2009.
“Governo Lula adotou a integração regional como seu principal objetivo de política externa e busca acelerar a institucionalização da integração regional, reduzir a ingerência externa, as desigualdade e assimetrias. Foi com este espírito, de convergência de políticas de desenvolvimento, bem como de ampla integração cultural e política, que o governo Lula trabalhou para manter o Mercosul e cooperar com os outros acordos sub-regionais.

“Embora toda política progressista e de esquerda deva necessariamente envolver um componente de solidariedade e identidade ideológica, a dimensão principal da integração, na atual etapa histórica latino-americana, é a dos acordos institucionais entre Estados, acordos que não devem se limitar aos aspectos comerciais. Este é o pano de fundo da CASA, agora chamada de UNASUL.
“Com esses objetivos, o governo Lula tem implementado duas diretrizes:
“a)politicamente, opera com base no eixo Argentina-Brasil-Venezuela. Sem desconhecer as distintas estratégias das forças progressistas e de esquerda atuantes em cada um desses países, é da cooperação entre eles que depende o sucesso do projeto de integração. (foi apenas durante o governo Lula que a Venezuela passou a ser reconhecida com um dos principais protagonistas do processo de integração).
“b) estruturalmente, busca implementar uma política de integração de largo espectro, envolvendo projetos de infra-estrutura, comerciais, de coordenação macro-economica, de politcas culturais, segurança e defesa, bem como a redução de assimetrias
“As negociações com a Bolivia (gás), Paraguai (Itaipu), a disposição permanente de negociar com a Argentina e com a Venezuela, entre outros, devem ser vistas como integrantes de uma política mais ampla, que já foi chamada, inadequadamente, pois, remete ao projeto hegemônico norte-americano, de plano Marshall para a América do Sul.
“O crescente protagonismo global do Brasil deve ser combinado com a reafirmação e a ampliação de seu compromisso com a integração regional, seja porque o protagonismo está fortemente vinculado aos sucessos latino e sul-americano,seja porque as características geopolíticas do país e de sua política externa conferem ao Brasil posição insubstituível no processo de integração regional.
“Frente a desafios gigantescos, a política externa implementada pelo goveno Lula é uma política de Estado. Mas parcela da classe dominante brasileira rejeita os fundamentos desta política, conferindo reduzida importância à integração regional, desejando menor protagonismo multilateral e preferindo maior subordinação aos interesses dos EUA.” Apesar de nesse sentido ainda não ser uma política de Estado(sic), a política externa do governo Lula tampouco é uma política de partido.
“Isso significa que, no curto prazo, a continuidade da atual política externa dependerá do resultado das eleições presidenciais. Mudará a correlação de forças regional, resultando no adiamento dos processos de integração e na interrupção do reformismo democrático-popular.
“A rigor, a atual política externa do Brasil corresponde aos interesses estratégicos de uma potência periférica, interesses que nos marcos do governo Lula e de um futuro governo Dilma comportam uma dupla dimensão: por um lado empresarial e capitalista e por outro democrático-popular”.

Rubens Barbosa, ex-Embaixador do Brasil em Londres e em Washington.

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