Abaixo, mais alguns livros recentes de diplomatas sobre temas diversios de relacões internacionais, em pequenas notas que devo publicar no Boletim ADB (ano 17, n. 75, outubro-novembro-dezembro 2011, p. 30-32;
ISSN: 0104-8503).
Rubens Barbosa:
O Dissenso de Washington: Notas de um
observador privilegiado sobre as relações Brasil-Estados Unidos
(São Paulo:
Agir, 2011, 384 p.; ISBN: 978-85-220-1296-1)
Poucos embaixadores deixam memórias
completas, e sinceras. Geralmente se trata da justificação de seus próprios
atos, quando no comando das chancelarias. Não é o caso deste depoimento, cobrindo
apenas uma pequena parte da longa carreira de Barbosa, mas uma etapa das mais
importantes na política externa brasileira, quando ela deixou de ser
estritamente diplomática para ser também, ou talvez essencialmente, partidária.
Ao relato detalhado de sua gestão em Washington (1999-2004), numa conjuntura
crucial para a política americana e as relações internacionais, há um longo
capítulo final sobre a condução das relações bilaterais com os EUA na era Lula,
no qual ele não deixa de registar a mudança fundamental de visão em relação aos
padrões anteriores, uma “motivação ideológica que mal disfarçava a intenção de
se opor aos Estados Unidos e às políticas apoiadas por Washington...” (p. 336).
Daniel Costa
Fernandes:
A Política Externa da Inglaterra: Análise
Histórica e Orientações Perenes
(Brasília:
Funag, 2011, 136 p.; ISBN: 978-85-7631-290-1)
O império já não é o mesmo, mas algumas
de suas políticas são perenes, como demonstra este estudo sobre três períodos
da diplomacia inglesa: a era Tudor (1485-1603), o período napoleônico (que viu
a Escócia já unida à Inglaterra) e o Congresso de Viena (1789-1815) e, uma fase
bem recente, a política externa do governo trabalhista, de 1997 a 2010. Em cada
um dos períodos, separados por dois séculos, o autor analisa o sistema
internacional, a situação da Inglaterra nesse contexto, o papel que ela podia
exercer (a política de poder), o processo decisório na formulação dessa
política (entrado no parlamento) e o instrumento principal para a defesa do interesse
nacional (a projeção do poder naval). Nos dois primeiros momentos, a Inglaterra
estava claramente em ascensão, imperial em sua boa forma; no terceiro e último,
teve de contentar-se em ser a força auxiliar do novo império (já não tão
ascendente...).
Sidnei J. Munhoz
e Francisco Carlos Teixeira da Silva (orgs.):
Relações Brasil-Estados Unidos: séculos
XX e XXI
(Maringá:
Editora da UEM, 2011, 576 p.; ISBN: 978-85-7628-372-0)
Um único diplomata comparece nesta
coletânea de estudos sobre as relações bilaterais por historiadores e
cientistas políticos: Paulo Roberto de Almeida, com um trabalho sobre
essas relações durante os dois governos FHC (1995-2002). Ele aproveita para
rever o padrão histórico do relacionamento, examina a emergência dos
contenciosos na era militar e na redemocratização e constata a melhoria do
ambiente, no contexto das boas relações pessoais que mantinham FHC e Bill
Clinton. A existência de diferenças de opinião quanto às políticas regionais
ou, por exemplo, a divergência de interesses no campo comercial não impediram
uma grande convergência entre os dois países. A era Lula-Bush, a despeito da
vontade proclamada de intensificar os laços, viu as divergências crescerem
novamente. Era a diplomacia soberana, ativa e altiva, em ação. Há que tentar outra
vez...
Paulo Roberto de Almeida:
Relações internacionais e política
externa do Brasil: a diplomacia brasileira no contexto da globalização
Uma síntese acadêmica sobre a metodologia
das relações internacionais do Brasil, uma compilação de largo espectro sobre a
produção historiográfica acumulada a esse respeito, uma análise das diplomacias
comercial e financeira do Brasil desde o final da Segunda Guerra Mundial, sem
esquecer as crises financeiras e a tendência à regionalização comercial. A
terceira parte integra estudos sobre a posição do Brasil no contexto da ordem
global, com destaque para questões de segurança, assimetrias em relação às grandes
potências e a governança econômica mundial, no contexto do multilateralismo dos
séculos XIX e XX. Uma bibliografia abrangente das obras mais importantes sobre
a interface internacional do Brasil completa essa consolidação da pesquisa
acadêmica realizada por um conhecedor prático do terreno balizado.
Renato L. R.
Marques:
Duas Décadas de Mercosul
(São Paulo:
Aduaneiras, 2011, 368 p.; ISBN: 978-85-7129-581-0).
Negociador que presidiu, por assim dizer,
ao nascimento do Mercosul, o autor está capacitado para contribuir com seu
depoimento de testemunha de primeira mão ao esclarecimento das principais
dificuldades que rondavam – ainda rondam – a consolidação desse bloco sui generis de integração econômica com
pretensões a ser mais do que um simples agrupamento de liberalização comercial.
A maior parte dos textos, fotografias de ocasião ou reflexões a quente enquanto
o bloco era construído, é dos anos 1990, anteriores, portanto, às crises
políticas e econômicas do final da década, que não parecem terem sido
inteiramente superadas. A “nota introdutória” do ex-chanceler Luiz Felipe
Lampreia acha que o livro poderia ser chamado “Presente na Criação”, numa
evocação das famosas memórias de Dean Acheson. Exagerado?
Fernando
Pimentel:
O Fim da era do petróleo e
a mudança do paradigma energético mundial: Perspectivas e desafios para a
atuação diplomática brasileira
(Brasília:
Funag, 2011, x p.; ISBN:978-85-7631-308-3)
O trabalho, explícito em seu imenso
título, tinha sido concluído em fevereiro de 2009, em meio à primeira fase da
atual crise mundial, com os preços do petróleo e outras matérias primas
despencando, junto com o comércio mundial e algumas dezenas de bancos nos EUA e
na Europa. O autor preparou uma introdução em julho de 2011, atualizando os
dados para a nova fase da crise, desta vez de crises de dívidas soberanas dos
países europeus, mas afetando igualmente os mercados do petróleo e de outra
commodities. Entre uma e outra fase, o status petrolífero do Brasil mudou, e
agora o país tem condições de adentrar na economia mundial do petróleo não mais
como mero consumidor, mas como grande produtor. Paradoxalmente, o mundo caminha
para a era pós-petróleo, e o Brasil precisa se adaptar a essa realidade: sua
situação parece bastante confortável, mas não conviria acomodar-se nessa
condição.
Nenhum comentário:
Postar um comentário