Como nos casos anteriores, este trabalho, de
11 de junho de 2004, permaneceu inédito. Vai agora divulgado, sem qualquer mudança.
O que o Brasil deu ao
Mundo:
algumas commodities que
fizeram história
Paulo Roberto de Almeida
(www.pralmeida.org)
Comentários a papers sobre açúcar, algodão, café e
borracha, respectivamente:
1) Tamás
Szmrecsányi: Brazilian Sugar Production:
a system that has helped to change the world and to sustain an exclusive social
structure;
2) Mary
Ann Mahony: The Role of Brazilian Cacao
in the Development of Industrial Cocoa and Chocolate;
3):
4) Zephyr
Frank: Before the Boom: The Brazilian
Rubber Industry, 1870-1914.
apresentados no painel “How Brazil Changed the World”, da VI BRASA, Rio de
Janeiro, 11 de junho de 2004.
Comentários
gerais:
O Brasil foi, no conjunto da
América Latina, um dos países a mais e melhor explorar suas vantagens
comparativas e seus recursos naturais e utilizá-los para o desenvolvimento de
atividades econômicas rentáveis. De fato, esses quatro produtos que o Brasil
deu ao mundo, embora de maneira não exclusiva mas sempre determinante em cada
uma das épocas respectivas, são representativos de quanta riqueza pode ser
acumulada a partir de vantagens comparativas ricardianas quase estáticas.
Só devemos lamentar que
nenhum deles resultou em (ou provocou) inovações tecnológicas a partir do
próprio Brasil, como tampouco eles sustentaram um processo de “socialização” da
riqueza em favor dos trabalhadores. Ao contrário, todos eles permitiram
acumular riquezas de forma concentrada, além de constituirem bases de poder
político e econômico consideráveis.
Uma pergunta geral que eu
gostaria de ver respondida em cada um desses trabalhos é em que medida esses
produtos, tão generosamente ofertados pelo Brasil ao mundo, são responsáveis
por parte considerável ou substantiva da concentração de renda, historicamente
e ainda hoje. O paper que mais se aproxima dessa resposta é o dto Tamás, mas
ele considera que a estrutura social da grande lavoura açucareira, ou sua
“economia política”, não mudou substancialmente até hoje, e eu considero que a
história do açúcar no Nordeste deve ser
contado de forma diferente da experiência recente do mesmo produto em São
Paulo, onde sim ocorreu modernização e transformação.
Mas, o sucesso brasileiro,
que sempre foi o de ganhos quae monopólicos, só foi possível enquanto outros
continentes e outros países oportunamente concorrentes não se alçavam também na
produção dessas commodities valorizadas. Uma vez que o fizeram, no café, no
cacau, na borracha e no algodão, nossos ganhos “extorsivos” diminuiram
bastante.
Os quatro papers são muito
úteis e deveriam ser publicados conjuntamente, talvez com um estudo
introdutório abrangente que mostrasse o papel, a posição, e a parte do Brasil
nos mercados mundiais desses produtos, confrontado de um lado a relativa
abundância dos nossos recursos primários (e os ganhos monopólicos associados)
e, de outro e finalmente, o pouco gênio inventivo dos nossos empresários
“extrativistas” e “rentistas”.
Não creio que se possa
extrair dessas quatro “estórias” qualquer suporte material ou empírico para
alguma “teoria do intercâmbio desigual”. O que elas mostram, na verdade, são
histórias frustradas de oportunidades perdidas pelo Brasil (e suas elites
cambiantes) para construir um centro de poder e riqueza no seu próprio território,
que fosse permanente ou que servisse de base a outras atividades de maior valor
agregado. Enquanto aquelas riquezas foram exploradas de maneira quase
monopólica, elas geraram muitos fluxos de riqueza, muitos recursos, que foram em parte investidos em mansões e
novas propriedades, mas em geral expatriados, torrados nos cabarés parisienses
e nos restaurantes europeus e construiram muito pouco no próprio Brasil, em
todo caso nunca foram para as universidades e obras públicas, a exemplo dos
“barões ladõres” da história do capitalismo triunfante nos Estados Unidos.
Em suma, tivemos “gigolôs” de
commodities, não industrialistas inovadores. Mas esse é o próprio da história:
ela distribui riquezas de forma desigual, mas sobretudo dota os homens de capacidades
desiguais. As nossas idéias nunca foram tão brilhantes quanto as vantagens
ricardianas de que desfrutamos de maneira inconsciente.
Continuamos a exportar todas
essas “riquezas naturais”: apenas se espera que hoje isso possa ser feito com
uma menor contribuição para a deterioração ainda maior dos níveis de
desigualdade e de pobreza no Brasil.
Comentários
específicos a cada um dos textos:
1) Tamás Szmrecsányi: Brazilian Sugar Production: a system that
has helped to change the world and to sustain an exclusive social structure.
O
trabalho constitui uma excelente síntese histórica em torno desse grande
complexo, agora velho de quase quinhentos anos, que representa o cultivo da
cana e da produção do açúcar no sistema econômico brasileiro. Tamás conseguiu
realizar em breves páginas um belo resumo sobre esse continuum histórico, do seu início até os dias de hoje, com forte
ênfase nas interações entre as estruturas econômico-sociais envolvidas nesse
complexo e suas implicações políticas, tecnológicas e até culturais.
Concordo
com a caracterização inicial (p. 1) sobre a “lasting importance of (Brazilian)
sugar industry within the Brazilian economy and society”, inclusive agora mais
do que nunca. Com efeito, os métodos de produção, por um lado, têm conhecido
melhorias progressivas ao longo das últimas décadas, com a modernização
sensível do agronegócio, sobretudo no estado de São Paulo, maior produtor e
exportador de açúcar e álcool. O Brasil, por outro lado, promete continuar
dominando esse negócio no plano mundial pelo futuro previsível, ainda que não
ocupe todas as possibilidades .
Mas
tenho algumas dúvidas quanto à caracterização da “unchanged archaic nature” do
setor açucareiro no Brasil. Talvez esse tipo de argumento seja válido para o
Nordeste e algumas regiões marginais do Sudeste, mas não me parece mais
aplicar-se ao setor canavieiro e sucro-alcooleiro de São Paulo, onde ocorreram,
justamente, nas duas últimas décadas, os maiores progressos nos processos
produtivos, na seleção de mudas e nas próprias relações de produção, com traços
nitidamente capitalistas.
O
mesmo tipo de caracterização volta à página 6, onde lemos que “whereas most
othr activities (that is, other economic product cycles and productive
complexes) arrive to evolve through time, adapting their productive structures
to changing circumstances and environments, sugarcane cultivation and
industrial transformation remained largely immutable ever since the colonial
period.”
Esse
quadro certamente permaneceu imutável em grande medida nos latifúndios do
Nordeste e parcialmente constante no estado de São Paulo até meados do século
XX, mas creio que desde a introdução do programa do álcool e, mais
recentemente, como resultado das profundas transformações de natureza
capitalista que afetaram todo o agronegócio do estado na década e meia de
modernização forçada trazida pelo abandono das práticas ultra-protecionistas da
era militar e da imediata redemocratização, o setor sucro-alcooleiro paulista
(e sob seu impacto outras zonas do Sul-Sudeste) conheceu transformações
substantivas, tanto no plano produtivo, como no terreno tecnológico, como no
âmbito da comercialização externa.
O
Brasil, isto é, o açúcar e o álcool paulistas, tornou-se novamente imbatíveis
no plano mundial, ganhando em produtividade e modernização de qualquer outra
indústria comparável em qualquer outra parte do mundo. Se não houvesse o
exacerbado protecionismo em vigor sobretudo nos Estados Unidos, na Europa, e um
pouco em várias outras regiões também, o complexo sucro-alcooleiro do Brasil
seria capaz de deslocar qualquer outra produção e de, virtualmente, abastecer o
mundo, com algumas poucas limitações físicas e de recursos que poderiam ser
também superadas em médio prazo.
O
acúcar brasileiro pode ser um “killer” absoluto nos mercados mundiais, e só não
o é, ainda, devido ao proteciionismo acima mencionado. Por outro lado, o
complexo energético representado pela biomassa associada a essa cultura e
sobretudo o etanol também podem dominar os mercados mundiais se lhes forem
dados espaços e condições de competir.
Tudo
isso não se fez com base nas velhas estruturas produtivas, e na preservação do
latifúndio e do poder mandonístico do senhor de engenho, ainda que moderno
capitalista. Não: esse fenômeno só se explica pelas revoluções produtivas,
tecnológicas e até nas relações de produção que caracterizam hoje essa
indústria em São Paulo. Não há praticamente subsídio nenhum nessa área, e os
subsídios que ainda permanecem são residuais e ligados parcialmente à
comercialização do álcool combustível. Permanecem subsídios indiretos, de
natureza tributária, no Nordeste, mas ele deixou de ser parâmetro para medir
esse complexo hoje em dia.
Assim,
se no Nordeste a caracterização de Peter Eisenberg, “modernization without
change”, talvez ainda seja válida, ela
não o é para São Paulo nas últimas duas décadas. Ali ocorreu uma modernização
com mudanças dramáticas no processo produtivo e na sua integração aos mercados
nacionais e mundiais. E este último aspecto tem pouco a ver com o desaparecimento
de Cuba dos mercados mundiais, e sim com a transformação interna do setor na
própria economia paulista, que continua a dominar o açúcar brasileiro desde
mais de um século. Bye, bye Nordeste, que só ficou na literatura e no folclore.
No
plano social e político, finalmente, é verdade que permanece o sistema da
grande propriedade associada a indústrias modernas de açúcar, mesmo e talvez
sobretudo em São Paulo. Mas não creio que esse aspecto configure, como
anteriormente, qualquer fonte de poder monopólico, seja no plano econômico ou
no político, um fonte de poder mais importante, em todo caso, do que outras
culturas e atividades econômicas ligadas ao agronegócio. O agronegócio é uma
potência, no Brasil, mas ele é uma potência pelo seu potencial de fazer dinheiro,
atrair dinheiro, digerir novas tecnologias, integrar a produção com os
circuitos comerciais internacionais, não pela velha dominação política sobre
pessoas e partidos como no passado. Ele é hoje um poder transformador, do
panorama econômico no interior e também do panorama social na nova paisagem
rural do agronegócio. Junto com a soja e a carne, o complexo açúcar-álcool é
hoje um dos mais modernos do Brasil.
A
miséria rural continua, certamente, em largas porções do território brasileiro,
mas cada vez menos nas propriedades ou mesmo à margem do novo complexo do
açúcar. Creio que a maldição do latifúndio e do amargo sabor do açúcar no
Brasil, pelo menos em São Paulo, caminha para o desaparecimento.
2) Mary Ann Mahony: The Role of Brazilian Cacao in the Development of Industrial Cocoa and
Chocolate.
O
trabalho me parece ter as dimensões de uma excelente história do cacao
brasileiro no sistema mundial do chocolate industrial, mas as 14 páginas
recebidas até a data do panel não me permitem fazer comentários extensivos.
Gostaria de conhecer o resto do trabalho e sobretudo vou ler o livro da autora,
The World Cacao Made, que me deixou
com enorme apetite pela história do cacau e pela participação do Brasil nesse
grande mercado mundial. O vício do chocolate é terrível…
3)
econômico e social do Brasil.
Fomos
um “price maker” e um “market shaper” mas a única coisa que faziamos era
colocar o café seco em sacos de juta (muitos importados), com gravetos, pedras
e folhas, e mandá-lo para o exterior, onde ele era (e é) transformado e vendido
a preços exponencialmente superiores aos que obtemos com nossas sacas de café.
Topik
relata muito bem como essa dominação de um país sobre uma única mercadoria é única na história do mundo. Nenhum outro
país conseguiu dominar um mercado mundial tão bem e de forma tão extensiva como
o Brasil com o seu café. Ele também indica uma das características principais
desse negócio até uma fase ainda recente da história econômica do café no
Brasil: “quantity and productivity were
valued over quality” (p. 7). Assim foi durante duzentos anos pelo menos, e assim
continuou até os anos 80, talvez.
Mas, a nossa capacidade de ser um “price maker” e um “market shaper” sempre
foi limitado por fatores diversos e algumas vezes alheios à capacidade política
dos plantadores de café, os grandes senhores da política brasileira na era
moderna, depois de quase 300 anos de dominação política dos plantadores de
cana, dos traficantes de escravos, e dos juristas, negocistas e comerciantes
baianos e cariocas.
Na
era áurea do café, quando o Brasil dominava 80% do mercado mundial havia a
“ditadura dos comissários”, não do povo, mas da elite e dos médios plantadores
de café. Os comissários foram parte da paisagem comercial, sem ser parte da
paisagem produtora, e por isso estiveram em condições de capturar uma parte
substancial do valor do negócio: eles eram, talvez, os “price makers” e os
“market shapers” tentativos, pelo menos. Esses comissários, que ainda detinham
uma parte do CIF até os anos 1930, parecem ter desaparecido depois, o que levou
o CIF para as margens marítimas e portos da Europa e dos Estados Unidos. Seria
interessante saber como isso aconteceu.
Apreciei
sobremaneira a explicação hirschmaniana sobre as limitações ao emprendedorismo
brasileiro devido aos pequenos efeitos em cadeia da produção de café e o seu
paradoxo de permitir por isso mesmo um grande desenvolvimento da burguesia do
café, uma burguesia portanto rudimentar e muito pouco inovadora. De certa
forma, essa burguesia foi uma espécie de “rentista” do café, vivendo de seus
lucros e colocando muito pouca inovação no negócio, o que limitou ainda mais o
papel do Brasil como “price maker” ou “market shaper”. Tenho a impressão que
fomos “price makers” e “market shapers” um pouco como o Monsieur Jourdan de
Molière fazia prosa, isto é, sem ter consciência disso e sem o desejar
verdadeiramente. Fomos “price makers” e “market shapers” malgré nous mêmes!
Em
outros termos, se há algum ator nesta história, algum agente da razão
hegeliana, ele parece ser o próprio café, e menos o Brasil ou sua elite pouco
esclarecida. Essa elite talvez fosse mais vebleniana do que propriamente
weberiana, como aliás sóe acontecer com várias outras elites na história da
industrialização brasileira. Parece ser o triunfo involuntário de Veblen sobre
Weber, o que nos deixa em má postura frente à história.
De
fato, infelizmente tivemos mais “fazendeiros selvagens” do que “capitalistas
selvagens”, o que teria ajudado a empurrar nossa industrialização para a
frente. Mas o fato é que, em plena era da segunda revolução industrial, na
Europa e nos Estados Unidos, ainda estávamos fazendo nossa primeira revolução
industrial, e a nossa “segunda” só começa quase meio século depois que ela
tinha dado seus passos mais vigorosos na Europa e nos Estados Unidos.
Creio
que se deveria valorizar (uma expressão brasileira, turned into English) um
pouco mais nesse estudo (e talvez em algum trabalho teórico subsequente), a
intensidade com que os fazendeiros de café formam a primeira categoria
consistente de “intervencionistas”na história econômica, antes do intervencionismo
estratégico provocado pela Primeira Guerra Mundial, ou das receitas fascistas
dos anos 1920, ou ainda do intervencionismo teórico de inspiração keynesiana.
Teriam
os fazendeiros brasileiros de café inventado uma modalidade moderna de
colbertismo tropical?
Por
outro lado, não estou seguro de que o que Topik chama de “cartel” do café,
consagrado na OIC do final dos anos 1950 e início de 1960, possa ser comparado
ao cartel do petróleo, este iniciado justamente em 1961 e muito mais efetivo,
devido às características únicas do petróleo, que se prestam ainda hoje à
cartelização. Explico-me.
Em
primeiro lugar, o “cartel” do café parece ser o único que tinha produtores e
consumidores numa mesma mesa, numa situação, na verdade, na qual estes últimos
talvez detivessem maior poder de dominação sobre os mercados (dominados pelos
grandes intermediários, torrefadores e distribuidores, não pelos produtores),
do que os países produtores, dispersos, concorrentes entre si, desorganizados.
Ou seja, não havia, de fato, um cartel do café, mas apenas uma tentativa de
mercantilismo bem inspirado para uns e para outros, para evitar sobressaltos no
mercado, digamos assim.
Em
segundo lugar, o cartel do petróleo sempre foi um conluio da produção
(relativamente concentrada, nos anos 60 e 70, e talvez também novamente agora)
e da distribuição por atacado. Aliás, o cartel era primeiro das “seven sisters”
e só depois dos países produtores, depois que estes nacionalizaram a produção,
constituiram empresas nacionais e começaram a atuar politicamente nesse
verdadeiro cartel (que ainda permanece poderoso, a despeito da diminuição da
parte da OPEP na produção e comercialização mundial, mas ela ainda detêm uma
espécie de monopólio sobre as reservas verificadas).
Em
terceiro lugar, quando se desejou, realmente, constituir um verdadeiro cartel
do café, sob a forma da APPC, criada em Brasília em 1986, ele nunca foi
efetivo, pois free riders como africanos e mais recentemente o Vietnã atuaram
para desestabilizar as tentativas de nova “valorization” (via retenção de
estoques”) dos países mais ativos. O fato é que o Brasil acabou pagando o preço
desse novo cartel, sem ter retirado benefícios substntivos desse mercado
transformado (que ele continua de certa forma a dominar, mas em escala não
determinante).
Resumindo:
apenas aparentemente “Coffee set the
precedent that later OPEC and other raw material producers would follow”
(p. 14), pois que o princípio dos carteis é o mesmo, teoricamente e
praticamente em todas as experiências conhecidas, mas o destino de cada cartel
foi muito diferente na realidade.
Por
outro lado, concordo totalmente em que “Coffee
had led Brazil from an archaic slavocratic social formation to state capitalism
in a half a century”. Fomos os inventores do “coletivismo do café”, mas
isso tampouco resultou em benefício para o grande número. Desta vez foram
outros “comissários” a lucrar: os manipuladores do Instituto Brasileiro do
Café, que na verdade foram os diretores designados pelo presidente e seus
amigos fazendeiros e negociantes de café.
Finalmente,
concordo em que “Today Brazil is the world’s second largest consumer of coffee
and it’s expected to overtake the U.S. for the number one position shortly”. O
Brasil vai continuar sendo o maior produtor, o maior exportador e vai se tornar
o maior consumidor, se os chineses continuarem no chá e realmente não adotarem
o café.
Hoje
o Brasil deve ter cerca de 30% de participação na
comercialização mundial de café, o que é um bom número para começar um cartel.
Pena que o café ainda não mova automóveis ou entre na composição dos plásticos
e outras embalagens. Mas quem sabe um dia o Brasil ainda não poderá chegar lá?
A característica interessante, agora, é que o
“socialismo” (ou “estatismo”) do café acabou, e as novas tendências parecem ser
inteiramente ditadas pelas forças do mercado (ou dos mercados, já que existem
vários mercados para os diversos cafés hoje produzidos). Será que o Brasil
continuará a ser um “price
maker” e um “market shaper” como acredita Topik? Talvez, mas as condições são
hoje bastante diferentes do que elas eram no início do século XX, ou cem anos
atrás. Não tão diferentes como gostaríamos, pois os países avançados continuam
a produzir e a exportar mais café do que os países produtores, sem produzir um
único grão. Acredito, porém, que pouco a pouco, países como o Brasil vão
começar a dominar a linha completa da produção e comercialização. Isto pode
demorar ainda um pouco mais, talvez duas ou três décadas mais, mas ocorrerá. Aí
então, talvez, o Brasil se converterá, realmente, em “price maker” e “market
shaper”.
4) Zephyr Frank, Before the Boom: The
Brazilian Rubber Industry, 1870-1914
Gostei
do approach de Zephyr Frank, ao considerar a história do boom da borracha no
Brasil como uma história de sucesso, rather than a failure. Torná-la autônoma
em relação ao desastre de 1913 e 1914 me parece ser um bom método para apreciar
o verdadeiro papel dessa “indústria” da selva que trouxe o único período de
prosperidade amazômica. Na verdade, hoje em dia muitos brasileiros reclamam da
cobiça internacional sobre a Amazônia (uma velha história) e existem mesmo as
versões paranóicas, disseminadas por militares e nacionalistas extremados, de
que os estrangeiros, geralmente americanos, estão querendo dominar a Amazônia, desmembrá-la
do Brasil ou até “internacionalizá-la”.
Pois
eu sou a favor dessa internacionalização da Amzônia, pois o único período no
qual a Amazônia foi próspera, foi quando ela esteve de fato internacionalizada
pela borracha.
A
história da borracha, enquanto commodity, é rica e surpreendente, e eu
apreciaria que a parte que figura na seção final do paper, “The Role of
Brazilian Rubber in the Industrial Revolution of the 1860s-1900s”, pudesse
eventualmente ser antecipada em parte para o início do paper, para termos uma
idéia, desde o começo da leitura, de quão útil foi a borracha na segunda
revolução industrial e no capitalismo triunfante do século XIX e de qual foi o
papel do Brasil nessa história.
No
restante do texto, a metodologia seguida por Zephyr me parece consistente e
ilustrativa do “successo” produtivo que foi o ciclo da borracha no Brasil,
possivelmente o último dos ciclos no estilo “rise and demise” da história
econômica do Brasil.
Paulo Roberto de Almeida
(www.pralmeida.org)
Brasília, 11 de junho de 2004.
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