O filósofo esloveno Slavoj Zizek afirmou que o chanceler Ernesto Araújo "não entendeu a questão" quando disse que ele estaria tentando promover o comunismo às custas da pandemina do novo coronavírus.
Zizek respondeu à interpretação que Araújo fez do seu novo livro, publicado no Brasil pela editora Boitempo com o título “Pandemia – Covid-19 e a reinvenção do comunismo”, no qual o filósofo aponta que o coronavírus demonstrou a insustentabilidade do atual modelo econômico, exigindo um pensamento além do mercado financeiro e do lucro.
"O chanceler brasileiro me acusou de usar a epidemia do coronavírus como uma desculpa para introduzir outro vírus, o 'comunavírus'. Infelizmente, ele não entendeu a questão", disse Zizek em resposta a um pedido de comentário feito pelo GLOBO.
“Não quero impor nada, apenas observo que até governos conservadores estão lidando com a crise sanitária e econômica provocada pela epidemia. Estão introduzindo medidas que, seis meses atrás, seriam inimagináveis e vistas como um sonho comunista”, escreveu o filósofo na mensagem.
Segundo Zizek, esses governos conservadores “estão sendo compelidos a agirem como comunistas, dando preferência ao bem comum em vez de mecanismos de mercado”. Com isso, adotam medidas como distribuir “gratuitamente bilhões para que os novos desempregados sobrevivam” e ordenar que a indústria produza equipamentos de saúde, além de admitirem que “precisamos não apenas de um serviço universal de saúde como também de um serviço global de saúde”.
No texto em seu blog, Araújo denuncia um suposto “plano comunista” que pretenderia tirar proveito da pandemia da Covid-19 para implementar sua ideologia por meio de organismos internacionais, como a Organização Mundial da Saúde. A coordenação global realizada pela OMS para fazer frente à crise, segundo Araújo, seria “o primeiro passo em direção ao comunismo” de um “projeto globalista”.
Intitulado “Chegou o comunavírus”, o texto do chanceler diz que o medo causado pela nova doença “nos faz despertar novamente para o pesadelo comunista” – projeto que, segundo ele, já vinha sendo executado “no climatismo ou alarmismo climático”, no “imigracionismo”, no "cientificismo" e no “antinacionalismo”. Para Araújo, isso faz com que o “comunavírus” seja mais perigoso que a Covid-19.
O presidente Jair Bolsonaro e parte de seus aliados têm atacado o chamado “globalismo”, termo usado por setores da direita para se referir a instituições multilaterais. Nesta semana, o Brasil foi um dos apenas 14 dos 193 países da ONU a não copatrocinarem uma resolução sobre a cooperação contra a pandemia.
Confira na íntegra a resposta de Zizek a Ernesto Araújo:
"O cancheler brasileiro me acusou de usar a epidemia do coronavírus como uma desculpa para introduzir outro vírus, o 'comunavírus'. Infelizmente, ele não entendeu a questão.
Não quero impor nada, apenas observo que até governos conservadores estão lidando com a crise sanitária e econômica provocada pela epidemia. Estão introduzindo medida que, seis meses atrás, seriam inimagináveis e vistas como um sonho comunista.
Esses governos estão violando as regras básicas do mercado, distribuindo gratuitamente bilhões para que os novos desempregados sobrevivam. Estão ordenando o que a indústria deve produzir (equipamentos de saúde) e admitindo que precisamos não apenas de um serviço universal de saúde como também de um serviço global de saúde. Estão pensando em como prever fome maciça como uma consequência da pandemia...
Em que outra época se viu conservadores se sentindo compelidos a agirem como comunistas, dando preferência ao bem comum em vez dos mecanismos do mercado?"
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