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quarta-feira, 10 de novembro de 2021

Por que defendo a decisão da Ministra Rosa Weber? - Deputado Rodrigo Maia (O Globo)

 POR QUE DEFENDO A DECISÃO DA MINISTRA ROSA WEBER?!

Rodrigo Maia, Deputado Federal pelo Rio de Janeiro
O Globo, 09/11/2021 

A decisão da Min. Rosa Weber, que determinou a suspensão do “orçamento secreto” e a adoção de medidas de transparência, tem gerado controvérsia. Lideranças parlamentares ligadas ao governo falam em crise com o STF. A decisão, contudo, limita-se a dar fiel cumprimento a uma regra aprovada pelo próprio Congresso em reformas recentes. Não pode ser interpretada como uma interferência na autonomia do Legislativo.

A LDO de 2014 já consagrava o caráter impositivo das emendas individuais. A Emenda n. 86/2015 constitucionalizou o “princípio da execução equitativa”, reafirmado na Emenda n. 100/2019. Segundo esse princípio, o governo deve observar critérios objetivos e imparciais na execução do orçamento, e as emendas apresentadas devem ser tratadas de forma igualitária e impessoal. Portanto, o próprio Congresso aprovou (nesta Legislatura) norma que proíbe o uso das emendas como uma ferramenta de gestão de coalizão parlamentar.

Podemos discutir, no mérito, se é bom ou ruim que em um sistema presidencialista com tantos partidos o governo possa lançar mão das emendas como forma de construir sua base. Mas esse debate já ocorreu, e uma decisão clara foi tomada. Não podemos fechar os olhos: o modelo instaurado pelo “orçamento secreto” não se coaduna com a Constituição, com “critérios objetivos e imparciais”, com “tratamento igualitário” de parlamentares.

Não se trata aqui de uma crítica indiscriminada às emendas individuais ou à busca dos parlamentares por mais recursos para os estados e regiões que representam, uma luta legítima. O modelo urdido pelas lideranças governistas, contudo, pretende lançar esse jogo fora dos limites constitucionais. Se o Congresso entende que precisa ter mais peso no orçamento, deve defender abertamente isso, aumentando o volume de recursos que serão alocados diretamente por decisão legislativa. As emendas, porém, devem ser empregadas de forma objetiva, impessoal e equitativa, a menos que a Constituição seja modificada. Por que a regra que valeu para o governo do PT não pode valer para o governo Bolsonaro, que se elegeu com uma crítica contumaz ao “toma-lá-dá-cá”?

A questão da transparência é outro grande problema. Ocultar os “congressistas requerentes da despesa” produz um quadro que é pior do aquele que se tinha antes de 2014. Naqueles tempos, era possível identificar e tematizar o tratamento diferenciado conferido aos parlamentares. Sabia-se quem estava recebendo, quanto, quando e para que. Agora, nem isso. O STF não pode controlar o mérito das emendas parlamentares e das alocações orçamentárias, mas pode (e deve) fiscalizar o procedimento orçamentário. O Congresso deve satisfação para a sociedade, mas, sem transparência, não há controle político pelas urnas.

O “orçamento secreto” gera, ainda, dois efeitos colaterais. Primeiro, diante elevada rigidez orçamentária, com despesas discricionárias abaixo de 7% do total, o abuso das emendas de relator desorganiza os programas estruturais de políticas públicas ao disputar recursos com eles. Num momento em que essas políticas são centrais para a rede de proteção social e para a retomada da economia, temos que privilegiar iniciativas que pensam de forma sistêmica o País. Segundo, com a proximidade das eleições, o acesso aos recursos do “orçamento secreto” gera uma vantagem competitiva para os beneficiados. Em nosso modelo eleitoral, políticos da mesma sigla acabam competindo entre si. Por isso, a cooptação de apoio no varejo, com base nas emendas de relator e à margem da ação de lideranças partidárias, estimula o racha em partidos outrora disciplinados.

Se o STF referendar a cautelar, assegurará a observância de regra duas vezes aprovada pelo Congresso, destinada a fomentar uma política parlamentar transparente e impessoal. Ela pode ser alterada no futuro, mas enquanto estiver no texto da Constituição, ninguém pode acusar o Tribunal de invadir o espaço do Legislativo.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

Rodrigo Maia traído por ACM Neto, quer criar um bloco de oposição a Bolsonaro (Valor Econômico)

 “UM AMIGO DE 20 ANOS ENTREGOU NUMA BANDEJA NOSSA CABEÇA AO PALÁCIO”!


(Valor Econômico, 08) A vida do deputado Rodrigo Maia (RJ) passa por profundas mudanças. O fim de seu mandato na presidência da Câmara não o fez trocar apenas de lar, a ampla residência oficial por um apartamento funcional como o de outros parlamentares, mas também de partido. A disputa pelo comando da Casa provocou um racha no DEM, sigla da qual ele promete sair para fazer oposição ao presidente Jair Bolsonaro.

Em sua primeira entrevista exclusiva desde que deixou o cargo, Maia não poupou críticas ao presidente do DEM, Antonio Carlos Magalhães Neto. Disse ter demorado a perceber que fora traído por um amigo de 20 anos, que levou o partido à neutralidade, em vez de fechar apoio a Baleia Rossi (MDB-SP), o que favoreceu o candidato governista e vencedor da disputa, Arthur Lira (PP-AL). “Mesmo a gente tendo feito o movimento que interessava ao candidato dele no Senado, ele entregou a nossa cabeça numa bandeja para o Palácio do Planalto”, desabafou ao Valor.

Para Maia, o movimento conduzido pelo presidente do DEM, de aproximar o partido ao governo Bolsonaro, faz com que a legenda retome sua origem de direita ou extrema-direita e afastará o apresentador Luciano Huck.

O deputado esquivou-se quando perguntado para qual partido irá e disse que pedirá sua desfiliação ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sem pressa ou briga. “Estarei num partido que será de oposição ao presidente Bolsonaro”, assegurou. Leia a seguir os principais trechos da entrevista:

Valor: Quais são seus próximos passos após a derrota? Irá mesmo deixar o DEM? Para qual sigla irá?

Rodrigo Maia: Não adianta falar primeiro o que eu vou fazer. As pessoas que me acompanham têm que entender por que eu vou fazer. Trabalhamos a mudança de posicionamento do então PFL até virar DEM e todo o posicionamento para se tornar um partido nacional. Isso começa em 1995, quando convidam meu pai, Cesar Maia, e o Jaime Lerner, para ingressar no partido, políticos que vinham de uma origem de centro-esquerda, e tiram o partido da Internacional Liberal, uma aliança internacional dos partidos de direita e extrema-direita, para aderir à Internacional Democrática. A intenção na época era exatamente tirar a pecha do DNA originário da Arena para se transformar num partido de fato de centro, centro-direita no máximo, que pudesse ter força em mais segmentos da sociedade e tivesse condições de vencer.

Valor: A eleição da Câmara mudou isso de que forma?

Maia: O grande problema é que o partido voltou ao que era na década de 1980, para antes da redemocratização, quando o presidente do partido aceita inclusive apoiar o Bolsonaro. Isso por decisão da direção partidária. Não é relevante, do ponto de vista do processo político, como cada deputado vota numa eleição para presidente da Câmara. Mas a movimentação da cúpula do partido, principalmente do seu presidente e do governador de Goiás, Ronaldo Caiado, deixou claro que há a intenção de aproximação maior com o governo Bolsonaro, que não será apenas uma relação parlamentar com a agenda econômica, mas mais ampla.

Valor: E quais as consequências?

Maia: A frase do presidente do partido terá preço grande a pagar por muitos anos. É um partido sem posição. “Posso ir do Bolsonaro ao Ciro Gomes.” Eu não posso ir do Bolsonaro ao Ciro Gomes. Ninguém que queira fazer política de forma orgânica pode. Isso não é um projeto de país. Isso é projeto de partido voltando a ser exclusivamente parlamentar e anexado a um governo. Esse movimento que desfaz tudo que construímos desde a década de 90 e que faz ter clareza de que não teremos nenhuma condição de construir um partido forte de centro-direita, que possa ter inclusive uma candidatura presidencial. Deste partido eu não tenho mais como participar porque não acredito que esse governo tenha um projeto, primeiro, democrático e, segundo, de país. Continuo dizendo que o governo é um deserto de ideias. O DEM decidiu majoritariamente por um caminho, voltando a ser de direita ou extrema-direita, que é ser um aliado do Bolsonaro.

Valor: O senhor acha que o presidente do DEM fez isso para ter apoio na disputa pelo governo da Bahia?

Maia: Não sei por quê. Não conversei mais com o Neto. Diferentemente do que ele imagina, na verdade o que o Bolsonaro conseguiu foi quebrar a nossa coluna, que era toda acordada, de que nunca estaríamos no governo Bolsonaro e nunca apoiaríamos o Bolsonaro. Isso eu ouvi do presidente ACM Neto centenas de vezes.

Valor: O senhor vai para o Cidadania, o PSDB ou o PSL?

Maia: Isso é tudo especulação. Ainda não estou decidindo para qual partido eu vou. Apenas quero deixar claro para os que me acompanham e acompanharam meus quatro anos e sete meses à frente da Câmara que não sou um vendido, que tenho caráter, que [não] construí um bloco com partidos de direita e esquerda para enganar essas pessoas. Estarei num partido que será de oposição ao presidente Bolsonaro. O partido a que vou me filiar será de oposição, diferentemente do ACM Neto, que fala uma coisa em “off” e em “on” fala outra, que diz que não apoia de jeito nenhum e ao mesmo tempo dá entrevista dizendo que pode ir do Ciro ao Bolsonaro. Mostra que não tem ou perdeu a coluna vertebral.

Valor: Na sua opinião, por que ele fez esse movimento então?

Maia: Porque está no DNA dele, né? A direita está no DNA dele, mas sem o talento do avô e do tio, que nunca teriam feito o que ele fez, de participar de um acordo, ratificar esse acordo e depois comandar o caminho para uma neutralidade que era exatamente o que interessava ao governo. É óbvio que o avô e o tio nunca fariam isso de falar uma coisa e construir outra.

Valor: Quando o senhor percebeu que ele estava traindo?

Maia: Pela relação de muitos anos, só percebi depois da reunião que foi feita comigo e com os líderes partidários antes da reunião do DEM, no domingo à noite (dia 31 de janeiro). Do Caiado eu percebi antes. Ele dizia que não podia ficar contra mim de jeito nenhum... e nenhum voto dele vinha. A participação do Neto eu de fato só consegui acreditar no domingo. Ele veio na quarta-feira, para uma reunião comigo, o Caiado, o Rodrigo Garcia, e a gente fazendo parte daquele papelão. Não podia imaginar que um amigo de 20 anos ia fazer um negócio desses. Todo mundo dizia que ele tinha feito acordo. O Palácio dizia que ele tinha feito acordo, [o presidente do PP] Ciro Nogueira dizia que o DEM ia ficar neutro e eu falava que não, que o Neto tinha me dito que não.

Valor: Nessa reunião com ACM Neto e Caiado, depois dos cinco deputados do DEM da Bahia declararem apoio ao Lira, eles se mostraram alinhados ao Baleia ali?

Maia: O Caiado foi mais pessimista. Ali já era a consequência de tudo que foi construído. Depois que você deixa o deputado solto para ele tomar a decisão que ele quiser, não orienta que há um acordo, não passa a informação correta pra ele... Combinei tudo com o presidente e o líder do partido. Até meu discurso de formação do bloco, um discurso duro, enviei para o Neto e ele concordou, disse que estava espetacular. Trabalhei no DEM por 20 anos para transformá-lo num partido de centro, centro-direita, e o partido decidiu não apenas pelos seus deputados, mas pela sua direção, que é um partido que tende a ser de direita, extrema-direita, apoiando o Bolsonaro.

Valor: Se o deputado Elmar Nascimento (DEM-BA) fosse o candidato do bloco, o desfecho seria outro?

Maia: O Elmar nunca foi o candidato do Neto. O Neto nunca trabalhou para um candidato do DEM na Câmara. Ele decidiu trabalhar para um candidato do DEM no Senado. A partir daí, tive que trabalhar para candidato de fora do DEM porque nunca poderia disputar as duas Casas. Quando consolidou a candidatura do Rodrigo Pacheco [DEM-MG] no Senado, foi impossível nome do DEM na Câmara, até porque a candidatura do Baleia foi vital para inviabilizar a Simone Tebet [do MDB, no Senado]. Fizemos todo o movimento alinhado com o Neto. Tudo foi ouvindo as posições e preocupações dele.

Valor: O senhor espera uma saída cordial ou que no DEM queiram tirar o seu mandato?

Maia: Não espero nada. Vou pedir minha saída no TSE, não tenho dez anos. Não vou brigar com ninguém. Estou fazendo crítica política. Hoje posso dizer que sou oposição ao presidente Bolsonaro. Quando era presidente da Câmara, não podia dizer. Mas agora quero um partido que eu possa dormir tranquilo de que não apoiará [o presidente]. Não estou criticando aqueles que defendem. Estou dizendo que nesse projeto não há espaço para mim. Não quero participar de um projeto que respalda todos os atos antidemocráticos.

Valor: Quantos correligionários o senhor pretende levar para o novo partido com a saída do DEM?

Maia: Não estou preocupado com quem vai comigo. Estou preocupado que eu não posso ficar. A questão para onde vou eu terei tempo para construir, conversando com os partidos sobre um projeto para 2022. Agora, a minha necessidade de informar que não estou mais no DEM para mim é muito importante. As pessoas ficam me dizendo para esfriar a cabeça. Minha cabeça está muito fria. Depois de quatro anos e sete meses pelo que eu passei, isso é muito tranquilo, não deixo de dormir por nada disso. Foi um processo muito feio do Neto e do Caiado. Ficar contra é legítimo, falar uma coisa e fazer outra não é legítimo. Não posso, depois de ter construído relação de confiança com muita gente, parecer que sou parte desse processo não da bancada, mas da direção, de não cumprir sua palavra. Falta caráter, né? Você falar uma coisa na frente e operar de outra forma, falta caráter.

Valor: O papel desempenhado pelo presidente do DEM foi fundamental para o resultado da eleição?

Maia: Ganhar ou perder é da democracia. Ninguém entrou numa eleição dessa, com o governo jogando do jeito que jogou, achando que era uma eleição fácil. Mas não tenho duvida nenhuma que a decisão do Neto foi decisiva para desidratar a candidatura do Baleia. Podia ganhar, podia perder. Era mais provável que perdesse, mas a minha conta era que, até o movimento do DEM acontecer, o Arthur ganharia ou perderia por pouco no primeiro turno. O movimento do DEM fez com que a própria bancada do DEM votasse mais lá, o PSDB também, a gente sabe disso, ficaram no bloco por causa da vaga na Mesa. Os do PSL que estava aqui votaram lá e os deles que iam votar aqui votaram lá. Se não tivesse esse movimento, ele teria de 240 a 260 votos. Era outra eleição, com ele favorito, claro. Mesmo a gente tendo feito o movimento que interessava ao candidato do Neto no Senado, ele entregou a nossa cabeça numa bandeja para o Palácio do Planalto.

Valor: Faltou articulação sua com os deputados do DEM? Reclamaram muito que não foi conversado com eles, foi decisão sua..

Maia: Não. O líder do partido e o presidente do partido participaram de todo o processo. O papel de articular com a bancada e levar as informações do que a gente estava fazendo era do partido e do líder. Se eu soubesse que o Neto tinha feito acordo com o Palácio do Planalto, eu poderia ter conversando... Não estou reclamando dos deputados que votaram com o Arthur Lira. O Neto está querendo misturar as duas coisas. Uma coisa é a eleição, o Arthur é presidente da Câmara, ganhou a eleição, parabéns. Espero que faça ótimo trabalho. Outra coisa é o posicionamento do partido, do ponto de vista de ser um partido de centro-direita que tenha expectativa de projeto nacional, que acabou. O projeto do DEM acabou.

Valor: Por exemplo?

Maia: O Luciano Huck estava filiado no DEM. Se decidisse ser candidato [à Presidência], estava 90% resolvido que se filiaria ao DEM. O Neto tem mais relação [com Huck] que eu. Eu tenho, mas o Neto também tem. Não descarto nem a hipótese de o Bolsonaro acabar filiado ao DEM.

Valor: Poucos dias depois da sucessão, já se fala no Congresso e no governo em novo estado de calamidade e alguns setores da sociedade mostram uma preocupação com a responsabilidade fiscal...

Maia: Não sei, não quero tratar... Não vou ficar sendo fiscal do novo presidente da Câmara. Estou tratando de política nacional. Sou oposição ao presidente da República, não ao novo presidente da Câmara. Ele ganhou a eleição e vai coordenar os trabalhos da Casa. Tem o direito de ter a opinião dele, como eu tinha a minha.

Valor: O senhor vê o Huck como centro-direita ou centro-esquerda?

Maia: Para mim, é mais centro-direita... quem está no entorno dele, pelo que ele pensa, pelo que a gente conversa. Claro, pelo setor que ele trabalha, é mais de esquerda, artistas. Mas, na economia ele com certeza é um liberal, pensa em menos intervenção do Estado. E na área social, como diz - dizia - o ideário do DEM, é a prioridade por justiça social, redução das desigualdades. Acho que ele vai organizar isso de forma competente para um país que é pobre e o liberalismo puro não se adequa a um país como o nosso. Na economia, ele tende a ser mais liberal pelos economistas que ele ouve, o Arminio [Fraga], o Marcos Lisboa. O espaço político que tem para ele entrar é do centro para centro-direita. Na centro-esquerda está um pouco interditado pelo Ciro e pelo PT, que dependendo do candidato fica mais ao centro ou a esquerda.

Valor: O senhor já fez uma autocrítica sobre a eleição? Como a demora para definir o candidato.

Maia: Nunca fiquei esperando o Supremo [decidir sobre a reeleição]. Sempre disse que não seria candidato. Talvez tivesse sido melhor definir o candidato logo, mas o atraso acabou dando as condições de criar o bloco. Se candidato saísse antes, o PT não vinha. Olhando agora como o governo operou, as chances que tínhamos era exatamente esse bloco. Se o bloco tivesse ficado firme, acho que o Arthur era favorito, mas era uma outra eleição. Então, eu acho que de fato errei, mas o erro acabou gerando um acerto, que foi o bloco.

Valor: Outro candidato teria mais chances que o Baleia?

Maia: Pode ser que sim. Se eu tivesse apoiado o [presidente do Republicanos] Marcos Pereira, a probabilidade de desmontar o bloco era menor, porque seria de 330 deputados e não de 290. Mas no final alguns partidos da esquerda questionaram, para eles a candidatura dele transformaria o Arthur no candidato de centro. O candidato conservador e de direita seria o nosso. Para a gente não seria problema, mas para alguns partidos de esquerda seria.

Valor: O senhor contava com votos de aliados que acabaram apoiando o adversário. Se sentiu abandonado?

Maia: Vocês acham que está errado eles apoiarem o candidato do partido? Eu acho que está certo. Se todo mundo tivesse apoiado o candidato do seu partido, a eleição tinha sido outra. Não era ali que a gente tinha que ganhar a eleição. Se a gente tivesse 85% dos votos do nosso bloco, venceria a eleição. Perdemos no nosso bloco, no DEM, no PSDB, no PSL.

Valor: O PSDB rachou. O sr. os vê mais próximos de Bolsonaro?

Maia: Não. No final, todos os líderes entraram, inclusive o Aécio [Neves], para segurar o partido dentro do bloco. Essa é a diferença entre o DEM e o PSDB.

Valor: O senhor se arrependeu de não ter acolhido um dos pedidos de impeachment lá atrás?

Maia: O julgamento do impeachment é político e as condições políticas não estão colocadas. Querendo ou não, Bolsonaro tem 30% de ótimo/bom e 40% de ruim/péssimo. A abertura de um impeachment em um momento em que as condições políticas não estão colocadas só o fortaleceria. Tiraríamos da agenda a pandemia e colocaríamos o impeachment. Talvez seja tudo que o ele quer: tirar da frente as milhares de mortes pela pandemia. A gente ia jogar para segundo plano a responsabilidade do presidente e do seu ministro da Saúde por todo o desastre na administração dessa crise, por todas as mortes, e íamos ficar todos discutindo um processo que ele provavelmente sairia vencedor e fortalecido do ponto de vista político.

Valor: Além de oposição no Legislativo, qual é seu projeto?

Maia: Quero fazer parte de um projeto em que a gente possa construir uma agenda, um projeto de país que reduza concentração de renda na mão de poucos, que garanta a modernização dos serviços públicos, que garanta ao setor privado as condições para investir no Brasil com segurança. Não acredito que esse governo tenha esse projeto. O projeto do presidente Bolsonaro é completamente diferente. Essas agendas não são prioridade dele. Todas as vezes em que conversei com ele, a agenda prioritária dele era acabar com proteção ambiental de Angra, a questão de armas e do turismo de mergulho afundando navios na costa. Essa era a agenda prioritária dele comigo. As reformas tributária e administrativa não eram, a modernização do SUS não era, a melhoria do Fundeb não era. Então, eu não posso, tendo conhecido o que o presidente pensa, ser parte disso.

Valor: A vitória deu fôlego ao governo. Que cenário vê para 2022?

Maia: Olhando a pandemia e as soluções na parte fiscal, minha impressão é que o governo chegará mais fraco do que está hoje. Mostrou força ao ganhar as duas Casas no Legislativo, mas dependerá da capacidade de articulação em relação a temas de difícil aprovação, até porque o presidente já abriu mão deles. No final do ano, ele disse que não trataria da PEC Emergencial. Eu sempre disse que se não aprovasse, teria que ser algo fora do Orçamento.

terça-feira, 4 de junho de 2019

Rodrigo Maia, o segundo adulto na sala: entrevista ao Estadao

ENTREVISTA COM O PRESIDENTE DA CÂMARA RODRIGO MAIA
ESTADO DE S.PAULO, 3/06/2019

ESP: Cin­co me­ses de go­ver­no de­pois, qual a sua ava­li­a­ção so­bre a ges­tão Bol­so­na­ro?

RM: Em cin­co me­ses, o pre­si­den­te es­tá ven­do que os de­sa­fi­os do Bra­sil são enor­mes e que to­do mun­do quer aju­dar, ca­da um com seu pon­to de vis­ta. E que ele vai con­se­guir cons­truir, co­mo tem cons­truí­do nas úl­ti­mas se­ma­nas, por meio do Onyx (Lo­ren­zo­ni, mi­nis­tro da Ca­sa Ci­vil), o diá­lo­go ne­ces­sá­rio pa­ra que as coi­sas pos­sam avan­çar.

ESP: O sr. apoia a ini­ci­a­ti­va de al­guns se­na­do­res de en­ca­mi­nhar pro­pos­ta de emen­da à Cons­ti­tui­ção pa­ra ins­ti­tuir o par­la­men­ta­ris­mo no Bra­sil, a par­tir de 2022? 


RM: Dis­cu­tir is­so ago­ra é an­te­ci­par um de­ba­te. Acho que po­de ser o me­lhor me­ca­nis­mo pa­ra go­ver­nar o Bra­sil, mas não es­tá na ho­ra. Tem cin­co me­ses de go­ver­no. Po­de en­fra­que­cer um go­ver­no que co­me­çou com gran­des ex­pec­ta­ti­vas e elas es­tão se re­du­zin­do. Não é bom pa­ra o Bra­sil que as ex­pec­ta­ti­vas po­si­ti­vas des­se go­ver­no, com a cri­se que a gen­te vi­ve, es­te­jam cain­do tão rá­pi­do.

ESP: O sr. se re­fe­re ao im­pac­to so­bre in­ves­ti­men­tos?

RM: Quan­do a po­pu­la­ri­da­de do pre­si­den­te cai, a con­fi­an­ça dos in­ves­ti­do­res em apli­car os seus re­cur­sos no Bra­sil tam­bém cai. Se vo­cê olhar os nú­me­ros da eco­no­mia, vai ver da­dos de­sas­tro­sos. Não é bom que ele já es­te­ja em al­gu­mas pes­qui­sas com 25% de óti­mo e bom, que en­tre os for­ma­do­res de opi­nião no mer­ca­do fi­nan­cei­ro te­nha caí­do de 80% pa­ra 14%. Vai ver o que es­tá acon­te­cen­do com a cons­tru­ção ci­vil. Pa­ra­ram o Mi­nha Ca­sa Mi­nha Vi­da, e is­so é mui­to gra­ve.

ESP: Ago­ra há mui­tos pro­tes­tos em re­la­ção ao blo­queio de re­cur­sos na edu­ca­ção...

RM: Acho que tem de se per­gun­tar o que a di­rei­ta pen­sa so­bre ha­bi­ta­ção, saú­de, edu­ca­ção. Edu­ca­ção não po­de ser o que es­se mi­nis­tro es­tá fa­zen­do. Eu acho que, na área de edu­ca­ção, qu­em es­tá tra­zen­do a cri­se pa­ra o go­ver­no é o mi­nis­tro (Abraham Wein­traub) por­que ele pri­mei­ro fa­lou de cor­te, de­pois, de con­tin­gen­ci­a­men­to. Ele cha­mou as uni­ver­si­da­des pa­ra o con­fli­to e de­pois fa­lou: “Eu não dis­se is­so, eu dis­se que era con­tin­gen­ci­a­men­to”. Aí faz um ví­deo, um mu­si­cal da Dis­ney, no qual ata­ca a ban­ca­da do Rio. Ago­ra, tem re­be­lião na ban­ca­da do Rio. Boa par­te vai vo­tar a Pre­vi­dên­cia com o go­ver­no. Ata­car a ban­ca­da por­que bo­tou uma emen­da pa­ra o mu­seu e a emen­da foi con­tin­gen­ci­a­da? On­de es­ta­mos?

ESP: O sr. acha que é ne­ces­sá­rio um pac­to pe­la go­ver­na­bi­li­da­de en­tre Exe­cu­ti­vo, Le­gis­la­ti­vo e Ju­di­ciá­rio? Is­so não é um che­que em bran­co pa­ra o go­ver­no? 


RM: De­pen­de do que se­ja es­cri­to. Um pac­to com com­pro­mis­sos re­a­fir­man­do a im­por­tân­cia das ins­ti­tui­ções, com prin­cí­pi­os, po­de avan­çar. Pac­tos com agen­da que ca­mi­nhem pa­ra de­ba­te ideológico te­rão di­fi­cul­da­de de pas­sar por to­dos os Po­de­res, não só na Câ­ma­ra. Mas acho que a ini­ci­a­ti­va é po­si­ti­va.

ESP: O sr. foi al­vo de ata­ques em ma­ni­fes­ta­ções pró-go­ver­no. Na sua opi­nião, o pre­si­den­te es­ti­mu­lou a ofen­si­va con­tra o Con­gres­so? 

RM: Acho que as ma­ni­fes­ta­ções são le­gí­ti­mas. O pre­si­den­te te­ve apoio num gru­po mui­to ra­di­cal. Não é um gru­po que fa­le com o meu elei­tor, com os se­to­res mé­di­os da so­ci­e­da­de. Ago­ra, na ho­ra em que vai o gru­po mais pró­xi­mo do pre­si­den­te pa­ra a rua, e da for­ma com que ele se co­mu­ni­cou nos úl­ti­mos me­ses, que­ren­do trans­fe­rir a res­pon­sa­bi­li­da­de pa­ra o Par­la­men­to, o elei­tor de­le viu aqui­lo co­mo ne­ces­sá­rio. Tal­vez de for­ma in­co­e­ren­te por­que, mo­dés­tia à par­te, se não fos­se pe­lo meu tra­ba­lho, a Pre­vi­dên­cia es­ta­va ain­da nas ga­ve­tas da CCJ (Co­mis­são de Cons­ti­tui­ção e Jus­ti­ça). O mo­vi­men­to ata­ca aque­les que têm sal­va­do o go­ver­no.

ESP: De que for­ma?

RM: O Af­fon­so Cel­so Pas­to­re (ex­pre­si­den­te do Ban­co Cen­tral) deu uma entrevista ( ao Es­ta­do, pu­bli­ca­da em 02/06 ) e, no fi­nal, fa­la qu­an­tos vo­tos nós ti­ve­mos. O Par­la­men­to te­ve 97 mi­lhões de vo­tos. O pre­si­den­te foi elei­to em dois tur­nos. O nú­cleo de­le con­ti­nua com ele, mas o elei­tor que não era des­se nú­cleo já saiu.

ESP: O go­ver­no não tem ba­se de sus­ten­ta­ção no Con­gres­so. Co­mo apro­var as re­for­mas as­sim?

RM: A Pre­vi­dên­cia tem cons­tru­ção no Par­la­men­to e va­mos tra­ba­lhar pa­ra apro­var. A re­for­ma tri­bu­tá­ria tem con­sen­so mai­or ain­da, os mar­cos re­gu­la­tó­ri­os de ga­ran­tia de in­ves­ti­men­to pa­ra o se­tor pri­va­do, tam­bém. Es­ta­mos com co­mis­são tra­tan­do das par­ce­ri­as pú­bli­cos-pri­va­das. Che­ga­mos num pon­to on­de ou nós cons­truí­mos es­sa agen­da em con­jun­to ou va­mos pa­ra o co­lap­so. Vai en­trar no co­lap­so de rup­tu­ra das re­la­ções so­ci­ais. É nis­so que vai che­gar. Já es­ta­mos num co­lap­so fis­cal, num co­lap­so pre­vi­den­ciá­rio. A po­lí­ti­ca es­tá dis­tan­te da so­ci­e­da­de, foi cri­mi­na­li­za­da. To­dos os pro­ble­mas que a so­ci­e­da­de vi­ve ho­je pas­sa­ram a ser da po­lí­ti­ca. Al­guns pon­tos são cor­re­tos, mas às ve­zes es­se pên­du­lo é exa­ge­ra­do. Pa­ra que a gen­te pos­sa dar so­lu­ção pa­ra o co­lap­so so­ci­al, pre­ci­sa­mos ter uma agen­da que ve­nha do Exe­cu­ti­vo.

ESP: O go­ver­no con­ti­nua um de­ser­to de idei­as, co­mo o sr. dis­se an­tes? 


RM: Acho que a coi­sa es­tá me­lho­ran­do. Nós es­ta­mos aqui que­ren­do aju­dar. O pró­prio pre­si­den­te do Ban­co Cen­tral (Ro­ber­to Cam­pos Ne­to) es­te­ve aqui com agen­da mui­to po­si­ti­va. Vou mon­tar um gru­po pa­ra tra­ba­lhar com ele e tra­tar de re­du­ção de ju­ro no che­que es­pe­ci­al, co­mo mon­tei ou­tro pa­ra tra­tar de mo­der­ni­za­ção do Es­ta­do.

ESP: Mas o pre­si­den­te ain­da cri­ti­ca a “ve­lha po­lí­ti­ca”...

RM: Ao lon­go do tem­po ele vai com­pre­en­der, até por­que foi de­pu­ta­do, que a mai­o­ria dos de­pu­ta­dos quer aju­dar. Ou to­dos. Ca­da um do seu pon­to de vis­ta. Pa­ra mim, a re­for­ma da Pre­vi­dên­cia é vi­tal; pa­ra o Ivan Va­len­te (de­pu­ta­do do PSOL), não é. E a po­si­ção de­le é tão le­gí­ti­ma quan­to a mi­nha. O go­ver­na­dor do Rio Gran­de do Sul (Edu­ar­do Lei­te) dis­se na con­ven­ção do PSDB uma fra­se mui­to boa: “Co­ra­gem mes­mo pre­ci­sa qu­em tem a ou­sa­dia de ser pon­de­ra­do”. Acho que a gen­te tem de ra­di­ca­li­zar na pon­de­ra­ção, no equi­lí­brio, no diá­lo­go.

ESP: Por que o DEM quer ago­ra se des­co­lar do Cen­trão?

RM: Eu não en­tro nes­sa ques­tão de “eu não sou da­qui, eu não sou da­li”. A pre­si­den­te do Par­la­men­to es­pa­nhol, quan­do es­te­ve aqui, me per­gun­tou: “Co­mo vo­cês vão fa­zer pa­ra go­ver­nar sem par­ti­do? Por­que na Es­pa­nha is­so é im­pos­sí­vel”. En­tão, va­mos cri­ti­car as pes­so­as que er­ram, mas não va­mos des­qua­li­fi­car os par­ti­dos. Qu­em co­lo­ca vo­cê nu­ma po­si­ção ou ou­tra são seus atos ou ati­tu­des. Se os par­ti­dos que es­tão no Par­la­men­to pro­va­rem que tem agen­da das re­for­mas co­mo pri­o­ri­da­de... A for­ma pe­jo­ra­ti­va co­mo se tra­ta o tal Cen­trão ho­je, ama­nhã na his­tó­ria vai en­trar co­mo os par­ti­dos que sal­va­ram o Bra­sil do co­lap­so so­ci­al, do cres­ci­men­to da de­si­gual­da­de, da po­bre­za, da fal­ta de edu­ca­ção e da fal­ta de mé­di­cos.

ESP: O sr. acha que a re­for­ma da Pre­vi­dên­cia vai ser apro­va­da? 


RM: Te­nho cer­te­za.

ESP: Quan­do o mi­nis­tro Pau­lo Gue­des diz que, se a re­for­ma vi­rar uma “re­for­mi­nha”, pe­ga as coi­sas e vai em­bo­ra, is­so aju­da?

RM: A gen­te que es­tá na po­lí­ti­ca há mui­tos anos sa­be que nin­guém é in­subs­ti­tuí­vel. O mer­ca­do fi­nan­cei­ro, há um ano, que­ria R$ 500 bi­lhões. E se o go­ver­no es­tá com pres­sa, a re­for­ma do Mi­chel (ex-pre­si­den­te Mi­chel Te­mer) co­me­çou com R$ 1 tri­lhão e o úl­ti­mo tex­to fa­la­va em R$ 500 bi­lhões. Eles po­de­ri­am ter apro­va­do em mar­ço a (pro­pos­ta) do Mi­chel, se ti­ves­sem vo­to.