O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

O "outro mundo possivel" fez chabu?; o FSM tropecou e caiu?

Eu sempre me pergunto a quantas anda a construção do tal de "outro mundo possível", prometido por um bando de esquizofrênicos mais de dez anos atrás e até agora carente de maiores definições.
Já escrevi muito a respeito dos malucos do Fórum Social Mundial, que ficam repetindo slogans bisonhos, totalmente sem sentido, sem saber o que fazer, que tipo de medida propor.


Este meu livro, por exemplo, foi todo dedicado à tribo dos antiglobalizadores, desmantelando cada um dos seus argumentos totalmente sem sentido, sem fundamento, totalmente equivocados: 


Globalizando: ensaios sobre a globalização e a antiglobalização 
(Rio de Janeiro: Lumen Juris Editora, 2011, xx+272 p.; Inclui bibliografia; ISBN: 978-85-375-0875-6;
link: http://www.pralmeida.org/01Livros/2FramesBooks/107Globalizando.html).


Mas eles insistem, agora sob a forma de Foros temáticos, mas pretendem, no próximo ano, voltar com o formato grandioso de Fórum Social Mundial.
Isso porque agora dispõem de um governo conivente, que vai usar o dinheiro dos cidadãos gaúchos para financiar o nada sobre o nada, pois eles não têm nada a propor.
Um professor esquizofrênico acha que uma das razões do fracasso é o fato de que o FSM desligou-se de governos, e insistiu apenas com ONGs, como se eles não tivessem recebido chefes de Estado (os suspeitos de sempre, ditadores, populistas, demagogos, e outros da tribo) e achacado governos para conseguir dinheiro.
O mais incrível é que eles usam toda a parafernália da globalização para protestar contra a globalização.
Ingratos!
Idiotas, também!
Contraditórios, idem, pois se fossem coerentes, não usariam sequer um iPhone, um tablet, o Google e o Gmail, todos os blogs de que se servem gratuitamente...


Eu sempre digo que tenho horror à burrice, mas desculpo os mais jovens, que estão nesse empreendimento por puro idealismo.
Mas, apenas até os 24 anos, quando devem começar a enfrentar a vida profissional.
Depois disso se tornam simplesmente estúpidos.
Mais grave é o caso dos mais velhos, estudantes profissionais, que estão ali para a política (e para viver de dinheiro público), e, sobretudo, os professores velhacos, acadêmicos supostamente consagrados, que vivem de enganar os outros. Estes são desonestos, e eu nem acrescentaria o adjetivo intelectual, pois não merecem. São simplesmente gente sem caráter, que atuam de má-fé, apenas querendo ter sucesso em cima dos ingênuos.


Em todo caso, continuo esperando as propostas inteligentes que eles teriam a apresentar.
OK, não precisaria ser inteligente, apenas inteligível, ou coerente.
Como? Nem isso? Não conseguem ter nenhuma proposta de qualquer tipo, mesmo estúpida?


Estamos bem arranjados: antiglobalizadores que não conseguem mais antiglobalizar...
Descansem em paz...
Paulo Roberto de Almeida 

Um dialogo "fiscal" de quatro seculos atras: sempre atual...

 Um trecho de literatura do século XVII, sempre atual, que alguns chamariam de "maquiavélico":



Diálogo entre Colbert e Mazarino, durante o reinado de Luís XIV,

 extraído da peça de teatro "Le Diable Rouge", de Antoine Rault: 

 Colbert: Para encontrar dinheiro, há um momento em que enganar 
[o contribuinte] já não é possível. Eu gostaria, Senhor Superintendente, 
que me explicasse como é que é possível continuar a gastar quando
 já se está endividado até ao pescoço...

Mazarino: Se se é um simples mortal, claro está, quando se está coberto 

de dívidas, vai-se parar à prisão. Mas o Estado... o Estado, esse, 
é diferente!!! Não se pode mandar o Estado para a prisão. 
Então, ele continua a endividar-se... Todos os Estados o fazem!

Colbert: Ah sim? O Senhor acha isso mesmo? Contudo, precisamos 

de dinheiro. E como é que havemos de o obter se já criámos todos os 
impostos imagináveis?

Mazarino: Criam-se outros.

Colbert: Mas já não podemos lançar mais impostos sobre os pobres.

Mazarino: Sim, é impossível.

Colbert: E então os ricos?

Mazarino: Os ricos também não. Eles não gastariam mais. 

Um rico que gasta faz viver centenas de pobres.

Colbert: Então como havemos de fazer?

Mazarino: Colbert! Tu pensas como um queijo, como um penico 

de um doente! Há uma quantidade enorme de gente entre os ricos 
e os pobres: os que trabalham sonhando em vir a enriquecer e 
temendo ficarem pobres. É a esses que devemos lançar mais impostos, 
cada vez mais, sempre mais! Esses, quanto mais lhes tirarmos, mais 
eles trabalharão para compensarem o que lhes tirámos. É um
 reservatório inesgotável." 

Citation originale:

Colbert: Pour trouver de l'argent, il arrive un moment où 

tripoter ne suffit plus. j’aimerais que Monsieur le Surintendant 
m'explique comment on s'y prend pour dépenser encore quand 
on est déjà endetté jusqu'au cou…
Mazarin:Quand on est un simple mortel, bien sûr, et qu'on est 

couvert de dettes, on va en prison. Mais l'État…, lui, c’est différent. 
On ne peut pas jeter l'État en prison. Alors, il continue, il creuse la dette ! 
Tous les États font ça.
Colbert :Ah oui ? Vous croyez ? Cependant, il nous faut de l'argent. 

Et comment en trouver quand on a déjà créé tous les impôts imaginables ?
Mazarin: On en crée d'autres.
Colbert :Nous ne pouvons pas taxer les pauvres plus qu'ils ne le sont déjà.
Mazarin ui, c’est impossible.
Colbert:Alors, les riches ?
Mazarin: Les riches, non plus. Ils ne dépenseraient plus. 

Un riche qui dépense fait vivre des centaines de pauvres 
Colbert: Alors, comment fait-on ?
Mazarin:Colbert, tu raisonnes comme un fromage (comme un 

pot de chambre sous le derrière d'un malade) ! il y a quantité de 
gens qui sont entre les deux, ni pauvres, ni riches… Des Français qui 
travaillent, rêvant d'être riches et redoutant d'être pauvres ! c'est 
ceux-là que nous devons taxer, encore plus, toujours plus ! Ceux là ! 
Plus tu leur prends, plus ils travaillent pour compenser… 
c'est un réservoir inépuisable. 

Extrait du "Diable Rouge" d'il y a 4 siècles...


Progressos da "democratizacao dos meios de comunicacao"

Está compatível com o que pretendem os companheiros, ou não?


Brasil cai 41 posições em ranking mundial de liberdade de imprensa

Segundo a organização Repórteres Sem Fronteiras, foi a queda mais acentuada na América Latina

A imagem do dia: o imperio reconsidera suas incursoes...

Pés cansados é o nome desta imagem:

A imprensa internacional continua se curvando ante o nada...

Parece que propaganda funciona: não fosse assim, ninguém consumiria os produtos mais publicizados nos meios de comunicação.
Pois é: os companheiros criaram uma máquina poderosa de comunicação -- comprada, seduzida, induzida, estimulada, chantageada -- que faz com que produtos que não significam grande coisa, ou nada, sejam vendidos como sendo a maior maravilha do cenário político universal.
Em parte é desinformação induzida de jornalistas pouco dispostos a empreender um trabalho analítico sério -- e por isso se deixam levar, por simpatia, ou não, pelo clima reinante de oba-oba nos círculos oficiais -- e em parte é esforço concreto de mistificação da realidade, pelos propagandistas das soluções milagre, e dos blefes construídos.
Nunca antes, no Brasil e fora dele, se vendeu mercadorias tão ordinárias como se fosse ouro em pó...
Paulo Roberto de Almeida


ROUSSEFF'S GENDER REVOLUTION
---------------------------------------------------------
Women Take Power in Brazilian Government
Spiegel online international, January 19, 2012

Brazil's new president, Dilma Rousseff, has quickly stepped out of the
shadow of her charismatic predecessor Lula. After one year in office,
she is more popular than any former president was at this stage. She has
surrounded herself with powerful women, who are now calling the shots in
Brasília.

Rousseff's Gender Revolution

Women Take Power in Brazilian Government

By Jens Glüsing in Brasília
Photo Gallery: Dilma Rousseff's Government
Photos
DPA
Brazil's new president, Dilma Rousseff, has quickly stepped out of the shadow of her charismatic predecessor Lula. After one year in office, she is more popular than any former president was at this stage. She has surrounded herself with powerful women, who are now calling the shots in Brasília.
Info
The epicenter of Brazilian power can be found on the fourth floor of the Palacio do Planalto in Brasília, the nation's capital. Liveried waiters elegantly carry trays of coffee through the hallways of the presidential palace, high-ranking officials wait in anterooms and air-conditioning units hum in the offices.

Planning Minister Miriam Belchior rushes past on her way to visit Chief of Staff Gleisi Hoffmann, with whom she will discuss a multi-billion-real investment program to combat poverty. On the way she is greeted by Ideli Salvatti, the woman who manages the government's relations with Congress. Two floors down, Press Secretary Helena Chagas is talking on the phone. In the front office, several women are reviewing the day's newspapers.
Wherever you look in this white marble palace, there are female ministers, female advisers, female experts and female undersecretaries. Only the waiters and the security guards in the entrance hall are men. Thanks to President Dilma Rousseff, everything else at government headquarters is firmly in female hands.
Rousseff is the first female head of state of Latin America's largest country, and she's appointed women to many of her government's most important posts. Ten of them sit in the cabinet. All but one of her inner circle of advisers are women. This isn't because of quotas. "Given a choice between a man and a woman with the same qualifications, she prefers to hire the woman," says Gilberto Carvalho, who runs the presidential office.
Women in Charge
Skilled women aren't hard to find. Brazilian women stay in education longer and attend university in greater numbers than their male counterparts. Although the country has its fair share of machismo, the society itself has distinctly matriarchal characteristics. Men may call the shots out on the street, but women rule everywhere else.
A third of all families are run by women. Often enough, men play only a reproductive role. Child benefit, known as the "bolsa família," is typically paid out to women because they are more responsible with money. Even so, working women earn a third less than men in the same position. Quotas exist only in politics: By law, 30 percent of all candidates in mayoral, gubernatorial and parliamentary elections must be women. Up to now, no more than lip service has been paid to this stipulation.
"The political parties claim they can't find enough qualified women," says Marta Suplicy, the vice president of the Senate. "But that's an excuse. They just don't try hard enough."
Suplicy is a member of the governing Workers' Party (PT) and a long-time champion of sexual equality. In the 1980s she made a name for herself on television fighting for homosexuals' rights.
Later, she served as mayor of Sao Paulo, the country's largest city and its economic hub. "Before I gave my inaugural speech, a politician who was also a friend of mine came to me and said, 'You say a few nice words of welcome, but then leave budgetary matters to me.' I first had to make clear to him which one of us had been elected mayor," Suplicy says.
The bitterest opponents of moves to promote women are sitting in the Brazilian Congress. Religious groups and patriarchal male alliances block all attempts at liberalization, for instance on issues such as abortion. "Luckily we're strong in government, and we have the president to thank for that" says Suplicy.
Effective Clean-Up
Gilberto Carvalho, the universally popular head of the presidential office, is the sole influential male. Carvalho served Rousseff's predecessor, Lula da Silva, for eight years, and nobody knows their way around the labyrinthine corridors of power better than Carvalho. "Gilbertinho," as Rousseff's women affectionately call him, using the Portuguese diminutive, is something like an older brother to them. They consult him whenever they get tangled up in the minutiae of the state apparatus, and they go to see him when the president has chewed them out. "I'm responsible here for the female part," Carvalho says.
Carvalho recalls that men frequently used macho expressions in the presidential palace in Lula's time. Nevertheless, that didn't stop Lula grooming a woman as his chosen successor. His instincts were spot-on. Rousseff now rules the traditionally male bastion of Brasília with an iron fist.
She has already replaced seven ministers, six of them because of various corruption scandals. The patriarchs in the affected parties in her governing coalition beat their chests and threatened her, but the president refused to be intimidated. Rousseff's political clean-up has clearly been effective. None of her predecessors was as popular a year into their presidency as she is now. It didn't take her long to step out of the shadow of Lula, who had become a national hero. The two still have a warm relationship, and once a month Rousseff visits Lula in Sao Paulo, where he is undergoing treatment for throat cancer.
Different Style
But Brazil's iron lady has a very different style of leadership than her jovial predecessor. "Lula acted on impulse and instinct," Carvalho says. By contrast Rousseff is more distanced from her staff. And she hates wheeling and dealing with party bigwigs, governors and parliamentarians.
Lula would fly to a different corner of his giant county every week, and rarely spent more than two days in the capital. His successor is more likely to be seen at her desk than in the government Airbus. The two are also very different in their approach to foreign policy. Iranian President Mahmoud Ahmadinejad was welcomed with open arms by Lula. But he deliberately avoided Brazil during his Latin American trip last week. That's partly because Rousseff criticized the regime in Tehran even before she came to office because of its medieval treatment of women.
Rousseff lives in Alvorada Palace, the official residence of the Brazilian president, together with her mother and aunt. Her closest confidant is Carlos Araújo, a former guerilla comrade-in-arms who is also her ex-husband and the father of her daughter.
O Globo newspaper dubs the head of state's most powerful staffers "the PT Amazons," in a reference to the Portuguese initials of Rousseff's Workers' Party. The group comprises the chief of staff, the planning minister and the minister for institutional relations, who is responsible for contact with the parliament.
Ruthless Manager
The most well-known face of the trio is Rousseff's ethnic German chief of staff, Gleisi Hoffmann, whose unusual first name is the result of a transcription error on her birth certificate. Her parents had wanted to call her "Grace" in memory of Hollywood star Grace Kelly. The men in Congress initially poked fun at the blonde woman with honey-colored eyes, calling her "Dilma's Barbie." But Hoffmann is a ruthless manager, and quickly whipped the congressmen into shape.
Her main task is to push through major government undertakings that are stuck in red tape or threaten to get held up by parliamentary hurdles. Hoffmann is currently overseeing the funding of the stadiums that will host the 2014 soccer World Cup as well as the expansion of ports and energy projects.
As a young girl she wanted to become a nun. Later she studied Marx and Engels and joined the Communists. At the end of the 1980s she became a member of Lula's Workers' Party. Later she was hired as the finance director of the major Itaipu hydroelectric dam. Staff at the presidential palace recall the time she presented the company's finances to the then-president, Itamar Franco. "Oh, you understand some math!" the old man said in surprise, though he subsequently apologized for his slip of the tongue.

"Women have to work twice as hard as men to get the same recognition," Hoffmann says. Her office in the presidential palace looks far out over the savanna. A spectacular cloudy sky hangs over the green landscape. Photos of her two children stand on the window ledge.
Wearing the Pants
She rarely gets home before 10 p.m., when they are already in bed. A domestic servant looks after them. "That's typical in this country: Women look after women," Hoffman explains. There are about 7.5 million female domestic servants in Brazil's households. "They work harder and have fewer rights than most laborers," Hoffmann adds.
Gleisi Hoffmann's cleaning lady has the weekend off. So the chief of staff shares the housework with her husband, Communication Minister Paulo Bernardo. Gleisi is his superior in cabinet meetings, Bernardo admits, but he insists there's no rivalry between them. "My opponents say nothing has changed for me," he says. "They say that Gleisi was already the one wearing the pants at home."
Translated from the German by Jan Liebelt

A diferenca entre pensar e simplesmente repetir - Roberto Da Matta

Uma pequena amostra de como e porque as universidades brasileiras continuarão a ser um lugar pouco adequado para se aprender alguma coisa.
A distância é enorme, e vai continuar aumentando.



Roberto DaMatta
Início do conteúdo

Uma lição para a vida

14 de dezembro de 2011 | 3h 07
Roberto DaMatta - O Estado de S.Paulo
Na minha primeiríssima e inesquecível - quem não se lembra de toda primeira e última vez? - estada nos Estados Unidos, em 1963, eu - um humilde e inseguro aprendiz de antropologia social numa portentosa Harvard - fiquei tão chocado quanto deslumbrado quando ouvia meninos e meninas com 20 e poucos anos de idade "discordarem" das ideias que saíam como cascata da obra dos grandes gênios das ciências sociais. Especialmente dos seus inventores, aqueles orgulhosos, persistentes, obsessivos e desafiadores Durkheim, Marx, Tocqueville, Frazer, Hocart, Mauss, Tylor, Maine, Weber... que em vez de policiarem e decretarem sobre o mundo, decidiram fazer o mais difícil: compreendê-lo em seus próprios termos. Esse modo mais complexo e profundo de transformá-lo.
Eu ficava apatetado e cheio de culpa quando meus colegas, uns merdinhas de olhos azuis claros como a inocência das louras que clamavam terem sido estupradas por negros, diziam em alto e bom som: "Eu discordo de Mauss!"; "Durkheim estava errado!"; "Preocupa-me a posição de Weber!"; "Marx perdeu o bonde!"; e assim por diante.
O modo tranquilo com que meus colegas, debaixo do olhar aprovador dos nossos professores, discordavam desses pioneiros me perturbava, pois quanto mais originais eram suas teorias, mais eles eram criticados. As opiniões não eram meras apreciações formais ou elogiosas de um iniciante ajoelhado diante de um mestre, mas uma assertiva sempre negativa e ostensivamente contrária ao que era discutido que, sendo boa ou profundamente enganada, promovia a discussão das ideias gerais contidas no livro em debate. Desse modo, todos (menos eu) faziam questão de bater de frente e essa atitude que para mim, surgia como hipercrítica, e até mesmo agressiva, passava por um crivo que eu não havia aprendido e certamente não existia no Brasil. O filtro de um ponto de vista individual e não a perspectiva pessoal que tende a atenuar ou arrefecer o debate e a apreciação do outro.
Entendi que estava no universo dos "eus". De fato, o que eu mais ouvia era o pronome pessoal "I" (eu). Entendi por que em inglês a primeira pessoa do singular, o "eu", é escrito com letra maiúscula...
Nesse contexto, passei por uma experiência decisiva.
Num seminário sobre a história da antropologia, dirigido pela professora Cora Du Bois, uma pioneira, ao lado de Margaret Mead e Ruth Bennedict na prática da antropologia social, uma mulher que havia feito trabalho de campo na Ilha de Alor, na Indonésia, quando nós, no Brasil, achávamos um problema ir a Niterói e impossível conhecer Manaus, eu apresentei um desses autores clássicos. Não me lembro mais quem era, mas não me esqueci da luz que essa experiência lançou na diferença entre o meu modo de aprender e o dos meus colegas harvardianos. Pois quando terminei o meu resumo, recebi da professora uma pergunta surpreendente.
- Sua apresentação está mais do que correta! - disse Cora Du Bois -, mas o que eu quero mesmo é saber o que você pensa sobre as teorias que acabou de apresentar.
A ênfase no "você" que individualizava e buscava a minha opinião íntima - o sentimento de um "eu" que mal sabia era autônomo e tomava partido - deixou-me embasbacado. Eu jamais havia pensado em me distanciar e me individualizar diante do autor estudado. Pelo contrário, eu havia feito exatamente o oposto e me identificava com ele preparando-me para defendê-lo a todo custo. Jamais havia passado pela minha cabeça que era possível e desejável formar uma opinião pessoal sobre ele e, eis o espanto, que essa opinião, mesmo sendo a de um jovem iniciante, contava e a experiente e sábia professora fazia questão de ouvi-la.
No Brasil eu era bamba em discutir ideias, projetos, leis e sistemas políticos sem ser obrigado a tomar posição em relação ao que estava em pauta. Aliás, o que eu aprendia era jamais criticar certos autores e, pela mesma moeda, elogiar outros. Mas entre o lado direito e o esquerdo, o alto e o baixo, o bom e o ruim não havia nenhum espaço para dizer o que eu realmente pensava de cada um deles.
Meu aprendizado não era individual. Era pessoal e grupal no sentido de que cada grupo ou turma tinha seus padrinhos e heróis, bem como seus inimigos e bandidos, como figuras para serem idolatradas e admiradas, a ponto de jamais serem apreciadas de modo individualizado. Sabíamos definir socialismo e liberalismo, mas não aprendíamos a tomar uma posição sobre cada um desses sistemas - e a exprimir o que eles diziam para cada um de nós.
Éramos, como ocorre em tantas outras esferas da vida social brasileira (e, imagino, latino-americana), contra ou a favor. Não líamos Marx, éramos marxistas! Ou reacionários, porque simpatizávamos com Durkheim, que jamais falou em luta de classes. Mas, entre um e outro, jamais fazíamos como aqueles meninos de Harvard que tomavam um partido individual relativamente a cada autor e assim mediam suas aversões e simpatias às suas ideias, métodos e teorias. E isso, parece, faz diferença. A diferença entre a repetição e o modismo e a verdadeira criatividade.

Cotas raciais no Brasil: a Economist faz enquete

Como vocês podem constatar abaixo, três quartos dos votantes nesta pesquisa da Economist se pronunciaram contra a política de cotas racistas.
Ainda assim, elas estão sendo implementadas.
Para maior pujança do Apartheid que está sendo construído, o racismo antibranco.
Paulo Roberto de Almeida


The Economist Asks

Are racial quotas at Brazilian universities a good idea?

Universities in the state of Rio de Janeiro reserve 20% of their places for black students. Do you support this requirement?
You voted: NoCurrent total votes: 887
24% voted for Yes and 76% voted for No
Voting opened on Jan 24th 2012 and closes on Jan 30th 2012


Readers' comments

The Economist welcomes your views. Please stay on topic and be respectful of other readers. Review our comments policy.

Meu comentário:


Racial quotas either for universities, or public offices, is the equivalent of an Apartheid system, in a country which, while having some grave inequalities touching mostly poor (and black ) people, never had policies separating its citizens according to racial or color lines.
This  modifies completely the political and social scenario in Brazil, for the worse, of course.
Paulo R. Almeida
Brasilia, Brazil

Venezuela: preludio para o caos (inevitavel, nas circunstancias atuais)


Venezuela Prepares as Chavez's Health Deteriorates


Geopolitical Diary, Stratfor, January 25th, 2012


According to a report published by Spanish newspaper ABC on Monday and Tuesday, Venezuelan President Hugo Chavez may only have 9-12 months to live as a result of his decision to prioritize presidential duties over personal health. Chavez's prostate cancer was reportedly discovered in January of 2011, at which point his prognosis was five years. Since that initial diagnosis, Chavez has repeatedly postponed treatments or skipped them altogether in the interests of concealing his illness and protecting his political position.
The leaked report, which ABC says was given to the paper by "intelligence services" (much like a November leak to The Wall Street Journal), is dated Jan. 12 and reviews a medical examination Chavez underwent Dec. 30. According to the report, the South American president needs to undergo a painful, debilitating treatment that, while preventing him from working for more than a month, could extend his lifespan. If he defers the treatment, he will likely to die within the year. According to ABC, when presented with a similar conundrum in November, Chavez chose to stay in Caracas rather than travel to Russia for treatment -- out of fear that the political situation in Venezuela was not secure. We have no way to be completely certain that the report accurately represents Chavez's medical condition, but the tenor of the report matches a series of accounts given to Stratfor and other open sources.
Competition within the Chavista inner circle dominated 2011, as each of Chavez's closest associates sought to take best advantage of the turmoil that ensued when Chavez's bout of illness became public in June. The upcoming October elections have added urgency to this struggle. There is no clear successor to Chavez among the Chavista elite. However, Chavez in recent weeks appointed Diosdado Cabello as first vice president of the Venezuelan United Socialist Party and later named him President of the National Assembly. Clearly, a single faction has taken the lead. Cabello represents the pragmatic, militaristic wing of the Chavista elite. However, although powerful, Cabello is not particularly popular, and he is not likely to be a suitable replacement for Chavez in October.
The most believable political alternative to Chavez may actually come from the Venezuelan opposition. After years of disunity and infighting, the opposition is presenting its most credible challenge to Chavez since he came to office in 1999. Miranda Governor Henrique Capriles Radonski appears most likely to secure the backing of the opposition parties in the Feb. 12 primaries. Capriles has positioned himself as a man of the people, claiming he is the natural heir to Chavismo, but with a pro-business twist.
The most important thing to remember amid all this uncertainty is that the underlying processes driving Venezuela are not as dependent on Chavez as they might appear. The kind of change that truly shifts the nature of a country comes slowly. The attributes of Chavez's regime that are so criticized by opponents -- the networks of corruption, economic inefficiencies and low levels of international investment – are merely contemporary expressions of Venezuela's timeless patterns of patronage and influence.
Even if a prudent leader takes power in Chavez's wake, he will not likely make immediate changes to the system because the risk of destabilization is high. Capriles has made clear that he would make few major changes -- even saying he would maintain the controversial oil shipments to Cuba.
Assuming Chavez is as ill as this week's reports suggest, the next six months will likely be tumultuous. Nonetheless, there remains a good deal of room for compromise among Venezuela's power players, and a power transition over the next year will not necessarily translate to a severe destabilization of the country.

Petite randonnee en Europe: de Paris a Lisboa, em tres tempos...

Foi mais fácil do que aprender a dizer saperlipopete de trás para diante, no escuro, sem hesitar e com as mãos amarradas às costas...
Enfim, maneira de dizer...
Estou me referindo ao pequeno circuito que acabo de fazer por metade da Europa (OK, 2/5, apenas), a partir do dia 15 deste mês de janeiro de 2012, apenas como lazer prévio ao trabalho (ele não me pega tão cedo).
Comecei desembarcando, como programado, no Charles De Gaulle, aeroporto que já foi mais impressionante do que é agora, comparado a outros novos monstros na Ásia ou na América do Norte. Serviços franceses, ou seja, quase inexistentes as 7hs da manhã...
Imediatamente comprei um chip para o meu iPhone, que ninguém fica sem comunicação hoje em dia por falta de chip, ou de celular. Telefonei para casa para avisar que tinha chegado bem e, zut, antes que eu me desse conta, os 5 euros de crédito se acabaram num átimo. Tive de comprar mais 25 e depois mais 25 euros, para enfrentar as necessidades pessoais e familiares.
Depois recolhi o carro que esperava por mim, no guichê da Hertz: um Peugeot 3800, diesel, seis marchas, teto solar, todo computadorizado, só faltando falar, ainda que ele apite quando a gente faz alguma bobagem.
Razoável, mas no começo fiquei buscando freio de mão manual: não existe, ele mesmo se encarrega de apertar e soltar, penetrando no seu pensamento e detectando que você quer parar ou começar a andar. Espertinho esse carro...


Fiquei em Paris, no primeiro dia, para rever a capital em que já morei e detectar algumas possíveis mudanças. Tem sim: muito mais carros. Inacreditável massa de veículos para um domingo, talvez porque fosse o último dia da iluminação natalina e de final de ano. Toda a cidade engalanada, a Tour Eiffel iluminada de alto abaixo (ou vice-versa), luzes para todo lado, e carros para todo lado, também. O que eu pretendia que fosse um passeio de meia hora apenas para percorrer os trechos mais conhecidos, acabou levando uma hora e meia de trânsito a 3kms por hora. 
Sim, também desisti de comer em algum restaurante do centro, do Quartier Latin, pois não acharia vaga em lugar nenhum para estacionar o carro. Acabei comendo um sanduíche e fui para o hotelzinho que acabei achando do lado de La Défense, para ter um com estacionamento próprio sem que isso me custasse mais uma diária.
Hotel des Ammandiers, em frente ao Théatre do mesmo nome, na Avenue Pablo Picasso, de Nanterre, um bairro universitário, que já teve dias mais movimentados (em 1968, claro).


No dia seguinte, segunda 16, logo de manhã, passei no Banco do Brasil, Avenue Kleber, perto da praça de l'Étoile (Arco do Triunfo, aquela coisa alta, na qual os americanos sobem para ver Paris em perspectiva), peguei meus cartões de crédito, e fui direto para a Embaixada (Cours Albert Premier, perto da praça Alma, onde se come muito bem). Depositei duas malas grandes, para deixar o carro mais leve e viajar com pouca bagagem e fui imediatamente para a estrada, via Porte St Cloud.
Tomei, como estava previsto o caminho de Orleans e Bordeaux.
Orleans foi uma primeira entrada para revisitar essa cidade que já foi mais gloriosa, nos tempos da Jeanne d'Arc, aliás objeto de uma recente controvérsia entre o presidente petit Nicolas Sarkozy e o líder de extrema direita Jean-Marie Le Pen, cada um reivindicando seu direito a homenagear a virgem salvadora da França (pelo menos é o que dizem...).
Catedral de Orleans (em foto rápida de iPhone)
Um almoço rápido num restaurante não tipicamente francês (aliás chinês, mas foi o que achei aberto numa segunda-feira em que tudo fecha), e estrada de novo, sem parar, em direção ao Sudoeste (o sol que descamba à frente do carro é um terror para dirigir).
Felizmente o tempo estava frio mas seco, sem um traço de chuva nas estradas, sem qualquer ameaça de neve: ótimo para chegar a pontas de 180kms/h.
A Espanha apareceu já no começo da noite, direto a San Sebastian (mais ou menos 800kms de Paris), a primeira cidade importante no norte, país basco. Também quase tudo fechado, mais de 21hs: felizmente apareceu um lugarzinho para estacionar bem em frente do Melia Tryp Orly, Plaza Zaragoza, a dois passos de uma lanchonete, à base de tapas (as, não os) e cerveja: comi um "hamburguer" de ternera (era o mais razoável), uma cerveja, justamente, e fui direto para o Hotel, onde coloquei o carro na garagem. Preço mais do que razoável, comparado ao resto da Europa, e isso não sei por causa da crise, ou da época, praticamente vazia de turistas gastadores...
No dia seguinte, ou seja, terça-feira 17/01, sai como programado, mas com algumas visitas no caminho. Primeira parada: Bilbao, que eu já conhecia, mas sempre é bom rever velhos amigos.
Fui imediatamente ao Guggenheim da cidade, para ver se ele ainda estava lá, e como parece óbvio, não se mexeu, nem ficou mais escuro, desde minha primeira e única visita, alguns anos atrás. Impressionante, por fora, pois por dentro continua com pouca coisa, dependendo mais de exposições temporárias e de empréstimos de outros museus do que de coleções próprias.
Guggenheim de Bilbao (esse iPhone até que é razoável para fotos rápidas)
Burgos, logo mais abaixo, foi a próxima etapa, onde almocei muito bem, num restaurante do centro da cidade, por um preço modestíssimo para a excelência da comida (e do vinho, que não devia ter exagerado, mas exagerei). Tirei algumas fotos, cuja postagem fica reservada a outra oportunidade.
Deixei de entrar em Valladolid e Tordesillas, que já conhecia de visitas anteriores, mas entrei em Salamanca, já que ela tem fama de "estudiosa" (pelo menos os padrecos de antigamente anteciparam Adam Smith, no estudo de questões econômicas, ou pelo menos em detectar a inflação que acometeu a Espanha da espoliação americana, inundado por ouro e prata em quantidades inacreditáveis para os padrões da época). 
Salamanca tem a famosa casa das conchas, cuja foto tirei, mais uma vez:
Casa das Conchas (Salamanca)
A partir de Salamanca, pretendia dormir no parador de Zamora, que conhecia de viagem anterior, mas resolvi seguir adiante, já que eram apenas 18hs. E lá fui, pelo norte de Portugal, em lugar do centro, pois pretendia passar pelo Porto, onde não tinha estado ainda.
Montanha, frio, noite, estrada pequena, fui até Bragança, apenas, uma centena de quilômetros adentro de Portugal. Não posso reclamar do hotel, San Lazaro, o melhor da cidade, também por um preço razoável (e um jantar à base de spaghetti aos frutos do mar, com um bom vinho da região). Mas isso depois que me perdi três vezes na cidade, tendo chegado até o castelo.
Não acordei cedo, mas ainda assim cheguei no Porto para o almoço, que fiz à beira do mar, no restaurante Shi, em Matosinhos, norte da cidade, mais exatamente na foz do Douro (que vinha seguindo desde a Espanha, mas o danado se chamava Duero, então).
Pela primeira vez na viagem, pode-se dizer que fiz haute gastronomie: vieiras grelhadas, com foie gras, chutney de manga e alcachofra, de entrada, e lulas recheadas de camarão, como principal, tudo isso acompanhado por um bom vinho do Douro, tinto, Touriga, Castelo D'Alba (a 18 euros, acho que valeu). 
Já estava então a 2 mil kms de Paris, e satisfeito...
Mulheres de pescadores, desesperadas com o desaparecimento de seus maridos, tragados pelo mar (escultura na praia de Matosinhos, norte do Porto)
Continuei, ainda que borracho, pois tinha de chegar a Lisboa, para esperar a Carmen Lícia (e comprar um presente, antes dela chegar). A despeito do vinho, do sono, do sol sempre incomodando, fui descendo, entre a autoestrada e pedaços da nacional, parando em algumas cidades pelo caminho.
Coimbra foi uma etapa óbvia, mas eu já conhecia e me contentei com algumas fotos, aqui e ali. A universidade deve ter sido boa, antigamente, hoje me parece dentro dos padrões portugueses normais (e vocês entendam o que desejarem por isso). Preferi enquadrar o criador do reino de Portugal, um gajo que teve lá o seu valor...
Estátua de Dom Dinis, em frente à Universidade de Coimbra
Feito isso, ainda enfrentei o sono e o cansaço para ir dormir numa cidade que é o símbolo de Portugal: Batalha. Pois foi nas batalhas contra os mouros que o reino de Portugal se fez.
Catedral de Batalha (túmulos dos reis fundadores)
O hotel ficava bem perto do mosteiro, e tinha um banheiro que era um gelo, a despeito do quarto ser aquecido: estamos falando de um frio a zero grau, e a solução foi tomar banho no vapor quente, com torneira e chuveiro amplamente ligados a toda...
Nessa noite fui jantar num restaurante perto do hotel, chamado de Vinho em Qualquer Circunstância, abreviado para este último nome: comecei com um folhado com queijo de cabra e depois enfrentei (é o caso de se dizer) um bacalhau a Pipo, regado a um rosé da região, Casa do Valle. Não posso reclamar da comida, ainda que o preço tenha destoado dos últimos dias. Enfim, o prazer valeu a fatura.

No dia seguinte, refeito do banho no vapor, visitei rapidamente a catedral, túmulo de vários reis portugueses (os pais fundadores, algumas mães também) e enfrentei novamente a estrada, direto a Lisboa, onde primeiro fui fazer compras (presente para Carmen Licia, que desembarcava no dia 20, mas que fazia aniversário em 24 de janeiro), e depois fui para o Hotel Lutecia, perto da saída para o aeroporto.
Jantar à base de bacalhau e vinho do Alentejo; bom, condizente com as 4 estrelas do hotel.
Justamente, acordei as 5hs da manhã, para buscá-la na chegada do voo da TAP de Brasília.
Nem entramos em Lisboa, pois seguimos direto para Évora, via nova Ponte Vasco da Gama.
Manha fria, com trechos de bruma, ou neblina, vocês escolhem.
Évora é uma cidade murada, cuja parte histórica está toda cercada de muralha e portas. A universidade fica na parte nordeste da cidade, que visitei na manhã seguinte à minha chegada, dia 21, portanto.
Mas sobre essa etapa falarei depois.
Paulo Roberto de Almeida 


(feito em Saint Raphael, Côte d'Azur, em 25/01/2012)