segunda-feira, 1 de abril de 2024

Ainda sobre o golpe de 1964 e a memória da ditadura e seus crimes - Luiz Carlos Azedo entrevista Caetano Araújo

 

Existe um fio de história que liga os acontecimentos de 1964 aos dias atuais, que passa pelas reformas de base na marra, a luta armada, o voto nulo, o não apoio a Tancredo Neves, a rejeição ao Plano Real e o fracasso do governo Dilma Rousseff: o voluntarismo e a frustração de esquerda porque a queda da ditadura não se confundiu com a revolução.”

 

domingo, 31 de março de 2024

Luiz Carlos Azedo - Por quem os sinos dobram neste 31 de março 

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Correio Braziliense

Há um pacto de silêncio entre Lula e os comandantes militares, que proibiram as comemorações nos quartéis do golpe de 1964, enquanto golpistas prestam contas à Justiça

É preciso fugir ao senso comum e ao passado imaginário para ter um novo olhar sobre o dia 31 de março de 1964. O regime militar que ali se instalou somente se encerrou com a eleição de Tancredo Neves, em 1985, e a bem-sucedida transição à democracia presidida por José Sarney, cujo coroamento foi a promulgação da Constituição de 1988. Desde então, temos uma democracia representativa de massas, de caráter social-liberal. Não é pouca coisa a preservar.

Um velho amigo, o sociólogo Caetano Araújo, consultor do Senado, a propósito da polêmica sobre se o governo Lula deveria comemorar ou não o golpe de 1964, fez uma sensata separação entre a verdade e a Justiça, que não são mesma coisa, embora devam caminhar juntas. É verdade que os órgãos de segurança cometeram crimes hediondos, sobretudo no caso dos desaparecidos, mas a aprovacão da anistia em 1979, que não foi exatamente como os militares queriam, foi o grande pacto entre o governo e a oposição que deu início efetivo à ultrapassagem pacífica do regime autoritário.

Era a justiça possível, como correu em outras transições complexas da época. O Chile até hoje convive com uma constitucionalidade herdada do governo de Augusto Pinochet. O Uruguai promoveu um plebiscito que anistiou os militares. A Argentina puniu seus ditadores, depois do desastre das Malvinas, mas também motoneros e militantes do ERP envolvidos em crimes de sangue. Na África do Sul, sob liderança de Nelson Mandela, a Comissão da Verdade promoveu uma reflexão para que o passado do apartheid não se repetisse, não teve papel criminal.

Seguiram o rastro da Espanha, profundamente dividida desde a década de 1930. Após a morte de Franco, em meio à crise econômica e social, sem a mínima estrutura democrática, com apoio do rei Juan Carlos I, Adolfo Suarez abriu o diálogo entre esquerda, centro e direita. No Palácio la Moncloa, em 1977, em Madri, todos os partidos assinaram um pacto no qual predominava a preocupação econômica, mas que abarcava previdência, trabalho, liberdade, direito, energia, defesa e educação. A Espanha tornou-se uma democracia sólida, que sobreviveu à tentativa de golpe militar de 1981.

“Por quem os sinos dobram” (Bertrand Brasil), de Ernest Hemingway, que lutou como voluntário nas Brigadas Internacionais, é uma grande história de amor, tendo por referência a experiência pessoal do escritor na Guerra Civil Espanhola. Entretanto, narra a extrema violência das tropas de ambos os lados: os nacionalistas, auxiliados pelo governo italiano e nazista alemão, e os republicanos, apoiados pelas brigadas e a União Soviética. O livro é inspirado no poema “Meditações”, do pastor e poeta John Donne: “Quando morre um homem, morremos todos, pois somos parte da humanidade”. Empresta o título à coluna.

Mortos e desaparecidos
Sim, os sinos hoje dobram por 434 mortos e desaparecidos, vítimas do regime militar, a maioria dos quais na tortura ou executados em confrontos simulados com os órgãos de repressão. Mas também dobram por cerca de 119 mortos pelos grupos armados que se opuseram à ditadura. E quatro militantes de esquerda que foram executados pelos próprios companheiros. Não eram “cachorros”. Qualquer tentativa de ajuste de contas punitivo com esse passado é um equívoco. Isso não significa confinar essa memória ao culto doméstico dos familiares de mortos e desaparecidos.

A radicalização política que antecedeu o golpe de 1964 dividiu profundamente a sociedade, inclusive as classes sociais e as famílias. Nem tudo foi fruto da “guerra fria”. Havia, como há ainda, um ambiente de iniquidade social propício. E também uma visão de ambos os lados de que as coisas se resolveriam pela força bruta do Estado e não pela sociedade, por via democrática.

A esquerda deveria se perguntar: por que Juscelino Kubitscheck e Ulyssses Guimarães apoiaram o golpe? A resposta é simples: foram empurrados para os braços de Carlos Lacerda e Magalhães Pinto, que empunharam a bandeira da democracia contra o radicalismo de esquerda. Os militares deveriam também se perguntar: por que Juscelino e Ulysses passaram à oposição, logo após o golpe de 1964? Outra resposta simples: o regime cancelou as eleições e derivou para uma ditadura sanguinária.

Existe um fio de história que liga os acontecimentos de 1964 aos dias atuais, que passa pelas reformas de base na marra, a luta armada, o voto nulo, o não apoio a Tancredo Neves, a rejeição ao Plano Real e o fracasso do governo Dilma Rousseff: o voluntarismo e a frustração de esquerda porque a queda da ditadura não se confundiu com a revolução.

Outro fio de história liga a frustração dos militares que ingressaram na carreira quando era uma via de ascensão ao poder político, cuja recidiva se deu no governo Bolsonaro, à tentativa de golpe de 8 de janeiro da extrema direita bolsonarista, inspirada no passado imaginário do regime militar: a mentalidade de que às Forças Armadas cabe tutelar a nação, por representar “o povo em armas”.

A polêmica sobre a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de não relembrar oficialmente o golpe militar de 31 de março de 1964 é fruto dessas vicissitudes históricas. De fato, há um pacto de silêncio entre Lula e os comandantes militares, que proibiram as comemorações nos quartéis, enquanto generais e outros oficiais golpistas prestam contas à Justiça comum, fato inédito na história.

Entretanto, a sociedade não está proibida de reverenciar seus mortos, como fizeram os professores da Faculdade de Direito de Niterói (UFF), ao propor o título de Doutor Honoris Causa ao seu ex-aluno Fernando Santa Cruz, sequestrado e assassinato em 1974, depois de diplomá-lo bacharel post mortem. 

O governo Lula tem de fazer mais para despolitizar as Forças Armadas brasileiras, porque aqueles que estiveram envolvidos nos planos golpistas permanecem quase todos impunes” - Entrevista Oliver Stuenkel (Visão)

 O governo Lula tem de fazer mais para despolitizar as Forças Armadas brasileiras, porque aqueles que estiveram envolvidos nos planos golpistas permanecem quase todos impunes”

Entrevista Oliver Stuenkel

Revista Visão, 30/03/2024

https://visao.pt/ideias/2024-03-31-o-governo-lula-tem-de-fazer-mais-para-despolitizar-as-forcas-armadas-brasileiras-porque-aqueles-que-estiveram-envolvidos-nos-planos-golpistas-permanecem-quase-todos-impunes/

É um académico que sabe e adora comunicar. Nas redes sociais e em órgãos de comunicação social de referência (The New York Times, Foreign Policy, Americas Quarterly, El País, ZDF, Globo) é capaz de comentar – em português, inglês ou alemão – o que se passa no mundo e também no país onde escolheu viver, o Brasil. Professor e investigador na Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo, Oliver Stuenkel, nascido há 42 anos em Dusseldorf, especializou-se nos desafios colocados pelos países do chamado Sul Global ao Ocidente.

Escreveu há poucas semanas [na Foreign Policy] que uma das ações menos conhecidas da administração de Joe Biden tem a ver com a forma como se envolveu na disputa eleitoral entre Lula da Silva e Jair Bolsonaro. Os EUA salvaram a democracia brasileira?
Em primeiro lugar, é importante lembrar o papel que alguns outros atores tiveram nesse processo. Em particular, a mobilização da sociedade civil. Essa dinâmica interna tem de ser destacada. Porém, através de uma série de conversas e entrevistas com especialistas em assuntos militares, com políticos e diplomatas brasileiros, começámos a perceber que a pressão dos Estados Unidos ao longo do ano 2022 parece ter sido crucial para dividir e alertar alguns elementos golpistas nas Forças Armadas brasileiras. Os EUA fizeram saber que não aceitavam uma rutura democrática no Brasil. Criou-se um ambiente muito hostil a esse tipo de ação, ao contrário do que se verificou em 1964 [Washington apoiou a conspiração e o golpe contra o então Presidente João Goulart, instaurando um regime militar que vigorou até 1985].

Como se exerceu a pressão americana?
Boa parte ocorreu nos bastidores. Sabemos das viagens dos dirigentes dos EUA. É muito raro que, num período eleitoral, o chefe da CIA, o secretário da Defesa, o conselheiro de Segurança Nacional, entre outros, visitem o mesmo país. Sabemos hoje que, para o setor antidemocrático das Forças Armadas brasileiras, a falta de apoio dos EUA foi um fator-chave. O ex-vice-presidente do Brasil, depois da derrota eleitoral, explicou aos seus seguidores que não havia mais nada a fazer. Ele sabia que uma parte da população desejava que as Forças Armadas dessem um golpe de Estado.

Está a referir-se ao general Hamilton Mourão?
Sim. Ele veio dizer [aos bolsonaristas] que entendia a insatisfação, mas que o ambiente internacional não o permitia. Outra explicação importante. Os EUA não pressionaram para que existisse uma vitória do Lula, pressionaram para que os generais reconhecessem o resultado eleitoral.

Para que houvesse respeito pela vontade popular?
Exato, e isso é muito significativo.

Porquê?
Por norma, vemos o envolvimento dos EUA com muito ceticismo, a perceção é de que só ocasionalmente defendem a democracia. Por terem vários regimes autoritários como aliados. Parece-me que Washington não queria uma rutura democrática no Brasil, talvez por recear um maior ostracismo brasileiro no Ocidente e isso facilitar a atuação chinesa no maior país da América do Sul. A China não se preocupa se os seus parceiros têm governos democráticos ou respeitam os direitos humanos. Com frequência, consolida a sua influência em Estados em situação de isolamento. Vejamos o que aconteceu com a Venezuela, com a Rússia e com uma série de países africanos que estão sob sanções ocidentais…

Interesses estratégicos…
Por um lado, evitar essa abertura estratégica à China; por outro, o fator Trump. Jair Bolsonaro posicionou-se como um dos principais fãs do ex-Presidente americano e questionou a legitimidade das eleições, em 2020. Para a administração Biden era muito importante evitar uma escalada autoritária na maior democracia do subcontinente.

Podemos dizer que a estrutura do Estado brasileiro já está desbolsonarizada? Os generais golpistas foram afastados?
Houve avanços, mas é um processo longo. Há que dizer que o Brasil, desde a sua independência, vive numa tensão permanente entre civis e militares. Vimos como logo no início do século XX – com o tenentismo – se criou a ideia de que os militares são mais patriotas, mais comprometidos com a nação, mais competentes, menos corruptos e que podem envolver-se em aventuras democráticas. Em momentos de crise, quando os civis se comportam de forma irresponsável, permanece essa ideia de que os militares precisam de atuar. É uma visão profundamente paternalista, como se os civis fossem crianças e os militares os adultos que precisam de intervir e supervisionar o que acontece. Isto é algo que um só governo não consegue eliminar.

Como assim?
É preciso demitir generais, afastar quem não denuncia situações graves. Como dizemos no Brasil, “o buraco é mais em baixo”. É uma questão que tem a ver com a educação e a formação dos militares, é preciso mudar os currículos nas academias. As nossas Forças Armadas nunca reconheceram de forma explícita as violações cometidas durante a ditadura [1964-1985] e isso deve-se ao processo de transição para a democracia, que foi excessivamente harmonioso.

Lula gostaria de ser um ator internacional como Modi, que tem um papel-chave na contenção da China. Só que a Índia é uma potência nuclear e tem o espaço de manobra estratégica que falta ao Brasil

Harmonioso?
Não teve nada a ver com o que aconteceu na Argentina, nos anos 80, em que houve um colapso moral das Forças Armadas e uma grave crise económica devido à guerra com o Reino Unido, como retrata o filme Argentina 1985[realizado por Santiago Mitre e protagonizado por Ricardo Darín]. No Brasil foi diferente. Foram os generais que conduziram a transição e ditaram que não haveria aquilo que eles designavam como “caça às bruxas”. Essas exigências foram cumpridas e, 35 anos depois, surge um indivíduo [Bolsonaro] com uma narrativa enviesada e romantizada da ditadura militar.

Que pode então ser feito?
O governo Lula tem de fazer mais para despolitizar as Forças Armadas, porque aqueles que estiveram envolvidos na elaboração de planos golpistas, aqueles que planearam a violência de 8 de janeiro de 2022, permanecem quase todos impunes.

Há processos a decorrer…
São processos simbólicos. Uma coisa é condenar cidadãos que estiveram em Brasília a destruir propriedade pública, outra coisa são os generais. Por enquanto, tudo indica que esses oficiais de alto escalão sairão ilesos. Temos o direito de questionar se algum general, se algum coronel, será expulso, será preso… No Brasil, o controlo civil sobre as Forças Armadas é muito mais recente do que parece. Só se criou um Ministério da Defesa em 1999. Antes, as chefias militares tinham assento no gabinete presidencial e faziam automaticamente parte do governo. O primeiro responsável pela pasta da Defesa com competência direta para decidir, por exemplo, orçamentos militares, foi Nelson Jobim [2007-2011]. Os outros cinco ministros civis que o antecederam não tinham poder nenhum.

Com Lula, a diplomacia brasileira voltou a ser “ativa e altiva”?
Esse conceito concebido por Celso Amorim [ex-ministro dos Negócios Estrangeiros e atual conselheiro do Presidente] voltou a ser recuperado logo a seguir às eleições de 2022. Ainda antes de tomar posse, em novembro desse ano, Lula foi ao Egito, à Cimeira do Clima, anunciar: “O Brasil está de volta.” De certa forma, é verdade, devido ao isolamento internacional causado por Jair Bolsonaro. O país deixou para trás a abordagem trumpista e de abandono do multilateralismo. Está novamente envolvido no combate às mudanças climáticas, regressou ao G-20, recebeu convite para participar no G-7…

Não é estranho que o Brasil tenha três grandes atores na sua política externa – Lula, Celso Amorim e Mauro Vieira [ministro dos Negócios Estrangeiros]? Que nem sempre parecem estar em sintonia…
Do ponto de vista geopolítico, está de volta, está mais ambicioso do que no tempo de Bolsonaro. Neste momento, tem uma abordagem que alguns chamam de não alinhamento, outros de multialinhamento, de neutralidade estratégica, de equidistância face às principais potências. É um caminho cada vez mais difícil num ambiente de grande turbulência geopolítica, com as relações entre os EUA e a China, ou entre a Rússia e o Ocidente, a piorarem. Claro que o Brasil quer manter e fortalecer os laços com o Ocidente, mas é o maior comprador mundial de diesel russo e também um dos maiores importadores de fertilizantes da Rússia. Lula já disse explicitamente que quer que Vladimir Putin esteja na cimeira dos G-20, no Rio de Janeiro, em novembro.

Um anúncio surpreendente…
O Brasil assinou o Estatuto de Roma [acordo que permitiu criar o Tribunal Penal Internacional e que entrou em vigor em 2002] e, portanto, em princípio, terá de prender o Presidente russo se este entrar em solo brasileiro. Isto parece o novo normal do Brasil. Em alguns momentos, parece estar do lado do Ocidente; em outros, não. Creio que existe uma intenção de aparente neutralidade, mas depois há a parte retórica. Lula gosta de falar de improviso, os assessores dele ficam em desespero. As palavras importam, pesam e muitas vezes atrapalham. Já tivemos afirmações dele muito controversas, das quais discordo em absoluto – sobre Zelensky e a Ucrânia, sobre Maduro e a Venezuela, sobre Israel e o Holocausto.

Lula está a comprometer a capacidade do Brasil de mediar alguns conflitos? Ou está a tentar ser o líder do Sul Global?
Ele gostaria de envolver mais o Brasil nas grandes questões. Sem dúvida que as nações do Sul Global têm de se sentar à mesa na hora de debater a reforma das instituições internacionais. O diretor do FMI tem de continuar a ser sempre um europeu? O presidente do Banco Mundial tem de ser americano? Os EUA e o Ocidente ainda ditam demasiadas condições. Porém, o que pode o Brasil fazer pelo futuro da Ucrânia? Conversei recentemente com dirigentes ucranianos e, na perspetiva deles, os governantes brasileiros demonstram ignorância sobre o conflito.

Um comentário que, presumo, lhe tenha sido feito na Conferência de Segurança de Munique [16-18 fevereiro].
Já antes ouvira algo assim. Em Munique não houve sequer uma participação brasileira de alto nível, com ministros e o Presidente [Lula estava na Etiópia, na Cimeira da União Africana]. A perceção na Ucrânia e no Ocidente é de que o Brasil tem simpatia pela Rússia.

Como é que Lula pode contrariar essa perceção?
Um dos países que inspiram o Brasil é a Índia. Narendra Modi [primeiro-ministro da Índia] também se posiciona de forma ambígua, compra armas e energia russas, mas é visto como um aliado do Ocidente. Creio que Lula gostaria de ser um ator internacional como Modi, que tem um papel-chave na contenção da China. Só que a Índia é uma potência nuclear e tem o espaço de manobra estratégica que falta ao Brasil.

Daí os entendimentos nos BRICS?
Os BRICS tornaram-se um instrumento-chave da política externa brasileira. Até Bolsonaro, que se apresentou como o candidato pró-EUA e anti-China, acabou por abraçar os BRICS – estava tão isolado no Ocidente, que se virou para os BRICS como uma espécie de seguro de vida diplomático. Mas a única coisa que une esse grupo é o incómodo com a liderança internacional dos EUA. Só que o Brasil possui uma visão reformista, não revolucionária, das organizações internacionais existentes. Por isso se opôs ao alargamento dos BRICS. Lula não quer pertencer a um clube antiocidental. Na próxima cimeira, em outubro, na Rússia, Putin pode ter a seu lado os presidentes do Irão, da Síria, da Bielorrússia…

O que pensa do fracasso das negociações entre a UE e o Mercosul?
Uma oportunidade perdida para todos. Parte das preocupações ambientalistas europeias em relação ao acordo é um protecionismo velado, porque não o assinar não vai preservar um centímetro de floresta no Brasil. Pelo contrário. O Brasil teria de adotar padrões ambientais muito mais exigentes. A alternativa é que o Brasil amplie agora o seu comércio com a China, que se importa muito menos com as questões ambientais.


Os ciclos da Inovação - Visual Capitalist

 


Lincoln Gordon pode ter sido o embaixador do golpe, mas para isso teve a ajuda do coronel Vernon Walters - Elio Gaspari (Globo, FSP)

O americano esteve em todas

Elio Gaspari


O Globo, domingo, 31 de março de 2024


Na manhã de hoje, há 60 anos, o embaixador americano Lincoln Gordon chegou à sua sala por volta das 9h15m. Ele sabia que o golpe estava por dias, mas não sabia que o general Olímpio Mourão Filho, comandante da Região Militar com sede em Juiz de Fora (MG), havia resolvido se rebelar. Quem o avisou que a coisa havia começado foi seu adido militar, o coronel Vernon Walters, um homem corpulento, amigo de militares brasileiros desde a Segunda Guerra Mundial.

Walters ralou durante esse dia. No fim da tarde achava-se que o general Castello Branco, seu colega de barraca na Itália e chefe do Estado-Maior do Exército, estava encurralado no Ministério da Guerra. (Falso, ele estava num aparelho na Zona Sul.) Um marechal avisou-o de que uma tropa legalista da Vila Militar marchava para Minas Gerais. Às 19h05m seu prognóstico era sombrio: “A rebelião parece estar perdendo ímpeto.”

Naqueles dias o Rio de Janeiro penava um racionamento de energia e bairros inteiros ficavam sem luz à noite. Perto das 23h, o marechal Lima Brayner, chefe do Estado-Maior da Força Expedicionária Brasileira durante a guerra, ouviu pancadas na entrada de serviço do seu apartamento de Copacabana, abriu a portinhola e viu, iluminado por uma vela, o coronel Walters. Brayner disse-lhe: “O Kruel acaba de lançar um manifesto.” “Graças a Deus”, respondeu Walters, um católico devoto.

A adesão do general Amaury Kruel, comandante da guarnição de São Paulo, havia decidido a parada. O marechal Cordeiro de Farias, patriarca de todas as sublevações militares do período resumiria a questão: “O Exército foi dormir janguista a acordou revolucionário.”

No dia 2 de abril, Walters passou pela casa de Castello Branco, em Ipanema. No dia 4, de novo, e também na do ex-presidente, marechal Eurico Dutra (1946-1950).

Eleito presidente, no primeiro dia de serviço, Castello convidou-o para um almoço no Palácio do Planalto. Walters presenteou-o com um abacaxi.

O coronel Walters entrou na mitologia das intervenções militares americanas como se, com seus seu pés enormes, esmagasse governos. Teria ajudado a derrubar o rei Farouk no Egito (1954), o premier Mossadegh no Irã (1953), os presidentes Manuel Prado no Peru e Arturo Frondizi na Argentina (1962), noves fora Jango. É um exagero.

Na vida real ele foi mais que isso. Onde houve encrenca ou mistério, lá está ele. Conversas secretas com chineses e vietnamitas? Foi Walters quem bateu à porta de embaixada chinesa em Paris com um recado do presidente americano Richard Nixon. Era em sua casa que Henry Kissinger se escondia para negociar com os vietnamitas do Norte. Escândalo do Watergate, que derrubou o presidente dos Estados Unidos? Ele era o vice-diretor da Central Intelligence Agency em 1972, quando a Casa Branca concebeu um estratagema para congelar as investigações do FBI. Walters e o diretor da CIA, Richard Helms, barraram a manobra.

Walters alistou-se no Exército para derrotar o nazismo e continuou na carreira para derrotar o comunismo. Em 1989, ele era embaixador na Alemanha e de sua janela viu o fim do Muro de Berlim. Morreu em 2002, aos 85 anos.

O homem que falava oito línguas

Walters era um interlocutor direto, dotado de um humor sarcástico. Costumava dizer que falava outras sete línguas (francês, italiano, espanhol, português, alemão, russo e holandês) mas não pensava em nenhuma. Seu português tinha pouco sotaque, como o de Roberto Campos.

Quando Fidel Castro lhe disse que estudou com padres, cortou:

— Yo también, pero me quedé fidel.

Quando era acusado de saber tudo sobre o Brasil, respondia.

— Se eu fosse isso tudo, não teria comprado um apartamento no Panorama Palace Hotel. (Lançado no Rio nos anos 1960, o Panorama foi um mico e hoje é chamado de Favela Hub.)

Walters alistou-se no Exército em 1941 antes mesmo que os Estados Unidos entrassem na guerra. Seu pai teve algum dinheiro, mas perdeu-o na Depressão dos anos 1930. Tinha talento para idiomas e lapidou-o na adolescência, como mensageiro de uma companhia de seguros da Babel de Nova York. Achou que com isso teria uma boa posição mas, de saída, virou soldado raso.

Um ano depois era tenente, na área de informações, e um coronel mandou que aprendesse português. Em 1943 foi designado para acompanhar oficiais brasileiros nos Estados Unidos e, mais tarde, na Itália. Daí em diante foi interprete das conversas de presidentes americanos com brasileiros, de Dutra a Médici, de Harry Truman a Richard Nixon. Teve dois padrinhos, o presidente Eisenhower e Averell Harriman, milionário, diplomata, ex-governador de Nova York grão-duque do partido democrata.

Depois de ter vivido alguns anos no Rio (e virar flamenguista), era adido militar em Roma em 1962, quando o embaixador Lincoln Gordon pediu ao presidente Kennedy que o removesse para o Rio, reforçando o dispositivo militar da embaixada. Walters moveu céus e terra para não sair de Roma, pensou em pedir passagem para a reserva. Em outubro o coronel desceu no Rio e teve 13 generais para recebê-lo no aeroporto.

Na noite de 13 de março de 1964 ele viu o discurso de João Goulart na casa do general Castello Branco. (O alto da testa de Castello batia abaixo da base do queixo de Walters, que o descreveria assim: “Baixo, robusto. O pescoço muito curto e a grande cabeça dão a impressão de que é corcunda”.)

Walters deixou o Brasil em 1967 como general. Uma semana depois da edição do AI-5, quando havia pressão para que os EUA se afastassem da ditadura, ele escreveu ao secretário de Estado Henry Kissinger defendendo a aliança:

“Se o Brasil se perder, não será outra Cuba. Será outra China”.

Walters foi adido militar em Paris, vice-diretor da CIA, embaixador nas Nações Unidas e em Berlim. Lá, pelo seu jeitão loquaz, o secretário de Estado James Baker evitava-o.

Washington manda, e Walters cumpre

Em 1966 a Polícia Federal prendeu dois americanos com contrabando de minérios na Amazônia. Um poderoso senador foi ao secretário de Defesa e pediu por eles. Walters recebeu o seguinte telegrama:

“Apreciamos seus francos comentários se há algo que possa ser feito nesse caso através de seus bons contatos com seus interlocutores militares brasileiros.”

Walters foi a Castello Branco dizendo-se envergonhado por encaminhar a gestão. Dias depois, as celas dos americanos amanheceram com as portas abertas e eles fugiram.

Missão impossível, Resgatar Kissinger

Quando: 1970.

Onde: Paris

O general Walters está no seu gabinete de adido militar na França e recebe uma mensagem de Washington informando que o avião que conduz do secretário de Estado Henry Kissinger para mais um encontro secreto com vietnamitas está sobre o Atlântico e será obrigado a descer no aeroporto de Frankfurt, na Alemanha.

Missão: Trazer Kissinger, incógnito, a Paris.

Walters desceu, caminhou até o palácio presidencial e pediu para ser recebido imediatamente pelo presidente francês Georges Pompidou. Expôs o seu caso: precisava de um avião para buscar o secretário.

Quando Pompidou perguntou-lhe o que Kissinger vinha fazer em Paris, respondeu que a viagem envolvia uma senhora.

Pompidou emprestou-lhe um jato militar, ele desceu em Frankfurt, atravessou a pista, mandou apagar os refletores e resgatou Kissinger. Seguindo a rotina, levou-o para seu apartamento, onde a empregada jamais soube quem era o hóspede.

Serviço:

Walters escreveu dois livros de memórias, o primeiro, “Missões silenciosas”, muito bom, tem edição em português.

 

Quem sabe o trabalho de Daniel Kahneman poderia ajudar na política econômica do governo Lula?

 

O que é a economia comportamental, que deu ao psicólogo Daniel Kahneman um Nobel de economia

Pesquisador morto nesta semana, aos 90 anos, deu contribuições importantes para a compreensão da tomada de decisões econômicas 

Com informações do The Washington Post e The New York Times

Por que a dor de perder R$ 100 é um sentimento muito maior do que o prazer de ganhar o mesmo valor? Foi a questões como essa, que exploram temas como a aversão à perda, que o psicólogo Daniel Kahneman, ganhador do Nobel de ciências econômicas, se dedicou ao longo de sua carreira como professor e escritor. Ele morreu na última quarta-feira, 27, aos 90 anos.

Conhecido como o pai da economia comportamental, Kahneman nunca fez um curso de economia, mas mesmo assim revolucionou a área, como conta Claudia Yoshinaga, coordenadora do Centro de Estudos em Finanças da Fundação Getulio Vargas (FGV). 

O trabalho de Kahneman, realizado em grande parte na década de 1970 e por muito tempo em colaboração com o também psicólogo Amos Tversky, demonstrou até que ponto as pessoas abandonam a lógica e tiram conclusões precipitadas. A pesquisa desenvolvida pelos dois teve impacto em outros campos que vão do esporte à saúde pública e foi creditada como responsável por mudar como os olheiros de beisebol avaliam novos talentos, os governos elaboram políticas públicas e os médicos chegam a diagnósticos médicos. 

Kahneman dedicou-se a desmascarar a noção do “homo economicus”, ou “homem econômico”, que desde a época de Adam Smith era considerado um ser racional que age por interesse próprio. Em vez disso, descobriu que as pessoas confiam em atalhos intelectuais que levam muitas vezes a decisões equivocadas que vão contra seus próprios interesses

Essas decisões equivocadas ocorrem porque os seres humanos “são muito influenciados por eventos recentes”, disse Kahneman. “Eles são rápidos demais para tirar conclusões precipitadas em algumas condições e, em outras, são lentos demais para mudar.” 

“Pode parecer absurdo dizer isso, mas a economia comportamental, na qual Kahneman foi pioneiro, se baseia na premissa de que nós somos humanos”, diz Claudia. “Inicialmente, a economia clássica parte do princípio que todo mundo é racional, pensa da mesma forma e terá escolhas semelhantes. Mas, no mundo real, as pessoas não são necessariamente racionais o tempo inteiro, elas não pensam exatamente igual e fazem escolhas diferentes”, explica. 

Segundo ela, as contribuições de Kahneman tiveram grande impacto. “Basta lembrar que ele é psicólogo e ganhou um prêmio Nobel de economia. Foi um reconhecimento muito grande da ciência como um todo de que, para discutir economia, era importante levar em consideração os aspectos psicológicos, o aspecto humano”, diz. 

O pesquisador ganhou o Nobel em 2002, “por ter integrado conhecimentos da pesquisa psicológica na ciência econômica, especialmente no que diz respeito ao julgamento humano e à tomada de decisões sob incerteza”, afirmou na época a organização. O prêmio foi dividido com Vernon L. Smith, pioneiro no uso de experimentos de laboratório na economia. Kahneman afirmou que seu parceiro de trabalho Amos Tversky merecia grande parte do crédito pela pesquisa ― Tversky havia morrido anos antes, em 1996, e o Nobel não é concedido postumamente.

Intuição e vieses 

Kahneman tinha uma visão negativa da capacidade das pessoas de pensar para resolver um problema. Suas ideias aparecem em seu livro Rápido e devagar: duas formas de pensar, lançado em 2012 no Brasil, onde ele afirma que “muitas pessoas são excessivamente confiantes, propensas a depositar muita fé nas suas intuições”. “Elas aparentemente consideram o esforço cognitivo pelo menos um pouco desagradável e o evitam tanto quanto possível”, escreve. 

No livro, ele explica os dois modos de operação da mente ― que ele não criou, mas organizou e desenvolveu: o sistema 1, no qual a mente, agindo rapidamente, depende da intuição, de impressões imediatas e de reações emocionais; e o sistema 2, no qual a mente, desacelerando, funciona de forma mais racional e analítica e consegue corrigir os erros cometidos pelo sistema 1. Kahneman argumenta que, na maior parte do tempo, a mente trabalha no sistema 1 e tira conclusões com base em intuição, vieses cognitivos e qualquer outra coisa que acelere o processo de julgamento.

Outros autores personificaram esses modos mentais como econs (pessoas racionais e analíticas) e humans (emocionais, impulsivas e propensas a exibir vieses mentais inconscientes e uma confiança insensata em regras de ouro duvidosas). 

Com Tversky, Kahneman realizou diversos experimentos para demonstrar esses vieses cognitivos. Um deles, por exemplo, apontou que muito mais pessoas estavam dispostas a fazer uma viagem de 20 minutos para economizar US$ 5 no preço de um produto que custava US$ 15, do que a fazer a mesma viagem para economizar a mesma quantia de dinheiro em um produto de US$ 125 ― o que se relaciona com o efeito de enquadramento (framing effect), ou seja, a forma como um problema se apresenta, que, segundo eles, pode alterar a tomada de decisão. 

“Essa questão do framing effect também se relaciona com a teoria da perspectiva, proposta pelos dois, que diz que a dor de perder R$ 100, por exemplo, é maior que a alegria de ganhar de R$ 100. Então, mesmo que as situações sejam equivalentes, você enquadra a questão para a pessoa de modo que ela entenda que é um ganho ou que é uma perda e a tomada de decisão será diferente”, explica Claudia Yoshinaga, da FGV. “Essa ideia de que somos mais do que avessos a risco, nós somos avessos a perdas, foi uma grande contribuição do Kahneman e do Tversky”, acrescenta. 

A teoria da aversão à perda sugere que é tolice verificar a carteira de ações com frequência, pois a predominância da dor sentida no mercado de ações provavelmente levará a uma cautela excessiva e possivelmente autodestrutiva.

Em outros experimentos, Kahneman e Tversky demonstraram outras tendências mentais que influenciam o julgamento das pessoas. Eles apresentaram a estudantes uma personagem fictícia, Linda, de 31 anos, como alguém que era ativista na faculdade, preocupada com discriminação e justiça social e participante de manifestações antinucleares. 

Então perguntaram o que era mais provável: que Linda fosse caixa de banco ou que Linda fosse caixa de banco e ativa no movimento feminista. A grande maioria optou pela segunda opção, que seria a escolha menos provável porque a probabilidade de duas condições será sempre menor do que a probabilidade de qualquer uma delas. O experimento apontou a chamada falácia da conjunção, outra forma pela qual as pessoas às vezes tiram conclusões precipitadas.

Kahneman também se debruçou sobre a distorção psicológica entre o bem-estar “experimentado” e “lembrado” e sua conclusão foi de que a experiência lembrada é, em grande parte, determinada por seu “pico” (momento mais intenso) e pelo seu fim: se o final de um período de férias for agradável, as pessoas tendem a lembrar de todo o período de forma positiva; se houver menos dor no fim de um procedimento médico, as pessoas lembrarão de toda a experiência como menos dolorosa. Suas descobertas apontam que, às vezes, a experiência lembrada é mais importante do que a experiência em si. 

“Mesmo que as ideias de Kahneman remontem à década de 1970, elas continuam superatuais e relevantes”, afirma Claudia. 

O psicólogo e autor de Harvard Steven Pinker afirmou ao The Guardian, em 2014, que a mensagem central de Kahneman não poderia ser mais importante: que a razão humana deixada por conta própria está apta a se envolver em uma série de falácias e erros sistemáticos. “Portanto, se quisermos tomar melhores decisões em nossas vidas pessoais e como sociedade, devemos estar cientes desses vieses e buscar soluções alternativas. Essa é uma descoberta poderosa e importante”, disse. 

O colunista do The New York Times David Brooks escreveu em 2011 que, antes de Kahneman e Tversky, as pessoas que pensavam sobre problemas sociais e comportamento humano tendiam a presumir que somos, em sua maioria, agentes racionais. “Elas presumiam que as pessoas tinham controle sobre as partes mais importantes de seu próprio pensamento. Eles presumiram que as pessoas são basicamente maximizadores de utilidade sensatos e que, quando se afastam da razão, é porque alguma paixão, como o medo ou o amor, distorceu seu julgamento.”

Mas os professores Kahneman e Tversky, continuou ele, “produziram uma visão diferente da natureza humana”. Brooks descreveu: “Somos jogadores em um jogo que não entendemos. A maior parte de nosso próprio pensamento está abaixo da consciência”. E acrescentou: “Nossos preconceitos frequentemente nos levam a querer as coisas erradas. Nossas percepções e memórias são escorregadias, especialmente sobre nossos próprios estados mentais. Nosso livre arbítrio é limitado. Temos muito menos controle sobre nós mesmos do que pensávamos.”

O livro mais recente de Kahneman, Ruído: Uma falha no julgamento humano, publicado em 2021 e escrito com Cass Sunstein e Olivier Sibony, analisa outro tipo de viés, que faz com que médicos deem diagnósticos diferentes para o mesmo problema e juízes deem sentenças diferentes para o mesmo crime, entre outros. É o chamado “ruído”: enquanto os vieses previsíveis ocorrem quando, por exemplo, um juiz sempre condena com mais severidade réus negros, o “ruído” diz respeito a decisões menos explicáveis resultantes do que é definido como “variabilidade indesejada nos julgamentos”.

Por Heloísa Scognamiglios, com informações do The Washington Post e The New York Times

Macron fez Lula avançar um pouco mais do que gostaria na questão das eleições venezuelanas - Lourival Sant'Ana (Estadão)

A visita de Macron e o tímido afastamento de Lula da ditadura venezuelana 

Política externa brasileira teve um reencontro com o Iluminismo com a visita do presidente francês. É cedo para dizer se foi o despertar de um longo e profundo sono dogmático 

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Por Lourival Sant'Anna ( ESTADAO / 31mar24)

A política externa brasileira teve um reencontro com o Iluminismo. Se foi o despertar de um longo e profundo sono dogmático ou apenas um breve clarão em meio às trevas, é cedo para dizer. Em três dias de visita, Emmanuel Macron percorreu sorridentemente com Lula os eixos estratégicos das relações Brasil-França. O presidente brasileiro aproveitou o instante de lucidez até para se desmarcar, ainda que timidamente, da ditadura venezuelana.

Lula e Macron têm vários pontos em comum. Ambos enfrentam uma oposição autoritária, governam países amazônicos, recusam-se a se alinhar com os EUA e detestam Jair Bolsonaro.

Eles se comprometeram em Belém a investir 1 bilhão de euros em iniciativas de conservação e desenvolvimento sustentável nos próximos quatro anos na Amazônia brasileira e na Guiana Francesa. Isso é quase três vezes todo o Fundo Amazônia.

No fórum empresarial Brasil-França, em São Paulo, com ênfase na transição energética, Macron celebrou aumento de 26% nos investimentos franceses no Brasil, ultrapassando estoque de 40 bilhões de euros. Mais de 1.100 filiais de empresas francesas atuam no Brasil. Com mais de meio milhão de contratados, os franceses são os maiores empregadores estrangeiros aqui.

Até mesmo em um ponto prejudicial aos interesses do Brasil, a implosão do acordo Mercosul-União Europeia, os dois presidentes estão alinhados. Macron acredita no livre comércio, mas não encontra condições políticas para fazer frente ao protecionismo agrícola francês, explorado por sua rival Marine Le Pen.

Lula não acredita em livre comércio. Há mais de 20 anos ele protege os setores da indústria e dos serviços da competição externa. Em seu primeiro mandato, torpedeou a criação da Área de Livre Comércio das Américas.

Lula respondeu ao banimento europeu às importações de commodities associadas ao desmatamento com outro obstáculo: a proteção das compras governamentais. Assim, os dois amigos podem culpar um ao outro pelo sepultamento do acordo.

No Rio, ambos viram a Marinha brasileira lançar ao mar o submarino Tonelero, o terceiro construído com tecnologia francesa. Macron afirmou que a França não transferiu tanta tecnologia de defesa a nenhum outro país. A parceria envolve a construção de cinco submarinos, o último deles com propulsão nuclear.

O Brasil tem outros cinco submarinos, fruto de parceria com a Alemanha, que também compartilhou tecnologia. É o único país do Hemisfério Sul com capacidade de construir submarinos. Essas armas são estratégicas para a proteção da vasta e rica costa brasileira. A propulsão nuclear eleva sua autonomia e reforça seu maior ativo: a invisibilidade.

Noutro lampejo, o presidente brasileiro abandonou o discurso contra a aquisição de armas, que o levou no passado recente a acusar Estados Unidos e Europa de terem interesse em fomentar a agressão russa contra a Ucrânia. “Queremos ter conhecimento para garantir a todos os países que querem paz que saibam que o Brasil estará ao lado de todos porque a guerra não constrói, a guerra destrói”, discursou.

É o poder de dissuasão, e não a retórica pacifista, que previne guerras. O escritor romano Flávio Vegécio já sabia disso no século 4: “Aquele que deseja a paz precisa se preparar para a guerra”.

Macron afirmou que potências pacíficas como França e Brasil têm de “falar com firmeza e força”, caso não queiram ser “lacaios” de outras nações: “Nós temos a mesma visão de mundo. Rejeitamos um mundo que seja prisioneiro da conflitualidade entre duas grandes potências. E temos de defender nossa independência, nossa soberania e o direito internacional”.

Macron é herdeiro de uma antiga tradição francesa, que preconiza um sistema de defesa europeu robusto e independente dos EUA. A França não faz parte da estrutura militar da Otan, mesmo sendo aliada. Esse propósito se tornou mais crítico para a Europa com a ascensão de Donald Trump, que ameaça violar as alianças de defesa dos EUA.

Ao mesmo tempo, Macron é um dos líderes da ajuda militar à Ucrânia, e tem afirmado que a Rússia precisa ser derrotada. Mas não se espera que Lula entenda isso. O Brasil não é relevante nessa questão.

Na região em que o Brasil pode exercer um papel, a América Latina, Lula parece ter entendido algo. “Não tem explicação jurídica, política, você proibir um adversário de ser candidato”, disse ele sobre a exclusão da candidata da oposição venezuelana, Corina Yoris, por sua vez substituta da verdadeira candidata impedida de disputar a eleição presidencial, María Corina Machado.

Macron precisa voltar mais vezes.

Trump é intelectualmente muito limitado (como Bolsonaro, aliás)

Unveiling the Truth: Donald Trump's Intellectual Shortcomings Exposed in His Own Words

Throughout his public life, Donald Trump has exhibited a pattern in his speech and behavior that suggests his intellectual capacity might be questioned. His frequent use of simple, repetitive vocabulary and his struggle to convey coherent, in-depth thoughts on complex subjects have been notable. For instance, analyses of his speeches, like those conducted by Factbase, show a tendency towards elementary language, with a preference for words that resonate with emotion rather than intellect.

Trump's performance in debates and interviews often reveals a limited grasp of detailed policy or global affairs. For example, in a 2016 interview with The Washington Post, Trump's responses to questions about foreign policy were vague and superficial, lacking in specific details or understanding. Similarly, his 2020 Axios interview on HBO displayed challenges in addressing detailed statistics and health policy nuances related to the COVID-19 pandemic.

While some supporters hail his approach as "intuitive genius," attributing his success to instinctual and impulsive decision-making, this perspective may overlook the necessity for analytical depth and critical thinking in governance. Trump’s strength seems to lie in his ability to connect with certain voter bases through direct, forceful language and populist assertions, rather than through substantive, evidence-based argumentation.

His approach to communication and decision-making, often seen as eschewing complexity in favor of gut reactions and bold assertions, has sparked debate over the nature of intellectual capability. While effective for rallying a particular segment of the populace, these characteristics have led to scrutiny of his intellectual depth when navigating the intricacies of political and social issues.


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Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...