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terça-feira, 26 de março de 2013

Maravilhas da diplomacia comercial companheira - Suely Caldas


O comércio do Brasil acorrentado
SUELY CALDAS
O Estado de S.Paulo, 24/03/2013

Não foi só o truque de deixar para janeiro o lançamento de importações de petróleo feitas em 2012 o único causador do enorme déficit de US$ 5.5 bilhões da balança comercial registrado até agora. O governo parece não se dar conta, mas o fato é que as exportações têm caído fortemente em quantidade, sinalizando tratar-se de um problema estrutural, a exigir tratamento também estrutural para tentar virar o jogo do nosso comércio com o mundo.
A Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex) constatou que em fevereiro a quantidade de produtos exportados caiu 13,2% em relação a fevereiro de 2012. E uma queda expressiva que precisa ser levada a sério, não menosprezada. Por mais que o ministro Guido Mantega insista na ladainha de culpar a crise internacional, a verdade é que o Brasil vem perdendo mercados em países onde a crise passa ao largo e que em 2012 registraram crescimento muito acima do nosso pibinho de 0,9%.
Em política comercial, o Brasil tem seguido na contramão do mundo. Isola- se, em vez de se integrar. E quando sai do isolamento busca parceiros errados. País que mais cresce na América Latina, o Chile escolheu caminho inverso ao do Brasil: abriu sua economia; reduziu tarifas de importação; ao expor sua indústria à concorrência com importados, melhorou seu produto em qualidade e preço; e adotou uma pragmática política comercial de fechar acordos com países e blocos econômicos isoladamente, o que lhe tem rendido bons resultados. Assinado em 2004, o acordo com os EUA expandiu as exportações chilenas em 31% já no ano seguinte. Nessa mesma época o Brasil rejeitava dar prosseguimento à Área de Livre Comércio das Américas (Alca) por puro preconceito ideológico e complexo de inferioridade: alegara que a Alca daria ganhos aos poderosos e ricos EUA e perdas aos países pobres da América. O PT falava o mesmo da globalização, e hoje a crise econômica abala os ricos, não os pobres.
Números de 2012 comparados com 2011 mostram que a crise pode explicar as perdas com os países europeus (que poderiam ser menores ou até nulas, se o comércio fosse amparado por um tratado de comércio com a União Europeia), mas não explicam com a China, a Rússia e a Argentina. De 2011 a 2012 nossas exportações para esses três países caíram nada menos que US$ 8,7 bilhões (US$ 3,1 bilhões com a China, US$ 4,7 bilhões com a Argentina e US$S 900 milhões com a Rússia). A economia chinesa desacelerou, desculpa-se o governo. Nada, cresceu 7,8% em 2012. As razões são outras, e os velhos e não resolvidos gargalos em estradas e portos são uma delas. A outra é o prometido acordo de comércio entre os Brics (Brasil, China, índia, Rússia e África do Sul), que não anda.
Foto de capa deste jornal na sexta-feira mostrou uma fila interminável de caminhões parados que levam horas, dias paia descarregar soja no Porto de Santos. Com isso, o embarque nos navios caiu 40% no 1.° bimestre. Esse enorme atraso nos embarques produz estragos: a importadora chinesa Sunrise acaba de cancelar a compra de 2 milhões de toneladas de soja do Brasil, transferindo-a para a Argentina. "Não adianta nada ter um preço bom se a soja não é entregue", disse ao Estado Shao Guorui, gerente comercial da Sunrise. Com isso o Brasil perdeu um negócio de US$ 1 bilhão.
Com seu protecionismo, a Argentina tem sistematicamente violado regras do Mercosul e forçado a queda de vendas do Brasil. Aliás, por vezes o Mercosul mais prejudica do que ajuda o Brasil. O caso da União Europeia é emblemático: desde 1999 o bloco do Mercosul discute um ambicioso acordo de zona de livre comércio com a Europa. As negociações paralisaram e o governo brasileiro se sente preso, impedido de negociar sozinho um pacto que abriria as portas de 27 países para o Brasil.
A tendência do mundo inteiro é a integração, não o isolamento, não a exclusão. Nos últimos anos a União Europeia concluiu acordos com Canadá, Cingapura e Coréia do Sul e está nos detalhes finais com Japão, Vietnã e Tailândia. O mundo avança por esse caminho. Por que o Brasil deve ficar preso aos briguentos vizinhos do Mercosul?

segunda-feira, 25 de março de 2013

Ladrao que rouba ladrao...

...tem cem anos de perdão?
Calma, não estou acusando os nossos estimados russos atuais, pós-soviéticos (será mesmo?), de serem ladrões, longe disso.
Claro, sabemos de alguns poucos que insistem no capitalismo mafioso, na corrupção desenfreada, na promiscuidade entre bens públicos e propriedade privada, nos desvios de justiça, nas manipulações estatais sobre bens públicos e privados, enfim em tudo isso, mas eles são muito poucos, pouquíssimos e absolutamente não são representativos da sociedade e do Estado russo atuais, corretos, honestos, transparentes, todos eles engajados num sistema de mercado luzídio, aberto, concorrencial, limpíssimo. Não podemos confundir as maçãs podres com a caixa de frutas, sobretudo com aquelas que vão para a salada de frutas, apreciada das novas elites, que professam amizade eterna ao Ocidente e aos valores democráticos, que amam a OTAN e tudo o que sai do G7.
Estou me referindo aos bárbaros bolcheviques, que quase cem anos atrás decretaram o calote oficial da dívida externa, confiscaram a propriedade de estrangeiros, capitalistas exploradores e banqueiros sedentos de lucros extraordinários, enfim todos os exploradores capitalistas que foram, finalmente, expropriados pela gloriosa revolução de Outubro, o farol do proletariado que se levantou contra a burguesia, os kulaks e os imperialistas, no que fizeram muito bem.
Ops, parece que agora esses detestáveis personagens do capitalismo monopolista internacional, com a ajuda dos esbirros do FMI e dos seus asseclas colonizados de países dependentes, resolveram se vingar do roubo perpetrado em 1917, e pegaram os camaradas russos de supresa, confiscando todas as riquezas honestamente amealhadas em duas décadas de construção do capitalismo na Rússia.
Durma-se com um barulho desses...
Paulo Roberto de Almeida

Russian Leader Warns, “Get All Money Out Of Western Banks Now!”
CantonDailyLedger
22 Mar 2013

A Ministry of Foreign Affairs (MFA) “urgent bulletin” being sent to Embassies around the world today is advising both Russian citizens and companies to begin divesting their assets from Western banking and financial institutions “immediately” as Kremlin fears grow that both the European Union and United States are preparing for the largest theft of private wealth in modern history.

According to this “urgent bulletin,” this warning is being made at the behest of Prime Minister Medvedev who earlier today warned against the Western banking systems actions against EU Member Cyprus by stating:

“All possible mistakes that could be made have been made by them, the measure that was proposed is of a confiscation nature, and unprecedented in its character. I can’t compare it with anything but … decisions made by Soviet authorities … when they didn’t think much about the savings of their population. But we are living in the 21st century, under market economic conditions. Everybody has been insisting that ownership rights should be respected.”

Medvedev’s statements echo those of President Putin who, likewise, warned about the EU’s unprecedented private asset grab in Cyprus calling it “unjust, unprofessional, and dangerous.”

In our 17 March report “Europe Recoils In Shock After Bankster Raid, US Warned Is Next” we noted how Russian entities have €23-31 billion ($30-$40) in cross-border loans to Cypriot companies tied to Moscow, and €9 billion ($12 billion) on deposit with Cypriot banks [as compared to the €127 billion ($166 billion) being kept in similar circumstances by 60 of the United States largest corporations in offshore accounts to avoid paying American taxes] which are in danger of being confiscated by EU banksters.

Demagogia educacional e mediocridade universitaria: duas marcas registradas do...

... vocês sabem de quem. Diretamente do MECdinossauro, mas ele é o puro resultado da republiqueta dos companheiros, que promoveram um dos maiories idiotas do Brasil, Paulo Freire, a "patrono da educação brasileira". O resto foi feito por ideologia, máfias sindicais de professores e funcionários, militantismo pé de chinelo de ignorantes travestidos em universitários gramscianos, enfim, toda uma malta de promotores ativos da mediocridade universitária e da deterioração da qualidade do ensino, em todos os níveis, do kindergarten ao pós-doc...
O desastre é incommensurável, e o Brasil vai pagar um preço altíssimo por isso. A tendência é que tudo continue a piorar pelo futuro previsível. Se, e a partir de quando (o que é altamente improvável), houver uma correção de rumos, algo que julgo difícil de acontecer, ainda demoraria 10 ou 15 anos para começar a melhorar um pouqinho. Como isso não vai ocorrer em minha vida útil, só posso prenunciar a continuidade do desastre pelo fim dos tempos.
Não se conserta um pau torto facilmente. O mais sensato seria arrancá-lo e plantar outra árvore no lugar, mas parece que isso não vai ocorrer, conhecendo como funcionam as faculdades de pedagogia no Brasil, um viveiro de saúvas freireanas. Não tem jeito, ao que parece.
Se, em matéria de economia sou moderadamente pessimista (ou seja, acredito que o Brasil vai continuar exibindo taxas medíocres de crescimento, se arrastando penosamente em direção à modernidade), em matéria de educação sou absolutamente pessimista, acreditanto que o Brasil vai continuar aceleradamente seu itinerário para trás, destruindo tudo o que de positivo vinha sendo penosamente construído nas décadas anteriores.
Os militantes gramscianos da educação são como os bárbaros de Atila: onde passam semeiam a destruição.
Paulo Roberto de Almeida

Mesmo com cotas, universidades estaduais e federais têm queda de alunos de escolas públicas nos vestibulares. Sabem por quê? Porque o governo escolheu o caminho errado sob o aplauso dos demagogos e o silêncio dos covardes
Reinaldo Azevedo, 25/03/2013

Vejam que coisa! O cotismo não levou mais alunos das escolas estaduais e municipais para os vestibulares das universidades públicas. Não é espantoso? NÃO! É ATÉ BASTANTE ÓBVIO. Vamos a algumas considerações prévias para chegar ao “x” da questão.

Dei destaque ontem aqui a uma reportagem do Globo sobre a situação miserável da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e observei que se tratava de um sintoma apenas. A doença é bem mais grave. Nestes dez anos de governo do PT, a educação é a área em que se produziram mais farsas e mistificações. A pantomima na correção das redações do Enem ilustra de forma debochada e trágica a farsa. Dado o andar da carruagem, vai demorar até que se encontre o caminho — na hipótese de que seja encontrado… Qual é a questão central? Trocou-se a qualidade pela demagogia inclusiva. Os críticos da política oficial certamente não se surpreendem com as reiteradas evidências de baixa qualidade do ensino universitário no país. O que surpreende a todos, inclusive os críticos, é que as medidas ditas redentoras e igualitárias não conseguem ser… inclusivas! Você verão.

Quais são as críticas principais da maioria dos que se opõem às políticas de cotas, pouco importando a sua natureza? Em primeiro lugar, o cotismo nega o fundamento da igualdade consagrado na Carta Magna. Quando o Supremo Tribunal Federal considerou constitucional a medida, abriu as portas para o imponderável. Com apelos malparados a Rui Barbosa, afirmou-se que é preciso, em certas circunstâncias, tratar desigualmente os desiguais. Que seja! Mas isso só é aceitável no caso de se conferirem benefícios suplementares ao “desigual”.

Solapar direitos universais de uma parte dos brasileiros — e as cotas fazem isso à medida que impedem que todos concorram segundo as mesmas regras — para proteger outra parte é um absurdo em si. Se a história de cada um de seus respectivos familiares torna os homens diferentes e se se chega à conclusão de que essas diferenças são social e politicamente determinadas, então que se alterem essas condições. O que não é razoável é que o indivíduo “A” tenha solapado um direito em favor do indivíduo “B” para fazer reparação histórica. Ora, desde o direito romano, a dívida do pai não passa para o filho… Imaginem se faz sentido indivíduos pagarem “dívidas sociais” relacionadas à cor da pele ou à origem de classe. Isso é uma boçalidade e uma violência institucional. Se querem tratar desigualmente os desiguais, reitero, que se deem a esses desiguais benefícios suplementares. Mas esse é só o aspecto que diz respeito à lei. Há outro mais sério.

Os críticos das cotas, raciais ou sociais, sustentam o óbvio, o elementar: é preciso qualificar os ensino fundamental e médio públicos. O cotismo, infelizmente, concorre para fazer o contrário: à medida que as vagas estão “garantidas”, é evidente que diminui a pressão sobre a escola pública e seus agentes. “Ah, mas melhorar a escola púbica vai levar muito tempo…” Bem, quanto mais tarde começar, pior. De resto, o fato de uma ação correta não ter um efeito imediato não confere licença para se fazer a coisa errada.

Cotas irrelevantes
Leiam o que informa Erika Fraga, na Folha desta segunda (em vermelho):
Entre dez universidades que enviaram dados à Folha, USP e Unicamp (São Paulo), UERJ (Rio de Janeiro) e UFMG (Minas Gerais) registraram queda no percentual de vestibulandos formados na rede pública de ensino. Em outras três universidades, a fatia se alterou pouco.  Os alunos das públicas ainda são minoria na maior parte dos vestibulares das instituições públicas, embora representem 85% dos que concluem o ensino médio no país, percentual que aumentou na última década. As universidades federais de Santa Catarina (UFSC) e do Rio Grande do Sul (UFRGS) estão entre as que tiveram aumento de alunos das escolas públicas em seus vestibulares.
Ainda assim, Júlio Felipe Szeremeta, presidente da comissão de vestibular da UFSC, diz que “não houve o boom esperado”. Em 2012, o percentual de vestibulandos de escolas públicas atingiu 37,5% na UFSC. “Imaginávamos que o percentual de vestibulandos de escola pública já teria chegado a 50%.” Já na Universidade Federal da Bahia (UFBA) houve queda no número de inscritos no vestibular saídos de escolas públicas após a adoção do regime de cotas em 2005. A tendência só foi revertida a partir de 2010, depois de um aumento no número de cursos noturnos de 1 para 33.

(…)

Voltei
Notem que não só não houve aumento como pode ainda haver queda, como no caso da UFBA — só se conseguiu reverter a tendência com cursos noturnos. Isso tudo faz sentido? Faz um brutal sentido! O próprio aluno oriundo do ensino médio público sabe que, na maioria das vezes, está despreparado para enfrentar alguns desafios. Sabe a escola em que estudou; conhece todos os seus defeitos.

Houve crescimento do número de universitários do país? Houve, sim, embora tenham ficado muito abaixo da meta. Em 2001, havia 3 milhões de estudantes matriculados nas universidades do país (públicas e privadas); no fim de 2010, eram 6,37 milhões, segundo o Censo Universitário do MEC. Mas calma!!! Nada menos de 14,7% desse total (quase um milhão) está matriculado na modalidade “ensino a distância” Com raras exceções, esse troço virou, no Brasil, um caça-níqueis ainda mais vantajoso do que instituições de ensino meia-bomba que vendem suas vagas para o ProUni. Não passa de picaretagem!  A meta do Plano Nacional de Educação, estabelecida em 2000, era chegar a 2010 com 33% dos jovens de 18 a 24 anos na universidade. Segundo o Censo, o governo do Apedeuta ficou bem longe disso: apenas 17,4%. E está nesse patamar até hoje.

Como se explica?
O crescimento está abaixo da meta, mas cresceu. Para onde foram os alunos? Para as instituições privadas, boa parte deles financiada pelo ProUni. É claro que existem instituições qualificadas. Infelizmente, não é a regra, e parcela considerável dos estudantes que buscam essas instituições quer um curso à altura do ensino fundamental e médio que teve — sendo ainda mais claro: prefere uma universidade privada e ruim (o ProUni pagará a conta) a uma pública e com mais qualidade (escrever “boa” talvez seja exagero). Voltamos, então, o “x” da questão. Desde sempre, o grande desafio é qualificar o ensino fundamental e médio públicos.

E que se observe: é mentira que não haja alunos de escolas públicas nas instituições universitárias também públicas. Há, sim! A questão é saber onde estão. Não tenho os números aqui, mas estou certo de que são mais presentes em cursos como pedagogia, história, geografia, letras, sociologia e filosofia, para citar alguns… E raros em engenharia, medicina e odontologia. De toda sorte, os números estão a indicar que as cotas não causaram uma elevação da demanda nas universidades públicas nem naquelas carreiras que não requerem tempo integral. São as instituições privadas, por conta do ProUni, que abrigam a massa de estudantes pobres.

Reserva de vagas
Por força de lei, as universidades federais terão de reservar 50% de suas vagas a alunos das escolas públicas em todos os cursos, obedecendo depois a critérios de cor de pele. É o “jeitinho PT” de fazer as coisas. Como se considera, no fim das contas, que o problema do ensino fundamental e médio públicos é mesmo insanável, busca-se “fazer justiça” na ponta, lá na universidade — que é feita para os mais aptos em qualquer país do mundo, nos EUA, na China ou em Cuba…

Quando estiver em pleno funcionamento, haverá o risco de sobrar vagas daquela metade reservada aos alunos da escola pública. Hoje, como mostra o levantamento, eles já poderiam ser mais presentes nas universidades federais e estaduais, mas, tudo indica, têm preferido as instituições privadas por intermédio do ProUni porque, com alguma frequência, esses cursos se transformaram numa espécie de cartório. Um cartório que custa caro!

É evidente que aqueles que criticam as cotas e pedem a elevação da qualidade do ensino público estão certos. É claro que não é fácil. Para tanto, precisávamos ter governos comprometidos com a educação, não com a demagogia eleitoreira. Sim, demoraria um pouquinho, eu sei. Mas esse é “pouquinho” é nada quando confrontado com a danação eterna a que está hoje condenada a educação. 

O fascismo em construcao no Brasil: o Estado administra a sua vida...

Este é mais um aspecto do fascismo em construção no Brasil, que vem sendo aceito passivamente pela sociedade. Além de termos um Estado babá, que pretende nos resguardar de certos perigos, para o nosso prórpio bem, temos o Estado feitor, que pretende ditar condutas e nos obrigar a certas coisas, contra nossa própria vontade.
Mentalidades fascistas acham que podem controlar o que fazemos. E conseguem, em certa medida. Depois vão querer controlar o que pensamos...
Paulo Roberto de Almeida

Ciência e liberdades

o Estado de S.Paulo, 25 de março de 2013
Denis Lerrer Rosenfield *
 
Aparentemente, o título deste artigo não faria nenhum sentido, considerando a época em que vivemos, na qual a pesquisa científica goza de uma ampla liberdade, garantida por universidades e institutos de pesquisa. Vai longe o tempo em que Giordano Bruno e Galileu foram condenados à morte, no caso do primeiro, com requintes da fogueira pública.

No entanto, a liberdade de que goza a pesquisa científica vem tendo um contraponto na utilização pelo Estado dos produtos dessa mesma pesquisa. Isso é particularmente visível no uso da ciência por políticas públicas de saúde, como se a certeza do conhecimento devesse traduzir-se por um controle "científico" do comportamento humano. Resultados de pesquisas ou, muitas vezes, meras hipóteses não verificadas são utilizados como instrumentos de ações governamentais, como se assim estivessem justificados.

Tais ações públicas estão particularmente presentes nas políticas conduzidas contra alimentos gordurosos, bebidas açucaradas, bebidas alcoólicas ou cultivo e consumo de tabaco. Governos arrogam-se direitos de intervenção na vida dos cidadãos, supostamente amparados no conhecimento científico. A justificação da restrição das liberdades não seria, então, arbitrária, mas científica. A dominação mudou de nome.

É próprio do progresso científico que seus resultados sejam tornados públicos, vindo a balizar, no caso, a vida das pessoas se elas optarem por seguir esse conhecimento adquirido. Se elas optarem, não se trata, ou não deveria tratar-se, de uma obrigação imposta pelo Estado.

A diferença é de monta. Uma coisa é as pessoas, de posse de certos conhecimentos, optarem por não consumir determinado produto por considerá-lo prejudicial à sua saúde. Nesse sentido, seria função do Estado informar os cidadãos sobre malefícios reais ou prováveis à saúde das pessoas do consumo de tais produtos. Outra, muito diferente, é o Estado impor determinadas condutas restritivas da liberdade de escolha, em nome de um conhecimento científico apropriado pelo governo com vista a seus fins específicos. Os cidadãos seriam despojados de sua liberdade de escolha.

Consequentemente, estaríamos diante de algo extremamente perigoso, a saber, a administração da vida. Pior ainda, a administração "científica" da vida. Cidadãos tutelados são cidadãos administrados, incapazes de discernir por si mesmos o que é "bom" para eles.

A pior administração é a que se diz "verdadeira", "científica", como se coubesse ao Estado optar no lugar dos cidadãos. Cidadãos administrados cientificamente tendem a se tornar servos do Estado. A eles é reservado um lugar específico, o de serem destituídos do conhecimento "verdadeiro", esse que lhes é imposto à sua revelia.

A comunidade científica, à medida que avança no terreno do político, começa a abandonar o seu terreno próprio, vindo a se tornar uma parte do problema, em vez de poder ser um elemento de sua solução. No momento em que entra na seara da política, ela corre o risco de colocar o seu próprio trabalho sub judice.

Melhor fariam os cientistas em avançar em suas pesquisas, mostrando, por exemplo, os elementos e produtos eventualmente prejudiciais à saúde dos indivíduos. Não lhes compete uma conduta de "cruzados" pelo controle "científico" dos cidadãos. Cidadãos devem ser informados, não tutelados. A sua liberdade de escolha deve ser, antes de tudo, preservada, tratando-se de um direito fundamental do ser humano.

A ideia de que caberia ao Estado simplesmente administrar a vida dos cidadãos segundo critérios "verdadeiros" não é nova, tendo produzido historicamente resultados catastróficos. Está amparada numa concepção de que o Estado, graças à sua "sapiência", sabe o que é melhor para os cidadãos, que não têm o alcance desse discernimento.

Em sua forma extrema, ela foi concebida e levada a efeito na extinta União Soviética, que sucumbiu, aliás, ao seu excesso de "verdade" e de "conhecimento". Bukharin, dileto discípulo de Lenin e destacado teórico bolchevique, chegou a escrever que num Estado de uma sociedade sem classes - logo, o Estado "bom" e "verdadeiro" - a sua função essencial seria somente "administrar" a sociedade e os cidadãos.

Tal administração seria, então, conduzida por burocratas "sapientes", "científicos", convenientemente doutrinados, que saberiam impor aos cidadãos o que seria melhor para eles. E não apenas a contragosto, mas pelo uso da força e da imposição, se necessário.

O direito de ser obeso é um direito fundamental, se assim a pessoa optar. Não se trata de impor aos que estão acima do peso considerado normal determinada conduta, que termina, ademais, atingindo todos os cidadãos. Em nome da suposta saúde dos obesos, todos os cidadãos, magros ou não, seriam obrigados a não mais consumir certos produtos.

O direito de beber, mesmo até a embriaguez, se ela não perturbar o próximo, é também um direito fundamental, o exercício que qualquer cidadão faz do seu gosto, sem nenhuma restrição. Cabe, evidentemente, ao Estado informar os cidadãos sobre os malefícios do seu consumo excessivo.

O direito de fumar - assim como a produção de tabaco é um direito proveniente da livre-iniciativa econômica, garantida, aliás, pela Constituição federal - é igualmente um direito fundamental. Proveniente que é da liberdade de escolha, pode ou não ser exercido pelos cidadãos que encontram prazer em fazê-lo. Evidentemente, fumantes não devem importunar o próximo, pois violariam a liberdade deste.

A fogueira, simbolicamente falando, está voltando em algo que se está tornando uma espécie de guerra contra alimentos gordurosos, bebidas alcoólicas, refrigerantes e tabaco. São os novos bodes expiatórios dos que temem a liberdade de escolha. Não nos enganemos: por meio desses produtos e suas proibições, são as liberdades individuais e de escolha que são visadas.

* Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia na UFRGS. E-mail: denisrosenfield@terra.com.br.

Como se criam mafias sindicais - Almir Pazzianotto

Governos e sindicatos, relações bastardas

O Estado de S.Paulo, 25 de março de 2013
Almir Pazzianotto Pinto *
 
João Goulart (1919-1976) é personagem singular e enigmática da nossa História. Escolhido por Getúlio Vargas para lhe suceder como condutor da política trabalhista, Jango herdou a resistência das elites e a desconfiança das Forças Armadas.

A aproximação entre Vargas e Jango iniciou-se no final de 1945, quando o presidente, deposto no dia 29 de outubro pelos generais, foi confinado na estância de Itu, no município de São Borja (RS), vizinha da propriedade da família Goulart. Partiu daí a transformação do jovem criador de gado em político do PTB gaúcho, pelo qual se tornou deputado estadual em 1947, deputado federal em 1950, presidente nacional do partido em 1952 e ministro do Trabalho em 1953.

Convocado por Vargas - que voltara ao Catete eleito presidente da República em 1951- para fortalecer vínculos com o movimento sindical, Jango "tornou-se figura de destaque e árbitro dos conflitos entre os trabalhistas, ao mesmo tempo que, em estreita ligação com Vargas, passava a controlar os principais cargos de chefia na Previdência Social". Simultaneamente, empenhava-se na tarefa de atribuir importância nacional às organizações sindicais, "de forma a constituir uma força que pudesse dar respaldo ao presidente, atingido, no segundo ano do governo, pelos efeitos da crise política, latente desde o período eleitoral" (Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro, volume III).

Desde a Carta Constitucional de 1937, sob a qual foi redigida a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), governo e sindicatos cultivam relações bastardas. Relata João Pinheiro Neto, no livro Jango, um Depoimento Pessoal (Ed. Record), que, quando ministro do Trabalho, várias vezes Goulart lhe disse: "Tu, que és menino inteligente, diga a esses homens (referia-se às lideranças sindicais) que não forcem demais, que me deixem um pouco tranquilo". E acrescentava: "Podes anotar: se me apertarem demais e eu cair, virá por aí uma ditadura militar que vai durar vinte anos. E, quando isso acontecer, os nossos líderes sindicais não poderão andar nem na rua..." O temor de quem se sentia acossado, e não dispunha de força para resistir ao assédio sindical, era profético. E seria confirmado pelos fatos.

A promiscuidade com o peleguismo foi obra de Vargas, exímio na arte de manipulá-lo. Jango não aprendeu com o mestre e (na Presidência da República) se deixou envolver por dirigentes ambiciosos, que imaginavam assumir o domínio do País a partir de movimentos grevistas, como o deflagrado em outubro de 1963 por 77 sindicatos e quatro federações estaduais, representantes de metalúrgicos, têxteis, gráficos, marceneiros, químicos-farmacêuticos, liderados pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI), controlada por aliança entre PTB e PCB.

Apoiada abertamente por Jango e Amaury Silva, ministro do Trabalho, a "greve dos 700 mil" não resistiu à intervenção do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, acionado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Mas eliminou a escassa confiança do setor patronal no propalado espírito cordato e conciliador do presidente.

O golpe de 31 de março de 1964 provocou total desarticulação do sindicalismo comuno-petebista. Entre os primeiros cem cujos direitos políticos foram suspensos por dez anos pelo Ato Institucional n.º 1 (de 9/4/64) do Comando Supremo da Revolução, 40 eram sindicalistas, entre os quais Clodesmith Riani, Dante Pellacani e Hércules Corrêa, diretores da CNTI e líderes do Comando Geral dos Trabalhadores (CGT). Para ocupar os postos deixados pelos cassados o governo nomeou interventores como Joaquim dos Santos Andrade, o Joaquinzão, que seria presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo.

A truculência do governo militar provocou a substituição dos protagonistas da promiscuidade. Em vez de sindicalistas ligados à denominada esquerda progressista, o que se observou foi a brusca ascensão de elementos das oposições na chefia de sindicatos, federações e confederações, em íntima colaboração com o Ministério do Trabalho, que lhes garantia sucessivas reeleições e os alimentava com o Imposto Sindical.

Em 1946 e 1988 perderam-se duas excelentes oportunidades de moralização do movimento sindical. O artigo 8.º (da Constituição de 88), o pior texto da história nessa matéria, afastou o poder de intervenção direta do Estado, mas conservou o sistema confederativo, a divisão de empregadores e empregados em categorias, o monopólio de representação, a contribuição sindical obrigatória para não associados, o registro no Ministério do Trabalho.

Governo e sindicatos cultivam relações bastardas. O primeiro, porque lhe dão tranquilidade, capacidade de controle e apoio eleitoral. Quanto aos segundos, tiram o máximo proveito da promiscuidade: recebem polpudas ajudas em dinheiro público, gozam de prestígio político, interferem na escolha de ministros, têm livre acesso a palácios e ministérios. Ser dirigente sindical próximo do governo é a melhor posição que alguém pode almejar, por trazer vantagens sem gerar preocupações.

A presidente Dilma Rousseff havia adotado postura austera e firme diante das centrais. Buscou, aparentemente, fazer que entendessem haver larga distância entre interesses pessoais de dirigentes, ávidos de dinheiro ou de ascensão política, e relevantes projetos nacionais, como tornar a economia competitiva no mundo globalizado, começando pela reforma dos portos e aeroportos. Mas, aconselhada pelo ex-presidente Lula, deu um passo atrás e as reconduziu a lugar de honra no Planalto. O primeiro fruto da reaproximação consiste na atitude da Força Sindical, autora de manifestações contra a privatização de terminais portuários, prevista na Medida Provisória 595, em tramitação no Poder Legislativo.

S. Exa. poderia dedicar algumas horas à história do trabalhismo janguista, e certamente concluirá que relações incestuosas, com o peleguismo, jamais trarão resultados benéficos ao País.

* Almir Pazzianotto Pinto é advogado, foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho.

O ogro famelico perde uma sobremesa: PIS-Cofins sobre importados

Desde 2004, quando foi instituído esse tributo, eu, que não sou nem tributarista e sequer advogado, sem entender nada de leis ou do irracional sistema tributário brasileiro, me posicionava contra essa exorbitância do Executivo, ao pretender cobrar Pis-Cofins sobre produtos importados, a pretexto (algo ainda mais absurdo) de "isonomia com a produção nacional".
Continuo não entendendo nada do que existe, mas meu raciocínio é muito simples, e segue a lógica elementar dos meios e fins: se o PIS-Cofins foi instituído para o financiamento da seguridade social no Brasil, como cobrar algo que JAMAIS será usado em benefício dos supostos produtores e trabalhadores que "colaboraram" na confecção do produto em si, que no caso foi produzido externamente. A menos que o Brasil pretendesse redistribuir o imposto aos produtores originais, para que estes financiassem os gastos de seus governos com a infraestrutura e logística da produção estrangeira, não havia sentido, e era claramente ilegal, e inconstitucional, tal cobrança.
A "isonomia" solicitada era um escárnio, já que os produtores nacionais podem ser solicitados a pagar, sobre seus produtos e serviços colocados no mercado, novos impostos sobre quaisquer supostos serviços que o Estado promete oferecer à cidadania -- por exemplo, passar a oferecer internet grátis a todo e qualquer passante -- e assim se achar no direito de cobrar mais alguma taxa por esse "serviço" oferecido ao distinto público (supondo-se que ele não estivesse já incluído em algum imposto anterior existente). Então, os produtos importados teriam também, para fins de "isonomia" passar a ser  taxados como os nacionais? Os absurdos nacionais têm de ser repassados aos estrangeiros?
O manicômio tributário brasileiro ainda não foi abalado, sequer arranhado, mas um dia os brasileiros vão descobrir que o ogro famélico avança cada vez mais sobre seu dinheiro, independentemente da criação de novos e engenhosos tributos. Por exemplo: sobre uma conta de eletricidade de menos de 50 reais, eu -- num apartamento entre 35 outros, num prédio coletivo -- pagava cerca de 16 reais de  "iluminação pública", perfazendo um total de 150 reais de conta de eletricidade, num roubo explícito e vergonhoso sobre os serviços efetivamente prestados.
Uma pequena lição ao ogro famélico, que agora vai tentar outros caminhos para recompor seu assalto aos nossos ativos.
Paulo Roberto de Almeida

Vitória do contribuinte

25 de março de 2013 | 2h 09

Editorial O Estado de S.Paulo
Redução dos preços dos produtos importados e maior segurança jurídica no campo tributário serão algumas consequências práticas imediatas e benéficas para a economia da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de considerar inconstitucional a incidência do PIS/Cofins sobre o ICMS cobrado nas importações e também sobre o próprio PIS/Cofins, por meio de uma complexa fórmula matemática. A decisão representa uma vitória do contribuinte e teve características incomuns, pois foi tomada por unanimidade, o que é raro quando o STF analisa questões tributárias, e em sessão que durou apenas 25 minutos.
O governo, que vinha se beneficiando da fórmula instituída em 2004 e agora declarada inconstitucional, alega que deixará de arrecadar cerca de R$ 6,8 bilhões por ano, pois, segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), o PIS/Cofins assim cobrado somou R$ 34 bilhões entre 2006 e 2010. É mais uma forte razão para que, ainda que tardiamente, o governo Dilma inicie o necessário ajuste de suas contas, especialmente pelo corte de suas despesas.
A cobrança do PIS/Cofins sobre o ICMS e sobre o próprio PIS/Cofins das importações foi instituída no governo Lula, pela Lei n.º 10.865, de 2004, mas vinha sendo contestada na Justiça pelas empresas. Estima-se que haja cerca de 2,2 mil ações nos tribunais questionando essa fórmula de cálculo. Já houve decisões em alguns tribunais, umas contra a cobrança, outras a favor.
A União apresentou ao STF um recurso extraordinário questionando decisão do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região que considerara inconstitucional essa forma de tributação. Em 2010, ao negar provimento ao recurso, a ministra Ellen Gracie (aposentada) contestou o argumento da União de que a incidência de tributo sobre tributos no caso dos importados destinava-se a estabelecer isonomia entre as empresas importadoras e as que estão sujeitas a essa forma de cobrança nas operações internas.
Segundo a ministra, as situações são distintas e o tratamento tributário isonômico não levaria em consideração as diferenças entre elas. A ministra observou também que a Constituição é clara ao estabelecer que a base de cálculo para as contribuições sociais, como o PIS/Cofins, é o "valor aduaneiro" do bem importado, e esse valor inclui frete, tributos como o Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante e IOF, além de encargos como seguro e outros.
O pedido de vista do ministro Dias Toffoli interrompeu o julgamento do recurso da União, que só foi retomado, e concluído, na sessão plenária do STF de quarta-feira (20/3). Toffoli acompanhou o voto da ministra Ellen Gracie, como fizeram os ministros que votaram em seguida.
A redução dos preços das importações deve ser de pelo menos 5%, de acordo com estimativa da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), que, desde a instituição da fórmula de cobrança do PIS/Cofins, agora derrubada pelo STF, advertia que a medida era inconstitucional. Advogados tributaristas, no entanto, preveem redução menor, de 2% a 3%. A diminuição depende da alíquota do ICMS, que varia de Estado para Estado.
O STF não definiu a data em que sua decisão passará a ter efeito. Em nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional disse que a devolução dos valores recolhidos a mais será feita caso a caso, "para as partes que requereram em juízo". Anunciou também que vai recorrer da decisão, por meio de embargos de declaração, nos quais poderá defender a aplicação da decisão somente em operações futuras.
Eliminada dos produtos importados, a cobrança do PIS/Cofins sobre o ICMS, sob outra forma, ainda aguarda julgamento do STF, numa ação de maior impacto financeiro do que a que foi julgada. Em 2007, a União propôs uma ação declaratória de constitucionalidade da cobrança do PIS/Cofins sobre a receita bruta das empresas, o que inclui o resultado da venda de mercadorias e serviços, sobre a qual incidiu o ICMS. A União estima que essa cobrança lhe propiciou uma receita de R$ 89,4 bilhões entre 2003 e 2008.
O advogado-geral da União que propôs a ação era o hoje ministro do STF Dias Toffoli, que, no caso das importações, votou a favor dos contribuintes.

O Mercosul aos 22 anos: algo a comemorar? - Paulo Roberto de Almeida


O Mercosul aos 22 anos: algo a comemorar?

Paulo Roberto de Almeida
Professor do Uniceub (Brasília) e diplomata.

O Mercosul – ou mercado comum do sul – registra, em março de 2013, o 22o. ano de sua existência formal, num clima que poderia ser caracterizado como de relativa indiferença, por parte de seus protagonistas principais, e de quase desconhecimento, da maior parte do público em geral. Aparentemente, ele já não desperta mais reações favoráveis ou desfavoráveis no seio da sociedade, tendo deixado de ser o centro das preocupações prioritárias dos responsáveis políticos, mesmo se os discursos oficiais continuam a proclamar seu papel estratégico nas relações regionais. Um ano após sua maioridade formal, o bloco não parece ter, efetivamente, motivos para comemorações, com a suspensão de um de seus membros originais – o Paraguai – e o ingresso em condições altamente controversas de um novo, a Venezuela. Cabe, no entanto, um pequeno resumo de sua trajetória e uma reflexão sobre o seu futuro.
O processo de integração começou sua trajetória institucional a partir de 1985, com os esquemas bilaterais entre a Argentina e o Brasil. Um tratado bilateral de integração, em 1988, prometia o estabelecimento de um mercado comum em dez anos, por meio de protocolos setoriais de integração, numa visão de complementaridade das duas economias. Em 1990, os presidentes Carlos Menem e Fernando Collor decidiram acelerar o processo, com posterior adesão do Paraguai e do Uruguai: o novo esquema de liberalização, consagrado no tratado de Assunção (de 26 de março de 1991), passou a ser automático, geral e de características fundamentalmente livre-cambistas. Os novos prazos de integração foram reduzidos pela metade e o “mercado comum” deveria ter sido alcançado até o início de 1995. Não é preciso dizer que tal não ocorreu.
A despeito de graves problemas de estabilização macroeconômica no Brasil e na Argentina, em meados daquela década, a liberalização comercial caminhou de forma mais ou menos rápida, abrindo espaço para o aumento do comércio intrarregional. Não obstante a expansão de comércio, dentro e fora do bloco, não foram criadas as condições estruturais para que os dois principais países – Brasil e Argentina – realizassem uma das premissas do tratado constitutivo, qual seja, a da abertura econômica continuada e a inserção de ambos na economia mundial. Ocorreu, contraditoriamente às expectativas dos primeiros anos, uma introversão do comércio, configurando aquela consequência nefasta dos processos de integração, que os economistas chamam de “desvio de comércio” (e de investimentos). Foi registrada uma espécie de “Brasil-dependência” na Argentina, uma vez que esta tinha no seu maior vizinho o destino para mais de um terço de suas exportações totais e um volume praticamente similar nas importações. O Brasil, embora menos dependente do comércio regional, também construiu para si uma espécie de “reserva de mercado ampliada”, o que pode ter arrefecido a busca de novos mercados.
O protocolo de Ouro Preto, assinado no final de 1994 para “completar” o tratado de Assunção, não criou instituições novas (com exceção de uma Comissão de Comércio que jamais conseguiu aprovar um código aduaneiro efetivo), nem estabeleceu mecanismos para facilitar a coordenação das políticas macroeconômicas dos países membros. Não obstante os avanços, não se chegou ao prometido “mercado comum” ou mesmo à união aduaneira completa, mantendo-se várias exceções à Tarifa Externa Comum. Muitos produtos continuaram fora da zona de livre-comércio, como açúcar e automóveis, por exemplo. Na verdade, depois da fase de transição, as orientações de política comerciais dos principais protagonistas jamais voltaram a se guiar pelas promessas de abertura e liberalização, caminhando no sentido contrário ao esperado.
Em 1996, Chile e Bolívia tornaram-se parceiros da “zona de livre-comércio”, mas a associação ao Mercosul dos demais parceiros do Grupo Andino teve de aguardar até os anos 2003-2005. A “ameaça” da Alca – projeto dos EUA para unificar numa mesma zona de livre-comércio todos os países do hemisfério – fez com que o Mercosul desenvolvesse uma estratégia comercial defensiva da qual ele jamais se separaria nos dez anos que se seguiram de processo negociador.
A desvalorização da moeda brasileira em 1999 representou um choque para a Argentina e o início de uma fase crítica para o Mercosul, que se prolongou até os nossos dias. A Argentina entrou em crise no final de 2001, o que coincidiu com o decréscimo nos fluxos de comércio: ela começou a recorrer, de modo frequente, a mecanismos de defesa comercial (salvaguardas unilaterais). A despeito da retomada do crescimento do comércio intrarregional a partir de 2003 permaneceram os desequilíbrios, motivando demandas de proteção por parte da União Industrial Argentina; o processo foi levado a extremos, com recurso a medidas claramente ilegais no âmbito do bloco e até mesmo do ponto de vista do sistema multilateral de comércio. Deve-se reconhecer que a atitude do governo brasileiro revelou-se estranhamente compreensiva com as infrações regulares às normas do bloco.
Em 2004 a Argentina começou a pressionar pela adoção de um instrumento de salvaguardas automáticas, eufemisticamente caracterizado como sendo um “mecanismo de adaptação competitiva”, que ela pretendia implementar de maneira unilateral. Antes, ela já tinha insistido num “gatilho cambial”, o que foi abandonado, em vista da persistente valorização da moeda brasileira a partir de 2003. No início de 2006, os dois países adotaram o projeto argentino para salvaguardas setoriais, recebido com reclamos por parte da indústria brasileira. No plano político, houve a criação de um fundo corretor de assimetrias estruturais – a ser utilizado sobretudo pelos dois sócios menores, mas com maior volume de financiamento por parte do Brasil – e a instituição de um “parlamento” do Mercosul, considerado um aperfeiçoamento institucional. Nem um, nem outro instrumento tocaram, de fato, nas pendências comerciais ou permitiram superar os obstáculos políticos à realização das metas inscritas do tratado de Assunção.
Assistiu-se, retoricamente, a demandas recorrentes pelo estabelecimento de “cadeias produtivas setoriais conjuntas”, iniciativas inviabilizadas na prática pela incapacidade dos governos de cada um dos países de prestar assistência financeira ou empreender investimentos em base a recursos públicos. Mas voltou-se a dar ênfase, naquele período, sobretudo sob impulso político do governo brasileiro, aos projetos de integração física continental, intenção consagrada na criação da “Comunidade Sul-Americana de Nações” (dezembro de 2004), depois convertida em União, pela ação do governo “socialista” da Venezuela.
A Venezuela, justamente, foi admitida “politicamente” no Mercosul, em dezembro de 2005, tendo os termos de sua incorporação comercial sido consagrados no protocolo de adesão de 2006; ela nunca chegou a completar, porém, os requerimentos estabelecidos neste e em outros instrumentos do Mercosul. Com a diluição da “ameaça” da Alca – inclusive a partir de sua virtual paralisação na terceira cúpula hemisférica, em Mar del Plata, no final de 2005, por atuação conjunta da Argentina, do Brasil e da Venezuela –, os países sul-americanos passaram a construir, com estratégias e objetivos muito diversos, uma nova agenda integracionista para a região, menos voltada para a liberalização comercial e mais orientada para a cooperação política e o estabelecimento de ligações físicas. Esse esforço redundou na Unasul e em diversos outros mecanismos (Calc, e depois Celac, ademais de um conselho de defesa), de importância mais retórica do que efetiva: para todos os efeitos práticos, a América Latina encontra-se fragmentada em diferentes esquemas de integração, indo do livre-comércio ampliado a um retorno do nacionalismo estatizante, o que também diluiu a importância do Mercosul na região.
Com a crescente importância econômica da Ásia Pacífico, alguns países da região – notadamente México, Colômbia, Peru e Chile – voltam-se para diferentes iniciativas voltadas para essa grande bacia oceânica, num cenário que também se caracteriza pela existência de acordos bilaterais de livre comércio entre esses países e os Estados Unidos. Os países do Mercosul parecem ter se conformado a um papel menor nesses grandes desenvolvimentos da economia regional e mundial.
Na verdade, o bloco atravessou sua maioridade formal enfrentando a maior crise de sua história. Em 2012, usando como pretexto o afastamento do presidente eleito do Paraguai numa crise política puramente interna, Argentina e Brasil suspenderam a participação do país nas reuniões do bloco e procederam à admissão irregular da Venezuela, num gesto altamente controverso, tanto no plano do direito internacional como no das regras próprias do bloco. Permanecem indefinidas as condições sob as quais a Venezuela poderá cumprir os requisitos formais de sua adesão ao bloco, processo não concluído nos quatro anos estabelecidos no protocolo de 2006, quando as condições econômicas no país bolivariano não se tinham deteriorado como na atualidade. De fato, não há muito o que comemorar neste início de segunda década do Mercosul: o bloco ainda não conseguiu retomar sua agenda de integração regional e de inserção na economia mundial.

Hartford, 24 de março de 2013

Russia invade Chipre para recuperar seu capital

Brincadeira antecipada de Primeiro de Abril, claro, mas parece que seria a única maneira de os grandes correntistas russos, indignados com o sequestro de todo aquele dinheiro honesto adquirido com os ingentes esforços do capitalismo russo para contribuir ao desenvolvimento cipriota, tentarem recuperar pelo menos parte do investimento feito naqueles bancos cipriotas que perguntavam pouco e prometiam muito.
Paulo Roberto de Almeida

Cyprus Bailout Agrees Large Losses on Uninsured Depositors.
Citi Research, 25/03/2013

Deal consists of €10bn financial assistance envelope to be disbursed via the ESM, with some contributions possibly from IMF and Russia. In exchange, Cyprus agreed to resolve its second largest bank, Popular Bank of Cyprus (Laiki), merging its “good” assets and insured depositors into Bank of Cyprus. Insured deposits (below €100k) in both banks are safeguarded. Equity shareholders and all bondholders in both banks will be fully bailed in. Uninsured deposits in Laiki will be fully bailed in, while uninsured deposits in Bank of Cyprus will be converted into equity and suffer major losses targeted to ensure that the bank capital ratio ultimately is brought to 9%. Uninsured deposits in Bank of Cyprus will be frozen during the process and major liquidity restrictions and capital controls are being put in place. Legislation on a bank resolution regime was already approved by Cypriot parliament, allowing government to implement decisions taken last night without further parliamentary approval. Comment: The deal is a much more straightforward way of dealing with insolvent banks, rather than spreading the costs throughout the whole banking system. The deal removes to a large extent short-term uncertainty and the risk of uncontrolled bank bankruptcies which might possibly have led to Cyprus exiting EMU. However, with confidence in the Cyprus banking sector severely hit by developments of the past week, the risk of major deposit outflows occurring when capital controls are eventually removed (or softened) remains significant, in our view.

Adam Ferguson e o Iluminismo escoces - book review (WSJ)

A resenha abaixo me relembra outro livro, de Albert Hirschman, The Passions and the Interests, um dos livros mais interessantes que já li, bem diferente de seus outros livros sobre economia do desenvolvimento.
Paulo Roberto de Almeida
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A Skeptical Modern

Eighteenth-century Britain's mixture of liberty and empire inspired philosophers. Adam Ferguson thought it spelled doom.

By the staid standards of the Scottish Enlightenment, the philosopher Adam Ferguson enjoyed a vividly eventful life. Descended from the dukes of Argyll, he received a deluxe education at St. Andrews and Edinburgh. He served as chaplain to the storied 42nd regiment of Highlanders. It was claimed, implausibly, that he was a fighting cleric, leading infantry against the French at the battle of Fontenoy in 1745. "Damn my clerical commission," he supposedly roared. After his military career, Ferguson joined Edinburgh's Select Society, the brain trust of the Scottish Enlightenment. He composed political pamphlets and—embarrassingly—promoted the "newly discovered" epics of Ossian (supposedly a "Celtic Homer" but in fact a hoax). He included among his friends Adam Smith, David Hume and Sir Walter Scott.
Ferguson eventually eased into an academic career at the University of Edinburgh. In 1767, he published his most significant book, "An Essay on the History of Civil Society." A "speculative history" of the kind popular with the Scots, the "Essay" hypothesized an account of humankind's emergence from natural barbarity. Ferguson's other major work, his "History of the Progress and Termination of the Roman Republic," remained popular into the 19th century and earned the praise of Edward Gibbon (no easy feat).
Ferguson lived through the "age of revolutions." In 1778 he was sent to America with a hapless commission to negotiate peace with George Washington. In retirement he followed the French Revolution with an initial enthusiasm that faded into gloom. One of his sons died fighting the French, another was captured, and another shipwrecked. The "Scottish Cato" spent his final years rusticating and hosting friends. He died in 1816 at the age of 92. His last words were: "There is another world!" He had certainly experienced a great deal of this one.
You will learn none of this from Iain McDaniel's "Adam Ferguson in the Scottish Enlightenment." Presumably written for academics, the book is almost perversely devoid of biographical narrative. This is a missed chance, and the uninitiated may find the book's style austere. Persistence, however, will be rewarded. Amid his military and political diversions, Ferguson grappled with every major philosophical figure of the Enlightenment. Mr. McDaniel skillfully captures the cut and thrust of these intellectual engagements.
What emerges is a reminder that, if Scotland and France were the pre-eminent sites of the Enlightenment, England was its abiding subject. For the philosophes, 18th-century Britain's rise to imperial pre-eminence exemplified the new political dynamics of the modern age.
The superstructure of British power was naval might and trading wealth, but its foundation was fiscal mastery. The Bank of England and London's stock exchange established Europe's first major secondary market in government bonds. This market allowed Britain to float open-ended loans serviced with dedicated tax revenues. To the investors of Europe, a free parliament (itself made up of bondholders) was far more credit-worthy than an absolute and capricious king. While the French monarchy frantically sold off assets and borrowed at ruinous rates, Britain created a perpetual, rolling national debt. Smaller than France, Britain mobilized its wealth with vastly greater efficiency. The "financial revolution" made fortunes at home and an empire abroad. Its consequences are with us still.
These British paradoxes—debt and wealth, liberty and empire—transfixed the enlightened intelligentsia. The more utilitarian among them—Smith and Hume, above all—considered commerce, self-interest and investment foundational to modern civility. The "ancient liberty" of the warrior and the citizen-statesman had given way to a "modern liberty" of privacy and consumption.
Ferguson recoiled from this appraisal. As a student of Caesar and Napoleon, he was obsessed "with the causes propelling modern states toward instability, revolution, and military government," Mr. McDaniel writes. Ferguson rejected the view that "sweet commerce" would pacify the state system of Europe.
To Ferguson, Britain in particular had thrown itself into a sordid scramble for riches. Defended by mercenaries, ruled by sybaritic oligarchs, Britain would—like Rome—succumb to despotism. "The combination of public credit and national aggrandizement," writes Mr. McDaniel, characterizing Ferguson's view, "had poisoned the foundations of the constitution." Britain's vaunted Parliament couldn't check this slide toward subjugation, Ferguson believed. Nor would a population interested only in cheap Caribbean sugar and secure bonds rise to the constitution's defense.
Ferguson's was a politics of nostalgia, inveighing against the "pathological features of advanced commercial societies." Mr. McDaniel adeptly presents Ferguson's thinking and places it in dialogue with luminaries such as Montesquieu, Rousseau and Adam Smith. The payoff is a richer understanding of Enlightenment debate as it confronted modern political economy.
Whether this book establishes Ferguson as a "major political thinker" with "contemporary resonance" is another matter. Modern Americans will wince at Ferguson's jeremiads against organizing public finance according to the "vicissitudes of the gaming table," but his belief that the "lucrative arts" would empower "populist demagogues" and despotic British generals must rank among the worst prognostications of the 18th century.
Neither commercial wealth nor imperial power has yet undermined the British constitution (or its American cousin). For good or ill, commerce, consumption and interest are the springs that feed modern liberal society. Hume, Smith and Tocqueville understood that these currents were irreversible. Ferguson didn't, and for this reason his writings haven't endured. For all of their idiosyncrasies, however, they retain the capacity to instruct.


Mr. Collins is a professor of history at Queen's University in Kingston, Ontario.
A version of this article appeared March 25, 2013, on page A15 in the U.S. edition of The Wall Street Journal, with the headline: A Skeptical Modern.

A Journey Inside the Whale: bebendo na baleia

Tem aquela história do Jonas, que foi engolido por uma baleia (a Biblia fala de um grande peixe, o que não seria o caso, portanto), mas que sobreviveu à sua maneira, com o que tinha à mão. Certamente não foi como numa versão à la Disney, misturando Gepetto e outros personagens, com algum conforto interior e até iluminação à la chandelle...
Bem, não posso dizer que a minha situação se parece com algum desses personagens, mas que eu tenho me divertido na minha jornada através da baleia, isso não posso negar.
Como se trata de uma baleia cosmopolita e livre cambista, aqui se pode comprar de tudo.
Sem querer humilhar ninguém, faço apenas uma listinha dos vinhos comprados e consumidos nos mercados locais, o que não inclui, obviamente, os consumidos diretamente nos restaurantes, como por exemplo neste domingo, no restaurante OPorto, assim mesmo, que teve uma garrafa de alentejano branco para acompanhar bacalhau e lulas grelhadas.
Vai aqui a listinha, não necessariamente na ordem de consumo, mas segundo as notas tomadas no computador (que deixaram de fora as 10 ou 15 garrafas de uma fase inicial). Vale lembrar que alguns desses vinhos foram criminosos reincidentes, já que as infrações se estenderam por duas ou três garrafas (como por exemplo o Zinfandel da California, a 15,5 graus, ou os Barbera, da Italia, a 14,5), mas não quero exagerar:


2010 Lockhart Merlot (California)
2010 Stonington Chardonnay (Connecticut)
2010 Riesling Markus Molitor (Deutschland)
2012 Cabernet Sauvignon Las Lenas (Argentina)
2010 Montepulciano Zaccagnini (Italia)
2012 Sauvignon Blanc Oyster Day (New Zealand)
2011 Pinot Grigio Barone Fini (Italia)
2010 Bordeaux Rouge Lafite Reserve Baron de Rothschild (France)
2011 Carmenere Casillero del Diablo (Chile)

Vai aumentar, certamente, a razão de três ou quatro garrafas por semana, que mais seria exagero, e menos seria uma perda de oportunidade...
Não menciono as garrafas de Porto, de Amaretto, de Grand Marnier ou de Limoncello, para não pensarem que estou seguindo o modelo americano dos grandes bebedores, inclusive porque, de consumido, mesmo, até agora, foram só duas garrafas de Porto. Outras virão, certamente.
A baleia por enquanto se mantém à tona...
Paulo Roberto de Almeida

domingo, 24 de março de 2013

As relações internacionais como oportunidade profissional - Paulo Roberto de Almeida

O site Mundo RI pediu-me permissão, no ano passado, para reproduzir uma antiga "entrevista" minha (de 2006) sobre a "profissão" do "internacionalista", o que sempre me deixa um pouco desconfortável pois todos sabemos que realidades dinâmicas como mercado de trabalho, perfis profissionais e o próprio mundo das relações internacionais estão constantemente mudando.
Eu não tinha tempo, porém, para responder novamente uma bateria de perguntas sobre esses temas, e por isso acedi, depois de uma leitura ultra-rápida, em diagonal, da matéria divulgada seis ou sete anos atrás. Não tenho certeza de ter revisto adequadamente esse texto, o que tampouco fiz agora.
O fato é que alguém me contatou, falando novamente dessa entrevista de setembro de 2012 (sic), da qual nunca tomei conhecimento, o que fiz agora.
Talvez ainda sirva para alguma coisa, e por isso me permito postá-la novamente aqui, sem as garantias de controle de qualidade e data de validade (existe algum controle externo sobre isso, que não seja o da Anvisa e outros órgãos do mesmo gênero?).
Em todo caso, não respondo pela atualidade da matéria, apenas pelo bom humor, que parece não ter ainda data final...
Paulo Roberto de Almeida


As relações internacionais como oportunidade profissional / Paulo Roberto de Almeida


Mundo RI

14/9/2012


As relações internacionais como oportunidade profissional / Paulo Roberto de Almeida

14/9/2012


Originalmente publicado em 2006 no próprio site do Diplomata Paulo Roberto de Almeida, estas resposta às questões mais colocadas pelos jovens que se voltam para a carreiras de relações internacionais, ainda são atuais, somente temos que abrir uma ressalva feita pelo próprio autor, que a realidade melhorou um pouco, junto com as oportunidades de mercado, com tendência de melhoria continua. Espera-se que o texto sirva para como mesmo diz o autor, para as pessoas "arregaçarem as mangas",deixarem de serem passivos. (Redação, Portal MundoRI.com)

1. Com quais expectativas o jovem ingressa no curso de relações internacionais?PRA: Provavelmente, na maior parte dos casos, com a expectativa de tornar-se diplomata ou funcionário internacional, ou então animado pelo vago desejo (ou mesmo vontade concreta) de sair do Brasil, passar sua vida entre capitais européias e da América do Norte, fazer-se no mundo, enfim. Deve-se observar desde logo que o ingresso na diplomacia, na verdade, acaba ocorrendo para uma fração mínima dos ingressados nesses cursos, uma parte também relativamente pequena voltando-se para as próprias atividades acadêmicas ligadas às relações internacionais e a maior parte devendo inserir-se, de algum modo, no mercado de trabalho "normal", isto é, do setor privado, altamente competitivo.

Aqueles muito jovens – digamos entre os 18 e 20 anos – ostentam uma visão relativamente romântica do que seja o mundo ou a projeção internacional do Brasil, não estando aqui excluídas motivações essencialmente idealísticas, no sentido da atuação em causas humanitárias, ecológicas, imbuídos que são do desejo de mudar o mundo ou de ajudar aqueles que são percebidos como "vítimas da globalização" ou de misérias ancestrais. Os mais "velhos" – que podem eventualmente ter iniciado o terceiro ciclo por algum outro curso e efetuado o desvio para relações internacionais no meio da rota – possuem expectativas mais concretas e realistas, eventualmente construídas a partir do exercício de alguma atividade profissional paralela aos estudos de terceiro ciclo, mas eles também podem estar imaginando ou aspirando por uma "vida diferente" da mesmice cotidiana em âmbito puramente nacional, algum relevante papel de "negociador", de "funcionário" ou de "executivo internacional". Ou seja, todos eles possuem altas expectativas em relação aos cursos e as oportunidades profissionais dele resultantes, sem talvez medir muito bem a distância que ainda separa o universo relativamente teórico do universo "mental" desses cursos e a realidade do mundo profissional, feita de muito esforço individual, salários nem sempre elevados como esperado e uma indefinição geral quanto ao exercício concreto das "generalidades" aprendidas nos bancos universitários.

2. Em quais as áreas o bacharel em RI sai preparado para atuar?PRA: Como ele é um generalista em especialidades "internacionais" ele poderá, supostamente, atuar em todas as áreas nas quais alguma competência vinculada ao seu terreno é requerida, seja no campo da análise e processamento de informações relativas aos diferentes cenários regionais e internacionais, seja na pesquisa e ensino acadêmico, nas áreas de relações internacionais das burocracias públicas – o que inclui a diplomacia tradicional, novas "diplomacias" em ministérios setoriais, assessorias internacionais de diversos órgãos etc. – e, provavelmente em maior "volume", nas empresas privadas e nas chamadas ONGs que possuem ou aspiram possuir qualquer tipo de interface com o mundo exterior. O problema, aqui, é que as empresas requerem, em geral, uma competência mais específica e provavelmente mais especializada do que o conhecimento sintético das relações internacionais, a qualquer título. As empresas não estão minimamente preocupadas com a teoria institucionalista ou neo-realista das relações internacionais, tampouco com o funcionamento do Conselho de Segurança da ONU: elas desejam simplesmente vender ou fazer negócios com parceiros externos e por isso elas são mais suscetíveis de apelarem para profissionais especializados como economistas, advogados ou algumas outras profissionais mais "tradicionais". Afinal de contas, trata-se de fazer uma prospecção de mercado ou de elaborar um contrato de cessão ou compra de direitos e outros ativos entre dois agentes privados, que devem rentabilizar seu tempo e seus recursos humanos e materiais, não havendo muito lugar para teorizações indevidas ou abstrações fora do campo essencialmente pragmático no qual atuam essas empresas.

Em outros termos, o bacharel de RI seria extremamente consciencioso se ele procurasse, de imediato, suprir suas carências em competências específicas buscando uma especialização dentro de seu campo de estudo, procurando estágios desde cedo ou mesmo fazendo algum outro curso paralelamente. Como para as demais especializações disciplinares, uma pós-graduação seria altamente recomendável, ou então uma outra via, mais racional, a formação de base numa profissão "normal" ou "tradicional" e uma pós ou estudos especializados em relações internacionais, eventualmente com orientação já definida para a área na qual o candidato a um bom emprego pretende atuar.

3. Qual o nome dado ao profissional depois de formado?PRA: Não tenho certeza se o termo está consagrado, mas, aparentemente, seria "internacionalista" (uma expressão ainda não oficializada, diga-se de passagem, como a própria "profissão", que não corre nenhum "risco" de ser regulamentada no futuro previsível). Em todo caso, melhor assim, do que algo estranho como "internacionalóide" ou "internacionaleiro".

4. Existe a discussão sobre a relevância do curso para quem quer seguir carreira diplomática. É mesmo o melhor caminho ou o primeiro passo para o Instituto Rio Branco e o Itamaraty?PRA: Não tenho certeza de que este seja o melhor caminho para os indivíduos que aspiram a ter alguma atividade já consagrada no circuito profissional, pois se trata de uma área relativamente nova, ainda não suficientemente "testada" nos mercados de trabalho. O que ocorreu, nos últimos anos, levado pelos ventos da globalização e da regionalização, foi um fenômeno "anormal" de expansão "geométrica" dos cursos de relações internacionais, provavelmente sem qualquer relação com a demanda efetiva do mercado. Havia uma demanda da parte dos jovens, atraídos pelo que parece ser um campo novo e talvez vasto – mas provavelmente não suficientemente "elástico" como o desejado pelos jovens – e as instituições privadas de ensino se encarregaram de satisfazer essa demanda por cursos de "aspecto" internacional.

Quanto à carreira diplomática, estrito senso, o recrutamento é altamente seletivo e a formação deveria ser, portanto, focada nas humanidades em geral, com um domínio igualmente satisfatório de ciências sociais aplicadas como economia e direito. Não é seguro que um curso de relações internacionais consiga dar todas as competências requeridas, mas ele é provavelmente o que mais estaria dentro do "campo" da diplomacia profissional. Acontece, porém – e isso precisa ficar muito claro aos jovens aspirantes à carreira – que, sendo o recrutamento caracterizado pela "hecatombe" de 90% dos candidatos, os "não-entrantes" precisam "sobreviver", de alguma forma, nas profissões normais, requeridas pelo mercado, e aqui o nicho das relações internacionais ainda é relativamente difícil.

Pode-se dizer, de uma maneira geral, que o curso, in abstracto, é relevante, mas os cursos, tomados concretamente, diferem muito entre si pela qualidade das matérias oferecidas, pela competência dos professores contratados, pela disponibilidade de recursos didáticos e materiais, etc.

Parece ocorrer, atualmente, com os cursos de relações internacionais, algo semelhante ao que se passou, em outras épocas, com os cursos de ciências sociais, de psicologia, de jornalismo, que passaram a atrair multidões de jovens sem um perfil muito definido quanto à carreira desejada ou suas aspirações concretas. O modismo, como tudo a cada época, um dia vem abaixo… Mas é também possível que os patamares de demanda sejam mantidos ou até ampliados, pois há certas "modas" que não passam, seja por uma demanda regular – como ocorre hoje com os cursos de jornalismo – seja porque a globalização é mesmo irrefreável e contínua, um "universo em expansão"...

5. O que diferencia o curso de RI dos cursos de comércio exterior e de direito e economia internacionais?PRA: Não existem cursos de "economia internacional", apenas de economia, tout court, assim como no direito, embora os egressos desses cursos possam buscar, nos últimos semestres, algum tipo de especialização informal dentro desses campos em suas respectivas áreas. Comércio exterior se apresenta hoje como uma orientação relativamente técnica, algo assim como "contador", embora seja uma área que requeira e deva contar com estudos aperfeiçoados, que aliás podem estar dentro de alguns cursos de relações internacionais – que assim exibiriam especializações mais para "ciência política" ou mais para economia internacional, segundo o gosto do cliente.

Acredito mesmo que no decurso da sedimentação necessária e natural dos cursos de relações internacionais nas diferentes regiões do país, essas orientações geográfico-espaciais ou essas inclinações temáticas acabarão emergindo progressivamente. Ou seja, pode-se conceber cursos de relações internacionais voltados para o agronegócio nas principais regiões produtoras de commodities demandadas pelo mercado mundial, cursos voltados para a diplomacia e a pesquisa nas ciências sociais em algumas grandes capitais, outros cursos voltados para o comércio exterior e a integração regional nas regiões mais "expostas" aos processos sub-regionais de integração e assim por diante.

6. O aumento de ofertas para o curso de RI em diversas faculdades públicas e particulares poderia significar que a procura é alta para a carreira?PRA: A procura ainda é alta por uma espécie de ilusão dos jovens quanto ao "charme" e a oferta de empregos nessa área, pelo efeito do já mencionado "modismo", ou porque o Brasil está mesmo deslumbrado com a globalização, ingressante tardio – e incompleto – que foi nos grandes circuitos da interdependência global. Não imagino que a demanda venha a se manter nos próximos anos, seja porque haverá um "plafonnement" e queda ulterior, seja porque o ritmo de crescimento tenderá a diminuir, ao descobrirem, muitos egressos, que os cursos não são assim tão "funcionais" para as necessidades de uma carreira concreta, seja porque a oferta, como sempre ocorre, supera a demanda efetiva. Não deve ocorrer, aqui, nenhum "keynesianismo" avant la lettre, pois o governo não parece estar em condições de garantir demanda efetiva numa área que não aparece como prioritária em termos de recursos humanos.

Resumindo: a procura, a jusante, não é alta, mas sim está ocorrendo um crescimento da oferta de cursos para atender uma demanda pré-existente, a montante, portanto. O mercado deverá ajustar oferta e procura dentro em breve. De toda forma, não existe UMA carreira de relações internacionais, e sim diferentes "carreiras" – ou melhor, oportunidades de emprego – que vão se ajustando aos nichos existentes, muito diversos entre si. Como a profissão não é regulamentada, nem tem chances de sê-lo muito em breve, persistirá essa relativa indefinição do que é "carreira" ou "especialização" em relações internacionais.

7. O jovem passou a se interessar mais por assuntos relacionados ao mundo?PRA: Certamente. O bebê já nasce ouvindo teclado de computador, e a internet, como as demais tecnologias de informação, permeia a vida das pessoas desde tenra idade. Não há como escapar, hoje, dos apelos do mundo. Mesmo que algum jovem não tenha o mínimo interesse por "coisas" do mundo, o mundo vem inevitavelmente até ele, pelos mais diferentes caminhos e meios. Ninguém escapa…

8. Os atentados de 11 de Setembro e as subseqüentes guerras no Afeganistão e no Iraque podem ter tido alguma influência no aumento de interesse por Relações Internacionais?PRA: Provavelmente, mas não mais do que MP3, celular, internet de modo geral. Há hoje uma crescente interpenetração entre o nacional e o mundial, todo dia franquias estrangeiras vêem se estabelecer no Brasil, as viagens internacionais são cada vez mais freqüentes e acessíveis, o inglês tornou-se obrigatório para o simples exercício (e vício) preguiçoso do "cut and paste" para os trabalhos escolares, enfim, o mundo vem até nós, aos borbotões. É natural que cresçam e apareçam as profissões e especializações ligadas às relações internacionais, mas os interesses e as oportunidades são ainda muito difusos.

9. Certos cursos, como direito e administração, são opções de vestibular para muitos adolescentes que não sabem exatamente o que querem fazer da vida. Por abranger muitas áreas, a carreira de RI não acaba atraindo mais jovens indecisos?PRA: Exatamente: direito e administração oferecem amplas possibilidades para todos os tipos de vocações, por vezes sequer diretamente relacionadas com os campos temáticos dessas duas áreas. As RI podem, também, oferecer muitas possibilidades, mas, à diferença das duas primeiras, elas não constituem uma profissão reconhecida, "testada" no mercado e expressamente demandadas pelos mercados ou pelas empresas. Essa pequena diferença pode ser decisiva na inserção profissional dos jovens: entre o certo de uma profissão tradicional e o incerto de um campo novo, talvez seja o caso de ficar com o certo. O problema é que o Brasil é um país dotado de muito pouco empreendedorismo, a despeito da tremenda flexibilidade de sua mão-de-obra, revelada na grande capacidade adaptativa e nos esquemas informais que permeiam os mercados de trabalho (existem vários, do mais inserido ao totalmente informal). Uma pesquisa na escola média revelaria, provavelmente, que poucos jovens aspiram lançar o seu próprio negócio, a maior parte deles estando voltada para cursinho ou estudo para algum concurso, qualquer um, em carreira dotada de estabilidade.

Esse problema da "indecisão" dos jovens pode hoje estar levando muito deles para as RI, assim como no passado os jovens "revolucionários" eram atraídos pela sociologia – segundo Mário de Andrade, a "arte de salvar rapidamente o Brasil" – e as jovens casadoiras eram levadas a fazer psicologia, esperando marido… Hoje se faz RI, porque protestar contra a "globalização perversa" virou esporte quase obrigatório entre os jovens…

10. Com tanta oferta de cursos, há espaço suficiente para o profissional em RI no mercado?PRA: Certamente tem ocorrido certa "inflação" de cursos, mas nisso os próprios demandantes levam a culpa: eles "pediram" e os empresários da educação correram para atender essa demanda do mercado de estudantes. Esses "industriais da educação" não estão minimamente preocupados com o espaço do "profissional" de RI – se é possível chamá-lo assim – no mercado de trabalho, esse não é o "departamento" deles. Sua função é a de apenas "fornecer" aquilo que lhes é pedido: um curso e um canudo, depois cada um que se vire como puder num mercado indefinido. Ou seja, não estamos num "supply side economics of international relations", mas essencialmente num mercado demandante por cursos e canudos, o resto fica ao sabor do próprio mercado…

11. O mercado e as empresas estão preparados para entender o que é profissional de RI?PRA: A pergunta deve ser completamente invertida: nem os mercados, nem a fortiori as empresas precisam estar "preparados para entender o que é profissional de RI". Essa não é função deles. Sua única função é recrutar competências para o exercício de atividades profissionais específicas e os requerimentos são estritos: ou o profissional se adapta e atende ao que lhe é demandado, ou então ele pode procurar outro emprego. Por isso, volto a insistir: as empresas, na maior parte das vezes, não querem intelectuais brilhantes que sabem discorrer sobre o Conselho de Segurança da ONU ou o último livro do Keohane, elas querem alguém que saiba redigir um contrato, negociar um acordo com parceiro de outro país, fazer uma boa prospecção de mercado, trazer negócios, lucros e resultados, ponto. Este é o mercado, que deve ocupar pelo menos 80% dos egressos dos cursos de RI, qualquer que seja o seu número (o resto indo para os governos e as academias).
Quem deve entender as (e de) empresas e o (de) mercado são esses profissionais, que se não souberem lidar com essas realidades, se auto-excluem dos melhores empregos nesses mercados. Não é uma questão de preferência, é assim, ponto. As empresas não vão à cata de jovens egressos dos cursos de RI, eles é que devem tentar se oferecer para elas.

Os jovens precisam, desde o início, tomar consciência de que, ao receber o canudo, ao saírem das faculdades, não vai haver uma fileira de "head hunters" esperando por eles na calçada, não haverá sequer um mísero recrutador esperando por eles para dizer: "Venha, meu jovem, tenho um emprego esperando por você!". Isso simplesmente não vai acontecer. Ou eles se preparam, desde o segundo ou terceiro ano, fazendo estágios, montando empresas juniores com seus colegas, pesquisando por conta própria novos nichos de mercado, ou eles vão ficar de canudo na mão reclamando da vida.

Se eu fosse um jovem, hoje, e não um diplomata com 28 anos de carreira, mas ainda disposto a diversificar no privado (ensino e pesquisa, eventualmente consultoria), eu me perguntaria: "qual é o meu nicho no mercado futuro, o que o Brasil ou o mundo me reserva, dentro de dois ou três anos?" Uma breve pesquisa de internet me daria a resposta em 5 minutos, ou a minha própria vontade e vocação determinariam o meu destino imediato. Abstraindo-se a própria carreira diplomática – excessivamente restrita para servir de "colocação" para um grande número de jovens – e algumas outras carreiras no serviço público – analistas de comércio exterior ou de inteligência – e nas academias, o que sobra, obviamente, como "opção" são as empresas, grandes e pequenas. Eu até diria que o "profissional" de RI poderia montar a sua própria, mas o empreendedorismo individual ainda é muito pouco desenvolvido no Brasil.

Nessa perspectiva, é óbvio que um jovem paulistano precisa ter uma visão "global business", é evidente que um jovem do "cerrado central" precisa pensar no Brasil como o grande fornecedor mundial – o que ele já é, mas será cada vez mais – de produtos do agronegócio, é evidente que aqueles que amam praia, sol, florestas e montanhas encontrarão excelentes oportunidades no turismo de massa ou especializado, está mais do que claro que o Brasil tem um imenso campo em todas as áreas nas novas energias renováveis, na exploração dos recursos naturais, na conformação de um espaço integrado na América do Sul. Se eu fosse jovem e quisesse ganhar muito dinheiro, eu já estaria estudando todas essas oportunidades. Tudo isso É relações internacionais, tudo isso é interdependência global, tudo isso é globalização. Quanto antes o jovem se preparar, e não ficar passivamente esperando o fim do curso para depois pensar no que vai fazer, será melhor para ele e para suas famílias.

Desse ponto de vista, acho, particularmente, que os cursos, atuais, das faculdades voltadas para esse campo, e seus respectivos professores, estão muito pouco preparados para atender essa demanda. Trata-se de uma demanda real, não daqueles requisitos prosaicos de uma grade curricular tradicional, que copia passivamente a inércia "humanistóide" dos cursos tradicionais das universidades públicas – em ciências sociais em geral, mas fazendo uma combinação de direito, história, economia e ciência política – que, elas, parecem não ter nenhum compromisso com os mercados reais. Talvez os jovens não encontrem o curso ideal nem nas faculdades privadas nem nas públicas. O melhor, então, seria que eles "construam", sozinhos, e de maneira absolutamente auto-didática (se possível com os colegas), os seus próprios "cursos". Talvez eles não sejam melhores, em qualidade imediata, do que aqueles oferecidos oficialmente pelas instituições de ensino, mas eles certamente serão mais adaptados e estarão mais conformes às aspirações e necessidades dos próprios jovens.

Acho que é hora de deixar de ser passivos: arregacem as mangas, jovens, mãos à obra, construam suas próprias vidas!

Paulo Roberto de Almeida é Doutor em Ciências Sociais, mestre em Planejamento Econômico, diplomata. E-mail: pralmeida@mac.com
Fonte: www.pralmeida.org