sexta-feira, 5 de novembro de 2010

A era da mentira, 2: um remake de muito mau gosto...

Caro leitor,
Estão querendo, novamente, meter a mão no seu, no meu, no nosso bolso (e no caixa das empresas, também, cela va de soi).
Parece que "a pedido dos governadores", a presidenta que ainda nem tomou posse, já cogita em "consentir" que eles se articulem para fazer voltar a CPMF, supostamente para financiar a saúde.
A candidata oficial tinha prometido que não iria aumentar impostos, e que iria até abaixar alguns.
Tudo isso prometendo uma saúde funcionando a 150% (sim, porque o presidente sainte já tinha dito que o SUS era quase perfeito).
Agora fazem volta atrás, contando com a nossa indiferença ou a nossa falta de lembrança.
Não com a minha, ou as minhas: eu não sou indiferente, e não tenho problemas de memória. Aliás, tenho os meus dois neurônios empregados na tarefa em perfeitas condicões de funcionamento (não precisao mais do que dois para se lembrar de coisas desagradáveis).
Tampouco gosto que mintam para mim, e acho que você também não gosta, caro leitor.
Aux armes citoyens?
Paulo Roberto de Almeida

Demanda de aluguel

Dora Kramer - O Estado de S.Paulo
05 de novembro de 2010

O tema não foi tocado nem de leve em toda a campanha eleitoral. Aliás, tirando o presidente Luiz Inácio da Silva, nunca mais, desde dezembro de 2007, se ouviu ninguém alimentar nostalgia pelo imposto do cheque.
Nem os governadores falaram mais no assunto e isso inclui os agora reeleitos, os eleitos e os que eram senadores à época da derrubada da CPMF e muito contribuíram para o resultado de uma votação que até hoje deixa o presidente Lula inconformado.
A tal ponto que ele foi "caçar" um a um os senadores oposicionistas nessa eleição, dedicando-se com empenho pessoal e especial a lhes impor derrotas. Saiu-se bem em alguns casos, em outros fracassou.
Convém recordar que a derrota na votação da renovação da CPMF no Senado enterrou o projeto do terceiro mandato, pois ali ficou claro que se passasse pelos deputados, pelos senadores não passaria. Portanto, aquela não foi uma derrota qualquer.
Foi uma derrota política surpreendente e definitiva.
A história contada pela presidente eleita de que não poderá se furtar a uma discussão levantada pelos governadores parece conto da Carochinha. De uma hora para outra, sem mais nem menos, os governadores - note-se, de partidos aliados ao governo - resolveram considerar a volta da CPMF uma urgência urgentíssima?
Um desses governadores, Renato Casagrande, do Espírito Santo, foi um dos mais combativos senadores na derrubada do imposto há três anos.
Dilma, quando candidata, negou intenção de recuperar o imposto. Compreende-se, dada a impopularidade do tema.
Então, nem bem é eleita Lula a chama com urgência ao Planalto - tanta que ela já estava com as malas no carro para sair em viagem - para uma entrevista coletiva em que o assunto de maior destaque é justamente a demanda dos governadores do PT e do PSB.
Não é necessário exercício muito elaborado de observação e dedução para perceber de quem é a ideia de pôr a CPMF de volta na agenda e tentar uma revanche logo no início do mandato para aproveitar a boa vontade geral com a presidente que entra e testar a força do novo Congresso de maioria governista folgada.
Seria uma bela vitória para a estreante nas lides político-palacianas. Os governadores, até de partidos de oposição, não teriam constrangimento algum em aderir, como de resto os politicamente fiéis não estão encontrando dificuldades para aparecer na cena como autores do plano.
Com a ampla maioria agora também no Senado, em tese não seria impossível pensar que o imposto do cheque passasse pelo Congresso.
Enfrentaria, no entanto, obstáculos difíceis de serem transpostos, exatamente por causa da amplitude, heterogeneidade e voracidade da "base". Dilma Rousseff precisaria administrar um problema de altíssima monta logo na estreia.
Sozinha ainda não reúne experiência para tal. Com o antecessor manejando os cordéis? Não combina com a promessa de Lula de cumprir uma quarentena.
Há também aquele outro problema chamado opinião pública. Em 2007 houve uma mobilização forte que inicialmente não foi dos partidos, DEM e PSDB.
Eles embarcaram na onda da campanha deflagrada pelo setor produtivo e conseguiram capitalizar a insatisfação da sociedade somada a contrariedades na base parlamentar governista e à displicência da articulação política.
No ano seguinte o governo tentou retomar o assunto mudando o imposto de nome e, depois, no ano passado, fez um novo ensaio. Não deu certo.
Desta vez pode ser que dê, exatamente porque a correlação de forças está ainda mais favorável ao governo e há Lula solto para poder articular.
Seria, porém, o caso de se fazer a conta se para a presidente Dilma seria um bom negócio comprar uma briga desse tamanho com a opinião pública e o empresariado logo aos primeiros acordes da sua sinfonia.
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E um comentário, de quem vocês já conhecem. Alguns podem até não gostar, mas isso não me importa; o que importa, para qualquer pessoa inteligente, são os argumentos, não que os expressa. Este blog é um blog de ideias, nao de pessoas...



Reinaldo Azevedo, 5.11.2010
Vejam como a coisa pode começar facinha, facinha, para Dilma Rousseff. O Estadão conseguiu ouvir 25 dos 27 governadores eleitos (ou reeleitos) sobre a volta da CPMF. Disseram-se favoráveis ao imposto 14 deles. O único oposicionista do grupo é Antonio Anastasia, de Minas (PSDB).
Agora a boa notícia: disseram “não” Geraldo Alckmin (PSDB-SP), Beto Richa (PSDB-PR), Marconi Perillo (PSDB-GO), Simão Jatene (PSDB-PA), Rosalba Carlini (DEM-RN) e Raimundo Colombo (DEM-SC). Três outros oposicionistas, embora ouvidos, preferiram não opinar: Teotônio Vilela (PSDB-AL), Anchieta Júnior (PSDB-RR) e Siqueira Campos (PSDB-TO). Entre os governistas, só dois não disseram nem “sim” nem “não”: Sérgio Cabral (PMDB-RJ) e Confúcio Moura (PMDB-RO). Roseana Sarney (PMDB-MA) e Omar Aziz (PMN-AM) não foram encontrados. Os outros 13, todos da base aliada, são favoráveis.
Publiquei ontem aqui um post com um vídeo sobre o paraíso em que Dilma prometeu transformar a saúde brasileira. Teria sido honestíssimo ter dito: “Olhem, quero fazer tudo isso, mas conto com a colaboração de vocês. Nós vamos recriar a CPMF…” Sim, eu sei, eleitoralmente não teria sido muito inteligente. Então se promete o céu e depois se vai atrás de um imposto… É mais inteligente, mas muito pouco honesto.
Esse debate já começa na pura malandragem. Dilma vai ter uma maioria acachapante no Congresso. Lá é o lugar de propor impostos novos e debater com a sociedade. O truque, posto em prática pelos governadores do PSB, é dividir o ônus da criação de mais um imposto com as oposições. Antonio Anastasia, governador de Minas — e, supõe-se, o senador eleito Aécio Neves — topam a parada. Seria a primeira promessa descumprida por Dilma. Usará os governadores como laranjas. Que os da situação ofereçam seu auxílio, vá lá. Que um oposicionista já tenha se oferecido…
Não se trata de saber se é preciso ter mais dinheiro ou não, se o importo será grande ou pequeno. Claro que é preciso mais grana. É defensável, sob certo ponto de vista, criar contribui8ções para a educação, para o transporte público, para a segurança, para engordar os magros, emagrecer os gordos, construir casas… Para todas as demandas da sociedade, existem os tributos arrecadados. A carga no Brasil já beira a extorsão. O que está em debate é o caminho. E o caminho está errado.
Qual vai ser a orientação? Vai se criar primeiro o imposto da saúde para, depois, debater a queda da carga tributária? Ora, tenham paciência! O truque é primitivo!
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Editorial O Estado de S.Paulo, 5/11/2010
CPMF - primeiro recuo de Dilma

- O Estado de S.Paulo
A promessa da presidente eleita de conter o gasto, controlar sua qualidade e aliviar a tributação já está prejudicada. Ela se declarou disposta a discutir a recriação do malfadado imposto sobre o cheque, a CPMF, uma das maiores aberrações do sistema tributário brasileiro. O recuo indisfarçável ocorreu na entrevista de anteontem no Palácio do Planalto, na qual, primeiro, negou a intenção de mandar ao Congresso uma proposta sobre o assunto e, depois, prometeu conversar com os governadores favoráveis à contribuição. Ao anunciar essa disposição, não apenas tornou seu discurso ambíguo, mas abriu uma brecha nos compromissos formulados na primeira fala depois da eleição e deu mais um argumento a quem recebeu com ceticismo o pronunciamento de domingo à noite.

Segundo a presidente eleita, governadores estão mobilizados para a defesa da volta da CPMF, extinta em dezembro de 2007. Foi uma referência ao movimento anunciado pelo governador reeleito do Piauí, Wilson Martins (PSB). Ele disse ter conversado sobre o assunto com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Além de Martins, também os governadores Cid Gomes (PSB-CE), Eduardo Campos (PSB-PE), Renato Casagrande (PSB-ES) e Jacques Wagner (PT-BA) defendem a proposta.

O presidente Lula encarregou-se de levantar o assunto na quarta-feira, antes da entrevista de sua sucessora. Ele mais uma vez lamentou a extinção da CPMF e acusou a oposição de haver prejudicado a maioria dos brasileiros.

Mas os tão pranteados R$ 40 bilhões anuais da CPMF nunca fizeram falta para a política de saúde. A arrecadação e a carga tributária continuaram crescendo nos anos seguintes. Se o presidente quisesse, poderia ter destinado verbas maiores aos programas de saúde. Bastaria conter despesas menos importantes ou claramente improdutivas. Frear o empreguismo e renunciar ao inchaço da folha de pessoal teriam sido boas providências.

Em nenhum outro país emergente a carga tributária é tão pesada quanto no Brasil, onde está próxima de 35% do Produto Interno Bruto (PIB). Além disso, a tributação brasileira é maior que a de várias economias avançadas, como Estados Unidos, Japão, Suíça, Espanha e Canadá. Emergentes com tributação menor que a do Brasil, incluídos México, Chile, Argentina e alguns asiáticos, têm padrões sanitários e educacionais superiores aos brasileiros.

A CPMF é desnecessária. União, Estados e municípios arrecadam, em conjunto, mais que o suficiente para custear os programas de saúde. Só não cumprem seus compromissos como deveriam por ineficiência e porque muitas administrações padecem de empreguismo e corrupção. Dinheiro não falta, mas falta usá-lo bem.

A CPMF serviu sobretudo para dar ao governo maior liberdade de gasto - não necessariamente um gasto bem dirigido. O grau de competência dos administradores continuou - e continua - sendo o fator mais importante para o sucesso ou insucesso das políticas de saúde. Mas o presidente Lula, seu partido e seus aliados nunca deram muita importância a variáveis como produtividade e competência.

Com o aumento dos gastos nos últimos dois anos, era previsível a volta da CPMF à pauta política depois das eleições, disse o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas. A única surpresa, segundo ele, foi um retorno tão cedo.

Só "ricos e grandes" pagavam a CPMF, segundo o governador Wilson Martins. Mais que uma tolice, o argumento é indício de notável desinformação. O imposto do cheque incidia sobre toda liquidação financeira e, portanto, sobre cada operação da malha produtiva. Quanto mais complexa a malha, maior o peso dessa tributação, maior o dano ao poder competitivo do produtor nacional e maior o prejuízo para a criação de empregos.

A presidente eleita prometeu valorizar a seriedade fiscal e a eficiência administrativa. Se não quiser comprometer desde já sua credibilidade, deve ser fiel àquelas ideias, definindo-se claramente contra a criação de impostos para financiar a gastança e renunciar de forma inequívoca às aberrações do tipo da CPMF.

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