TENDÊNCIAS E DEBATES
Os royalties e a ‘maldição da riqueza’
Estudo mostra que, em vez de melhorias na infraestrutura, saúde e educação, dinheiro do pré-sal se esvai em burocracia e corrupção.
Por Hugo Souza
Opinião e Notícia, 28/10/2011
O Senado federal aprovou na semana passada o projeto que prevê a redistribuição dos royalties da camada pré-sal para todos os estados e municípios do Brasil, diminuindo a porcentagem dos recursos destinados aos estados e municípios produtores.
A decisão desencadeou uma choradeira generalizada entre políticos fluminenses e capixadas, sobretudo. Choram, na verdade, desde a aprovação na Câmara em maio do ano passado da chamada emenda Ibsen, que previa uma drástica mudança na forma de divisão dos recursos provenientes da exploração de petróleo no Brasil.
Naquela feita, o governador do Rio da Janeiro, Sergio Cabral, chorou literalmente ao falar sobre a emenda — que acabaria vetada pelo então presidente Lula — em um evento na PUC-Rio, revoltado com a possibilidade de perda de arrecadação para o estado.
Chorou, porém, lágrimas de crocodilo, tendo em vista que o motivo alegado para o berreiro, ou seja, o de que a população fluminense seria gravemente penalizada em caso de redistribuição dos royalties do petróleo, não resiste, para usar uma palavra cara ao governo do Rio, a um leve “choque” de realidade.
Campos de petróleo e de pobreza
Um estudo do Departamento de Economia da Universidade Estadual Paulista mostrou que, por maiores que sejam os recursos provenientes da exploração de petróleo, eles não necessariamente se traduzem em melhores condições de vida para a população. Ao contrário: no fim das contas, lá no fim, o destino de tanta riqueza é financiar o inchaço da administração estatal e encher o bolso dos corruptos. Talvez esteja aqui o motivo de tanto desespero de políticos dos estados produtores quando se veem obrigados a dividir o dinheiro da farra com terceiros.
O destino de tanta riqueza é financiar o inchaço da administração estatal e encher o bolso dos corruptos. (Ilustração/Alviño)
O maior exemplo disso vem exatamente da cidade brasileira que mais recebeu dinheiro do petróleo em toda a história: Campos dos Goytacazes, no norte do estado do Rio de Janeiro, para onde foram mais de R$ 1 bilhão em royalties em 2010 e onde os recursos do pré-sal representam cerca de 70% do orçamento municipal. Lá, a destinação prioritária dos recursos do petróleo não é a saúde, tampouco a educação, muito menos a cultura ou projetos de habitação, ou qualquer esforço para melhorar a qualidade de vida da população local ou a infraestrutura.
Lá, no feudo da família Garotinho, os recursos do petróleo se esvaem em ações de cunho eleitoreiro e em destinações, digamos, ainda menos ortodoxas. Desde 2004 a prefeitura de Campos gastou cerca de R$ 18 milhões em convênios com quatro hospitais da cidade, mas o número de internações se manteve o mesmo, bem como o índice de desenvolvimento humano da cidade permanece em níveis pífios.
E como será no Piauí?
Ou será que foi mesmo em defesa do povo que Rosinha Garotinho, a prefeita cassada de Campos que se mantém no cargo por liminar, e seu consorte promoveram no último dia 17 de outubro uma manifestação na Cinelândia, no centro do Rio, debaixo de chuva, para protestar contra o compartilhamento dos royalties do pré-sal com os estados e municípios não-produtores?
“Em cidades como Campos dos Goytacazes, criou-se uma maldição da riqueza. Esse dinheiro foi gasto com a máquina pública e não trouxe desenvolvimento. Com essa distribuição dos recursos do pré-sal que está sendo discutida, certamente também não traremos desenvolvimento”, disse o coordenador do estudo da Unesp, Claudio Paiva, ao portal Terra.
Mas, no Rio, já há quem diga que, diante do sorvedouro político local dos recursos do petróleo, talvez seja de fato melhor dividir os royalties do pré-sal com outros estados.
Estados como o Piauí, o mais pobre do Brasil, que deve receber R$ 15 milhões em royalties do pré-sal já em 2012. O governador do estado, Wilson Martins, garantiu: “nossa prioridade de investimento é saúde, educação e segurança. Sem dúvidas a população vai sentir o impacto dessas mudanças”.
Sem dúvidas?
Caro leitor,
Você concorda com a redistribuição dos recursos do petróleo para todos os estados e municípios do Brasil?
Você acha que deveria haver vinculação por lei dos recursos do petróleo a melhorias na saúde e na educação, por exemplo?
Você confiaria bilhões de reais em recursos extras às decisões de políticos como Rosinha Garotinho?
4 comentários:
foi triste ler isso, sério...
Nada do que eu diga mudará a situação.
Nada do que eu pense abrandará
minha impressão.
Nada com nada é desilusão.
É... parece que estou doente.
Em solidariedade a tristeza do leitor do comentário anterior.
Gilrikardo / Joinville / SC
Na minha opinião o mais correto seria destinar 50% disso tudo aí para a educação e pesquisa, nada mais justo e óbvio. Os outros 50% diretamente para setores considerados críticos em infraestrutura, como no caso a saúde, mas infelizmente não é fácil assim!
Kaio,
Sem pretender ser contrarianista, mas sendo, eu diria que os problemas da educação não vão ser resolvidos com mais dinheiro simplesmente, embora um pouco de dinheiro sempre ajuda em muita coisa.
No caso da educação, porém, pode até piorar, se enfiarmos dinheiro novo em coisa ruim.
A educação precisa uma revolução completa, antes e sem ganhar dinheiro nenhum.
Quando e se ela puder ser reformada, em todos os níveis e radicalmente, aí sim eu diria que mereceria não dinheiro novo -- pois ele já existe e é mal gasto - mas que o dinheiro existente servisse para pagar melhores salários aos professores, mas apenas aos que estiverem efetivamente EM SALA DE AULA.
Paulo Roberto de Almeida
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