O lugar dos
partidos nas manifestações
Lucas Berlanza
Instituto Liberal (via Blog Libertatum, em 14/03/2015)
À medida que as aguardadas manifestações
do dia 15 de março vão ficando mais próximas, os diferentes grupos de interesse
prestam maior atenção aos movimentos que as organizam e compreendem a dimensão
que elas podem atingir. A preocupação prévia do Planalto com a articulação dos
protestos e a queda retumbante de popularidade da presidente apenas jogam
tempero nesse cenário. Diante desse desenho, e do fato de a palavra
“impeachment” estar presente como nunca antes, desde Collor, no dia-a-dia
nacional, os partidos começam a acordar para a realidade.
Um tanto tarde. Quem mobiliza e desperta
consciências para a necessidade de uma oposição legítima – não limitada a uma
disputa rasteira por cargos, mas disposta a um verdadeiro confronto de
princípios e projetos de país, o que não é para covardes hesitantes – são
movimentos sociais, como o Movimento Brasil Livre, que recentemente entrevistamos para este blog, e que demonstram
a origem espontânea de sua articulação, sem o incentivo direto ou o
investimento de legendas ou de “medalhões” da política brasileira. As
manifestações de 15 de março são obra desses movimentos, convidando abertamente
a todos os cidadãos. Têm bandeira: a do Brasil. Isso quer dizer que são
apartidárias, e assim deveriam permanecer, para que sejam capazes de passar o melhor
recado à sociedade, bem como por uma questão de justiça com aqueles que de fato
tiveram a iniciativa e as organizaram.
Nesta quarta-feira, o maior partido de
oposição, o PSDB, divulgou nota oficial em que declara apoio aos eventos que
prometem levar multidões pelas ruas de vários estados, apontando-os como
“manifestações de indignação dos brasileiros diante da flagrante degradação
moral e do desastre econômico-social promovidos pelo governo Dilma Rousseff”.
Os tucanos sustentaram o princípio da liberdade de expressão, alfinetando os
arroubos autoritários do petismo, e anunciaram que participarão dos aglomerados
“através de seu militantes, simpatizantes e várias de suas lideranças”. Essa
declaração acontece pouco depois de Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente do
país e grande símbolo “humano” do partido, ter dito que “não adianta nada tirar
Dilma”, e Aloysio Nunes, que até então vinha demonstrando um espírito combativo
incomum para os companheiros de tucanismo, dizer que não quer impeachment, pois
prefere “ver a Dilma sangrar” – o que enxergamos como uma afirmação lamentável,
afinal a sangria prolongada da presidente representa a continuidade do
sofrimento atroz do povo brasileiro, diante da crise instalada. Ora, exigir o
impeachment – ou a renúncia – de Dilma é o principal clamor dos manifestantes,
conquanto não seja o único, já que a indignação é bastante mais geral e
abrangente. Posicionamento similar foi adotado em 2005, diante do falso “herói
popular dos trabalhadores” Lula da Silva – que na verdade se orgulha de não
gostar de ler e nunca foi lá muito chegado a trabalho -, quando o PSDB preferiu
vê-lo “sangrar”. Quem sangra hoje, depois do maior escândalo de corrupção da
história das Repúblicas, é o Brasil. O apoio tímido e tardio do PSDB, que não pode
ser meramente reprovado pelos amantes da democracia, também não pode ser
aproveitado de maneira oportunista pelas lideranças tucanas. Escrevemos na
intenção de fazer um apelo, defendendo um ponto de vista que acreditamos
prudente: bandeiras, símbolos e slogans, apenas aqueles que são genericamente
de interesse nacional. Nada de propaganda partidária.
Não somos contra manifestações de
partidos, de maneira nenhuma; apenas não é o propósito. Sabemos que o MBL não é
tucano, o povo que vai às ruas não é necessariamente tucano, esta não é uma
manifestação do PSDB. Isto é o que deve ficar claro – e, felizmente, a julgar
pelas declarações dos políticos do partido, eles também compreendem essa
realidade.
Por outro lado, caso ações efetivas
contra o governo possam se concretizar, no âmbito de processos políticos, em
especial o impeachment, podemos prever que a anuência de partidos e
representantes políticos formais se fará necessária. Não será o caso, então, de
encarar os fatos com ingenuidade; não precisamos louvar ou apreciar as
lideranças que possivelmente estiverem então fazendo acontecer, mas devemos
entender que os limites pragmáticos nos impõem a aceitação dos trâmites
institucionais democráticos, tal como funcionam. Os diferentes podem agir
conjuntamente, se tiverem um propósito em comum.
A surpresa da semana é que quem toma
iniciativas concretas, no momento, não é o PSDB; o Partido Solidariedade,
presidido por Paulinho da Força, foi o primeiro a formalizar uma campanha
oficial pelo impeachment. O partido alega estar há alguns meses buscando
pareceres jurídicos que embasem a ousada decisão, como o do renomado Ives Gandra Martins, e
pretende promover uma coleta de assinaturas favoráveis. Além disso, o que é
mais importante, a coluna de Reinaldo Azevedo na Veja informa
que o Solidariedade está em diálogo a respeito dessa possibilidade com o bloco
de partidos que se uniram a ele para a eleição da Câmara, especialmente os nada
desprezíveis PSB, PPS e PV. AFolha de São Paulo acrescenta
que Paulinho já teria conversado sobre essa intenção com Eduardo Cunha,
presidente da Câmara, visivelmente descontente com o relacionamento com o
Planalto. Para tomar medidas concretas, precisamos de agentes concretos. Para
os fatos que podem estar por vir, os partidos e representantes terão seu lugar.
No domingo, porém, que esse lugar seja dimensionado, restrito aos seus méritos
e à sua conveniência. Que os que assim desejam, não marchem como militantes de
alguma sigla; marchem tão somente – o que já é muito – como patriotas.
Sobre o autor
Acadêmico
de Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo, na UFRJ, e colunista do
Instituto Liberal. Estagiou por dois anos na assessoria de imprensa da
AGETRANSP-RJ. Sambista, escreveu sobre o Carnaval carioca para uma revista de
cultura e entretenimento. Participante convidado ocasional de programas na
Rádio Rio de Janeiro.
Matéria extraída do website do Instituto Liberal
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