sexta-feira, 26 de junho de 2020

Joel Mokyr, historiador econômico - entrevista (Revista Exame)

“Não é o vírus que tira meu sono”

O historiador americano Joel Mokyr diz que a sociedade tem mais condições para enfrentar pandemias


O historiador econômico Joel Mokyr, professor na Universidade Northwestern, em Chicago, acredita que a sociedade hoje tenha muito mais ferramentas para enfrentar pandemias como a do novo coronavírus. E, por isso, crê que seus efeitos serão limitados. O que ele teme, porém, são as investidas de líderes populistas contra a democracia e as instituições  (Agence Opale/Alamy/Fotoarena)

O historiador econômico naturalizado americano Joel Mokyr costuma se diferenciar de seus pares por um olhar otimista sobre a capacidade da sociedade de enfrentar os desafios que os tempos atuais impõem. Um dos maiores especialistas do mundo em economias industriais modernas e professor na Universidade Northwestern, em Chicago, Mokyr acredita que os avanços científicos e tecnológicos tenham criado uma resiliência muito maior das economias perante as adversidades. São essas conquistas que o fazem pensar que o impacto do coronavírus deve ser limitado.
O historiador, porém, diz que tem se preocupado muito mais com retrocessos na democracia, nas instituições e nas liberdades individuais. “Essa é a vulnerabilidade da sociedade hoje. A prosperidade econômica exige um alto grau de liberdade, inconformismo e gente pensando fora da caixa”, afirma Mokyr. 

Leia a seguir a entrevista concedida à ­EXAME.

Do ponto de vista da história econômica, como o senhor dimensiona a pandemia do novo coronavírus?
>A pandemia vai trazer mudan­ças permanentes, mas, pensando num cenário mais amplo, não acho que mudará o curso da sociedade. Continua­remos a ter um crescimento econômico baseado em avanços cie­ntíficos e tecnológicos. É fato que não vivemos nada parecido com isso nos últimos 100 anos. Surgiram novos vírus, como o zika e o HIV. Pense na aids: quando surgiu, era asso­ciada a grupos como o de homossexuais e o de hemofí­licos. Não havia um medo co­­letivo de contrair aids. No caso da covid, sabe-se que os assintomáticos são capazes de transmitir a doença, mas não há segurança de como e quando isso ocorre, o que exigiu que tudo fosse fechado e as pessoas se recolhessem em casa.
Mas os impactos econômicos serão profundos…
Sim, os efeitos de longo prazo vão persistir. Talvez sejam necessários dois ou três anos para estarmos no patamar do PIB global anterior ao da pandemia. Mas os efeitos são dispersos e desiguais. Há setores que foram duramente atingidos, como o transporte aéreo. Um grande número de pequenas empresas, talvez 50%, não voltará a operar nos Estados Unidos. Negócios como restaurantes, oficinas, salões de beleza não vão sobreviver à crise. Mas é como ocorre depois de um incêndio florestal: o meio ambiente é tão favorável que outras árvores vão nascer naquele lugar. No caso de um restaurante, por exemplo, a demanda deve continuar lá, os profissionais permanecem disponíveis. Outros virão.
Mas quais mudanças a pandemia deverá trazer?
Haverá, obviamente, ajustes na economia. E nem todos serão ruins. Muitas pessoas descobriram que conseguem trabalhar produtivamente de casa, e o teletrabalho será cada vez mais comum. Vamos repensar a utilização dos espaços, que na prática são aproveitados somente 50% do tempo. Metade do tempo nós estamos em casa; e metade, no trabalho. É muito desperdício.
As pandemias do passado não nos prepararam para a atual?
Sempre soubemos do risco de novas pandemias. Os governos têm sido alertados para isso e sobre como deveriam responder adequadamente. Historicamente, o meio ambiente joga contra os seres humanos. Doenças antigas sofrem mutações e podem se tornar mais agressivas. Foi isso que aconteceu com a varíola. Era um vírus que sempre esteve por aí e, entre os séculos 16 e 17, uma mutação o tornou muito mais virulento. As pessoas ficaram apavoradas, pois era uma doen­ça terrível e mortal. Aí descobriu-se a vacina em 1796 e foram necessários 200 anos para que a doença fosse erradicada. Um processo parecido ocorreu com a pólio nos anos 1920 e 1930, quando surtos da doença provocaram pânico. E aí veio a vacina nos anos 1950. Essas coisas se repetem. É uma eterna guerra entre os humanos e os microrganismos que tentam nos matar.
Laboratório na Itália: “O sequenciamento genético do novo coronavírus levou semanas para ser feito” | Antonio Masiello/Getty Images
Laboratório na Itália: “O sequenciamento genético do novo coronavírus levou semanas para ser feito” | Antonio Masiello/Getty Images (Divulgação/)
Mas os avanços científicos não colocam a humanidade numa situação muito mais vantajosa hoje?
A humanidade tem hoje ferramentas que há 100 anos, quando emergiu a gripe espanhola, nem sequer poderiam ser imaginadas. Em 1918, as pessoas não sabiam que a gripe espanhola era causada por um vírus, que foi isolado apenas em 1933. Já o sequenciamento genético do coronavírus foi feito em semanas, em meio a uma crise sanitária que surgiu há seis meses. A gripe espanhola matou 50 milhões de pessoas no mundo. Nos Estados Unidos, as estimativas apontam que morreram aproximadamente 600.000 pessoas na época, numa população equivalente a um terço da atual. Se a covid-19 tivesse a mesma mortalidade da gripe espanhola, ela mataria 2 milhões de americanos. E isso não vai acontecer. Vamos derrotar o vírus e, no processo, vamos aprender mais e criar novas soluções que serão aplicadas a outras coisas. E na próxima pandemia seremos ainda mais rápidos.
A sociedade se tornou mais resiliente, portanto?
Somos mais resilientes a qualquer tipo de choque porque a prosperidade das nações hoje é construída com base em conhecimento e tecnologia. Isso é difícil de destruir. A pobreza no mundo vem caindo rapidamente nos últimos 20 anos, sobretudo por causa do crescimento econômico da China e da Índia. Esses fundamentos devem continuar os mesmos. Sendo muito franco, o que me tira o sono não é um vírus, mas os ataques à democracia e às instituições. Essa é a vulnerabilidade da sociedade hoje. O risco para a prosperidade futura não vem da natureza, de pandemias ou terremotos, mas, sim, dos seres humanos.
Quais riscos o senhor vê?
Nos últimos 20 anos, porém, houve um declínio acentuado na prevalência e na popularidade das democracias liberais. Isso faz parte de um “ciclo normal”. As democracias liberais são processos confusos e difíceis de manejar, geralmente repletos de corrupção. Então, as pessoas se cansam delas e escolhem populistas autoritários ou machos “lei e ordem”, como Rodrigo Du­terte, nas Filipinas, e Hugo Chávez, na Venezuela, somente para descobrir que são dez vezes piores, e depois querem os democratas de volta.
Por que isso ocorre?
O problema é que existe uma assimetria: é fácil votar em líderes democráticos inaptos ou desonestos — essa, afinal, é a ideia por trás da democracia. Mas os autoritários, em geral, exigem muito mais esforço para ser desalojados: veja o horrível Viktor Orbán, na Hungria, para não falar de Vladimir Putin, na Rússia, e Xi Jinping, na China. Foi preciso uma guerra para livrar o mundo de Mussolini e uma espera de 30 anos para fazer o mesmo com Franco, na Espanha. Eles compartilham entre si uma visão anti-intelectual e anticiência, sem compromisso com valores como a liberdade de expressão. Eles não são conservadores, mas criam uma mistura tóxica de ideologia nacionalista reacionária, criptofascista e raivosa.
O presidente Jair Bolsonaro já se envolveu em muitas polêmicas desde que foi eleito e agora tem minimizado os impactos da pandemia no Brasil. Como o senhor avalia o presidente brasileiro?
Bolsonaro representa uma tendência global em direção ao declínio da qualidade institucional e à corrupção da governança básica. O que a história nos conta é que, ao contrário da tecnologia que sempre melhora, isso não se aplica aos governos, que ora avançam, ora retrocedem. Mas a diferença entre esses novos líderes populistas está nas restrições institucionais que enfrentam: Duterte e Putin podem se safar de assassinatos, Xi é ainda pior, Trump não pode fazer da maneira que ele gostaria. Vamos torcer para que Bolsonaro acabe mais como Trump e menos como Putin. Mas não invejo os brasileiros.
A polarização foi ampliada pelas redes sociais?
Não estou convencido de que isso seja tão novo assim. Muito lixo já foi publicado nos jornais antes do surgimento do Twitter e do Facebook. Nos Estados Unidos, Joseph McCarthy liderou uma rede de notícias falsas em nome do combate ao comunismo na década de 1950. A vantagem da internet e das redes sociais é que o acesso é muito barato. As pessoas costumam ler basicamente o que confirma o que elas pensam. Se olharmos para os anos 1950 e 1960, não era tão diferente assim. Acho que o impacto atribuído às redes sociais é exagerado.
Mas qual é a diferença hoje?
A diferença está nas pessoas­ que têm poder e tomam as decisões. Trump acabou de cortar relações com a Organização Mundial da Saúde. Isso não é uma notícia falsa, é política. Existe um movimento de desmantelamento da cooperação global que pode resultar em políticas mais agressivas contra, por exemplo, a redução dos efeitos das mudanças climáticas. Isso não ocorre somente nos Estados Unidos. Veja o que acontece na China. Os chineses abandonaram o comunismo, abriram seu mercado e tornaram-se uma economia capitalista. Mas uma economia capitalista exige mais democracia, porque são coisas que andam juntas. E Xi Jinping, em particular, virou as costas à democracia, à proteção dos direitos individuais, à liberdade de expressão. É o que estamos vendo também nos protestos em Hong Kong. O filósofo e historiador alemão ­Friedrich ­Schiller [1759-1805] disse que “contra a estupidez até os deuses lutam em vão”.
Com a pandemia, temos visto muitos ataques às cadeias globais de produção, sobretudo as da China. Essa é uma preocupação legítima ou é uma desculpa para uma guerra comercial?
Diria que o fato de a pande­mia ter iniciado em Wu­han, na China, é nada mais do que um azar. E daí? É responsabilidade dos chineses? É verdade que sob a administração Trump há claros sinais de aumento da sinofobia, especialmente porque Peter Navarro [conselheiro econômico de Trump] tem alegado que a China está trapaceando, roubando a tecnologia e destruindo a indústria americana. Resumindo, para Navarro os chineses são pessoas terríveis. Obviamente, ele não menciona que a China é quem há anos fornece produtos baratos que foram incrivelmente favoráveis aos consumidores americanos. Provavelmente, 50% das coisas que tenho na minha casa foram feitas na China. Os chineses não são perfeitos, claro, mas também não são essa força do mal. Dito isso, a China ficou mais agressiva sob a liderança de Xi, o que explica o aumento dos ataques por parte do governo Trump.
Há riscos contra a globalização?
Ela não está morta, mas profundamente abalada. A globalização foi uma força para o bem. Fez muita gente enriquecer e tornou o mundo mais integrado. Não foi boa para todo mundo, como quase nada é, mas foi a principal responsável por tirar milhões de pessoas da pobreza. É só olhar para o que aconteceu em Bangladesh, um lugar absurdamente miserável. O setor têxtil lá passou a produzir para as grandes marcas globais, a um custo baixíssimo, em condições de trabalho horríveis. O que aconteceu com a pandemia? Todas as fábricas fecharam e o que era ruim ficou pior. E foi isto que a globalização fez: deu a pessoas muito pobres uma chance de sobreviver. Elas não vivem bem, certamente poderia ser melhor, mas tirar isso delas é tornar tudo pior — tanto que as fábricas de vestuário estavam reabertas em maio. A globalização fez muito pelas pessoas, mas pode colapsar muito rápido. Essa parte da economia é pouco resiliente.
Os países estão gastando trilhões de dólares no combate à crise. O papel dos governos vai mudar com a pandemia? 
As dívidas vão aumentar para todos os paí­ses do mundo, sem dúvida nenhuma. No entanto, pragmaticamente, o que muda num país em que o endividamento de 90% do produto interno bruto passa temporariamente para 120%? O que espero é que as pessoas percebam que riscos como as pandemias exigem mais intervenção dos governos. É algo que o livre mercado jamais será capaz de lidar sozinho. Questões fundamentais virão quando surgir a vacina. Qual será o preço dela? Como será sua distribuição? Quem tiver dinheiro vai se vacinar antes dos mais pobres? Não sou um grande fã do Estado como regulador, mas esse é um caso em que as forças do mercado não podem agir sozinhas.
O presidente americano, Donald Trump, anuncia corte para Organização Mundial da Saúde: “Não é fake news. Isso é política”, diz Mokyr | Alex Wong/Getty Images
O presidente americano, Donald Trump, anuncia corte para Organização Mundial da Saúde: “Não é fake news. Isso é política”, diz Mokyr | Alex Wong/Getty Images (/)
Em quais outras situações os governos deveriam ser mais atuantes?
Um assunto urgente é a questão das mudanças climáticas. Sem a intervenção dos governos, esse será de longe um desastre muito maior do que a pandemia de covid-19 terá sido. A diferença é o tempo do impacto. Os efeitos das mudanças climáticas levam anos para se manifestar. É apavorante o que pode acontecer e ninguém está fazendo nada a esse respeito. Já sabemos o que precisa ser feito e também como fazer, mas isso demanda recursos que os governos só passam a gastar se outros governos também estiverem desembolsando. E, ainda assim, os recursos não serão suficientes. O mundo atingiu uma sofisticação tecnológica capaz de solucionar muitos dos nossos problemas, porém seguimos tendo líderes idiotas. A prosperidade econômica exige um alto grau de liberdade, inconformismo e gente pensando fora da caixa.

quinta-feira, 25 de junho de 2020

Why the Central Bank "Bailout of Everything" Will Be a Disaster - Daniel Lacalle (Mises)

Why the Central Bank "Bailout of Everything" Will Be a Disaster

Mises, 06/24/2020
Despite massive government and central bank stimuli, the global economy is seeing a concerning rise in defaults and delinquencies. The main central banks’ balance sheets (those of the Federal Reserve, Bank of Japan, European Central Bank, Bank of England, and People’s Bank Of China) have soared to a combined $20 trillion, while the fiscal easing announcements in the major economies exceed 7 percent of the world’s GDP according to Fitch Ratings.
This is the biggest combined stimulus plan in history. However, businesses are closing at a record pace and unemployment has reached extremely elevated levels in many countries.
There is an important risk in what I call the "bailout of everything," or the conscious decision by governments and central banks to provide any needed support to all sectors and companies with access to debt. Most of these stimulus packages and liquidity measures are aimed at supporting current government spending and providing liquidity to companies with assets, with access to debt, and in traditional sectors. It is not a surprise, then, that at the same time as we see the largest fiscal and monetary support plan since World War II, we are already witnessing two dangerous collateral effects: the rise of zombie companies and the collapse of small businesses and startups.
According to the Institute of International Finance (IIF), the figure of global corporate bond defaults has risen to $50 billion in the second quarter of 2020 despite historic low interest rates and high liquidity. Additionally, according to Deutsche Bank and the Bank of International Settlements, the number of zombie companies in the eurozone and the US, large companies that cannot cover their interest expenses with operating profits, has rocketed to new all-time highs. In 2019 Professors Petroulakis (ECB) and Andrews (OECD) stated, "Europe’s productivity problem is partly due to the rise of zombie firms that crowd out growth opportunities for others" ("What Zombie Firms Tell Us about Europe’s Productivity Problem,” World Economic Forum, April 2019). This problem is only increasing in the current crisis.
The rise in bond defaults is a consequence of previous high leverage in a weakening operating income environment. This should not be a concern if creative destruction works to improve the economy, as inefficient companies are taken over by efficient ones and new investors restructure challenged businesses to make them competitive. The big problem is how massive liquidity and low rates are perpetuating overcapacity and keeping an extraordinary amount of zombie firms alive.
Maintaining and increasing zombie firms destroys any positive effect from restructuring and innovation. Additionally, to maintain cash flows and stay alive, companies are cutting investment in innovation, technology, and research. Meanwhile, small businesses that do not own hard assets or have access to debt are dissolving every day. In most developed economies, where 80 percent of employment comes from small businesses, the "bailout of everything" is becoming a massive transfer of wealth from the new economy to the old economy, preventing a stronger and more productive recovery.
In the eurozone, the main beneficiaries of the European Central Bank corporate bond purchases are large industrial conglomerates that were already facing weak margins, poor growth, and bloated balance sheets in 2019. In the United States, the financing channel of the real economy is more diverse, and the impact of zombification is smaller, but not negligible or irrelevant.
Some of these problems may have been inevitable in a crisis, but the majority of them could have been mitigated significantly by implementing supply-side policies instead of large government-directed stimuli and recovery plans based on adding more debt to already challenged sectors.
The Bailout of Everything (as long as it is large) creates significant risks.
Low-productivity and indebted sectors survive, creating a perverse incentive that benefits malinvestment and poor capital allocation. Additionally, as these sectors already had overcapacity and structural problems, their bailout does not lead to higher job creation or stronger investment. Furthermore, high-productivity sectors will likely suffer the rising tax burden after these governments’ rescue plans diminish the employment potential and the likelihood of rising real wages as productivity growth stalls.
Finally, when governments bail out large and overcapacity-ridden conglomerates, investment in innovation, efficiency, and restructuring of loss-making divisions is severely diminished. Why? Because the reason why governments agree to take stakes or bail out large sectors is precisely to prevent them from restructuring in the first place. Tax cuts and supply-driven liquidity measures to small businesses and technology would have worked significantly better and at a lower cost for taxpayers.
What we are seeing today may have long-term negative implications.
A weaker than expected recovery, with low-productivity growth and a challenging return of the lost employment as well as poor investment growth, are likely the collateral damage of the misguided and panic-driven Bailout of Everything. Unfortunately, it will also generate more debt and higher taxes that will further complicate things for taxpayers and innovative sectors.
Author:
Daniel Lacalle, PhD, economist and fund manager, is the author of the bestselling books Freedom or Equality (2020), Escape from the Central Bank Trap (2017), The Energy World Is Flat (2015), and Life in the Financial Markets (2014).
He is a professor of global economy at IE Business School in Madrid.

A Sobrevivência da Humanidade, Erich Fromm (1961): minha primeira resenha publicada

Minha primeira resenha publicada, infelizmente perdida...


May Man Prevail? An inquiry to the Facts and Fictions of Foreign Policy
By Erich Fromm (1961)
Amid the uncertainty of the early 1960s, many feared imminent nuclear destruction. Drawing on this Cold War case study, a celebrated philosopher examines how paranoid thinking can dangerously influence public policy.

Este livro constituiu a minha primeira resenha publicada, na edição brasileira: A Sobrevivência da Humanidade (tradução de Waltensir Dutra; Rio de Janeiro: Zahar editores, 1961). Saiu no jornalzinho do Diretório Acadêmico que passamos a publicar, assim que conquistamos a representação estudantil no Colégio Estadual Ministro Costa Manso, no bairro do Itaim-Bibi, em São Paulo, em 1965. Infelizmente, nunca guardei cópia da resenha (que saiu publicada em mimeógrafo, algo que os mais jovens nunca encontraram na vida). Lembro-me apenas que mesmo convertido ao marxismo desde algum tempo, nunca fui pró-soviético, e credito a este livro minha precoce adesão a uma versão libertária do socialismo, mais pela vertente humanista (que era a de Erich Fromm), do que na versão stalinista-soviética.


Para que os meus leitores tenham uma ideia precisa da natureza e do conteúdo do livro, transcrevo o link para uma excelente resenha, de autoria de Friedrich Meier: 




quarta-feira, 24 de junho de 2020

Guilherme Casarões: sobre a destruição do Itamaraty, pelos mesmos que fazem guerra cultural de extrema direita

Permito-me postar uma série de tuítes do Guilherme Casarões sobre a destruição do Itamaraty pelos olavo-bolsonaristas, fanáticos antiglobalistas, que eu classificaria de demenciais:


Guilherme Casarões
Flag of Brazil

Desinformador profissional certificado pelo chanceler Ernesto Araújo. Professor/pesquisador no resto do tempo. Pai de dois
❤
. RT ≠ endosso. Opiniões pessoais.


24 de Junho de 2020

Conversation
Para onde vai a @FunagBrasil
? A política externa populista de @jairbolsonaro é parte integral da guerra cultural bolsolavista, em que instituições são desmoralizadas, aparelhadas e destruídas. O Itamaraty está sob ataque - e a corrupção da FUNAG faz parte do processo.



1) A destruição da inteligência acumulada pela FUNAG, braço acadêmico do Itamaraty, começou antes mesmo do início do governo. O manual de História do Brasil, do grande @joadani, foi retirado do site, onde poderia ser baixado gratuitamente. O problema do livro? Este parágrafo:


Replying to @GCasaroes
2) A 2ª pancada ocorreu no começo do mandato. @PauloAlmeida53 foi demitido do cargo de diretor do IPRI após republicar expoentes do "deep state" tucano-globalista, Rubens Ricupero e o ex-presidente @FHC. Nem Paulo nem Ricupero escondiam suas discordâncias com o antiglobalismo.



3) Ao longo de 2019, @ernestofaraujo se recusou a publicar 2 livros sobre política externa. O do embaixador Synesio Goes foi vetado por ter o prefácio escrito por Ricupero. O da pesquisadora Mathilde Chatin, barrado graças ao prefácio de Celso Amorim.

Com censura a obras acadêmicas, Araújo ameaça a imagem do próprio Itamaraty
https://t.co/ptfu0NMpfz?amp=1
https://brasilianismo.blogosfera.uol.com.br/2019/08/02/com-censura-a-obras-academicas-araujo-ameaca-a-imagem-do-proprio-itamaraty/

[Abro um parênteses, aqui, para transcrever o que Guilherme Casarões linkou, pois eu ainda não tinha tomado conhecimento dessa matéria, que cita o meu livro de 2019: "Miséria da Diplomacia", livremente disponível em meu blog Diplomatizzando]

Uma reportagem publicada pela Folha revela que o Itamaraty se recusou a publicar um livro do embaixador Synesio Sampaio Goes Filho por conta do prefácio da obra, escrito por Rubens Ricupero, ex-embaixador em Washington e também historiador da diplomacia –e visto como desafeto pelo atual ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo.
O caso não é isolado, entretanto, e o clima de revisão e censura também atinge outras obras que passam pelo MRE. Esta tendência cria uma ameaça à imagem de profissionalismo, olhar crítico e independência do Itamaraty no resto do mundo.
Em seu livro mais recente, que não foi publicado pela Funag, o diplomata Paulo Roberto de Almeida cita pelo menos um outro caso em que a censura ocorreu neste ano.
"Uma tese de doutorado defendida no King's College, da Universidade de Londres, por Mathilde Chatin – Brazil: a new powerhouse without military strength? – A conceptual and empirical quest about an emerging economic power –, já aprovada para publicação pelo Conselho Editorial da Funag em 2018 foi congelada definitivamente por incluir um prefácio do ex-ministro Celso Amorim, no cargo durante o período coberto pelo trabalho acadêmico", diz Almeida em "Miséria da Diplomacia: A Destruição da Inteligência no Itamaraty"(Boa Vista: Editora da UFRR, 2019).
A mesma Folha relatou à época que a demissão ocorreu após Almeida republicar, em seu blog pessoal três textos recentes sobre a crise na Venezuela, um assinado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, outro pelo embaixador e ex-ministro Rubens Ricupero e o terceiro pelo atual ministro das Relações Exteriores.
Na época, o clima de perseguição dentro do ministério levou à preocupação com o uso mais frequente da censura.
A imposição de censura no Itamaraty, especialmente quando direcionada a obras acadêmicas e de história, aumenta o risco pelo qual vem passando um dos principais ativos da diplomacia brasileira.
Por anos, o Itamaraty foi reconhecido internacionalmente como um dos serviços de política externa mais ativos e competentes do mundo. O profissionalismo e senso crítico dos diplomatas brasileiros são mencionados com frequência por estrangeiros que trabalham com política externa, que elogiam o preparo e conhecimento dos representantes do Brasil. Com a imposição de censura, é possível que o serviço de política externa do Brasil perca parte da sua capacidade crítica, que ajuda a promover esta imagem de competência da presença brasileira no exterior.

[Retomo Guilherme Casarões]:   

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4) Como se não bastassem as censuras, a turma olavista ocupou-se em promover conceitos frágeis, meio conspiratórios, como o novo léxico da política externa brasileira. A construção da "novilíngua" da extrema direita começou com o evento abaixo, em mai/19. http://institutoriobranco.itamaraty.gov.br/artigos/60-noticias/85-funag-e-irbr-promoveram-a-palestra-governanca-global-e-autodeterminacao-popular-de-filipe-g-martins-assessor-especial-do-presidente-da-republica
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5) Em jun/19, um grande evento "internacional" trouxe expoentes da guerra cultural antiglobalista para denunciar George Soros, o STF, Paulo Freire, o @ForodeSaoPaulo, os Illuminati e a Nova Ordem Mundial. À exceção do palestrante americano, todos são orgulhosos alunos do Olavo.

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6) 
fez a abertura do evento, denunciando a "pseudorreligião globalista" a partir de uma leitura torta de Nietzsche e Marx. O ponto mais alto da fala foi a celebração do discurso de 6 MINUTOS de Bolsonaro em Davos, por ter tido a bravura de falar de Deus.


7) Em dez/19, foi a vez do jurista/influencer olavista Evandro Pontes falar sobre as "virtudes do nacionalismo" a partir do livro do filósofo Yoram Hazony, que basicamente opõe o nacionalismo benigno ao totalitarismo da governança global. A construção da novilíngua segue firme.



8) Com o advento da pandemia, a FUNAG passou a realizar seminários virtuais sobre "a conjuntura internacional pós-coronavírus". Evento no mínimo curioso p/um chanceler que, dias antes, problematizou a pandemia de Covid19 como uma questão "terminológica", seguindo o mestre Olavo.


Carlos Malamud: Ernesto Araújo destrói credibilidade da política externa e abala o Itamaraty

Ernesto Araújo destrói credibilidade da política externa e abala o Itamaraty

A gestão de Ernesto Araújo no Itamaraty é vista como desastrosa por analistas e estudiosos de todo o mundo. Araújo retirou o Brasil de fóruns regionais como a Unasul e a Celac, fechou sete embaixadas na África e Caribe e submeteu o país aos EUA. “O país se encontra no maior isolamento diplomático dos últimos 50 anos”, afirma o historiador Carlos Malamud
Ernesto Araújo
Ernesto Araújo (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Sob o governo de Jair Bolsonaro e a gestão de Ernesto Araújo na Chancelaria brasileira, o Itamaraty, uma das mais sólidas instituições do Estado nacional, sofreu um abalo em suas estruturas. Araújo retirou o Brasil de fóruns regionais como a Unasul e a Celac, fechou sete embaixadas na África e no Caribe que haviam sido abertas nos anos Lula-Dilma Rousseff, mudou posições históricas na ONU para alinhar-se aos Estados Unidos, impôs dificuldades em negociações ambientais e privilegiou o relacionamento na Europa com dois países comandados por líderes da extrema direita, aponta reportagem do jornal Valor
“O país se encontra no maior isolamento diplomático dos últimos 50 anos”, afirmou o historiador Carlos Malamud, apontado como um dos 50 intelectuais ibero-americanos mais influentes pela revista espanhola “Esglobal” e hoje pesquisador do Real Instituto Elcano, em Madri. 
Para ele, a boa fama da diplomacia brasileira “está se dilacerando” na Europa e atualmente “seria impensável” ver o Brasil à frente de grandes coalizões de países emergentes em fóruns multilaterais, como ocorreu no passado. 
A destruição da imagem do Brasil está relacionada ao discurso de Ernesto Araújo sobre a questão ambiental, a subordinação do país ao governo de Donald Trump e a postura de Bolsonaro de desleixo em face da pandemia de Covid-19.  
O distanciamento da atual gestão do Itamaraty de posições anteriormente defendidas pela diplomacia brasileira é tanto, que a Associação dos Diplomatas Brasileiros (ADB) manifestou o temor de que representações do país no exterior e seus profissionais passem a ser alvos de ataques, por conta de atitudes como a promessa de mudança da embaixada em Israel para Jerusalém e do apoio ao ataque americano que matou o general iraniano Qassem Soleimani no Iraque. 
A reportagem cita a ironia do diplomata aposentado Roberto Abdenur, ex-embaixador em Washington. Ele diz que o Brasil hoje só tem “três países e meio” como amigos: Israel, Hungria e Polônia. “Meio são os Estados Unidos, porque estamos excessivamente alinhados com as ideias do Trump e antagonizamos com a outra metade, os democratas”, afirmou Abdenur, em um seminário virtual da ADB, na semana passada. Ele vê uma brutal ruptura da atual política externa com o patrimônio diplomático brasileiro. O resultado é o encolhimento da presença do Brasil no plano internacional. 
A gestão de Ernesto Araújo também provocou abalos nas relações internas do ministério, com a instalação de uma "caça às bruxas". 
“O clima é de humilhação e caça às bruxas”, diz o ex-ministro da Cultura e deputado federal Marcelo Calero (Cidadania-RJ), que se licenciou da carreira diplomática para o exercício do mandato. Ele encaminhou ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a proposta de criar uma comissão de acompanhamento externo do Itamaraty. “Moderação e previsibilidade são atributos da própria diplomacia, mas hoje existe uma contaminação pela ideologia, um fanatismo quase místico”, afirma. 

Postagem em destaque

Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...